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CAPÍTULO 2 – UMA ANÁLISE DO SISTEMA DE MARKETING DA SAÚDE SOB A

3.2 Diálogo com médicos

3.2.2 Resultados das entrevistas

3.2.2.2 Organizações sociais pela visão de profissionais médicos

Em uma consulta rápida na internet sobre ONGs no contexto da saúde, podemos encontrar diversas organizações, inclusive por cidade ou estado. No entanto, quando questionamos, em um primeiro momento, se os entrevistados conheciam alguma ONG que atua no setor de saúde, cinco deles disseram que não, um disse que já ouviu falar mas não conhecia e apenas três disseram conhecer. De fato, a atuação de ONGs parecer ser algo bem distante da prática médica, posto que como informa o entrevistado M8, não há o contato com essas

organizações nos ambientes onde ele atua. Com isso, observamos menção às associações formadas pelos próprios médicos.

Não estou recordando imediatamente no sentido de uma ONG... porque existem fóruns, não é? Existem fóruns, por exemplo, da própria Sociedade Brasileira de Cardiologia, das clínicas médicas, de diversas especialidades, os sites daquelas associações. Existem os fóruns de pacientes que se interligam; eles se comunicam e falam com especialistas. (M2)

Eu conheço... Veja, existem os órgãos de classe. Conheço, é, com relação a patologias, tem os órgãos de classe, que é do interesse do médico e também da sociedade. (M9)

É possível que haja certa resistência da classe médica em pensar em organizações sociais como agente de mudança na promoção de saúde. Para a entrevistada M1, a grande maioria dos profissionais não gosta de ONGs porque desloca o médico do lugar do saber, que fica mais difuso. Já a respondente M6 atenta para o fato de as ONGs não serem percebidas como científicas, e que, no contexto da saúde, o que é dito científico é considerado o mais importante. Desse modo, a entrevistada M2 recorre ao exemplo da atuação da ONG Pastoral da Criança que teve uma grande importância no contexto da saúde, mas que tem pouco reconhecimento pelos pares médicos.

[...] você sabe que o que diminuiu a mortalidade infantil, que era monstruosa, foi a participação da Arns, não é? [...] Então, a gente sabe a participação, nem sempre o governo registra isso, reconhece, faz alguma referência, nem considera como foi importante essa participação da Pastoral da Criança, sabe? Mas na verdade foi ela, foi ela sim (ênfase), todo mundo sabe da área médica, que foi ela que modificou a mortalidade infantil no Brasil. Então, é uma ONG! Está entendendo? (M2)

Mesmo assim, passada a primeira reação contrária sobre o conhecer ONGs, alguns entrevistados mencionaram exemplos de organizações, dentro de uma lógica assistencialista, como é o caso de ONGs de prestação de serviços. De fato, há uma grande quantidade de organizações sociais com perfil filantrópico e assistencialista, o que torna coerente o reconhecimento de ONGs que atuam com essa finalidade. A percepção dos entrevistados confirma esse contexto, uma vez que a maioria afirmou que entende o trabalho de organizações sociais como agregador.

Alguma ONG? Que eu lembre... (pensativa) não. Não lembro. Quer dizer, tem assim, tipo, o pessoal que vê a questão da saúde da mulher, aí tem umas ONGs que veem isso. Da violência, em relação à violência da mulher. [...] Eu lembro que tinha uma ONG também que oferecia, no caso da mulher, o DIU, o diafragma, esses métodos preservativos. [...] Eu acho que esses serviços prestam boas ajudas, eu não sou contra, não, eu acho que tudo que vier no sentido de ajudar, de melhorar, de... pra mim acho ótimo. (M1)

ONGs de acolhimento, eu conheço sim. Mas no sentido, não no sentido terapêutico, mas de suporte outros, como um acolhimento de custo, de humanização, de encaminhamentos, de facilidades de transporte, mais nesse sentido. [...] Acho que ano

2000 que foi o boom de ONGs, que tinham muitas ONGs, muita gente quis entrar e participava, investia. Hoje eu nem sei. Se elas existem é porque ainda existe cooperação. Mas sem dúvida é... não está na mídia (riso), mas não deixa de existir, não é? Então eu acho, eu vejo com bons olhos. (M2)

Acho muito bom! Quer dizer, eu acho que isso seria uma soma, não é? (M5)

A ideia de assistencialismo em ONG é comum ao ponto de uma respondente associar a existência desse tipo de organização à falha no sistema de saúde, na medida em que deveria ser o Estado a prover qualquer tipo de atendimento. Ou seja, o entendimento é de que ONGs fazem o papel do Estado e não necessariamente da sociedade civil.

Nos discursos também houve referência a questões pertinentes à idoneidade de organizações sociais, mesmo que essa percepção não prejudique a importância conferida a esse tipo de organização. De fato, é crescente a pressão social que as ONGs enfrentam para que suas atividades sejam realizadas com transparência e prestação de contas, o que pode direcioná-las, inclusive, a aderir práticas de governança (ROCHA; FEITOSA, 2013).

Eu acredito o seguinte: nem toda organização não governamental é isenta e ética. Tá? Existem muitas organizações não governamentais para ganhar dinheiro. Outras para serem lobistas de alguma marca, para serem lobistas de alguma coisa. Então eu acho que a diversidade, apesar de ONGs possivelmente não éticas, é muito boa para a sociedade. (M4)

Eu acho que a proposta, a seriedade, o histórico, né? Porque a gente já soube também de ONGs e ONGs que tiveram seus nomes manchados por corrupção também. Então, eu acho que a ONG, quando ela tem a seriedade, a especificidade, o histórico, a sua missão, eu acho que ela se encaixa perfeitamente dentro dos interesses da medicina, dos interesses de qualquer profissional, porque faz o sistema funcionar, faz as engrenagens da vida funcionarem melhor (M1)

Todos os entrevistados ressaltaram a importância que esse tipo de organização representa para a sociedade. A profissional M4, que não apenas conhece, mas trabalhou com ONGs formadas por equipes multidisciplinares em um projeto de promoção da saúde em Brasília, afirma “que é imprescindível e importantíssimo a gente trabalhar com o terceiro setor

na saúde” (M8).

De maneira geral, observamos que a atuação de ONGs no contexto de saúde, para esses médicos, é distante da rotina de trabalho, tendo em vista que não é algo familiar. Em contrapartida, o reconhecimento no que diz respeito à importância das atividades desse tipo de organização é recorrente. Com isso, pudemos investigar a opinião dos entrevistados sobre o Despatologiza, como uma organização social que busca defender os interesses da sociedade, com perfil menos assistencialista e mais ativista.