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PARTE II GESTÃO AMBIENTAL NA REFORMA AGRÁRIA

6. INCRA E ÓRGÃOS AMBIENTAIS

6.1 OBTENÇÃO DE TERRAS

No Manual de Obtenção de Terras e Perícia Judicial do Incra consta que as infrações à legislação ambiental observadas nas fazendas vistoriadas devem ser registradas nos Laudos Agronômicos de Fiscalização, para que sejam comunicadas ao órgão ambiental competente. Entretanto, apenas três Superintendências Regionais do Incra responderam que estão informando aos órgãos competentes a respeito dessas infrações ambientais. Uma não respondeu essa questão e catorze disseram que não estão comunicando aos referidos órgãos.

Em nenhuma das Superintendências pesquisadas, houve algum caso de desapropriação por descumprimento da função social no que se refere à utilização inadequada dos recursos naturais disponíveis e do desrespeito à preservação do meio ambiente, conforme o inciso II do art.186 da CF/88. A pouca importância dada aos critérios ambientais da função social da terra também foi constatada por D’ávila (2005:28):

Na prática administrativa, somente é objeto da ação de desapropriação o imóvel considerado improdutivo pelo não alcance dos índices76 de GUT e GEE, na forma estabelecida no art. 6º, da Lei n. 8.629/93. Os outros critérios para o cumprimento da função social da propriedade rural, dentre eles o da função socioambiental, não são tratados de forma relevante no laudo de vistoria e fiscalização do Incra, identificando-se aí o início da dificuldade de fazer valer os dispositivos constitucionais e legais que tratam da matéria.

Na opinião dos agrônomos que responderam ao questionário, a maioria (15) considera que as leis agrárias vigentes não são suficientes para que um imóvel possa ser desapropriado, em decorrência do descumprimento do inciso constitucional referente ao fator ambiental da

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Os índices citados pela autora significam: GUT – Grau de Utilização da Terra e GEE – Grau de Eficiência na Exploração da Terra. A Lei 8.629/93 explicita como devem ser determinados esses índices. De acordo com essa lei, um imóvel que tenha o GUT inferior a 80% e/ou GEE inferior a 100% enquadra-se como improdutivo.

função social da terra. Somente dois acreditam que as legislações existentes são suficientes para esse tipo de desapropriação e um agrônomo não respondeu essa questão.

De acordo com os agrônomos que não acham suficientes as legislações agrárias vigentes, faz-se necessário uma regulamentação específica que defina os parâmetros para desapropriação nesses casos e/ou uma alteração no inciso II do art.185 da CF/8877. Foi citada, também a necessidade de haver uma maior aproximação entre o Incra e o Ibama e um maior comprometimento dos técnicos e dos procuradores, para que possa ser conduzida a desapropriação em decorrência da utilização inadequada dos recursos naturais disponíveis e do desrespeito à preservação do meio ambiente.

Embora o inciso II do art. 185 da CF/88 tenha sido apontado como um entrave para a desapropriação do imóvel rural produtivo que não cumpre a função social no que se refere ao fator ambiental, é importante destacar que alguns autores discordam dessa visão. Pinto Jr. & Farias (2005) e Marés (2003) apontam que esse inciso não pode ser interpretado de maneira isolada e, portanto, não pode ser visto como um obstáculo à desapropriação nesses casos. Os trechos a seguir explicitam a opinião desses autores:

A produtividade da terra, nos sistemas jurídicos que protegem o meio ambiente e buscam o desenvolvimento sustentável, somente pode ser entendida como um processo permanente, isto é, não pode ser considerada produtiva a terra que esgota os recursos naturais a ela associados e inviabiliza ou dificulta seu uso pelas gerações futuras (MARÉS, 2003:133).

(...) a vedação do art. 185 da CF/88 não pode excepcionar ipso facto o comando do art. 184, senão nos casos em que a produtividade provenha de atividades não contrapostas a vedações legais, e, pois não pode ser invocada para tutelar os casos em que a produtividade derive de descumprimento de preceitos de regime ambiental ou trabalhista (...) (PINTO Jr. & FARIAS, 2005:21).

No cálculo do Valor Total do Imóvel (VTI), somente em três Superintendências tem sido aplicado algum procedimento para desvalorização no preço das terras em função da degradação ambiental (erosão, desmatamento em áreas de preservação permanente ou reserva legal, cursos d’água poluídos e/ou assoreados, dentre outros). Em catorze não tem sido aplicado nenhum fator e uma não respondeu esse item. Entretanto, dentre os que disseram não adotar nenhum procedimento foi informado por alguns que a quantidade de erosão influencia na definição das classes de capacidade de uso da terra, o que altera o valor da terra nua.

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De acordo com o inciso II do art. 185 da CF/88, a propriedade produtiva é insuscetível de desapropriação para fins de reforma agrária.

As benfeitorias (pastagens, currais, pomares, casas...) localizadas em áreas de preservação permanente (APP) e em reserva legal (RL) não estão sendo pagas ao proprietário em treze Superintendências. Em outras duas, no entanto, essas benfeitorias estão sendo avaliadas em separado e tem ficado a critério da Justiça determinar ou não o pagamento desses bens. Três Superintendências não responderam essa questão e em nenhuma foi informado que as benfeitorias localizadas nessas áreas estão sendo pagas.

Em sete Superintendências, não foram implantados assentamentos em áreas de mata primária na Floresta Amazônia, na Mata Atlântica e no Pantanal Mato-Grossense, nos últimos cinco anos. Em três Superintendências, foi informado que foram implantados assentamentos nessas áreas. Outras quatro informaram não terem nenhum desses biomas e quatro não responderam a esse item.

Quando o imóvel a ser desapropriado não tem Reserva Legal Averbada, as Superintendências informaram que não há nenhuma forma de penalidade no cálculo do valor a ser pago pela propriedade e a avaliação é feita normalmente como se fosse terra nua. Portanto, nesses casos, para a definição do valor total do imóvel não tem havido diferença se a Reserva Legal está averbada ou não.

Um agrônomo informou que se encontra em fase de discussão a definição de um procedimento para onerar o proprietário em caso da Reserva Legal não estar averbada e outro agrônomo informou que no novo Manual de Obtenção de Terras do Incra, estarão previstas penalidades quanto à definição do valor a ser indenizado para aqueles que descumprem a legislação ambiental. É importante observar que até o último mês da pesquisa, esse manual ainda não havia entrado em vigor.