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SUMÁRIO

Capítulo 1 – O comportamento dos bancos em uma economia monetária

1.2. Teoria neoclássica da firma bancária: diferentes abordagens

1.2.3. O racionamento de crédito de Stiglitz e Weiss

Stiglitz e Weiss (1981, p. 393) afirmam que: “[…] in equilibrium a loan

market may be characterized by credit rationing”. De acordo com os pesquisadores,

os bancos concedem empréstimos atentos às taxas de juros que cobram e aos riscos envolvidos. Alertam, todavia, que as próprias taxas de juros cobradas podem afetar o nível de risco dos empréstimos concedidos, principalmente por meio da seleção adversa e do efeito incentivo, derivados diretamente do fato de o mercado de crédito ser caracterizado por informações imperfeitas (STIGLITZ e WEISS, 1981). Segundo os pesquisadores, o processo de seleção adversa em função da taxa de juros decorre do fato de que diferentes tomadores de recursos apresentam diferentes probabilidades de inadimplência. Dessa forma, com o retorno financeiro

dos bancos dependendo da probabilidade de pagamento dos empréstimos, procura- se identificar que tomadores de recursos apresentam menores riscos de se tornarem inadimplentes. Com esse propósito, os bancos adotam vários “dispositivos de investigação”33

(screening devices).

A taxa de juros que um demandante de recursos está disposto a pagar representa um dos dispositivos de investigação adotados, pois quanto maior a taxa de juros, maior o risco do projeto, o que também indicaria que o tomador de recursos tem ciência de que a sua probabilidade de pagamento do empréstimo é baixa, independentemente da taxa de juros cobrada. Nesse sentido, os autores observam que, conforme a taxa média de juros aumenta, o risco de inadimplência também aumenta, podendo diminuir os lucros dos bancos (STIGLITZ e WEISS, 1981).

Por sua vez, o efeito incentivo que Stiglitz e Weiss (1981) citam está relacionado à forma como alterações das taxas de juros e de outros termos dos contratos de empréstimos podem afetar o comportamento dos tomadores de recursos. Por exemplo, um aumento das taxas de juros, ao reduzir o retorno financeiro de projetos que poderiam ser bem sucedidos, pode levar as firmas a optarem por projetos com maiores retornos, porém, com maiores riscos e menor probabilidade de sucesso. Ao optarem por projetos mais arriscados, as firmas estariam aumentando a sua probabilidade de se tornarem inadimplentes, com possível redução da rentabilidade dos bancos. Nesse sentido, aumentos das taxas de juros poderiam levar os emprestadores de recursos a agirem de forma contrária aos interesses dos bancos que, em resposta, racionariam crédito ao invés de elevarem as taxas de juros quando houvesse uma maior demanda por “fundos emprestáveis”34

(STIGLITZ e WEISS, 1981).

Stiglitz e Weiss (1981) destacam que em um mundo com informações perfeitas e sem custos para a sua obtenção, todas as ações dos tomadores de recursos que pudessem afetar o retorno financeiro dos empréstimos seriam passíveis de previsão por parte dos bancos. Todavia, os bancos não são capazes nem de prever e nem de controlar todas as ações futuras dos emprestadores de

33 Além da taxa de juros que os autores citam, outros “dispositivos de investigação” usualmente adotados pelos

bancos são: pesquisas cadastrais, análises econômico-financeiras, referências, entre outros.

34

Stiglitz e Weiss (1981), assim como os demais autores ortodoxos abordados anteriormente, também desenvolvem a sua argumentação com base no conceito de oferta e demanda de “fundos emprestáveis”; ou seja, os pesquisadores também não consideram que os bancos criam novo poder de compra.

r* Taxa de juros Reto rn o fi n an cei ro es p er ad o

recursos, razão pela qual incluem em seus contratos cláusulas que levem os tomadores de recursos a se comportar de acordo com os seus interesses e também com o propósito de atrair tomadores de recursos que apresentem menor risco de se tornarem inadimplentes (STIGLITZ e WEISS, 1981).

Em razão da seleção adversa e do efeito incentivo, Stiglitz e Weiss (1981) afirmam que o retorno financeiro esperado dos empréstimos concedidos por um banco pode não acompanhar a evolução de suas taxas de juros, sendo que, a partir de determinado ponto, o retorno financeiro poderia diminuir, mesmo com a cobrança de taxas de juros mais elevadas. Dessa forma, os autores assumem que haveria uma taxa de juros ótima (r*) que maximizaria o retorno financeiro dos bancos, conforme mostra a Figura 1 a seguir:

Figura 1: Taxa de juros (r*) que maximiza o retorno financeiro esperado dos empréstimos concedidos por um banco.

Fonte: Stiglitz e Weiss (1981, p. 394). Elaboração do autor.

Os pesquisadores também consideram que tanto a demanda, quanto a oferta de “fundos emprestáveis” são funções da taxa de juros, sendo a oferta determinada pela taxa de juros ótima (r*), com a demanda por “fundos emprestáveis” sempre excedendo a sua oferta àquela taxa, ao contrário do que estabelece a análise econômica tradicional, segundo a qual, na presença de um excesso de demanda, as taxas de juros subiriam até equilibrar demanda e oferta.

Dessa forma, apesar de não haver um equilíbrio entre oferta e demanda à taxa de juros ótima (r*), essa seria a taxa de juros de “equilíbrio” do mercado, em

razão de ser a taxa que maximizaria o retorno financeiro esperado dos empréstimos concedidos. Na visão dos pesquisadores, isso decorre do fato de que um banco não concederia um empréstimo a uma firma ou indivíduo que estivesse disposto a pagar mais que a taxa de juros ótima (r*), por considerar tal empréstimo mais arriscado. Além disso, os bancos também avaliariam que o retorno esperado a uma taxa de juros maior que r* seria menor do que o retorno à taxa de juros r*, conforme Figura 1 já apresentada anteriormente. Nesse sentido, Stiglitz e Weiss chegam à conclusão de que não há forças competitivas que levem a oferta a igualar a demanda, havendo, portanto, racionamento de crédito, uma vez que a demanda por crédito não é atendida em sua totalidade

Cabe destacar que os pesquisadores utilizam o termo racionamento de crédito ao se referirem: i) à parcela dos demandantes de crédito de mesmo risco que terão suas solicitações rejeitadas e que não receberão empréstimos, mesmo que estejam dispostos a pagar uma maior taxa de juros; ou ii) a certos grupos de indivíduos da população que, dada determinada oferta de crédito, são incapazes de obter empréstimos, a quaisquer taxas de juros e mesmo no caso de um aumento da oferta de crédito (STIGLITZ e WEISS, 1981).

Em resumo, a principal contribuição de Stiglitz e Weiss (1981) para a discussão consiste em vincular o racionamento de crédito à assimetria de informações, principalmente à seleção adversa e ao efeito incentivo.

Porém, conforme observa Freitas (1997)35, o racionamento de crédito de Stiglitz e Weiss (1981), apresentado como uma ideia original, pode ser compreendido como um exemplo de incorporação e de aplicação da incerteza fundamental de Keynes às formulações do mainstream economics.