• Nenhum resultado encontrado

OS ASSENTAMENTOS RURAIS DE REFORMA AGRÁRIA E O RECONHECIMENTO DAS MUDANÇAS

Capítulo IV MUDANÇAS CLIMÁTICAS A PARTIR DE ASSENTAMENTOS

IV.III OS ASSENTAMENTOS RURAIS DE REFORMA AGRÁRIA E O RECONHECIMENTO DAS MUDANÇAS

CLIMÁTICAS NO PONTAL DO PARANAPANEMA – SP

endo em vista as condições observadas previamente, este tópico analítico pretende expor considerações sobre o clima e suas mudanças a partir das aferições obtidas junto aos sujeitos que se dispõem no cotidiano de vida dos assentamentos rurais do Pontal do Paranapanema - SP, uma vez que suas produções de alimentos se conformam na relação intrínseca com o ambiente.

Isto, de maneira geral, dimensiona-se conjuntamente com alinhavar do arranjo político em torno do contexto avaliado, partindo do ponto em que os reconhecimentos de causas e efeitos climáticos “consigo” podem levar a forçamentos sociais (GIDDENS, 2010).

Especificamente, pretende-se discernir como os laços de considerações do trinômio “clima – plantio - política climática” ocorrem nos assentamentos rurais de reforma agrária enfocados, caracterizando aspectos potenciais no que corresponde às possibilidades territoriais de mitigação, adaptação e resiliência.

Esta modelação pela descrição dos assentados traz consigo a exposição dos alcances escalares locais do Estado, através da PNMC e PEMC-SP (agenda nacional), e dos movimentos sociais do campo que atuam mundialmente e nacionalmente nas questões climáticas associadas ao rural (vide Parte I).

Em linhas estritas, a importância dada à temática se coloca pela aferição das diferentes orquestrações climáticas nos territórios formados, materializando-se

nas rotinas diárias com dificuldades e/ou potencialidades quando das distinções no clima, bem como na exposição relatada do alcance dos principais agentes do tecido social rural do Pontal do Paranapanema em que se encontram os assentamentos.

Dessa maneira, com as pesquisas de campo realizadas, pôde-se alcançar que há a predominância do conhecimento empírico, referido a partir de nuances históricas de vida, por conta dos entrevistados se encontrarem nas áreas dos assentamentos, em média, num intervalo de 15 a 20 anos, somados a isto cerca de 5 anos em processos de ocupações, o que os insere numa totalidade de consideração de 20 a 25 anos em experiências no Pontal.

Assim sendo, este discernimento sobre as manifestações climáticas se apresenta narrado por conjugações coletivas intra-assentamentos, com poucos indicativos de representações externas que intervêm em leituras sobre o “Climate

Change” pertencentes ao quadro geral das nuances conceituais e práticas

evidenciadas no primeiro e segundo capítulos, cunhando uma produção de significados locais centrada na orquestração habitual das práticas desenvolvidas nos lotes.

Obviamente, existem algumas indicações de informações obtidas através dos aparatos globais em sociedade que permeiam o assunto, cruzando aparelhos midiáticos, visitas ou conversas esporádicas com representantes de ONG’s e políticos que projetam possibilidades locais e as justificam de múltiplas maneiras. Todavia, há a distinção majoritária da temática pela abordagem dos assentados, na relação com a percepção da totalidade dos “ruídos” que lhes chegam, com maior posicionamento à relação sujeito/natureza no processo de trabalho.

Tal perspectiva é importante, pois se diferencia, em certos aspectos, das grandes notações em conhecimento sobre mudanças climáticas, suas dinâmicas e seus alcances ambientais, econômicos e sociais e, amplamente, agendas políticas em escalas internacionais e nacionais. Isto aponta certas lacunas do Estado e dos movimentos sociais na relação global-local.

Neste sentido, nota-se um caminho diferente ao encontrado por Leiserowitz (2006), em seus estudos na Yale University sobre o discernimento do clima e suas mudanças em populações nacionais. Em sua concepção, Leiserowitz (2006)

perspectivou que as notações em alterações climáticas são, em maior parte, concebidas a partir de valores que alcançam os sujeitos indiretamente nos seus cotidianos, ou seja, demonstrações socioculturais que se iniciam em distintos processos (políticos e educacionais, mas, sobretudo, midiáticos).

No caso dos assentamentos rurais de reforma agrária, não houve grandes números de relatos sobre instrumentos e contextualizações provindas da mídia, do próprio Estado ou dos movimentos sociais que pertencem aos seus históricos de formação territorial, mas sim do cotidiano de vida e produção, com inclinações observadas diretamente pelos agricultores em seus lotes, como apresenta o gráfico a seguir,

Gráfico 3. Fontes de identificações sobre mudanças climáticas pelos

assentados no Pontal do Paranapanema-SP.

Fonte: Pesquisa de campo.

Data: Agosto de 2015

Isto se reafirma por falas relativas aos alcances das políticas climáticas e dos movimentos associados, onde é relatado que: “Não, nunca houve. Aqui em ‘tão tão distante’ a gente não sabe muita coisa” (Entrevista em Assentamento Rural do Pontal do Paranapanema-SP). Ou então: “Olha, a gente ouviu alguns boatos, mas alguém aqui falando disso nunca viu não” (Entrevista em Assentamento Rural do Pontal do Paranapanema-SP).

12%

Neste ínterim, primariamente ocorrem dois questionamentos: Onde se encontra o Estado e a aplicação da PNMC ou PEMC-SP? Quais os motivos da incapacidade de alcance dos movimentos sociais combativos em mudanças climáticas na macroescala quando da relação com os assentamentos rurais do Pontal do Paranapanema – SP? Buscar-se-á tratar de resolver estes dois questionamentos posteriormente, centrando as atenções, neste momento, para a evidenciação e conjugação teórica da delineação direta sobre como os assentados observam o tema em sua aplicação nos lotes.

Tendo isto enfocado, muitos narram que os plantios que outrora se concretizavam com facilidades hoje estão sofrendo com oscilações e sensações de temperaturas mais elevadas, ocorrências que são demonstradas, por exemplo, nas folhas que queimam e secam nas plantações e que, previamente, não caracterizavam este comportamento.

O gráfico a seguir expõe a totalidade de famílias que indicaram complexificação na relação clima/plantio desde suas fixações nos lotes de reforma agrária.

Gráfico 4. Percepções climáticas nos assentamentos rurais alcançados com a

pesquisa de campo.

Fonte: Pesquisa de campo.

Como exposto por um assentado,

[...] cada ano que passa você percebe que está aumentando a temperatura. Até nas lavouras você percebe, a chuva não vem na hora certa, a lavoura não produz conforme ela, né, então já, e é devido a temperatura, se a temperatura ficasse que nem hoje, assim, meio abafado mas com terra molhada, e né, agradava, assim ficava bom, mas quando chega tem o sol que é quente mesmo. Tá mais quente, judia bastante da produção, o Sol tá é tão quente que a barrada do lado de lá que é a barrada perto do sol ela chega a queimar, você vê as folhas queimadas, do Sol quente João, inclusive mesmo se você reparar bem, o lado de baixo que é o lado que pega o Sol da tarde a saiada do pé de café é mais pequena, porque o Sol queima, aí ele tenta crescer, mas o Sol queima ele, então ela é mais pequena. Era muito diferente. Tem hora que eu falo pros caras eles acha até graça né [...] (Entrevista em Assentamento Rural do Pontal do Paranapanema-SP).

Outro assentado complementa esta perspectiva com os seguintes dizeres:

Eu percebi que o tempo tá mais quente, a gente vai fazer quatorze anos que está aqui, ao todo dezoito, quatorze de assentamento e quatro de ocupação. Tá bem mais quente, a produção fica mais difícil também pra dar, né, as coisas assim que a gente plantava que dava agora a gente percebe que não consegue, queima as plantas, o Sol muito quente. Queima mesmo de torrar, você olhar assim e falar nossa parece que tocou fogo, mas é a temperatura. Quando a gente começou a plantar aqui não era comum queimar assim, de jeito nenhum, a gente plantava, ainda quando a gente chegou aqui isso aqui era pasto, terra socada de animal, mesmo assim o que plantava dava, agora não (...) se a gente for plantar uma horta você tem que cobrir porque o Sol elas não aguentam, e muita água, outra coisa também que está difícil, é a água né, aqui a gente depende do tempo mesmo (Entrevista em Assentamento Rural do Pontal do Paranapanema-SP).

Esta dimensão sintética através dos alimentos produzidos possui representação por designar a constatação através do comportamento da atividade- fim dos assentamentos rurais, em que se efetivam as dificuldades observadas diretamente pelo produtor, o que, por si, expõe indagações em causas, circunstâncias e contextos sobre o clima e mudanças.

Neste sentido, o agricultor assente nas rotinas habituais de cuidado com a lavoura que os vegetais vêm lidando com aspectos distintos no que corresponde aos sistemas atmosféricos, insolação, cargas hídricas, temperaturas etc. Contudo, não ocorrem possibilidades explicativas provindas de extensões rurais via Estado e

planejamentos ou práticas através dos movimentos sociais, o que caracteriza um esvaziamento escalar da temática.

Das composições representativas, a sensação do calor e os aparatos de trabalho nas plantações são considerações constantemente expostas e que tem se manifestado como exemplificação da intensificação percebida nas localidades dos assentamentos rurais do Pontal do Paranapanema-SP pelos agricultores familiares.

Gráfico 5. Percepção da sensação de calor no período de vivência nos

assentamentos rurais.

Fonte: Pesquisa de campo.

Data: Agosto de 2015.

Neste aspecto, é relatado que:

Eu comecei a trabalhar de boné também, essa parte de cima aqui ficava normal, agora essa parte onde pega o Sol aqui, rapaz, fica russo, que nem loiro, queimado do Sol João, que a temperatura é muito quente. Foi quando a gente começou a usar chapéu, e a temperatura cada vez que passa tá ficando mais quente, tá, tá ficando cada vez mais quente (Entrevista em Assentamento Rural do Pontal do Paranapanema-SP).

Em adição a estes pontos, relata-se que:

Tem mudado, quando a gente pensa que vai fazer sol, faz frio, quando a gente pensa que vai fazer frio, faz Sol, quando a gente pensa que não vai chover, chove, tem vezes que faz um calor de

derreter (Entrevista em Assentamento Rural do Pontal do Paranapanema-SP).

Nestas linhas apresentadas, o mote é reconhecido como problema enfrentado e anuído pelos assentados por já virem suportando, de alguma maneira, implicações climáticas. Não se conjugam - stricto sensu - abordagens que se inserem como comprovativos locais de fenômenos peculiares, ou dotações amplas em correntes de pensamento prós ou contrárias ao aquecimento global, mas sim o discernimento nos assentamentos de que os episódios climáticos são marcas importantes das rotinas e ações desenvolvidas no seio do projeto de reforma agrária em que se encontram.

Esta consideração poderia levar quase que automaticamente a um intenso debate local - global com ações concretas em aspectos de mitigação, adaptação ou resiliência no Pontal do Paranapanema, porém, isto pouco acontece.

Corroborando Ferrante e Barone (2006), num assentamento rural existem prismas que se colocam como barreiras ou potencialidades para a afirmação da produtividade, como o caso do clima. Abordando o futuro, para a manutenção da capacidade de existência do mesmo assentamento e de suas condições de reproduções sociais a introdução de capacidades resilientes é de fundamental importância.

Por este viés, o clima e suas nuances nos assentamentos do Pontal do Paranapanema têm se apresentado como uma preocupação observada in lócus, por conta das condições encontradas no processo de plantio e colheita, assim como pelos impactos gerados por manifestações próximas, como o caso de grandes plantios de cana-de-açúcar.

Imagem 4. Usina de produção de Álcool e Açúcar e plantio de cana-de-

açúcar que circundam os assentamentos rurais de reforma agrária.

Fonte: Pesquisa de campo.

Data: Agosto de 2015.

Entretanto, dentro das limitações que cingem o caminho analítico da tese, o Estado e os movimentos sociais não possuem representações significativas sobre a temática para os assentados consultados. Neste processo, o trinômio “clima- plantio-política climática” não se realiza na ponta “política climática”, abrindo uma lacuna latente no caso de agricultores familiares.

Isto conjuga uma abordagem que remete ao questionamento da atribuição de responsabilização sobre o assunto pelos assentados, revelando seus anseios para com o Estado e os próprios movimentos sociais quando da aplicação e geração de debates e ações nos âmbitos das mudanças climáticas. Assim, se faz necessário compreender a quem os sujeitos designam responsabilidades.

Neste sentido, apontam-se no próximo tópico as aferições e sinalizações que os assentados descrevem sobre as relações em responsabilidade numa conjuntura de mudanças climáticas.

IV.IV. CLIMA, MUDANÇA E ATRIBUIÇÃO DE

Outline

Documentos relacionados