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A literatura consultada permitiu a identificação do relato de dificuldades e obstáculos à efetivação da interdisciplinaridade. Para Fazenda (1992) a partir da síntese das categorizações de Japiassu (1976, p.93-97) os principais obstáculos seriam os epistemológicos, e institucionais; os psicossociológicos, os culturais; os metodológicos, os materiais e os relacionados à formação dos docentes.

A partir da síntese realizada por Altheman (1998) sobre as ideias de Fazenda (1992) os obstáculos epistemológicos e institucionais estariam relacionados à própria hierarquização do conhecimento no âmbito das disciplinas, onde cada qual busca a supremacia sobre as demais, onde o diálogo interdisciplinar é prejudicado pelo uso de uma terminologia acessível somente aos especialistas.

Dentre os obstáculos epistemológicos, Japiassu (1976, p.93) destaca todos os empecilhos ou resistências colocados pelos especialistas notadamente, no caso das ciências humanas, expressas através das dificuldades aos contatos, às aproximações, comunicações, as relações criadoras e fecundas, aos confrontos, à integração as disciplinas. Nesse plano estaria situado ainda o que o autor denominou de inércia das situações adquiridas das instituições de ensino e pesquisa que tendem a valorizar a especialização e a fragmentação das disciplinas.

No que diz respeito aos obstáculos institucionais, as organizações voltadas para o ensino e a pesquisa, que se constituem no sulco da história do saber, separa administrativamente os diversos campos do conhecimento, em disciplinas estanques, empreendendo a separação do saber de seu conjunto. E como se a instituição levasse a ciência a um entesouramento, a uma espécie de capitalismo epistemológico, favorecendo a esclerose do pensamento (JAPIASSU 1976, p. 94-95)

No que concerne aos obstáculos psicossociológicos, estes decorrem do preconceito existente em relação as práticas interdisciplinares em função do desconhecimento do seu significado, pela falta de formação adequada e pelo anonimato que decorre da participação nesses projetos, considerando que o foco deixa de ser o indivíduo, mas o grupo.

A divisão do espaço do saber em compartimentos disciplinares estanques, cada vez mais restritos, culmina na formação de um tipo de sistema feudal que rege os empreendimentos de ensino e de pesquisa, transformando essas instituições em “guetos” universitários, dando curso à vontade de poder e dominação dos especialistas (JAPIASSU, 1976, p.95).

Em relação aos obstáculos culturais, Japiassu (1976) manifesta-se que estes surgem da separação entre as diversas áreas culturais, suas mentalidades próprias, suas linguagens, suas técnicas próprias. Os cientistas de determinados países, no interior de uma ciência ou disciplina tendem a trabalhar em circuito fechado, sob o regime de admiração mútua, muitas vezes com pouco interesse em ultrapassar as barreiras nacionais, onde num mundo de fronteira aberta, suas teses podem ser contestadas.

Já os obstáculos metodológicos, segundo Fazenda (1992) estão relacionados à própria dinâmica de como as disciplinas se inter-relacionam, o grau de participação de cada uma no projeto e o grau de participação das pessoas envolvidas.

A formação docente (ou a ausência dela) pode vir a configurar-se como um forte obstáculo à interdisciplinaridade. Um novo tipo de formação do professor é requerido para a atuação em práticas disciplinares considerando a necessidade da utilização de uma pedagogia dialógica, que estimule a participação e a criticidade.

Os obstáculos materiais citados por Fazenda (1992) estão relacionados a falta de planejamento nas questões relacionadas ao tempo e espaço, ou quaisquer outros fatores que possam dificultar a realização de encontros presentes entre os indivíduos e os grupos de trabalho.

Ainda no que diz respeitos aos impedimentos à mudança interdisciplinar, Klein (1998) menciona: as questões corriqueiras de tempo, orçamento e planejamento; apoio político; e a preocupação pessoal no que diz respeito às relações de equipe.

Japiassu (2006, p.3) menciona também outros obstáculos que precisam ser ultrapassados para, através das experiências interdisciplinares, “ restituir vida às nossas mais ou menos esclerosadas instituições de ensino”. Dentre os obstáculos, o autor refere-se os “mandarinatos” no ensino e na pesquisa e até na administração, onde os cargos são ocupados pelos medíocres; o peso da rotina e das estruturas mentais; a mentalidade

esclerosada de um aprendizado por acumulação ou entesouramento; o enfeudamento (departamentalização) das instituições; dentre outras.

Evidentemente, que os efeitos não programados das práticas interdisciplinares, têm contribuído ao longo do tempo para o surgimento de resistências ao enfoque, mesmo se sabendo, conforme já tratado neste estudo, que a ideia de superação da fragmentação nas ciências e consequentemente no ensino, não é nova.

O que se verifica e que só em período recente por conta principalmente das tentativas oficiais, também já abordadas neste estudo, com destaque para a Lei 5672/71 e também das Diretrizes Curriculares, é que a ideia da superação da fragmentação do ensino volta ao debate nos meios acadêmicos e também da área de regulação, trazendo em seu bojo uma falsa ideia de inovação.

Essa situação já era observada por Luck (2007, p. 87) para quem, a interdisciplinaridade não deve ser considerada como inovação em seu sentido pleno, como algo novo, mesmo que muitos professores tenha ouvido falar dela só recentemente. Sabe-se que toda inovação gera resistência, sobretudo quando não leva em consideração a cultura dos grupos onde é implantada, principalmente quando é imposta de fora para dentro de cima para baixo, o que parece ter em relação da adoção da interdisciplinaridade nos cursos de graduação em administração, situação que teve que ser absorvida pelas instituições de ensino.

Embora o enfoque interdisciplinar não seja novo, cristaliza a preocupação com superação de um problema que tem preocupado a comunidade acadêmica por muito tempo. Na perspectiva de Luck , o enfoque interdisciplinar deve ser entendido

[...] enquanto caminhada de construção do conhecimento e da prática pedagógica, mediante uma nova ótica, mas se distancia do sentido de inovação e se caracteriza como transformação, como vivência intuitiva e experiência humana que se elabora e reelabora em seu contexto histórico, seu próprio situar-se (LUCK, 2007, p. 87).