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2 FUNDAMENTOS DA PESQUISA

2.2 Quanto à utilização de tecnologias digitais da informação e da comunicação

O advento e a popularização da tecnologia computacional, especialmente no início do século XXI, causaram diversas mudanças na vida humana: desde a economia até o lazer passaram a ser influenciados pela informática. A presença abundante da tecnologia no cotidiano, contracenando com a velocidade e a numerosidade de informações, mostra uma

realidade antes desconhecida pelos indivíduos. De acordo com Leite (2011, p. 64): “[...] estamos vivendo o fortalecimento da cultura digital, que tem tido participação cada vez mais abrangente na vida das pessoas de todas as idades e localizadas praticamente em todas as partes do globo.”.

Primeiramente destaca-se que a informática é uma tecnologia, assim como outras que existem há mais tempo e já são muito utilizadas na educação, como, por exemplo, lápis, quadro branco e papel. Isso porque a definição de tecnologia diz respeito à instrumentos que auxiliam

os seres humanos a realizarem tarefas. Nesse sentido, Levy (1993) enfatiza que a história das

tecnologias sempre esteve entrelaçada com a história da própria humanidade.

Apoiando-se nessa visão, Borba e Penteado (2003) defendem que não é adequada uma visão dicotômica entre homem-mídia, já que, sob um panorama histórico, sugere que os indivíduos são constituídos por técnicas que estendem e modificam seu raciocínio e, simultaneamente, esses mesmos indivíduos estão continuamente transformando essas técnicas. Por esse motivo, os autores adotam “uma perspectiva teórica que se apóia na noção de que o

conhecimento é produzido por um coletivo formado por seres-humanos-com-mídias, ou

seres-humanos-com-tecnologias”. (BORBA; PENTEADO, 2003, p. 48, grifos nossos).

Nas constatações de Ponte, Brocardo e Oliveira (2009), o suporte tecnológico permite o desenho, a manipulação e a construção de entes matemáticos, facilita a exploração de conjecturas e a investigação de relações que precedem o uso do raciocínio formal, o que contribui com as ideias de IM apresentadas nessa pesquisa. Os autores enfatizam ainda que vários estudos destacam também que a utilização dessas tecnologias facilita a recolha de dados e o teste de conjecturas, apoiando, desse modo, explorações mais organizadas e completas e permitindo que os alunos se concentrem nas decisões em termos do processo, o que pressupõe a valorização do saber e do fazer históricos na ação cognitiva dos estudantes, presentes em nossa proposta.

Posto isso, destacamos nossa escolha de utilizar o software Geogebra4 como ambiente para exploração dos estudantes quanto às construções históricas realizadas e analisadas sob a perspectiva de investigação matemática de problemas que envolvem soluções de equações quadráticas pela álgebra geométrica de Ibn Turk. A escolha do software se deu por vários motivos, sendo o principal deles a harmonia dos objetivos das atividades a serem realizadas com os recursos disponibilizados no Geogebra, em especial, a associação dos campos de

4 Software de matemática dinâmica desenvolvido por Markus Hohenwarter, em 2001, com o objetivo de ser

visualização geométrico e algébrico do mesmo objeto matemático. Além disso, esse software é gratuito e de fácil manipulação em uma atmosfera que valoriza a dinâmica, a observação, a construção e a experimentação, possibilitando aos estudantes o envolvimento ativo com as atividades propostas.

Sob esse enfoque, a informática é utilizada também como meio para uma maior

integração/participação dos estudantes nas aulas; eventos muitas vezes complicados de

serem realizados em ambientes sem a presença das tecnologias. Em aulas expositivas, por exemplo, os alunos algumas vezes se sentem inibidos a envolver-se na aula, agindo, apenas como ouvintes. Nesse sentido, é importante ressaltar que a aprendizagem não se dá a partir da fala do professor; ela exige, para além disso, o diálogo entre docentes e alunos, a colaboração de ambos para a construção/desenvolvimento de um conhecimento que vá além da memorização de fórmulas e algoritmos, no caso de matemática. No posicionamento de Borba e Penteado (2017), é enfatizada a dinâmica da informática nas aulas: um problema que pode remeter a outro, a interação entre professores, alunos e tecnologia que gera conjecturas e ideias matemáticas, originando assim uma perspectiva de experimentação que inverte a ordem de exposição oral da teoria, exemplos e exercícios e permitindo uma nova ordem pautada na investigação e, então, teorização/formalização dos conhecimentos. No caso de equações quadráticas, assunto abordado no nosso produto educacional, é possível notar diversas vezes um ensino marcado pela representação algorítmica do conceito - aplicação de fórmula, ou seja, priorização excessiva da aprendizagem mecânica, que não faz relação, por exemplo, com aspectos geométricos e origem das fórmulas utilizadas atualmente, como proposto nessa pesquisa.

Assim, consideramos que o Geogebra propiciará o desenvolvimento de uma atitude investigatória por parte dos alunos, subsidiando uma categoria de experimentação que possibilitará, por um lado, otimização de tempo na reconstrução de conhecimentos históricos e associação desses com o hoje, que, caso realizadas de outra forma, poderiam levar muito tempo para serem criadas, investigadas e compreendidas. De fato, Ponte, Brocardo e Oliveira (2009, p. 85) apontam que “a possibilidade de usar programas de Geometria Dinâmica facilita a realização de experiências que, de outro modo, se tornariam morosas e difíceis de analisar”. Ainda esclarecendo, esta otimização do tempo aqui tratada envolve redução deste, mas vai além disto, ou seja, não é só, diminuir o tempo de execução das atividades, mas aproveitá-lo da melhor forma e, quando, diminuído, usar o tempo ganho para investigar e explorar relações.

Nessa dinâmica proposta pela utilização das tecnologias em sala de aula, o papel do

professor é redimensionado: ele passa de expositor de conteúdo para apoiador de seus alunos,

para propositor de saberes, provocador de situações, formulador de problemas, criador de possibilidades e de articulações entre diferentes áreas, orientador, aquele que mobiliza/estimula seus alunos na construção do conhecimento. Considerando o que foi posto, Silva (2011, p. 95) afirma que o docente deve, em sala de aula:

- oferecer múltiplas informações (em imagens, sons, textos, etc.), utilizando ou não tecnologias digitais, mas sabendo que estas, utilizadas de modo interativo, potencializam consideravelmente ações que resultam em conhecimento.

- ensejar (oferecer a ocasião de...) e urdir (dispor entrelaçados os fios da teia, enredar) múltiplos percursos para conexões e expressões com o que os alunos possam contar no ato de manipular as informações e percorrer percursos arquitetados.

- estimular os alunos a contribuir com novas informações e a criar e oferecer mais e melhores percursos, participando como coautores do processo.

Acerca disso, Borba e Penteado (2003) entendem que a utilização de tecnologias na educação matemática é harmoniosa com uma visão de construção do conhecimento que privilegia o processo e não o produto-resultado em sala de aula, e que entende o conhecimento como tendo sempre um constituinte que depende do sujeito. Em consonância com essa visão, Valente (1993) ressalta que:

[...] ao invés de memorizar informação, os estudantes devem ser ensinados a

procurar e a usar a informação. Estas mudanças podem ser introduzidas com a

presença do computador que deve propiciar as condições para os estudantes exercitarem a capacidade de procurar e selecionar informação, resolver problemas e aprender independentemente. [...] A função do aparato educacional não deve ser a de ensinar mas sim a de promover o aprendizado. Isto significa que o professor deixa de ser o repassador do conhecimento — o computador pode fazer isto e o faz muito mais eficientemente do que o professor — para ser o criador de ambientes de aprendizado e facilitador do processo pelo qual o aluno adquire conhecimento. (VALENTE, 1993, p. 5, grifos nossos)

O dinamismo do Geogebra está associado, de acordo com os pensamentos de Borba, Silva e Gadenide (2015, p. 23) “às possibilidades em podermos utilizar, manipular, combinar, visualizar e construir virtualmente objetos geométricos, permitindo traçar novos caminhos de investigação”.

As tecnologias têm ainda gerado diferentes formas de elaborar e de representar o conhecimento, implicando, portanto, em transformações nas práticas educativas – e é essencial para o aluno, enquanto participante da sociedade – se apropriar dessas novas linguagens, novas atividades, ou seja, se alfabetizar nesse ambiente tecnológico. Essa questão envolve a formação

de indivíduos éticos e críticos da realidade tecnológica que é vivenciada, ou seja, cidadãos que são formados em interação com os valores da contemporaneidade. Concordando com essa visão, Borba e Penteado (2003) defendem que:

O acesso à informática deve ser visto como um direito e portanto, nas escolas públicas e particulares o estudante deve poder usufruir de uma educação que no momento atual inclua, no mínimo, uma ‘alfabetização tecnológica’. Tal alfabetização deve ser vista não com um Curso de Informática, mas sim, como um aprender a ler essa nova mídia. Assim, o computador deve estar inserido em atividades essenciais, tais como aprender a ler, escrever, compreender textos, entender gráficos, contar, desenvolver noções espaciais etc. E, nesse sentido, a informática na escola passa a ser parte da resposta a questões ligadas à cidadania. (BORBA; PENTEADO, 2003, p. 17)

A escola tem como responsabilidade social formar pessoas. Essa formação, para ser integral/global, deve levar em consideração todo o contexto político, social e econômico que vive a sociedade naquele momento. Daí surge a relevância das instituições de ensino construírem propostas pedagógicas que dialoguem com as novas tecnologias: elemento que adquire uma importância cada vez maior no século XXI. Leite (2011, p. 73) adverte que “a escola contemporânea precisa ser problematizadora, desafiadora, agregadora de indivíduos pensantes que constroem conhecimento colaborativamente e de maneira crítica”.

Para a informática adentrar para a sala de aula como parte do coletivo pensante citado anteriormente, o ideal é que suas características (algumas já citadas antes) possam ser aproveitadas ao máximo, no sentido de melhorar a aprendizagem. Isso deve ser feito com enfoques pedagógicos que harmonizem com essas tecnologias, ou seja, práticas educativas que valorizem a participação ativa do educando, a significação de conteúdos pelo aluno, possibilitem a interdisciplinaridade, a experimentação e a construção de saberes de maneira coletiva. Entendemos que a HM está em consonância com essa perspectiva, tendo em vista o que já foi exposto. Nesse sentido, enfatiza-se novamente nossa escolha em utilizar o Geogebra como tecnologia para o trabalho com investigações históricas, pois a mesma proporcionou a realização de construções geométricas de forma rápida e dinâmica, contribuindo para uma melhor visualização geométrica e uma maior agilidade na (re)construção de tais construções, quando o estudante, por exemplo, necessitava refletir mais sobre alguma etapa do que já havia feito. Essa possibilidade ficaria inviável, por exemplo, com recursos como lápis e folhas (construções geométricas no papel), em que seria gasto muito tempo e esforço para efetuar tal processo de construção-reconstrução. Além disso, as ferramentas do Geogebra enriqueceram o trabalho de investigação histórica na medida em que permitiram aos estudantes de cada grupo, individualmente, investigar passos de uma construção geométrica já elaborada previamente,

procedimento complicado de ser feito sem o aparato tecnológico apropriado. Em razão disso, propomos nesse trabalho a aliança entre essas ferramentas objetivando uma proposta alternativa para a aprendizagem entre os alunos, por meio de uma perspectiva investigativa. Acerca desse tema, Borba e Penteado (2003) enfatizam que, na educação matemática:

O enfoque experimental explora ao máximo as possibilidades de rápido feedback das mídias informáticas e a facilidade de geração de inúmeros gráficos, tabelas e expressões algébricas. Por outro lado, essa prática pedagógica estimula a utilização de problemas abertos, de formulação de conjecturas em que a sistematização se dá como coroamento de um processo de investigação por parte dos estudantes (e, muitas vezes, por parte do professor). (BORBA; PENTEADO, 2003, p. 45).

O ambiente informatizado possui, então, potencialidades pedagógicas que representam, para o professor, um aperfeiçoamento de sua prática profissional; para o aluno, novas possibilidades de formação, e para a educação como um todo, o desenvolvimento de novos contextos/situações de ensino e aprendizagem. Essa visão concorda com a de Tikhomirov (1981), que afirma que os computadores reorganizam o pensamento. No caso dessa pesquisa, como veremos no capítulo quatro, a tecnologia contribuiu para que os estudantes compreendessem uma forma de integração geometria-álgebra em equações quadráticas ao longo das atividades, assim como trouxe maneiras de utilizar a tecnologia integrada à investigação histórica, apoiando a formação docente desses licenciandos. Nessa linha de raciocínio, a escola se sobressai como um ambiente de reorganização e discussão de informações, que podem ser adquiridas por diversos outros meios; e não mais como uma instituição meramente transmissora de conhecimentos.

Tendo isso em vista, cabe ressaltar mais uma vez o papel central do professor para a utilização dessas tecnologias no âmbito escolar: esse deve ser formado para aproveitar da melhor maneira as potencialidades do mundo tecnológico, assim como para assumir outros papeis (já mencionados anteriormente) propostos pelas tecnologias. Conhecer as limitações e a importância das mesmas para a atuação docente, assim como para o desenvolvimento educacional dos estudantes também são saberes primordiais para o docente. Acerca disso, Borba e Penteado (2017, p. 66), afirmam que

ao caminhar em direção à zona de risco, o professor pode usufruir o potencial que a tecnologia informática tem a oferecer para aperfeiçoar sua prática profissional. Aspectos como incerteza e imprevisibilidade, geradas num ambiente informatizado, podem ser vistos como possibilidades para desenvolvimento: desenvolvimento do aluno, desenvolvimento do professor, desenvolvimento das situações de ensino e aprendizagem.

Valente e Almeida (1997) remetem ao contexto do final do século anterior, mas que ainda observamos no período vigente desta pesquisa:

A formação do professor deve prover condições para que ele construa conhecimento sobre as técnicas computacionais, entenda por que e como integrar o computador na sua prática pedagógica e seja capaz de superar barreiras de ordem administrativa e pedagógica. [...] Finalmente, deve-se criar condições para que o professor saiba recontextualizar o aprendizado e a experiência vividos durante a sua formação para a sua realidade de sala de aula compatibilizando as necessidades de seus alunos e os objetivos pedagógicos que se dispõe a atingir.

Nesta linha, segundo os mesmos autores, os cursos de formação de professores ainda não propiciam condições para que esses possam aprender, efetivamente, a usar o computador, sendo que o processo pedagógico de preparo do aluno da graduação baseia-se ainda na transmissão de informação, não tendo sofrido modificações profundas.

Mais uma vez volta-se para a questão da formação docente e suas implicações para práticas pedagógicas no ambiente escolar. Nesse sentido, Borba e Penteado (2017) destacam que: “inovações educacionais, em sua grande maioria, pressupõem mudança na prática docente, não sendo uma exigência exclusiva daquelas que envolvem o uso da tecnologia informática. A docência, independentemente do uso de TI, é uma profissão complexa”.

É importante ressaltar ainda que esses mesmos autores apontam que já há indicativos de que, se o professor não tiver espaço para refletir sobre as mudanças que acarretam a presença da informática na sala de aula, eles tenderão a não utilizar essas tecnologias, ou ainda utilizá- las de maneira superficial, domesticando-as, portanto. Por este motivo ainda, consideramos importante trazer em nossa proposta de produto para formação inicial de professor de matemática, a incorporação da tecnologia neste aspecto. Dessa forma, mais uma vez a formação se mostra como ponto fundamental para a implantação de inovações quaisquer na área da educação, daí sua relevância no contexto geral educacional, e na realização desse trabalho especificamente. Cabe, portanto, destacarmos que o caderno de atividades produzido trará problemas/situações históricas a serem investigadas pelos estudantes com apoio das TDIC, procurando fomentar várias discussões ao redor dessas temáticas no campo da educação matemática, como também o ensino de matemática, contribuindo, nessa perspectiva, para a formação docente.

Finalizada essa seção, que abordou diversos pontos sobre os quais nos respaldamos para utilizar as TDIC nas aulas de matemática, seguiremos apresentando considerações que tratam de tópicos acerca da Investigação Matemática (IM) como via para o estudo de álgebra geométrica sob uma visão integradora entre HM e TDIC.