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SUMÁRIO

Capítulo 1 – O comportamento dos bancos em uma economia monetária

1.4. Características e impactos da atividade bancária sob uma perspectiva pós-keynesiana

1.4.2. A oferta endógena de moeda

De acordo com a teoria da oferta exógena de moeda, o banco central controla a quantidade total de reservas disponível na economia por meio de controles quantitativos, sendo essa a ideia de oferta de moeda presente nos trabalhos dos autores neoclássicos tratados na presente dissertação e associada ao “verticalismo” monetarista.

A teoria alternativa é a de que a oferta de moeda é endógena, estando vinculada ao “horizontalismo” pós-keynesiano55

, que se subdivide em duas correntes: a acomodacionista e a estruturalista. Mendonça (1994) aponta a diferença entre as duas correntes existentes na linha “horizontalista”:

Na literatura observa-se a diferenciação entre dois grupos: os acomodacionistas e os estruturalistas. Os primeiros são assim chamados por afirmarem que o comportamento da autoridade monetária será sempre no sentido de acomodar aumentos da oferta [de crédito] resultantes de alterações na demanda por credito. A única variável sob a égide da autoridade é o preço a partir do qual está disposta a realizar trocas de reservas. Os estruturalistas destacam-se pela importância que dão ao arcabouço institucional no processo de geração de moeda dentro do mercado financeiro. A determinação das taxas de juros é resultado da interação dos comportamentos da autoridade monetária e instituições financeiras (Mendonça, 1994, p. 83).

Segundo a corrente acomodacionista56, a autoridade monetária não controla a quantidade total de reservas disponível na economia; ao contrário, o banco central apenas acomoda a demanda por reservas do público e dos bancos comerciais com o propósito de atingir a sua meta de taxa de juros, a variável que efetivamente está sob o seu controle.

Nesse sentido, a quantidade de reservas é determinada endogenamente, em função do objetivo de taxa de juros fixado pela autoridade monetária e da demanda por reservas do público e dos bancos comerciais, o que pode ser feito por

55 Carvalho (1993) não considera a exogeneidade ou endogeneidade da oferta de moeda, por si só, como um

critério que possa diferenciar ortodoxia ou heterodoxia em termos de matéria monetária ou macroeconomia em geral. O pesquisador faz referência a autores estritamente ortodoxos em questões monetárias, como Wicksell e Schumpeter, que construíram modelos de moeda endógena. Segundo Carvalho, o próprio Milton Friedman não se comprometeria completamente com o exogenismo.

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A corrente acomodacionista da oferta endógena de moeda também pode ser denominada de horizontalista, o que pode causar alguma confusão, uma vez que não é raro a adoção do termo “horizontalista” como sinônimo da teoria da oferta endógena de moeda, que inclui as vertentes acomodacionista e estruturalista.

meio de operações de mercado aberto e/ou pela alteração de sua taxa de requerimento de reservas.

O banco central aumentará ou diminuirá a sua oferta de reservas em função de sua meta de taxa de juros, pois essa é a variável exógena definida e perseguida pela autoridade monetária; enquanto a quantidade total de reservas é a variável endógena, determinada em função da meta de taxa de juros e da demanda por reservas do público e dos bancos comerciais, as variáveis exógenas.

Por sua vez, para a corrente estruturalista, as reservas constituem apenas mais um instrumento financeiro que pode ser utilizado como meio de pagamento. O fato de o sistema financeiro poder criar, principalmente por meio de inovações57, outros instrumentos financeiros que também sirvam como meios de pagamentos, diminuiria a sua dependência do banco central, embora este último continuasse a exercer influência decisiva sobre o comportamento e as decisões das instituições financeiras.

A criação desses novos instrumentos financeiros teria entre os seus principais propósitos escapar à regulação, uma vez que não passam por alterações da legislação ou de política monetária; bem como garantir o aumento do crédito e a realização de novos ganhos financeiros. Além disso, esses novos instrumentos financeiros, utilizados como meios de pagamento, exerceriam pressões sobre as taxas de juros (Mendonça, 1994).

Nesse contexto, a determinação das taxas de juros não ficaria única e exclusivamente a cargo do banco central, como afirmam os acomodacionistas, sendo também influenciada pelas instituições financeiras, em que pese a grande relevância que a autoridade monetária ainda tivesse em sua definição.

Entretanto, Rochon e Rossi (2013, pp. 211/212) afirmam que há atualmente maior consenso entre acomodacionistas (horizontalitas) e estruturalistas:

[…] regardless of the horizontalist–structuralist debates of some decades

ago, there is today much wider consensus […] In particular, there is consensus on the following four important points. First, post-Keynesians agree that the ‘supply of money’ is demand-determined in order to finance the needs of the economic system to reproduce itself and grow, through the use of bank credit: money is issued through bank credit. Second, there is also agreement that banks are special because they can issue any money

57 Entre as inovações usualmente citadas estão o próprio mercado interbancário e produtos financeiros

units, and that their role is of primary importance in economic activity. Banks are not constrained by prior central bank reserves, and lend to all customers they deem creditworthy, although what they consider as creditworthy may change over the cycle (see Rochon 2006). Third, there is also some agreement on the role of central banks in preventing financial crises by supplying banks with the liquidity the latter need. Indeed, the crisis in Europe has exemplified the important role a central bank can play in mitigating the impact of a crisis. The refusal of the European Central Bank, for instance, to intervene more aggressively has had some devastating effects. Central banks must act as a lender of last resort. Finally, there is now, we would argue, also a large consensus on the exogenous nature of the central bank controlled rate of interest (see Rochon and Rossi 2006). Central banks can determine any rate of interest they wish, as is clearly the case with near-zero interest rates in several countries at the time of writing.

Considerando-se o maior consenso entre acomodacionistas e estruturalistas, apontado por Rochon e Rossi (2013), que destacam, entre outros pontos de convergência, que a oferta de moeda é endogenamente determinada por meio da concessão de crédito para o financiamento da produção com vistas ao crescimento da economia, bem como o fato de o banco central ter condições de determinar a taxa de juros que desejar, nessa dissertação será adotada a visão acomodacionista, uma vez que essa parece se aproximar mais do consenso atualmente existente na literatura pós-keynesiana.

1.4.3. A criação de moeda ou de novo poder de compra pelos bancos