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4. O MODELO BRASILEIRO DE PROTEÇÃO JURÍDICA À PARTICIPAÇÃO

5.4 A infraestrutura político-eleitoral

5.4.2 Sistemas eleitorais e participação política da mulher

5.4.2.1 Origens e modalidades

Nohlen (2007, p. 09) destaca que o estudo científico dos sistemas eleitorais possui uma histórica longa, o qual remonta ao iluminismo francês, quando começaram se desenvolver procedimentos matemáticos para melhorar os resultados eleitorais, os quais eram calculados tendo por base a regra da maioria simples. Tais esforços acabaram se traduzindo em sistemas práticos que possibilitaram a aplicação da representação proporcional200.

A representação proporcional emerge em um contexto de transformações sociais e antes de ser um sistema sem efeito, sua instituição atuou no sentido de proporcionar que grupos políticos concretos tivessem mais atuação política (NOHLEN, 2007, p. 26) para que o Parlamento pudesse estar composto de todas as tendências políticas na proporção do seu peso no eleitorado (NOHLEN, 2007, p. 37)201.

Entende-se por sistema eleitoral “o modo como os eleitores expressam as suas preferências políticas em votos e como estes se traduzem em mandatos quando se elege um Parlamento ou um poder executivo” (NOHLEN, 2007, p. 90)202.

Ou seja, o sistema eleitoral “corresponde aos critérios utilizados para apontar os vencedores em um processo eleitoral, tendo em vista a legitimidade do voto” (MACHADO, 2016, p. 34).

Aponta Nohlen (2007, p. 16) que os sistemas eleitorais “são estruturas complexas cujos efeitos políticos dependem de como se relacionam os seus distintos elementos”, destacando ainda que “as distintas formas de candidatura e de votação podem ser usadas para melhorar a representação política”. Nenhum sistema eleitoral é ideal (NOHLEN, 2007) e a superar os déficits da representação democrática coloca uma série de desafios (MIGUEL,

200 Frisa Nohlen (2007, p. 09) que o debate teórico sobre as vantagens e desvantagens da representação

proporcional atingiu seu auge com John Stuart Mill e Walter Bagehot. Foi no contexto da ampliação do sufrágio e da “inclusão de todo o universo masculino adulto” que praticamente todos os países da Europa continental optaram pelo sistema de representação proporcional.

201 No Brasil, desde a independência até 1930, a escolha dos representantes no Brasil se dava através de vários

modelos de representação majoritária. Em 1932 optou por um sistema misto e apenas em 1945 foi que, para os cargos parlamentares, o sistema proporcional foi integralmente adotado (NICOLAU, 2003, p. 202-203).

202 Os sistemas eleitorais cumprem, segundo Nohlen (2007, p. 97) 05 (cinco) funções. A primeira é de

representação política, no sentido clássico, no sentido de eleger representantes que irão veicular a vontade do povo. Explica que não é a representação sociológica, ou seja, dos grupos e clivagens sociais que fazem parte da sociedade, embora reconheça expressamente que as mulheres devem ter uma representação parlamentar igual ou superior às quotas. A segundo função é concentração (ou eficácia) visando formar maioria estáveis para que seja possível a governabilidade. Para Nohlen (2007, p. 124) A terceira é a participação dos eleitores votarem tanto nos partidos como nos candidatos. A quarta é a simplicidade ou transparência do sistema eleitoral, que deve permitir que o eleitor entenda bem aquilo que acontece com o seu voto. Essa questão é importante pois, pelo menos no Brasil, a grande maioria dos eleitores não tem ideia de como se dá a contabilização de seus votos no sistema proporcional (NICOLAU, 2003, p. 203) e a quinta é legitimidade, que é a aceitação da população dos resultados eleitorais, o que gera confiança do sistema utilizado (NOHLEN, 2007, p. 97-99).

2014), mas um dos caminhos é analisar a adequação desse sistema às contingências históricas, politicas e sociais de cada Estado (NOHLEN, 2007).

A fórmula da conversão de votos em mandatos ou a regra da decisão é quem vai definir quem são os vencedores e vencidos em cada eleição (NOHLEN, 2007, p. 20). Não existe uma fórmula pré-definida.

Na fórmula “maioritária” ou majoritária, termo usado pelo ordenamento jurídico brasileiro, “ganha o partido ou candidato que tiver a maioria exigida – relativa ou absoluta – dos votos”, de modo que os votos dados ao candidato vencido são inúteis. Nessa fórmula, o eleitor faz uma escolha clara e compreende bem o que acontece com seu voto (NOHLEN, 2007, p. 20)203.

Em relação à forma proporcional, “a distribuição dos mandatos resulta da porcentagem de votos obtidos pelos distintos partidos ou candidatos”. Em relação à valorização do voto, Nohlen (2007, p. 20) destaca que nessa fórmula “uma parte muito maior do eleitorado vê sua participação ser bem sucedida, já que seus votos contribuem para a obtenção de mandatos de um partido.” Pontua que nesse caso “para os candidatos e simpatizantes dos partidos vale a pena lutar por cada voto, o que pode significar uma maior vitalidade na competição interpartidária e na participação eleitoral”.

No que tange à fórmula proporcional, que não se limita ao simples cálculo matemático do número bruto dos votos, “a conversão de votos em mandatos pode ser feita através de múltiplos procedimentos, que são de difícil apreensão e que fazem com o que o eleitor dificilmente sabe o que acontece ao seu voto” (NOHLEN, 2007, p. 20-21), daí porque Nohlen (2007, p. 124) defende que uma das funções do sistema eleitoral é a transparência, justamente para realizar esse esclarecimento e o eleitor possa, assim, votar mais consciente.

Geralmente, a fórmula proporcional é usada para determinação de quem irá ocupar das vagas do Parlamento (Poder Legislativo), visando-se justamente valorizar a representação das diversas tendências do eleitorado. Contudo pode ser que se opte, para as eleições dos membros do Poder Legislativo, por outras fórmulas, como a majoritária, através da técnica de divisão da circunscrição em distritos.

203 “Desta forma, a aplicação da fórmula maioritária pode levar à desmobilização – completa ou em parte – da

oposição política nos bastiões eleitorais, existindo o perigo de empobrecimento da paisagem partidária e da diminuição da participação política” (NOHLEN, 2007, p. 20).

Por essa técnica, cada distrito elegeria seu representante, com base na maior quantidade votos nominais (MACHADO, 2016, p. 45)204. É o caso do sistema distrital. Pode

ser também que se opte por uma fórmula combinada (majoritária e proporcional), que é o caso do sistema misto, que é “aquele em que para um mesmo cargo, sobretudo os cargos para o Parlamento, empregam-se técnicas do sistema majoritário e do sistema proporcional”. No caso, a “circunscrição é dividida em distritos para votação pelo sistema distrital. Ao lado dessa votação, realiza-se outra referente a toda circunscrição pelo sistema proporcional” (MACHADO, 2016, p. 45).

O Brasil optou pela adoção do sistema majoritário para o preenchimento de todos os cargos do Poder Executivo e para o cargo de Senador (Poder Legislativo), o qual se utiliza a fórmula “maioritária”. Para o sistema majoritário, eleito é o candidato que tenha alcançado o maior número de votos. Esse sistema pode ser simples205 ou absoluto206.

Para os demais cargos do Poder Legislativo (vereadores, deputados estaduais, distritais e federais), optou pela fórmula proporcional. Essa modalidade “permite o chamado voto de legenda, ou seja, para o partido”. Ele “chama-se proporcional diante da proporção entre os votos e os lugares dos partidos (ou coligações)” (MACHADO, 2016, p. 38). Nesse caso, o número de vagas a que o partido/coligação terá direito no Parlamento tomará por base o número de votos que a legenda recebeu, prestigiando-se, assim, a representatividade, e quem ocupará essas vagas será determinada de acordo com a modalidade de listas (fechada, semi-fechada e aberta).

Na lista fechada, os votos são dados ao partido que pode ter uma maior ou menor margem de autonomia na definição de quem dos candidatos que irão ocupar as vagas. No caso da lista aberta, o partido lança os nomes e as candidaturas, sem ordem de preferência, e o eleitor irá atribuir seu voto ao candidato. Apenas se quiser, é que pode votar apenas na legenda. No caso da lista semi-aberta ou semi-fechada, “é apresentada uma ordem de

204 Esse modelo tem “como vantagem ser mais simples do que o sistema proporcional e possibilitar uma maior

proximidade entre eleitor e eleito, já que este restringiria sua campanha a um ou alguns distritos e não toda a circunscrição” (MACHADO, 2016, p. 45).

205 O sistema majoritário simples, nos termos do ordenamento jurídico brasileiro, aplica-se às eleições para os

cargos de prefeito e vice-prefeito, em municípios com até 200.000 (duzentos mil) eleitores, conforme se depreende do art. 83 do Código Eleitoral e do art. 29, II da Constituição Federal, e para o cargo de senador, nos termos dos arts. 83 do Código Eleitoral e 46 da Constituição Federal (MACHADO, 2016, p. 36).

206 Já o sistema majoritário absoluto aplica-se às eleições para presidente e vice-presidente da República,

conforme se depreende dos arts. 77 da Constituição Federal e 2º da Lei nº 9.504/1997, governador e vice- governador (arts. 28 da Constituição Federal e 2º da Lei nº 9.504/1997) e prefeito e vice-prefeito (arts. 29, II da Constituição Federal e 3º, §2º da Lei nº 9.504/1997), nos casos dos municípios com mais de 200.000 (duzentos mil) eleitores. Exige-se, para eleição de um candidato, que ele tenha alcançado mais da metade os votos válidos. Caso o primeiro colocado não atinja a quantidade de votos exigida, os dois mais votados irão concorrer em um segundo turno. (MACHADO, 2016, p. 36-37).

prioridades pelos partidos, mas isto pode vir a ser alterado pelos eleitores no momento de votação, podendo estes últimos redefinir a prioridade dos nomes” (ARAÚJO, 2001, p. 240)

207).

No sistema proporcional de lista aberta, que é o que vigora no Brasil, a votação tende a ser mais personalizada e a influência do partido no processo de captação de votos é mais diminuta e se constata uma competição entre candidatos do mesmo partido. Nesse sistema não “se vota na lista, mas sim no candidato. É este que o eleitor fica conhecendo na propaganda eleitoral, muitas vezes feita de maneira desvinculada do partido” (ARAÚJO, 2001, p. 243).

A principal crítica feita ao sistema proporcional de lista aberta no Brasil é que ele estimula a “predominância da reputação individual em detrimento da reputação partidária”, provocando uma personalização das campanhas. Como o desempenho do partido depende da votação dos candidatos e assunção de uma vaga pelo candidato dependente de todos os votos dados pelo partido, os partidos acabam demonstrando interesse em lançar ou investir em candidaturas de pessoas com alto capital político (NICOLAU, 2003, p. 204). Essa crítica acaba conduzindo a outro fator que é o fato de esse sistema estimular uma alta competição entre candidatos do mesmo partido/coligação (NICOLAU, 2003, p. 219), o que explica a indiferença de muitos candidatos no preenchimento fraudulento das cotas de candidatura.

Os sistemas eleitorais, portanto, têm sua essência definida, em suma, a partir da interação entre votos, partidos/coligação e cargos, de forma que o atendimento da soberania popular ou da “regra da maioria” deve ser avaliada a partir de cada sistema.

No sistema majoritário, a soberania é concretizada ao considerar eleito aquele que obteve mais votos; já no sistema proporcional, a soberania restará respeitada ao se respeitar a distribuição das vagas levando em conta o partido/coligação que obteve mais votos, pois a quantidade de votos dados à agremiação é a variável que determinará quantas cadeiras eles irão ocupar no Parlamento. Quem irá ocupar essas vagas, é uma questão que vai depender do tipo de lista que o sistema irá adotar.

207 “Primeiro, a lista fechada, na qual os partidos estabelecem a hierarquia de prioridades dos seus candidatos e

os eleitores votam na lista partidária como um todo, sem poder alterar a sua ordem, ou seja, vota-se predominantemente no partido. Segundo, a lista semi-fechada ou flexível, na qual é apresentada uma ordem de prioridades pelos partidos, mas isto pode vir a ser alterado pelos eleitores no momento de votação, podendo estes últimos redefinir a prioridade dos nomes. Finalmente, há a lista aberta, na qual o partido só compõe um universo de nomes, sem ordem de prioridades formal, e o eleitor vota num único candidato, sem necessariamente ter de votar para a legenda partidária” (ARAÚJO, 2001, p. 240).