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O território Potiguar e os interesses oligárquicos na produção de

4 Agricultura e cultivo de frutas tropicais no Rio Grande do Norte: ações

4.1 O território Potiguar e os interesses oligárquicos na produção de

No Rio Grande do Norte, atrelada às políticas de modernização, a produção de frutas se estabelece dentro de um programa de Estado que visava modernizar a base produtiva. De acordo com Barbosa (2014), o projeto de modernização do Rio Grande do Norte revela-se um processo incompleto e seletivo, conduzido por grupos oligárquicos locais, os quais também se constituem grupos políticos, usando de programas e projetos governamentais que favoreciam a interesses próprios criando ações corporativas mascaradas pelo discurso da modernização e do desenvolvimento territorial.

As ações consistiam em fazer uso de recursos públicos para dotar o território de uma infraestrutura técnica. Teoricamente, vimos a técnica como mediadora da vida e das relações sociais. Desse modo, a intencionalidade que implicará no uso da técnica guarda sua essência, pois como esclarece Heidegger “A técnica não é perigosa. Não há uma demonia da técnica. O que há é o mistério de sua essência. Sendo um envio de desencobrimento, a essência da técnica é o perigo” (2007, p. 30). Ou seja, a intencionalidade de seu uso. A técnica é mais que um instrumento, é a ideia, o ato, a materialidade carregada de intencionalidade, dotada de um uso por um determinado grupo, visando atender seus interesses.

Como demostra Barbosa (2014), existia uma clara intenção de modernização da infraestrutura empreendida pelos grupos políticos do Rio Grande do Norte, seja nas áreas urbanas ou nas áreas rurais, esse processo

modernizante e excludente ocorreu com a dotação de infraestrutura hídrica e de estradas, em porções do território em que os grupos políticos oligárquicos que reversavam o controle da máquina pública tinham empreendimentos ou aliados. Segundo a autora, a concepção de moderno que vigorou nesta unidade da federação esteve atrelada à construção de novos arranjos territoriais por meio de infraestrutura e crescimento econômico. Nos espaços rurais, a modernização consistiu em substituir os cultivos de algodão e sisal, com a procura em decadência no mercado externo, por novos produtos que o mercado externo absorvesse.

As ideias de moderno e de crescimento econômico, no Rio Grande do Norte, estiveram nitidamente atreladas a uma produção cujo consumo apresentava caráter exógeno. Nesse sentindo, a modernidade perde sua condição efêmera e adquire forma e lugar, demarcando condições de uso e estabelecendo arranjos produtivos. Berman (1982) assevera que a modernidade se estabelece na relação espaço-tempo ficando suas marcas registradas na paisagem a partir das relações sociais que criamos com este espaço e com este tempo. Assim, a modernidade é uma forma de nos relacionarmos com o espaço e com o tempo.

A modernidade, desse modo, se estabelece por um conjunto de percepções e numa relação conflituosa de poder, predominando a concepção de modernidade que emana das forças de poder da classe social dominante e dos interesses políticos dominantes. Exemplo claro é a construção de Brasília, que tinha dentre as muitas finalidades de sua construção, a de mostrar um Brasil moderno (IANNI, 1992).

Nesse sentido, a construção do moderno está em íntima relação com o poder político posto. “Em todos os lugares, combina-se o moderno material com o autoritarismo do mando e do desmando” (IANNI, 1992, p. 37). A ideia de moderno justificava uma nova empreitada econômica, o investimento público e a concepção de progresso que uma determinada atividade traria à Nação. Nesses moldes, a industrialização representava um novo modelo de organização da sociedade brasileira, deixando de lado os laços com os espaços rurais e fortalecendo os espaços urbanos como modernos e progressistas. Caberia, então, aos espaços rurais se modernizarem para fazer parte deste país, isso ocorreria com o direcionamento a cultivos demandantes

de técnicas e ciências, a exemplo das frutas. Nas palavras de Ianni (1992, p. 44), “o capitalismo avançou mais ainda no campo, de modo extensivo e intensivo”.

As ações governamentais empreendidas no campo promoveram a tecnificação dos espaços rurais, sem, no entanto, desmontar sua estrutura desigual, fato que ficou conhecido na literatura como modernização conservadora. Acreditamos que esse episódio, além de manter as estruturas fundiárias, acentuou ainda mais as desigualdades locais e regionais, na medida em que grandes empresas especializadas na produção de frutas tropicais passaram a exercer o domínio dos meios de produção no uso do território.

Apesar de conservadora e concentrada, a modernização da agricultura no Brasil também pode ser classificada como expansionista, pois seus reflexos se fizeram presentes em todas as unidades da federação, seja de forma planejada ou desordenada, fase que ocorreu com maior proeminência a partir dos anos 1980, por meio do incentivo governamental, em diversificar os produtos da base agrícola com vistas ao crescimento das exportações e na consolidação do incipiente mercado interno.

As ações governamentais amparadas no discurso ideológico de redução das desigualdades regionais justificaram a formulação de uma série de planos e programas destinados à homogeneização das técnicas produtivas na agricultura. Dentre os que tiveram maior período de duração, destacam-se as ações destinadas ao desenvolvimento da agricultura mecanizada com a utilização de tratores, fertilizantes, sementes modificadas geneticamente e das técnicas de irrigação, que tiveram início nas áreas úmidas dos rios e, posteriormente, foram alargadas para a região semiárida, via Política Nacional de Irrigação, que possibilitou a criação de áreas públicas destinadas a essa prática.

Segundo análise de Santos e Silveira (2008), a modernização da agricultura nesses espaços produtivos, que constituem na verdade belts produtivos, evidencia-nos que:

O território brasileiro tem incorporado muitas das características da chamada revolução agrícola, mas especialmente nas culturas de exportação, aquelas que consolidam a divisão territorial do trabalho mundial. Assim, esses produtos acabam por invadir, com velocidade cada vez

maior, áreas antes destinadas às produções domésticas. Houve uma desvalorização das agriculturas alimentares básicas e de tradição nacional (como arroz, feijão e mandioca), e isto se dá com a colaboração do crédito público, da informação, da propaganda e dos novos consumos. O conflito velado entre agricultura de exportação e agricultura para o mercado interno [...] (SANTOS; SILVEIRA, 2008, p. 120).

Esse formato de produção ao qual a agricultura brasileira foi se moldando nos últimos anos expressa, também, os interesses nacionais de competir internacionalmente como grande produtor de produtos primários. Assim, ocorre uma organização do espaço produtivo agrícola, intensificando o nível de especialização regional, no qual determinadas regiões do país concentram maiores índices de produção em decorrência de deterem elevadas taxas de mecanização, de endividamento por parte dos proprietários, e por apresentar uma melhor infraestrutura distribuída espacialmente no território.

4.2 Oligarquia, agricultura e política no Rio Grande do Norte: reflexos na