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1.2.1 O “Terreiro” Teórico

No documento 000717678 (páginas 35-37)

Ao longo de minha trajetória de pesquisa fui motivado por várias teorias filosóficas, pois tive uma jornada acadêmica bem turbulenta. Me formei paralelamente em Filosofia e Letras. Minha cabeça é a propria encruzilhada do pensamento, pois desde o começo tentei unir Literatura e Filosofia e Educação. Depois, outra dupla formação. Tive a oportunidade de ser aprovado em dois Mestrados na Universidade Federal de Santa Catarina e os concluí. No Mestrado em Letras tentei articular o aspecto poético e ontológico no Grande sertão: veredas de Guimarães Rosa pelo viéis heideggeriano, sobretudo o Heidegger tardio, “de passagem para o poético” e no Mestrado em Educação tentei pensar uma política de formação estética do educador, a partir do pensamento da

36 diferença. No Mestrado comecei a estudar Deleuze e foi o que me deu a possibilidade de fazer um projeto e tentar a seleção de Doutorado aqui na UFRGS, na Linha de Pesquisa “Filosofias da Diferença e Educação”. Devido a várias questões de natureza política e pessoal, esse projeto não avançou e, por opção, resolvi mudar de Linha de Pesquisa e, certamente, de orientador. Foi onde encontrei a professsora Dra. Malvina do Amaral Dorneles que acolheu-me e me deu a possibilidade de mostrar a minha “voz afro”. Procurei conhecer mais sobre a Linha de Pesquisa, os seus interresses teóricos e começar a germinar uma ideiazinha que pudesse intensificar um certo namoro, uma aliança possível. Comecei a fazer as disciplinas com ela e ali pude ter uma relação mais próxima com o “seu” Referencial Teórico que, certamente, seria o meu. Dessa forma, quando ia a campo já era motivado por essa inspiração teórica. Certamente essa “bagagem intelectual” que carrego ao longo de minha vida me fortaleceu e, de certa forma, foram determinantes nessa maneira de ver que estou propondo.

E outras motivações teóricas que foram se impondo na medida em que a pesquisa começava a avançar além das que vieram no processo de estudo no Doutorado que tiveram um papel relevante na pesquisa até o momento de “qualificação” onde outras alianças foram construídas e que foram determinantes para o fortalecimento do pacto e para os novos rumos que a pesquisa tomou. “Dentro da riqueza do campo, complexo e multifacetado, o pesquisador vai privilegiar um aspecto, de acordo com sua formação, suas preferências pessoais” (Augras, 2000:46). Advertiu-nos Augras. É importante mostrar com que conceitos estarei trabalhando. No que diz respeito a Heidegger (1999), trago a noção de Cotidiano que nos interessa agora em Ser e Tempo I, embora a noção de Cuidado e Cura apareça em vários momentos. Esse Heidegger ajudou-me a pensar existencial e ontologicamente o Terreiro como espaço da cura, ressaltando a importância das folhas e do “ebó”. De Nietzsche (1992), retomo a noção de Tragédia em O Nascimento da Tragédia. Esse Nietzsche tem uma importância pelo aspecto dionisíaco, trágico, que foi motivado pelas leituras cuidadosas que fiz do Instante Eterno e da Sombra de Dionísio de Michel Maffesoli. No que diz respeito a Deleuze (2003), a noção de signo em Proust e os Signos, pois é ali que comecei a ter contato com a noção de Aprendizagem, que é o que justificaria o aprender na tribo do Candomblé. Em Maffesoli, estarei transitando entre O Tempo das Tribos, O Instante Eterno e A Sombra de Dionísio. Em Georges Balandier, focalizo O Contorno: Poder e Modernidade e Desordem: elogio do movimento, pois encontrei nesses livros uma força esclarecedora sobre a figura de Exu, a contradição humana, a modernidade fugidia e o embaralhar da

37 modernidade que se revela no jogo dos búzios. Edgar Morin é arrastado a todo instante nas dobras do texto pela própria noção de Complexidade, pois a tribo e a condição humana que nela vive, é por natureza complexa. A cada instante deparamos com as incertezas e precisamos enfrentá-las para entrarmos nesse

homo complexus que é o Povo do Santo. Em Geertz (1989), retomo a noção de cultura em A Interpretação das Culturas, pois a autor, ao definir a natureza do trabalho etnográfico, nos coloca diante do ethos e de uma visão de mundo Em

Ritos e rituais contemporâneos de Martine Segalen (2002), pude buscar compreeder o terreiro como espaço de rituais que se transfiguram e nos mostram que o terreiro é, em cada instante, um rito de passagem, assim como vai intensificar Roberto DaMatta (1987) ao nos mostrar o o trabalho de campo como um rito de passagem.

Em A Violência e o Sagrado de René Girard (1990), apresento a noção de mimetismo e a noção de pessoa no Terreiro, pois é impossível falarmos em máscara e estética sem falarmos da construção da noção de pessoa, bem como Girard inspirou-me uma abordagem do sagrado no processo de transfiguração do transe. Quando falamos em religião, falamos em sagrado e em segredo. De certa forma, essa Tese é de inspiração maffesoliana e, a partir dele, pude andar por caminhos diversos tais como o pensamento da diferença de Deleuze-Guattari, O trágico em Nietzsche, O cuidado e a cura em Heidegger, a noção de poético em Bachelard e imaginário-simbólico em Gilbert Durand (2002). Em Paulo Freire (2005), indaguei em A Pedagogia do Oprimido a noção de Pedagogia dialógica a fim de intensificar a teia intercultural e pedagógica. Apoiado na religação do saberes e na Complexidade de Edgar Morin, em seu Método, seguirei várias jornadas de trabalho de campo, do estar – junto, do ver e ser visto na liga das coisas, da terra, dos deuses e do mundo. Surgem as jornadas que são de vida, de pensamento, de modo de ver, de crer e de ser.

No entanto, outros teóricos dos estudos afro-brasileiros ajudaram-me a estabelecer um forte elo nesse trabalho e farei, a seguir, um levantamento da literatura da área.

1.3 - Atuais estudos Afro-brasileiros:

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