UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE DIREITO
GRADUAÇÃO EM DIREITO
MONIQUE MARIA GUIMARÃES UNIAS
FASHION LAW: AS CRIAÇÕES DE MODA COMO OBJETO DO DIREITO DE
PROPRIEDADE INTELECTUAL E O TRATAMENTO JURÍDICO DADO AO TRADE
DRESS
MONIQUE MARIA GUIMARÃES UNIAS
FASHION LAW: AS CRIAÇÕES DE MODA COMO OBJETO DO DIREITO DE
PROPRIEDADE INTELECTUAL E TRATAMENTO JURÍDICO DADO AO TRADE
DRESS
Monografia apresentada ao Programa de Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial à obtenção do título de bacharel em Direito. Área de concentração: Direito Empresarial.
Orientadora: Prof.ª Dr.ª
Raquel Cavalcanti Ramos Machado.
FORTALEZA
MONIQUE MARIA GUIMARÃES UNIAS
FASHION LAW: AS CRIAÇÕES DE MODA COMO OBJETO DO DIREITO DE
PROPRIEDADE INTELECTUAL E TRATAMENTO JURÍDICO DADO AO TRADE
DRESS
Monografia apresentada ao Programa de Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial à obtenção do título de bacharel em Direito. Área de concentração: Direito Empresarial.
Orientadora: Prof.ª Dr.ª
Raquel Cavalcanti Ramos Machado.
BANCA EXAMINADORA
________________________________________ Prof.ª Dr.ª Raquel Cavalcanti Ramos Machado (Orientadora)
Universidade Federal do Ceará (UFC)
_________________________________________ Prof. Dr. William Paiva Marques Júnior
Universidade Federal do Ceará (UFC)
_________________________________________ Prof. Dr. João Luís Nogueira Matias
A Deus.
A meus pais, Alberto e Ivone.
AGRADECIMENTOS
A Deus, por tudo. Por cada minuto da minha vida e por me dar a certeza de que
todas as coisas têm o seu tempo determinado e de que há tempo para todo o propósito debaixo
do Céu. Obrigada por ser o Maestro perfeito dessa grande orquestra de desafinados da qual
nós, em nossa pequenez humana, fazemos parte.
Aos meus pais, Alberto e Ivone, por todo o amor. Obrigada por serem os
melhores. Sei que o grande objetivo de vocês é proporcionar para mim e para a Camilla o
necessário (e muito além) para a nossa formação pessoal e profissional. Obrigada por todos os
“nã s” “sins”( is “nã s” qu “sins”, ig -se de passagem). Obrigada por renunciarem
a tantas coisas para que nós tivéssemos a melhor educação. Mami, a senhora é meu exemplo
de altruísmo e de que ter humildade é a maior riqueza de alguém. Papi, espero um dia ter um
terço da sua força, dedicação e bondade. Sou muito abençoada por ter vocês comigo, sempre
tão presentes e maravilhosos.
À minha irmã, Camilla, por me mostrar o verdadeiro significado de almas
gêmeas. Obrigada por ser minha amiga de todas as horas. É muito bom ser a caçula quando se
tem uma irmã tão inspiradora. Desde que nasci, literalmente, você é minha companhia
garantida. Sempre me incentivando a seguir meus sonhos e me fazendo acreditar que sou
capaz de qualquer coisa. Obrigada por me elevar a um patamar que tenho certeza de que não
mereço. Você é minha torcida garantida quando nem eu mesma acredito que vou conseguir.
Obrigada por tudo, amiga.
Ao pequeno Nino, meu quadrúpede preferido, por trazer leveza aos meus dias tão
corridos. Ter a certeza de que haverá um animalzinho ansioso e feliz por ouvir a sua voz não
tem preço.
Ao meu cunhado, Rodrigo, por sempre torcer por mim como se eu fosse sua irmã
mais nova. Obrigada, também, por me levar para conhecer as praias bonitas com a Camilla, a
Júlia e o Pedro.
Às minhas melhores amigas desde a época da escola, inh s qu i s “N z s”,
por tantas histórias boas que vivemos e ainda viveremos, se Deus quiser. Vocês são a paz e
gratidão que me preenche quando me lembro do passado e vejo que as responsáveis por
algumas de minhas melhores lembranças estão ainda ao meu lado. Yara, Heloise, Carol,
Laene, Bárbara, Brenda e Thaynar, muito obrigada por serem a certeza de que há amizades
que duram para sempre.
Às minhas queridas amigas da FD, porque, como diria uma história da qual muito
e derrubar um trasgo montanhês de quase quatro metros de altura é uma dessas coisas”.
Amanda e Ivina, muito obrigada pela amizade, pela companhia certa em madrugadas de
estudo e pelas reflexões aleatórias sobre a vida, o universo e tudo mais. Lia e Anna Caroline,
muito obrigada pela amizade, pelos gostos em comum e pela companhia mais feliz no estágio
na Defensoria Pública da União. Roberta e Katherine, muito obrigada pela amizade e por
terem deixado meus dias de graduação mais leves e divertidos. Torço muito pelo sucesso de
vocês e espero que sejam muito felizes.
Aos Pigmeus®, meus valiosos presentes inesperados da FD. Com vocês, o riso é
certo. Muito obrigada por dividirem comigo alguns dos melhores momentos dos últimos anos.
Espero que Deus conserve nossa amizade do jeitinho que é: leve, descontraída e com
afortunadas desventuras em série (das quais faremos piadas eternamente).
Ao Felipe, grande amigo que a faculdade me proporcionou. Obrigada por toda a
ajuda durante a graduação, por todos os momentos de crise compartilhada com o Direito e por
uma amizade que é ainda tão recente, mas parece de anos. Torço muito pela sua felicidade,
amigo.
À Defensoria Pública da União, lugar no qual estagiei durante dois anos. Nunca
conseguirei expressar o tamanho de minha gratidão por ter tido a oportunidade de estagiar em
um lugar tão humano. A DPU não só me ensinou um pouco da prática do Direito, como me
fez crescer espiritualmente, reascendendo a esperança de que ainda existem pessoas que
trabalham para aqueles que precisam. Muito obrigada, sobretudo, ao Dr. Eduardo Negreiros e
à Dra. Vanessa Pinheiro, meus chefes, por toda paciência e aprendizado.
Às Comissões de Direito da Moda da OAB - SP e da OAB - RJ, por tanto se
dedicarem ao estudo do Fashion Law, divulgando essa área ainda pouco difundida no Brasil. À professora Raquel Machado, por cordialmente ter aceitado orientar-me neste
trabalho. Professora, a senhora é inspiradora e sua leveza transborda. Nós, alunos da FD,
temos muita sorte em conviver com sua gentileza e paciência. Sou muito grata por ser sua
orientanda. Obrigada por todas as considerações acerca desta monografia e por todo o
incentivo. Que Deus abençoe a senhora e a sua família com muito amor e muita luz.
Ao professor João Luís, por gentilmente ter aceitado compor minha banca
avaliadora e pelas valiosas lições na cadeira de Direito Empresarial. O senhor é um dos
grandes exemplos de profissionais do Direito que considero. Muito obrigada, professor.
Ao professor William Marques, por toda sua dedicação à FD e aos alunos.
Sinto-me muito feliz pela oportunidade de ter sido sua aluna. O senhor é a prova de que há
tranquilo (como nos dias estressantes de matrícula – até porque o SIGAA nunca será tão
eficiente quanto o professor William). Muito obrigada por tudo. É uma honra tê-lo na minha
banca. Que Deus o abençoe ainda mais.
Por fim, mais uma vez expresso minha gratidão a Deus, por tantas bênçãos que
“Porque a arte dá-nos não a vida com beleza, que, porque é a vida, passa, mas a beleza com vida, que, como é beleza, não pode perecer.”
Fernando Pessoa
"Fashion is the most powerful art there is. It's movement, design and architecture all in one. It shows the world who we are and who we'd like to be."
RESUMO
A temática do presente trabalho centra-se na análise do atual tratamento jurídico dado às
criações da indústria fashion e à proteção ao trade dress (conjunto-imagem) do produto, do serviço e da marca de moda. O Fashion Law, termo de origem norte-americana, abrange os direitos sobre os produtos e designs criados por estilistas e empresas especializadas,
compreendendo, sobretudo, a propriedade industrial, com a utilização de patentes, registros de
desenhos industriais e de marcas, e os direitos autorais. Desse modo, por meio do estudo da
atual legislação brasileira que regulamenta a matéria, bem como da breve abordagem sobre o
sistema de copyrights e trademark americano e sobre o tratamento às criações de moda na Europa, analisam-se as possibilidades de proteção aos artigos da indústria fashion.
Empecilhos como a efemeridade das tendências apresentadas nas semanas de moda, a
obsolescência programada e a demora nos processos administrativos do Instituto Nacional de
Propriedade Industrial, bem como a dificuldade em enquadrar o estilista como sujeito de
direitos de autor, são abordados. Ademais, diante da ausência de regulamentação específica
no Brasil acerca do tema em questão, apresentam-se alguns casos concretos sobre Fashion
Law e suas respectivas soluções pelo Judiciário Brasileiro.
Palavras-chave: Fashion Law. Direito de Propriedade Intelectual. Propriedade Industrial.
ABSTRACT
This term paper aims to perform an analysis of the current legal treatment given to the
creations of the fashion industry and the protection of the trade dress of the product, the
service and the fashion brand. Fashion Law, a term created in the United States of America,
includes the product and design rights created by designers and specialized companies,
including, in particular, the industrial property, the using of patents, the industrial design and
trademark registrations, and Copyright. Thus, through the study of the current Brazilian
legislation that regulates the matter, as well as through the brief approach on the system of
copyrights and American trademark and the treatment of fashion creations in Europe, it will
be studied the possibilities of protection to the Fashion industry articles. Obstacles such as the
ephemerality of the trends presented in the fashion weeks, the programmed obsolescence and
the delay in the administrative processes of the National Institute of Industrial Property, as
well as the difficulty in framing the stylist as subject of copyright will be analyzed too. In
addition, given the lack of specific regulations in Brazil on the issue in question, it is brought
some concrete cases on Fashion Law and their respective solutions given by the Brazilian
Courts.
LISTA DE FIGURAS
Figura 01 Descrição de invenção de modelagem tridimensional de produtos de moda... 25
Figura 02 Descrição de padrão ornamental aplicado a artigos de moda e
embalagens... 28
Figura 03 Descrição do conjunto-imagem da embalagem da Tiffany & Co... 33
Figura 04
Figura 05
Figura 06
Figura 07
Sapatos Yves Saint Laurent e Louboutin e os solados vermelhos... Design 151 X Estampa Zara... Três casos brasileiros envolvendo o trade dress...
B ls Bi kin g if H ès X B ls 284 c l çã “I’ n t th
igin l”... 39
44
58
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
CUP – Convenção da União de Paris
EUA – Estados Unidos da América
INPI – Instituto Nacional de Propriedade Intelectual
LDA – Lei de Direito Autoral
LPI – Lei de Propriedade Industrial
OMC – Organização Mundial do Comércio
OMPI – Organização Mundial da Propriedade Intelectual
TRIPS – Acordo de Aspectos Relacionados ao Comércio dos Direitos de Propriedade
Intelectual
UNIFAB – União dos Fabricantes da França
USPTO – U.S. Patent and Trademark Office
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO...16
2. DIREITO DE PROPRIEDADE INTELECTUAL: CONSIDERAÇÕES INICIAIS...19
2.1. Considerações históricas...19
2.2. Lei de Propriedade Industrial (Lei nº 9. )...21
2.3. Sistema de Patentes...23
2.3.1. Patentes de invenção e modelos de utilidade...23
2.3.2. Requisitos de patenteabilidade...25
2.3.3. Concessão e vigência de patentes...26
2.4. Sistema de Desenhos Industriais...27
2.4.1. Desenhos industriais ...27
2.4.2. Requisitos de registrabilidade e vigência do registro...29
2.5. Sistema de Marcas...30
2.5.1. Direito Marcário...30
2.5.2. Requisitos de registro de marcas...31
2.6. Trade Dress...32
2.7. Direito Autoral (Lei nº 9. )...36
3. FASHION LAW: ABORDAGEM JURÍDICA DAS CRIAÇÕES DE MODA...38
3.1. Obsolescência programada na indústria fashion: empecilho à proteção jurídica efetiva?...41
3.2. Proteção das criações de moda nos Estados Unidos da América (EUA)...43
3.3. Proteção das criações de moda na Europa...47
4. A APLICABILIDADE DA LEGISLAÇÃO DE PROPRIEDADE INTELECTUAL BRASILEIRA ÀS CRIAÇÕES DA INDÚSTRIA DA MODA E AO TRADE DRESS...50
4.1. A Lei de Propriedade Industrial Brasileira (Lei nº 9. ) e o F ashion Law...51
4.1.1. Patentes e o Direito da Moda...51
4.1.2. Registro de desenhos industriais e o Direito da Moda...52
4.1.3. Direito Marcário e Direito da Moda...54
4.2. Proteção ao Trade Dress e o Direito da Moda...56
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS...64
1 INTRODUÇÃO
O Direito de Propriedade Intelectual, sobretudo como consequência da
globalização, das novas tecnologias e da maior celeridade em circulação de informações,
assume posição de destaque. Desse modo, naturalmente, outras expressões específicas
concernentes a essa grande área jurídica foram surgindo, por se tratarem de conjuntos de leis
relevantes ao tratamento de determinado assunto. Como exemplo, ressalte-se o Fashion Law
(Direito da Moda)1, tema do presente trabalho, cuja origem da terminologia é creditada às universidades de Direito americanas, sobretudo ao Fashion Law Institute, vinculado à
Fordham University, a qual se localiza em Nova Iorque.
Ainda que no Brasil exista legislação regulamentando a cadeia de produção e o
comércio, com seu sistema de patentes, marcas e desenhos industriais, não há tratamento
específico às criações de moda, tampouco ao conjunto-imagem (trade dress) de uma marca. A problemática reflete-se em litígios envolvendo a apropriação indevida da imagem de
determinada marca por outra, por exemplo, os quais, muitas vezes, são solucionados com a
aplicação de dispositivos que regulamentam a concorrência desleal.
Por se tratar de tema, até então, em ascensão no Brasil, há certa carência em obras
nacionais sobre o Fashion Law, especificamente. Desse modo, o trabalho é embasado na doutrina básica do Direito de Propriedade Intelectual e de seus institutos relacionados à
temática abordada. Para tanto, faz-se uso de explicações constantes não somente em livros
especializados em Direito de Propriedade Industrial e em Direito Autoral, como em obras
referentes à parte geral do Direito Comercial. Ademais, tig s ci ntífic s, l gisl çã , TCC’s,
notícias de sites jornalísticos, dados publicados na internet e jurisprudência são de grande
importância para a fundamentação desta monografia.
Como não há no ordenamento jurídico brasileiro menção específica a produtos
oriundos do mercado da moda, a jurisprudência aplica dispositivos de leis preexistentes, tais como a Lei nº 9. , que regulamenta direitos e obrigações relativos à propriedade industrial, e a Lei nº 9. , que consolida a legislação acerca de direitos autorais, as quais são a base do referencial teórico do presente estudo.
Visando a responder se dentro do Direito Brasileiro há como garantir a proteção
efetiva às criações de moda, inicialmente, faz-se uso da doutrina e dos conceitos pertinentes
ao tema em questão, para que se possa adentrar na especificidade da matéria com maior
segurança. No segundo capítulo, é feito um panorama geral da Lei de Propriedade Industrial,
abordando-se os institutos de patentes de invenção e modelo de utilidade, de registro de
desenhos industriais e de registro de marca. Ademais, apresentam-se conceitos referentes ao
trade dress (conjunto-imagem) e, por fim, um breve estudo sobre a Lei nº 9. 8 (Lei de Direitos Autorais).
No terceiro capítulo, preocupa-se em trazer à baila as especificidades do Direito
da Moda em um contexto internacional. A obsolescência programada, termo o qual não
somente se refere às tecnologias da informação, influencia no enquadramento das produções
da indústria fashion, conforme também se demonstra no capítulo três. Ademais, aborda-se o tratamento do Direito da Moda na legislação norte-americana e europeia, analisando-se os
empecilhos e vantagens de cada uma, respectivamente.
A indústria da moda compõe parte significativa da indústria nacional, com
considerável movimentação do setor. Desse modo, a burla à propriedade industrial fragiliza o
mercado brasileiro e ofende o princípio da segurança jurídica, em parte, quando não há
regulamentação específica sobre a matéria em questão. É nesse sentido que se concatena o
capítulo quatro, no qual se aborda o Fashion Law dentro do contexto jurídico do Brasil. Demonstram-se as possibilidades de consonância da Lei de Propriedade Industrial com as
produções de moda, trazendo à baila alguns casos práticos e suas respectivas soluções pelo
judiciário brasileiro.
Quanto ao trade dress, mesmo que se mencione de forma sucinta seu significado e alguns exemplos ao serem abordadas as especificidades do Direito de Propriedade Intelectual,
apresentam-se, no quarto capítulo, casos emblemáticos os quais repercutiram no estudo do
Direito da Moda no Brasil. A imitação ao conjunto-imagem de um produto, um serviço ou
uma marca de moda repercute na proteção à propriedade intelectual, uma vez que, de certo
modo, é uma cópia velada.
Ademais, persiste a dificuldade em enquadrar a produção do estilista dentro da
proteção ao Direito Autoral, diferente do que ocorre na França, onde há menção específica às
criações de moda em seu Code de La propriété intellectuelle (Código Francês da Propriedade Intelectual). Ainda assim, há litígios no Judiciário brasileiro envolvendo a cópia de artigos de
moda, os quais foram solucionados por meio de institutos de Direitos Autorais, como o caso
envolvendo a grife Hermès e a marca nacional 284, cujo objeto em análise foi a famosa bolsa
Por fim, motivando-se no crescimento das discussões acerca do Fashion Law no Brasil, o presente estudo tem como objetivo analisar a efetividade da proteção aos produtos da
2 DIREITO DE PROPRIEDADE INTELECTUAL: CONSIDERAÇÕES INICIAIS
O Direito de Propriedade Intelectual, de acordo com a classificação proposta pelas
Convenções de Paris e de Berna, é caracterizado no ordenamento jurídico internacional e
nacional como gênero, do qual partem duas espécies: Direito de Propriedade Industrial e
Direito Autoral.
Nesse sentido, a Organização Mundial de Propriedade Intelectual (OMPI) 2
define
o assunto da seguinte forma:
A propriedade intelectual se relaciona com as criações da mente: invenções, obras literárias e artísticas, tais como símbolos, nomes e imagens utilizadas no comércio. A propriedade intelectual se divide em duas categorias: a propriedade industrial, que abarca as patentes de invenção, as marcas, os desenhos industriais e as indicações geográficas; e o direito de autor, que abarca as obras literárias, os filmes, a música, as obras artísticas e os desenhos arquitetônicos.
No atual contexto socioeconômico, a extensão da matéria de Propriedade
Intelectual abrange setores do conhecimento humano que não foram previstos em um
primeiro momento. Desse modo, o Fashion Law ou Direito da Moda não é uma área do Direito como Civil, Penal ou Empresarial, por exemplo, mas um ramo de aplicação desses
institutos jurídicos, conforme se explana ao longo deste trabalho.
Como se trata do estudo das produções de moda como objeto do Direito
Comercial, mais especificamente do Direito de Propriedade Intelectual, prossegue-se para a
apresentação dos principais conceitos da matéria, bem como do breve histórico da área
jurídica em questão.
2.1 Considerações históricas
Ainda que não existisse codificação específica para um regime de proteção à
criação, a origem da ideia de propriedade intelectual remete, sobretudo, ao momento em que a
percepção humana e sua capacidade criativa influenciaram-se por uma produção em larga
escala.3
Antes disso, artistas, diante da ausência de proteção jurídica e com receio em ver
suas obras plagiadas, costumavam codificar suas criações com artifícios que as
2 Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI). Disponível em: < http://www.wipo.int/aboutip/es/>.
Acesso em: 31 jul. 2016.
3
particularizavam. O exemplo mais famoso é o de Leonardo da Vinci, que se utilizava de siglas
e caracteres codificados em suas obras, designando, desse modo, sua verdadeira autoria.4 Os primeiros registros de proteção dos quais se tem conhecimento eram
vinculados a critérios subjetivos. Reis e senhores feudais concediam proteção e monopólio
aos beneficiários a partir de requisitos baseados na sua conveniência e vontade, conforme
expõe Gabriel Di Blasi5:
Na França, ainda na Idade Média, privilégios foram concedidos para a industrialização de produtos. O inventor Philippe de Cavquery, em 1330, recebeu do
i Phili V l is n óli x l “f b ic çã i s”. N
entanto, o primeiro privilégio verdadeiramente conhecido foi outorgado pelo Feudo de Veneza, em 1469, o qual prescrevia ao seu titular o direito de exclusividade para exploração, durante cinco anos, em todo território feudal, d u “in úst i
i ssã ”.
Contrastando com a arbitrariedade dos primeiros registros de proteção, os quais,
como já se afirmou, se tratavam basicamente de privilégios pessoais, os primeiros textos
legislativos em matéria de propriedade intelectual começaram a ser redigidos e sancionados.
A Venetian Patent Law, de 1474, e o Statute of Monopolies inglês, de 1623, iniciaram, historicamente, o sistema de patentes e de proteção à propriedade semelhante ao atual.6
Ressalte-se que o desenvolvimento comercial e industrial está intrinsecamente
relacionado aos textos supracitados. Se em Veneza, onde o comércio caracterizava-se como
fonte econômica matriz, houvesse proteção àqueles que incorporassem novas tecnologias e
produzissem objetos inéditos, haveria superávit (saldo positivo para as exportações) e,
consequentemente, empregos e arrecadação de impostos.
Em Londres, cujo contexto político, social e econômico era o da Revolução
Industrial, as cartas-patentes concedidas pelo monarca por critérios alheios aos relacionados à
proteção das novas invenções não mais faziam sentido. Com o Statute of Monopolies, houve a regularização da concessão de patentes para as invenções, bem como a fixação de um
período máximo de duração de quatorze anos. Fabio Ulhoa7 expõe que, a partir desse momento, o inventor foi motivado a investir em suas pesquisas e descobertas.
4 Em 2010, o pesquisador italiano Silvano Vinceti, ao analisar microscopicamente a obra Mona Lisa, percebeu a
existência de algumas letras que, supostamente, seriam siglas pintadas por Leonardo da Vinci. Teorias à parte, tais codificações não negam a autoria do artista italiano. Ainda que precário, o artifício funcionou, singularizando a pintura ainda tão copiada hodiernamente. Disponível em: <http://super.abril.com.br/historia/leonardo-da-vinci-realmente-escondeu-codigos-em-seus-quadros>. Acesso em: 31 jul. 2016.
5 DI BLASI, Gabriel. A Propriedade Industrial: Os Sistemas de Marcas, Patentes, Desenhos Industriais e
Transferência de Tecnologia. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 2.
6
Os critérios de novidade e aplicação industrial, assim como o de concessão por tempo determinado, presentes no sistema de patentes atual, existiam nesses primeiros textos legislativos, sobretudo no Statute of Monopolies.
Em 1883, almejando à uniformização do tratamento internacional dado à
propriedade intelectual, foi assinada a Convenção da União de Paris (CUP). Ressalte-se que o
Brasil foi um dos primeiros signatários da CUP, a qual aplicava as regras de Direito
Internacional Privado às questões relativas à propriedade intelectual. Outrossim, a Convenção
de Berna, de 1886, sobre a proteção das obras artísticas e literárias, corroborou com a
abordagem internacional e multilateral do assunto em questão.8
Em um contexto mais recente, em 1967, foi criada a Organização Mundial da
Propriedade Intelectual (OMPI). Integrante das Nações Unidas, a OMPI é definida como um
fórum global para serviços de propriedade intelectual. Hodiernamente, 189 Estados fazem
parte da Organização9. Nesse sentido, afirma Di Blasi qu “ lém de centralizar os trabalhos que visam à disciplina operacional dos convênios, tratados e acordos celebrados
internacionalmente nos campos de propriedade intelectual, a Organização tem a função de dar
assistência aos países”.10
Para findar o breve histórico apresentado, relevante se faz a menção à Rodada
Uruguai, a qual deu origem à Organização Mundial do Comércio (OMC) e à celebração do
Acordo de Aspectos Relacionados ao Comércio dos Direitos de Propriedade Intelectual
(TRIPS). Este, ratificado no Brasil em 1994, influenciou a atual legislação de Propriedade Intelectual brasileira, conforme se expõe a seguir.
2.2 Lei de Propriedade Industrial (Lei nº 9. )
Refletindo o pioneirismo brasileiro em matéria de propriedade industrial, a
maioria dos textos constitucionais apresentaram dispositivos referentes ao tema.11 Hodiernamente, a Constituição Federal de 1988 elenca em seu art. 5º, inciso XXIX:
A lei assegurará aos autores dos inventos industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País.
Nesse sentido, a Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996, foi sancionada visando à
regulamentação dos direitos e deveres relativos à propriedade industrial. Conhecida como Lei
8
BARROS, Carla Eugenia Caldas. Manual de Direito da Propriedade Intelectual. 1ª Ed. Aracaju: Evocati, 2007, p. 79.
9 Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI). Disponível em: < http://www.wipo.int/aboutip/es/>.
Acesso em: 10 ago. 2016.
10
DI BLASI, Gabriel. A Propriedade Industrial: Os Sistemas de Marcas, Patentes, Desenhos Industriais e Transferência de Tecnologia. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 64.
de Propriedade Industrial (LPI), o referido diploma normativo revogou o antigo Código da
Propriedade Industrial, instituído pela Lei nº 5.772 de 1971.
Ressalte-se que, quando o Congresso Nacional aprovou o acordo de Aspectos Relacionados ao Comércio dos Direitos de Propriedade Intelectual, promulgado pelo Decreto Presidencial n 4, o projeto de Lei de Patentes (a posteriori, Lei nº 9.2 ), que ainda não havia sido examinado pelo Senado, adequou sua redação para melhor
consonância com o TRIPS.
O Código de Propriedade Industrial de 1971 apresentava um rol taxativo e
variadas discriminações em relação ao seu objeto. A limitação ao consentimento de proteção
ia de encontro à modernização e ao surgimento das novas tecnologias, limitando o
investimento de empresas internacionais no mercado brasileiro. A Lei nº 9.2 , no
entanto, possibilitou a ampliação dos bens tutelados, não sendo passíveis de proteção somente
aqueles explícitos na própria Lei e no TRIPS.12
Segundo Fran Martins, o termo indústria, referido na expressão propriedade industrial, deve ser interpretado de forma extensiva, incluindo o comércio, uma vez que as duas atividades têm como escopo a circulação de mercadorias por meio de empresas criadas
para esse fim. A globalização, da mesma forma que possibilitou a diminuição de fronteiras
para o mercado, auxiliou na divulgação de tecnologias que não só fomentaram o
aperfeiçoamento dos produtos, como tornaram frequente o uso de técnicas especializadas em
usurpação da propriedade industrial.13
A LPI tem como objeto as invenções, os modelos de utilidade, os desenhos
industriais e as marcas, tutelando-os por meio de concessão de patentes, no caso dos dois
primeiros, e de registro, em se tratando dos dois últimos. Ademais, visa a assegurar proteção à
propriedade industrial mediante a repressão às falsas indicações geográficas e à concorrência
desleal.
Outrossim, as ações14 de proteção previstas na LPI são realizadas por ato administrativo do Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI). Este fora criado em
1970, por meio da Lei nº 5.648, compondo, desde então, a Administração Indireta do País. O
12 DI BLASI, Gabriel. A Propriedade Industrial: Os Sistemas de Marcas, Patentes, Desenhos Industriais e
Transferência de Tecnologia. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 12.
13
MARTINS, Fran. Curso de direito comercial / Atual. Carlos Henrique Abrão – 37. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 331.
14 Entre os serviços do INPI estão a concessão de patentes, o registro de marcas, de desenhos industriais, de
art. 2º da Lei que instituiu a autarquia, após a lt çã l i n 2 , define a
finalidade do INPI nos seguintes termos:
O INPI tem por finalidade principal executar, no âmbito nacional, as normas que regulam a propriedade industrial, tendo em vista a sua função social, econômica, jurídica e técnica, bem como se pronunciar quanto à conveniência de assinatura, ratificação e denúncia de convenções, tratados, convênios e acordos sobre propriedade industrial15.
O ato administrativo supracitado é de caráter constitutivo, ou seja, o inventor ou
empresário somente será titular da patente ou do registro de marca, por exemplo, após a
manifestação do INPI. Desse modo, a legitimidade pertence àquele que primeiro efetuar o
pedido de registro ou patente, podendo ou não ser quem desenvolveu a invenção16.
Em conformidade com a Convenção da União de Paris17, a LPI é aplicável ao pedido de patente ou de registro proveniente do exterior e depositado no País a quem tenha
proteção assegurada por tratado ou convenção em vigor no Brasil e aos nacionais ou pessoas
domiciliadas em país que assegure aos brasileiros ou pessoas domiciliadas no Brasil a
reciprocidade de direitos iguais ou equivalentes.18
As demais especificações da Lei de Propriedade Industrial necessárias para futura
melhor abordagem do Fashion Law serão comentadas nos seguintes tópicos. Destarte, os sistemas de patentes, de marcas e de desenhos industriais serão o foco do estudo da Lei nº
9.2 no presente capítulo.
2.3 Sistema de Patentes
Os primeiros objetos de estudo da LPI são a invenção e os modelos de utilidade,
os quais têm sua proteção assegurada por instituto específico, quando atendidos os critérios
estabelecidos na Lei.
2.3.1 Patentes de invenção e modelos de utilidade
15 BRASIL. Lei nº 5648, de 11 de dezembro de 1970. Cria o Instituto Nacional da Propriedade Industrial e dá
outras providências. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5648.htm>. Acesso em 10 ago. 2016.
16 Invenção no caso de patentes. 17
O art. 3º da LPI faz referência clara aos princípios da prioridade e da assimilação. Enquanto este equipara os direitos e os prazos dos países unionistas, aquele estabelece que qualquer requerente de país signatário da Convenção pode reivindicar a prioridade no Brasil de patente ou de registro industrial concedido, de forma equivalente, no seu país de origem, fazendo-se necessário o respeito aos prazos estabelecidos.
18
BRASIL. Lei nº 9279, de 14 de maio de 1996. Regula direitos e obrigações relativos à propriedade
industrial. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9279.htm#art240>. Acesso em: 11 ago.
Conforme já mencionado, a Lei de Propriedade Industrial determina a concessão
de patentes para invenções e modelos de utilidade e de registro para desenhos industriais e
marcas. Na Lei, dos quatro bens tutelados pelo Direito de Propriedade Industrial, somente não
é definido o termo invenção.
A invenção caracteriza-se como um bem incorpóreo fruto da atividade intelectual
e inventiva do homem. De certo modo, é fácil visualizar o que poderia ser um invento. No
entanto, de tão simples e intuitivo, há dificuldade em se conceituar tecnicamente. Fran
Martins entende a definição como “a criação ou a concepção de um processo, produto,
instrumento ou meio novo que possa ser aplicado à indústria, com a finalidade de
melhorá-la”19. A legislação, no entanto, preocupou-se em expor o que se encontra excluído do rol de possíveis invenções, conforme aduz o art. 10 da Lei nº 9.2 20:
Art. 10. Não se considera invenção nem modelo de utilidade: I - descobertas, teorias científicas e métodos matemáticos; II - concepções puramente abstratas;
III - esquemas, planos, princípios ou métodos comerciais, contábeis, financeiros, educativos, publicitários, de sorteio e de fiscalização;
IV - as obras literárias, arquitetônicas, artísticas e científicas ou qualquer criação estética;
V - programas de computador em si; VI - apresentação de informações; VII - regras de jogo;
VIII - técnicas e métodos operatórios ou cirúrgicos, bem como métodos terapêuticos ou de diagnóstico, para aplicação no corpo humano ou animal; e
IX - o todo ou parte de seres vivos naturais e materiais biológicos encontrados na natureza, ou ainda que dela isolados, inclusive o genoma ou germoplasma de qualquer ser vivo natural e os processos biológicos naturais.
O l utili , n nt nt , é fini n l gisl çã c “o objeto de uso
prático, ou parte deste, suscetível de aplicação industrial, que apresente nova forma ou
disposição, envolvendo ato inventivo, que resulte em melhoria funcional no seu uso ou em
sua fabricação”.21
Segundo Rubens Requião22, l utili é “u is siçã u f nova obtida ou introduzida em ferramentas, instrumentos de trabalho ou utensílios, destinados
u us átic ”. Em síntese, o modelo de utilidade deve, também, envolver a atividade
inventiva do seu criador. Não se trata de mero ato estético, mas de ampliação e otimização do
19
MARTINS, Fran. Curso de direito comercial / Atual. Carlos Henrique Abrão – 37. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 332.
20BRASIL. Lei nº 9279, de 14 de maio de 1996. Regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9279.htm#art240>. Acesso em: 11 ago.
2016.
21
Ibidem.
22
objeto de uso industrial. Deve ser caracterizado como engenhoso e produtivo. Para Fábio
Ulhoa23, o modelo de utilidade é considerado o aperfeiçoamento da invenção.
Destarte, o mesmo dispositivo da LPI que define as atividades que não são
consideradas invenção também se aplica aos modelos de utilidade.
Em consulta ao site do INPI, é possível ter acesso a alguns pedidos de patente
relacionados à área da moda. A patente de invenção de produtos de moda desenvolvidos por meio da moulage com total aproveitamento de matéria -prima24, por exemplo, diz respeito à técnica de desenvolvimento de roupas por meio da modelagem tridimensional, ajustando-as
ao corpo do interessado por meio de dobraduras, de modo que evite o dispêndio de tecido.
Ademais, as roupas confeccionadas com a invenção têm a característica de poderem ser
utilizadas de maneiras distintas por pessoas de diferentes tamanhos.
Figura 01 – Descrição da invenção de modelagem tridimensional de produtos de moda.
Fonte: INPI (2016).
2.3.2 Requisitos de patenteabilidade
A Lei de Propriedade Industrial define como requisitos de patenteabilidade de
invenções e de modelos de utilidade a novidade, a atividade inventiva, a aplicação industrial e
o desimpedimento (licitude da atividade).
A LPI estabelece como novo aquilo que não se encontra no estado da técnica. Ou seja, a novidade consiste em a invenção ser completamente diferente de tudo que existe no
23COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de Direito Comercial - Vol. 1. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 230 24 Patente de invenção nº 0804893-2 A2. Nome do Depositante: Universidade Estadual de Londrina. Nome do
conhecimento, inclusive, de comunidade técnico-científica especializada. Ressalte-se que o
caráter absoluto da novidade obedece à extraterritorialidade, uma vez que seja no Brasil, seja
em outro país, ela deve ser inédita.
O requisito da atividade inventiva significa que a invenção ou o modelo de
utilidade tenham sido fruto do trabalho e capacidade do inventor. Desse modo, a dedicação e
criatividade resultarão em uma novidade. Gabriel Di Blasi25 afirma:
Basicamente, considera-se a existência de atividade inventiva quando o ato de criação de uma invenção não poderia ter sido feito por um técnico no assunto, em condições normais de criação. [...] A atividade inventiva é um exercício intelectual da capacidade de criação humana.
Ademais, a invenção ou o modelo de utilidade devem ter aplicação industrial.
Ainda que a atividade seja inédita, revolucionária e fruto da criatividade do inventor, se ela
não puder ser aplicada em escala industrial, ela não poderá ser patenteada. O objeto deverá ser
produzido para o consumo da sociedade e aplicado em algum setor do sistema produtivo.26 Por fim, depois de preenchidos os requisitos supracitados, deve-se averiguar a
licitude da invenção ou do modelo de utilidade. Desse modo, o objeto do pedido de patente
não poderá constar no rol estabelecido no art. 18 da LPI, no qual se mencionam as atividades
não suscetíveis de patenteamento.27
2.3.3 Concessão e vigência de patentes
O procedimento administrativo para pedido de patentes deverá seguir quatro
fases: depósito, publicação, exame e decisão.28Todas as etapas estão especificadas na Lei de Propriedade Industrial, com seus respectivos prazos e requisitos.
O ato administrativo de concessão de patente, resultante na carta-patente, é burocrático e demorado, especialmente no Brasil. Um depósito de pedido de patenteamento
pode durar anos até que seja, finalmente, deferido, conforme será exposto no terceiro capítulo,
ao se analisar os empecilhos da LPI no que concerne à proteção das criações de moda.
A Lei de Propriedade Industrial determina, em consonância com o acordo
TRIPS, que a vigência da patente de invenção e de modelo de utilidade será, respectivamente,
25
DI BLASI, Gabriel. A Propriedade Industrial: Os Sistemas de Marcas, Patentes, Desenhos Industriais e Transferência de Tecnologia. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 201.
26
Ibidem, p. 205.
27 Ressalte-se que um objeto pode ser considerado invenção ou modelo de utilidade, mas, ainda assim, não ser
patenteável, diferente do art. 10 da Lei de Propriedade Industrial que, como citado em tópico anterior, se refere àquilo que não pode ser enquadrado como invenção ou modelo de utilidade.
28
de vinte e quinze anos, contados a partir do depósito do pedido. Sendo este o primeiro
requisito para se requerer o patenteamento, para que se evite o prejuízo do requerente diante
do processo demorado, o prazo de vigência não será inferior a dez anos para patente de
invenção e a sete anos para de modelo de utilidade, a partir da data de concessão.
2.4 Sistema de Desenhos Industriais
A proteção de desenhos industriais é realizada por meio de registro, nos termos na
LPI, conforme exposto a seguir.
2.4.1 Desenhos industriais
De acordo com a Organização Mundial da Propriedade Intelectual, o desenho
industrial abrange os aspectos ornamentais e estéticos de um objeto, podendo consistir em
características bidimensionais ou tridimensionais29. Contornos, cores, linhas, texturas, por exemplo, atribuem referência estética ao produto, acrescentando-lhe um novo efeito visual30.
Nesse sentido, afirma Marlon Tomazette31:
O desenho industrial contribui para os prazeres de fruição visual, sem qualquer acréscimo de utilidade. Trata-se de uma criação meramente de forma, sem efeitos funcionais, podendo ser bidimensional ou tridimensional. Como exemplos, podem ser citados os desenhos de veículos, de móveis, de eletrodomésticos.
Ressalte-se que, apesar do caráter fútil do desenho industrial, o objeto ao qual ele
se vincula apresenta funcionalidade. Ao contrário de uma obra de arte32, cuja função, ainda que carregada de metáforas, simbolismos e questões artísticas, é, sobretudo, estética, o
desenho industrial, apesar de também estético, atribui-se a algum objeto utilitário.33
Importante se faz deixar claro que o significado de futilidade utilizado neste
trabalho restringe-se ao sentido técnico empregado pela doutrina. Não há a intenção de
desmerecer quaisquer questões intrínsecas às características estritamente visuais. Conforme
afirma Umberto Eco, as representações da beleza por meio da arte, longe de serem julgadas
29Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI). Disponível em: < http://www.wipo.int/aboutip/es/>.
Acesso em: 20 ago. 2016.
30
DI BLASI, Gabriel. A Propriedade Industrial: Os Sistemas de Marcas, Patentes, Desenhos Industriais e Transferência de Tecnologia. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 335.
31TOMAZETTE, Marlon. Curso de Direito Empresarial. Teoria Geral e Direito Societário. Volume 1. 5ª Ed.
São Paulo: Editora Atlas, 2013, p. 194.
32
A LPI determina, em seu artigo 98, que não será considerado desenho industrial um objeto de caráter puramente artístico.
como desnecessárias e acessórias, identificam os objetos de contemplação humana ao longo
da história da própria humanidade.34
O desenho difere-se do modelo de utilidade, uma vez que este, como mencionado
anteriormente, amplia a função do produto. Desse modo, se a criação objeto de proteção da
propriedade industrial for de caráter técnico, será passível de patenteamento por se tratar de
invenção. Se for, no entanto, para fins essencialmente estéticos, será sujeita a registro por se
tratar de desenho industrial.
No que tange às criações de moda, o instituto do desenho industrial tem
aplicabilidade considerável. Segundo a OMPI, o pedido de registro de desenho industrial é a
forma mais efetiva para se proteger o design de produtos de moda de longa duração no mercado.35 Em breve consulta ao site do INPI, pode-se ter acesso a alguns registros de desenhos e padrões aplicados à indústria fashion, como o ilustrado a seguir36:
Figura 02 – Descrição de padrão ornamental aplicado a artigos de moda e embalagens.
Fonte: INPI, 2016.
34
ECO, Umberto. História da Beleza. 5ª Ed. Rio de Janeiro: Ed. Record, 2015, p. 10.
35Organização Mundial da Propriedade Intelectual. Um ponto no tempo o uso inteligente da Propriedade Intelectual por empresas do setor têxtil. Publicação 794, p. 03. Disponível em <http://www.wipo.int/edocs/pubdocs/pt/sme/794/wipo_pub_794.pdf>. Acesso em 25 ago. 2016.
36Registro de Desenho Industrial nº 7002029-9. Titular: Sharmut Fashion AS. Autor: Giacomo Scarcella.
2.4.2 Requisitos de registrabilidade e vigência do registro
A LPI estabelece a novidade, a originalidade e o desimpedimento (licitude da
atividade) como pressupostos de registrabilidade do desenho industrial37.
A novidade, requisito também exigido para concessão de patentes, é atendida
quando o desenho industrial não se encontra no estado da técnica. Este, conforme já definido em tópico anterior, consiste nos conhecimentos e em tudo o que foi divulgado até a data de
depósito do pedido38. É considerado novo o desenho ainda não conhecido pelo público e pela comunidade técnico-científica.
O requisito da originalidade é atendido quando o desenho industrial atribui ao
objeto a que se vincula uma estética diferente em relação às existentes. Tomazette afirma que
pequenas mudanças, ainda que não sejam compreendidas no estado da técnica, não
representam originalidade39.
Outrossim, para que atenda ao pressuposto do desimpedimento, o desenho não
deverá ir de encontro à moral e aos bons costumes, ofender a honra e imagem de pessoas e
atender em desfavor da liberdade de expressão. A forma comum do produto ou que apenas
acrescente aspectos funcionais e técnicos também não será sujeito a registro. Ademais, o
objeto puramente artístico40 também gozará de proteção nos termos da LPI.41
Após o depósito do pedido perante o INPI, ocorre a publicação do desenho
industrial e a concessão do registro, sem que haja análise do mérito (novidade e
originalidade). Trata-se da única hipótese de livre concessão prevista na LPI. O pedido de patente, no entanto, obedece ao sistema de exame prévio, uma vez que somente ocorre o seu deferimento após o exame das condições de patenteabilidade.42
Com a desnecessidade de exame prévio, caso ocorra a concessão de registro de
um mesmo desenho para mais de um titular, o interessado que se sentiu lesado poderá
37
Artigos 96, 97 e 100, respectivamente, da Lei de Propriedade Industrial.
38COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de Direito Comercial - Vol. 1. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 253. 39 TOMAZETTE, Marlon. Curso de Direito Empresarial. Teoria Geral e Direito Societário. Volume 1. 5ª
Ed. São Paulo: Editora Atlas, 2013, p. 195.
40
Nesse caso, conforme já mencionado, se atender aos critérios de obra de arte, será objeto de proteção do Direito Autoral.
41BRASIL. Lei nº 9279, de 14 de maio de 1996. Regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9279.htm#art240>. Acesso em: 15 set.
2016.
solicitar ao INPI o exame dos requisitos de registrabilidade, no que tange à novidade e à
originalidade.43
Segundo a Lei de Propriedade Industrial, o registro de desenho terá durabilidade
de dez anos, a partir da data de depósito do pedido, podendo ser prorrogado três vezes por
período de cinco anos cada.
2.5 Sistema de marcas
A LPI confere às marcas a proteção por registro, assim como ocorre com os
desenhos industriais.
2.5.1 Direito Marcário
O Direito Marcário é considerado o ramo de aplicação do Direito de Propriedade
Industrial no que concerne à proteção das marcas. Estas, em um contexto comercial,
apresentam importância elevada, uma vez que, como afirma Gabriel Di Blasi, são sinais que
possibilitam a distinção entre produtos industriais, artigos comerciais e serviços profissionais
de outros do mesmo gênero e atividade, consistindo em um meio eficaz para estabelecer
clientes.44
A Organização Mundial da Propriedade Intelectual define marca como um sinal
distintivo que indica que a elaboração de determinados produtos e serviços se encontra
vinculada a alguma pessoa ou empresa. Devido a esse sistema, os consumidores podem
identificar e adquirir o objeto de acordo com suas características e qualidade, os quais são
indicados por meio de sua marca exclusiva.45
Ademais, além de existirem as marcas indicativas de produtos e serviços, cuja
definição representa o conceito intuitivo que se tem acerca da matéria, a LPI elenca outras
duas espécies de marcas. Estas são intituladas como marca de certificação e marca coletiva. Enquanto a primeira é utilizada para atestar a conformidade do objeto com normas e
43
BRASIL. Lei nº 9279, de 14 de maio de 1996. Regula direitos e obrigações relativos à propriedade
industrial. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9279.htm#art240>. Acesso em: 15 set.
2016.
44DI BLASI, Gabriel. A Propriedade Industrial: Os Sistemas de Marcas, Patentes, Desenhos Industriais e
Transferência de Tecnologia. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 292.
45Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI). Disponível em: < http://www.wipo.int/aboutip/es/>.
especificações técnicas, a última identifica produtos e serviços pertencentes à determinada
entidade.46
A Lei de Propriedade Industrial define como passíveis de registro por marca sinais
visualmente perceptíveis. Partindo-se do critério de apresentação visual, são classificadas da
seguinte forma: nominativas, quando formadas apenas por sinais linguísticos, como palavras, números, letras; figurativas, quando compostas por imagens, desenhos, letras ou algarismos estilizados; mistas, quando o signo distintivo é formado pela combinação de características nominativas e figurativas, como sinais linguísticos apresentados de forma diferenciada;
tridimensionais, quando apresentadas por meio de formas espaciais ou embalagens capazes de designar o produto específico.47
A doutrina acrescenta, ainda, que existem marcas gerais e específicas. Enquanto estas designam diretamente algum produto, aquelas indicam a sua procedência genérica.48 Para exemplificar, contextualizando com o Fashion Law, a conhecida empresa inglesa
Burberry, que tem seu registro de marca nominativa designando todos os produtos os quais fabrica, registrou a sua estampa xadrez característica como marca figurativa.49 Nesse caso, marca específica.50
Outrossim, o Direito Marcário mostra-se como diretriz para a resolução de litígios
envolvendo o uso indevido de propriedade industrial no mercado da moda, conforme será
exposto nos capítulos seguintes.
2.5.2 Requisitos de registro de marcas
Para que uma marca seja registrada, ela deverá atender aos requisitos da
capacidade distintiva, da novidade e do desimpedimento.51
O primeiro critério diz respeito à função precípua da marca, qual seja, identificar e
diferenciar serviços e produtos de seus semelhantes. Ulhoa relaciona esse requisito ao da
46BRASIL. Lei nº 9279, de 14 de maio de 1996. Regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9279.htm#art240>. Acesso em: 20 set.
2016.
47TOMAZETTE, Marlon. Curso de Direito Empresarial. Teoria Geral e Direito Societário. Volume 1. 5ª Ed.
São Paulo: Editora Atlas, 2013, p. 146.
48
BARBOSA, Denis Borges. Uma Introdução à Propriedade Intelectual. 2ª Ed. Disponível em <http://www.denisbarbosa.addr.com/arquivos/livros/umaintro2.pdf>.Acesso em: 20 set. 2016.
49Registro de marca figurativa nº 822964147. Autor: Burberry Limited. Disponível em:
<http://www.inpi.gov.br>. Acesso em: 20 set. 2016.
50
MAIA, Lívia Barboza. A proteção do direito da moda pela propriedade intelectual. Disponível em: <http://www.nbb.com.br/pub/A907%20Livia%20Barboza%20Maia.pdf>. Acesso em: 20 set. 2016.
novidade, uma vez que, caso a marca não seja nova, ela não conseguirá atender ao propósito
de distinção. O autor acrescenta, ainda, que a novidade em questão é relativa, sendo restrita ao
setor de produtos e serviços a que pertence o objeto marcado.52
Trata-se, portanto, do princípio da especialidade que orienta o Direito Marcário.
Ressalte-se que há situações em que marcas têm proteção assegurada não só no ramo de
atividade do objeto ou serviço ao qual se referem, mas em todos os setores classificados pelo
INPI. Nesse caso, recebem a denominação de marcas de alto renome:
A marca de alto renome (antigamente denominada notória) trata-se de uma inovação prevista no artigo 125 da Lei nº 9.279. Este princípio determina que a marca considerada de alto renome no Brasil terá proteção assegurada em todas as classes, mantendo registro próprio para impedir o de outra que a reproduza ou imite, no todo ou em parte, desde que haja possibilidade de confusão, pelo consumidor, quanto à origem dos produtos, mercadorias ou serviços, ou ainda prejuízo à reputação da marca.53
Para gozar do status supracitado, o titular deverá requerer ao INPI, em petição
específica, a qualificação. Anteriormente, a solicitação somente poderia ocorrer no bojo de
uma impugnação, como matéria de defesa contra registro formulado por terceiro.54
Outrossim, a marca, ao ser registrada, não poderá ir de encontro a marcas notoriamente conhecidas. Estas são tuteladas de forma especial, uma vez que sua proteção independe de registro prévio no INPI. Ademais, a Autarquia poderá indeferir de ofício o
pedido de registro marcário que seja igual ou semelhante à marca notoriamente conhecida55, conforme prevê a LPI.56
Quanto ao requisito do desimpedimento, o pedido de registro não poderá versar
sobre a lista de proibições apresentadas no artigo 124 da Lei de Propriedade Industrial.
2.6 Trade Dress
Ainda tratando de propriedade industrial, faz-se necessário salientar acerca do
trade dress (conjunto-imagem), matéria que, apesar de não ser prevista na legislação
52COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de Direito Comercial - Vol. 1. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 255. 53
DI BLASI, Gabriel. A Propriedade Industrial: Os Sistemas de Marcas, Patentes, Desenhos Industriais e Transferência de Tecnologia. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 313.
54INPI. Disponível em: < http://manualdemarcas.inpi.gov.br/projects/manual/wiki/Manual_de_Marcas> . Acesso
em: 21 set. 2016.
55
Como exemplo de marca notoriamente conhecida no setor da moda, cite-se Chanel, Louis Vuitton, Yves Saint Laurent, dentre outras. Tais signos alcançaram visibilidade mundial, sendo imediatamente associados a seus titulares.
56
BRASIL. Lei nº 9279, de 14 de maio de 1996. Regula direitos e obrigações relativos à propriedade
industrial. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9279.htm#art240>. Acesso em: 21 set.
brasileira, é tema de discussão e de decisões judiciais recentes, sobretudo envolvendo a
indústria da moda.
O trade dress é caracterizado como a forma que um produto ou serviço se apresenta para o consumidor. É o conjunto que compõe a imagem da marca, formado por
cores, elementos e características estéticas. Nesse sentido, afirma José Carlos Tinoco
Soares57:
Trade dress é a exteriorização do objeto, do produto ou de sua embalagem, é a maneira peculiar pela qual se apresenta e se torna conhecido. É pura e simplesmente
’ sti nt ’, / u ‘unif ’, ist é, u t ç culi , u u g u
maneira particular de alguma coisa se apresentar ao mercado consumidor ou diante dos usuários.
A criação de um conceito vinculado à identidade visual mostra-se eficaz no
mercado, uma vez que se converte em um captador de clientes e, por tabela, em uma relevante
fonte de lucros. Tamanha a importância do conjunto-imagem que outras marcas, as quais não
obtiveram o mesmo destaque na criação do seu trade dress, incorporam signos distintivos de produtos e serviços de marcas com identidade visual consolidada, aproveitando-se do
prestígio de terceiros para alcançar seu destaque comercial.
Importante ressaltar que, além de características físicas, o trade dress abrange outros aspectos da atividade comercial, como o cheiro do estabelecimento ou do produto, a
cor, o modus operandi. Nesse sentido, pode incluir, ainda, o aviamento de empresa, definido por Requião como o atributo ou qualidade da empresa de gerar lucros resultante de sua
organização58. Trata-se de valor intangível, sustentado por uma ideia desenvolvida com o funcionamento da empresa, por meio da soma de seus elementos comerciais.
Exemplo clássico e internacionalmente conhecido de trade dress é o das caixas azuis da empresa americana Tiffany & Co. A cor, criada pela Pantone especialmente para a
grife, é registrada como trademark59 nos Estados Unidos e não pode ser comercializada por outras empresas. Outrossim, o próprio termo Tiffany Blue Box é trademarked.60
Figura 03 – Descrição do conjunto-imagem da embalagem da Tiffany & Co.
57SOARES, José Carlos Tinoco. Concorrência Desleal vs. Trade Dress e/ou Conjunto-imagem. São Paulo:
Ed. Tinoco Soares, 2004, p. 213.
58
REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. Vol. 1. 29ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 394.
59 Ao longo deste trabalho, utiliza-se a expressão em inglês equivalente ao registro de marca nos Estados Unidos,
conforme exposto no capítulo três.
60
Fonte: Adweek, 2014.
Ressalte-se que o registro do trade dress nos Estados Unidos decorre do Lanham Act, conforme é abordado no capítulo três. No Brasil, como já citado, não há regulamentação específica para a proteção do conjunto-imagem.
O ato administrativo que concede a proteção à propriedade industrial, conforme já
exposto, é de natureza constitutiva e vinculada. Parte da doutrina, no entanto, considera a
identidade visual do produto ou serviço adquirida pelo trade dress semelhante ao fenômeno do secondary meaning61, ou seja, o sentido secundário da marca adquirido por seu uso, capaz de diferenciá-la no mercado. Nesse caso, para ser passível de proteção, a natureza do ato
administrativo deveria ser declaratória, situação que não se encontra prevista na LPI.62 No entanto, ainda que não haja dispositivo legal direcionado especificamente ao
trade dress, a reprodução de elementos do conjunto-imagem de uma marca por terceiros é
61
Neste trabalho, optou-s f z us s x ssõ s “s c n y ning” “s nti s cun á i ” c sinônimas. Com a finalidade de evitar repetições, ora utiliza-se a forma em inglês, ora utiliza-se a forma traduzida.
62
XAVIER, Vinicius de Almeida. As possibilidades de proteção ao trade dress. Direito Justiça (Porto Alegre
Online), [s.l.], v. 41, n. 2, p.248-263. Rio Grande do Sul: EDIPUCRS, 2015. Disponível em:
solucionada, na maioria dos casos, por meio da aplicação do artigo 195, inciso III da Lei de
Propriedade Industrial, combinado com o inciso XXIX do art. 5º da Constituição Federal.63 O artigo supracitado da LPI trata da concorrência desleal caracterizada pelo uso
de meios fraudulentos para desvio de clientela próprio ou alheio.64Logo, mesmo sem trazer à baila menção específica ao conjunto-imagem, o Judiciário Brasileiro se vale da repressão à
concorrência desleal ou da garantia à livre concorrência em suas decisões, conforme o caso.
Nesse sentido, vale nci n c s “Hy c s X Vict i ’s S c t”.
Hypermarcas, detentora da marca Monange, realizou um evento nacional intitulado Monange Dream Fashion Tour, que reunia desfile de peças íntimas, modelos conhecidas mundialmente65, música ao vivo e figurinos adornados com asas de anjo, em uma proposta muito semelhante à da marca de lingerie norte-americana66. A ação em desfavor da empresa brasileira e dos outros organizadores do evento foi julgada procedente pelo juízo da 14ª
Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. A decisão condenou a parte ré ao
pagamento de uma indenização de R$100.000,00 (cem mil reais) por danos morais e à
abstenção de realizar eventos que possam aludir ao Victoria’s Secret Fashion Show.67
A alegação da autora na petição inicial foi acolhida em sede de sentença. Ou seja,
foi considerado o uso dos adornos e símbolos específicos pela Hypermarcas como um caso de
concorrência desleal. Além de as empresas serem do mesmo ramo comercial, a estrutura do
evento e, sobretudo, o uso das asas poderiam causar o desvio de clientela e o enriquecimento
i u i nti isu l c i l Vict i ’s S c t. Logo, mesmo que os
símbolos individualizados não fossem passíveis de proteção pelo ordenamento jurídico
brasileiro, a decisão resguardou o conjunto-imagem criado pela empresa norte-americana.68 Posteriormente, são apresentados outros casos emblemáticos em se tratando de
trade dress na indústria da moda, bem como as implicações decorrentes da lacuna legislativa no que concerne à sua proteção.
63
PIVA, Fernanda Neves . Trade dress: imitação e concorrência desleal. Revista do Instituto dos Advogados de São Paulo , v. 35, p. 191-206, 2015. Disponível em: < http://revistadireitoempresarial.com.br/artigos/95-Artigo%20trade%20dress.pdf>. Acesso em: 10 out. 2016.
64BRASIL. Lei nº 9279, de 14 de maio de 1996. Regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9279.htm#art240>. Acesso em: 10 out.
2016.
65 Algumas das qu is,inclusi , f zi t c l s Vict i ’s S c t.
66 Vict i ’s S c t, s éc n nt , liz “Vict i ’s S c t F shi n Sh w”, nt qu ún
grandes figurinos adornados por asas de anjo, de tal forma que as modelos vinculadas à marca são conhecidas
un i l nt c “ ng ls”.
67 BEZERRA, Elton. TJ-RJ condena Hypermarcas a indenizar Victoria's Secret. Disponível em:
<http://www.conjur.com.br/2013-ago-19/hypermarcas-indenizar-victorias-secret-concorrencia-parasitaria>. Acesso em: 12 out. 2016.
68 Sentença disponível em: <http://www.migalhas.com.br/arquivo_artigo/art20130816-10.pdf>. Acesso em: 12
2.7 Direito Autoral (Lei nº 9. )
C l s lb t Bitt fin Di it ut c s n “ Di it Privado que regula as relações jurídicas advindas da criação e da utilização econômica de
obras intelectuais estéticas e compreendidas na literatura, nas artes e nas ciênci s”.69
Enquanto o Direito de Propriedade Industrial decorre de um ato de natureza
constitutiva, o Direito Autoral surge no momento de criação da obra, independente de haver
ou não o registro. Nesse sentido, Fábio Ulhoa70 afirma:
O direito de exclusividade do criador de obra científica, artística, literária ou de programa de computador não decorre de algum ato administrativo, mas da criação mesma. Se alguém compõe uma música, surge do próprio ato de composição o direito de exclusividade de sua exploração econômica. É certo que a legislação de direito autoral prevê o registro dessas obras: o escritor deve levar seu livro à Biblioteca Nacional, o escultor sua peça à Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro, o arquiteto seu projeto ao CREA e assim por diante. Estes registros, contudo, não têm natureza constitutiva, mas apenas servem à prova de anterioridade da criação, se e quando necessária ao exercício do direito autoral.
Destarte, a titularidade de direito de autor, como se percebe, é de ato de natureza
declaratória. Surge no momento em que o artista ou escritor, por exemplo, cria sua obra de
arte ou seu livro, respectivamente.
A Lei nº 9. 8, conhecida como Lei de Direito Autoral (LDA), em seu artigo
7º, define como objeto as criações de espírito em qualquer suporte. O sujeito, por sua vez, é o
autor dessas criações. Nesse sentido, o Direito de Autor disciplina as relações jurídicas
existentes entre criador e obra, tanto no ato de criação (direitos morais), quanto no momento
em que o objeto é inserido em circulação (direitos patrimoniais).71
Devido aos fins a que se destina o presente trabalho, convém destacar, no que
tange ao assunto em questão, o conceito de obra de arte. Ao contrário do desenho industrial, a
obra artística é de caráter essencialmente fútil, no sentido de não apresentar caráter utilitário.
Ressalte-se que, como já afirmado em tópico anterior, o desenho também é fútil, mas o objeto
a que se vincula apresenta utilidade. Nesse sentido, Ulhoa expõe:
O objeto em que se materializa o desenho industrial possui sempre uma função principal, de natureza utilitária, que falta às telas e suportes de esculturas. O desenho industrial, em si, é fútil, no sentido de que não amplia as possibilidades de utilização do objeto a que é aplicado; mas o objeto tem necessariamente utilidade.72
A legislação anterior à que regula hodiernamente os Direitos Autorais estabelecia
que as obras de arte aplicadas, cujo valor artístico pudesse ser dissociado da aplicação
69 BITTAR, Carlos Alberto. Direito de Autor. 4ª Ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2008, p. 8. 70
COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de Direito Comercial - Vol. 1. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 239.