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Obsolescência programada na indústria fashion: empecilho à proteção jurídica

3. FASHION LAW: ABORDAGEM JURÍDICA DAS CRIAÇÕES DE MODA

3.1. Obsolescência programada na indústria fashion: empecilho à proteção jurídica

Segundo Gill s i tsky, “u in úst i cultu l qu s g niz s b

incí i s b n n i c s n u c nsu xc ci n l nt instá l”.85 O consumo de roupas e artigos de moda cresceu consideravelmente, sobretudo com a repercussão do fast-fashion. Peças repostas quase diariamente e coleções sazonais com

produção em larga escala fomentaram uma indústria de moda que vai além das necessidades do público a que se destina.

O termo obsolescência programada tem sua origem associada ao Cartel Phoebus, na década de 1920. Grandes fabricantes de lâmpadas acordaram uma vida útil de 1000 horas para cada lâmpada, uma vez que houve decréscimo de venda devido ao aperfeiçoamento da matéria para uma duração de 1500 horas. Desse modo, quanto maior a durabilidade do produto em comento, menor seria a necessidade de adquiri-lo.86

No que concerne à moda, a obsolescência não só programada como psicológica é aplicada às produções. É programada no sentido semelhante ao que foi empregado às lâmpadas do Cartel Phoebus: roupas produzidas em massa para coleções efêmeras, com material de qualidade duvidosa e, algumas vezes, com mão de obra análoga à escrava, fatores os quais diminuíram os preços dos produtos. Desse modo, com menor valor, o consumidor tende a adquirir mais peças em um menor período.

Quanto à obsolescência psicológica, é moldada naquele que consome uma suposta necessidade em se obter a peça do vestuário lançada na coleção mais recente. Ou seja, ainda que o consumidor possua vestimentas perfeitamente usáveis e de boa qualidade, o

85 LIPOVETSKY, Gilles. O império do efêmero. A moda e seu destino nas sociedades modernas. Trad. de

Maria Lúcia Machado. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.

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SANTOS, Helena Roza dos; DOMINIQUINI, Eliete Doretto. A Insustentabilidade Da Obsolescência

Programada: Uma Violação Ao Meio Ambiente E Aos Direitos Do Consumidor. Disponível em:

desejo em obter o novo o faz adquirir além de suas necessidades.87Nesse sentido, afirma Gilles:

Forma moda que se manifesta em toda sua radicalidade na cadência acelerada das mudanças de produtos, na instabilidade e na precariedade das coisas industriais. A lógica econômica realmente varreu de permanência, é a regra do efêmero que governa a produção e o consumo dos objetos. [...] A lei é inexorável: uma firma que não cria regularmente novos modelos perde em força de penetração no mercado e enfraquece sua marca de qualidade numa sociedade em que a opinião espontânea dos consumidores é a de que, por natureza, o novo é superior ao antigo.88

Destarte, a empresa que estagna sua produção e não acompanha a celeridade do contexto em que se insere, tende a ser menos atrativa para o público a que se destina. Ainda que os objetos clássicos e atemporais permaneçam, a exigência de investir no novo é imprescindível para que a marca de moda não forje sua imagem como ultrapassada ou alheia aos apelos do mercado.

Desse modo, diante da inevitabilidade do consumo, importante se faz trazer à baila o impacto da efemeridade do produto em se tratando da propriedade intelectual. As Semanas de Moda, as quais ocorrem semestralmente nas cidades mais influentes no mercado

fashion, apresentam as tendências, as cores mais utilizadas na estação, os modelos de peças que predominarão. Lívia Barbosa Maia expõe, ainda, que cada estilista, mesmo que não apresente as criações nas passarelas, divide suas coleções em nichos por estação. Logo, o suposto intervalo semestral entre lançamentos diminui para períodos mensais ou, em casos específicos, quinzenais.89

Conforme se expõe no quarto capítulo, quando são apresentados os empecilhos da LPI para a proteção de artigos de moda, o processo administrativo de registro ou patenteamento do produto deve ser, no mínimo, compensado pelo retorno financeiro que o objeto trará por meio da relação consumerista.

Logo, para uma peça que ficará em destaque no mercado por somente alguns meses, de acordo com o que melhor convir à empresa, ao estilista e, sobretudo, ao público, o custo-benefício é relevante quando a submete à proteção de propriedade intelectual? Para responder à questão, mais uma vez é necessário refletir acerca do conceito intrínseco àquele que produz a peça.

87 Em pesquisa recente, foi constatado que as peças de vestuário feminino são usadas, em sua maioria, por

apenas sete vezes até que sejam descartadas ou inutilizadas. Ademais, o consumo de roupas e sapatos, nos Estados Unidos, duplicou desde a década de noventa. Informações disponíveis em: < http://www.theatlantic.com/business/archive/2016/02/buying-less-by-buying-better/462639/>. Acesso em 18 out. 2016.

88 LIPOVETSKY, Gilles. O império do efêmero. A moda e seu destino nas sociedades modernas. Trad. de Maria

Lúcia Machado. São Paulo: Companhia das Letras, 2009, p.5.

89 MAIA, Lívia Barboza. A proteção do direito da moda pela propriedade intelectual. Disponível em:

Para uma marca de slow fashion, cujo objetivo é produzir peças duráveis, neutras e atemporais, a patente ou o registro90podem adequar-se conforme as especificidades do produto. Um tecido ecológico, por exemplo, produzido com tecnologia inovadora e diferente do que há no mercado, se preenchidos os requisitos, poderia ser patenteado.

Conforme afirma João Luís Nogueira Matias91, contemporaneamente, almeja-se

x cíci ti i c nô ic s i l “ liz õ s if nci s, com o s it s int ss s qu l s qu s l ci n c s ci ”. Assim, o slow fashion

vai ao encontro da necessidade de padrões éticos da atuação empresarial. Por não se filiar à produção em massa, investe-se em uma cadeia produtiva que não visa ao lucro pelo lucro.

No que concerne ao fast fashion, no entanto, o enquadramento em proteção à propriedade intelectual é mais difícil de ser obtido, tanto por, geralmente, não investirem em produtos de qualidade, quanto pela efemeridade em que os objetos ficarão em destaque no mercado. Soma-se a isso o fato de as próprias fast-fashion serem responsáveis pela popularização das tendências apresentadas nas passarelas, de modo que, muitas vezes, figurem no polo passivo de litígios envolvendo uso indevido de propriedade intelectual de terceiros.