• Nenhum resultado encontrado

2 FUNDAMENTOS DA PESQUISA

3.1 Contexto histórico e matemático da época

3.1.1 Os califados

Como dito, após a morte de Maomé, surgiu uma questão que veio a dividir politicamente os islâmicos: qual(is) pessoas deveria(m) ser o(s) novo(s) líder(es) do império? Esse assunto criou dois grupos que pensavam de maneira diferente quanto à resposta para o problema: um grupo ficou conhecido como xiita, que acreditava que Maomé tinha escolhido seu genro e primo Ali (600-661), para ser o seu sucessor. O outro grupo, porém, acreditava que o califa deveria ser escolhido pela comunidade de fiéis – são os sunitas. A seguir, um esquema que sintetiza como ocorreu a escolha daqueles que sucederam o líder Maomé (califas).

Esquema 01 - Califados no império islâmico

Fonte: Acervo da autora

Doak (1963) destaca que após muitas discussões, Abu Bakr (570-634) foi escolhido para ser o primeiro califa, sendo um governante apoiado pelos sunitas. Ele e seus três sucessores (Omar, Uthman e Ali) ficaram conhecidos como califas justamente guiados – e formaram o primeiro califado (também conhecido como Califado Ortodoxo). Apesar desse período ser de muita expansão para o império islâmico, tendo em vista a importância dada ao exército islâmico e às conquistas territoriais dirigidas por esses califas, também foi uma época de muitos conflitos políticos, devido à discordância de opiniões da comunidade muçulmana, divididos em xiitas e sunitas.

O segundo califado ficou conhecido como califado Omíada (661-750), sendo que em 660, Muawiya (da dinastia Omíada) se proclamou califa, estabelecendo como capital a cidade

• Califado Ortodoxo

• 632 - 661

• Califas justamente

guiados (Abu Bakr,

Omar, Uthman e Ali)

1º CALIFADO

• Califado Omíada

• 661-750

• Capital: Damasco

2º CALIFADO

• Califado Abássida

• 751-1258

• Capital: Bagdá

• Idade de ouro

islâmica

de Damasco. Porém ele só assumiu completamente o império em 661, com a morte de Ali, o quarto califa justamente guiado e último do primeiro califado. Conforme Doak (1963, p. 35, tradução nossa):

Muawiya (602-680) governou o Império Islâmico por 20 anos. A principal característica dele foi estabelecer um governo forte e estável e estar ativamente envolvido no negócio de governar seu enorme império. Ele supervisionou a tributação, o exército e novas conquistas. Ele também foi o primeiro califa a fazer moedas muçulmanas para o império, de ouro e prata.

É importante observar que as conquistas islâmicas contribuíram de diversas formas para o desenvolvimento dessa região, trazendo benefícios para a sociedade. Isso porque a expansão do império não foi apenas territorial - foi também de caráter cultural. Os islâmicos incorporaram, aos seus hábitos de vida, os costumes de outros povos. A elaboração de moedas, por exemplo, trouxe inovações no comércio, apontando um avanço econômico para o império. Nesse sentido, Doak (1963) aponta que as conquistas possuíam também razões materiais, tendo em vista que a Península Arábica era um deserto com difíceis condições para subsistência, e nas novas terras eles encontraram suprimentos abundantes, além de riquezas e luxos com os quais eles não estavam acostumados.

O Califado Omíada (segundo califado do império) terminou em 750, quando esse foi derrotado por abássidas12 e outros inimigos antigos, em uma revolução iniciada em 747 contra a dinastia governante. O terceiro califado, o Califado Abássida, durou até 1258. Sob essa dinastia, a nova capital foi modificada para Bagdá, as conquistas do império entraram em declínio e o império em si entrou em uma época conhecida como idade de ouro da civilização islâmica, período em que o estudioso Ibn Turk viveu, do qual trataremos como medieval.

De fato, nessa época, por um lado, o território do império islâmico era muito vasto devido às conquistas anteriores, estando cada vez mais difícil controlar tais áreas satisfatoriamente, visto que eram povos de diferentes culturas e por vezes, inimigos entre si. Por outro lado, houve, em todo o império, crescimento e desenvolvimento da vida urbana, com intensa atividade comercial, especialmente em Bagdá. Além disso, sob o califado Abássida ocorreu o florescimento da filosofia e da ciência, com amplo apoio aos estudiosos. Esse apoio manifestou-se por exemplo por meio da criação da Bayt al-H. ikma, ou Casa da Sabedoria. A seguir abordaremos alguns aspectos dessa instituição, assim como seu papel histórico para a ciência e matemática islâmica.

3.1.2 A casa da Sabedoria

Antes da expansão do império, os povos da Arábia dependiam principalmente da tradição oral (memorização e declamação de longas obras) para preservar sua literatura e história. Com a criação de bibliotecas e escolas em Bagdá, especialmente no período chefiado pelo Califado Abássida, essa realidade foi modificada. Além disso, cientistas, poetas e outras pessoas instruídas vieram visitar e estudar o novo centro científico do império, favorecendo o desenvolvimento de vários campos disciplinares como a astronomia, a medicina, a agricultura, a economia, entre outros. (DOAK, 1963).

Durante o reinado de Harun al-Rashid (786-809), houve a construção de uma biblioteca em que podiam ser encontradas obras originais em sânscrito, persa e grego, assim como traduções desses trabalhos científicos. (BERGGREN, 1986).

Esse foi somente um dos primeiros impulsos para o crescimento da cultura islâmica. De fato, a fundação de um centro de estudos também na cidade de Bagdá estimulou ainda mais a pesquisa científica nessa região do mundo. A Casa da Sabedoria13, passou a ser, em pouco tempo, o polo de conhecimentos científicos da Península Arábica, sendo fundada pelo califa al- Ma’nun (786-833). De acordo com Katz (2008, p. 266, tradução nossa):

O sucessor de Haraí, o califa al-Ma'mun, estabeleceu um instituto de pesquisa, o Bayt

al-H. ikma (Casa da Sabedoria), que duraria mais de 200 anos. Para isso, foram

convidados estudiosos de todas as partes do califado para traduzir textos gregos e indianos, bem como para conduzir pesquisa original.

Bagdá, já estabelecida capital por al-Mansur (754-775) e prosperando como centro econômico, se estabelece agora como sede de produções intelectuais por atuações de Al- Ma’nun. Salienta-se que esse califa era estudioso de vários campos científicos, tendo, além de incentivado, se envolvido com projetos da Casa da Sabedoria. (SEZGIN, 2010).

Nessa instituição, estudiosos de todas as religiões e nacionalidades eram bem recebidos para realizar seus trabalhos intelectuais. Assim, como dito, foram traduzidos manuscritos de diversas civilizações, como a grega, a babilônica e a hindu, desenvolvendo-se a base para que uma atividade científica de forma original fosse também produzida. Importante destacar ainda que o califa Al-Ma’nun criou o primeiro observatório astronômico em Bagdá e outro em Qiyiy (montanha de Damasco). Existem indícios de que os maiores estudiosos dessa época realizaram

13 Existiam outros centros intelectuais de produção de conhecimento na época, criados por outros califas, mas o