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2 FUNDAMENTOS DA PESQUISA

2.3 Sobre a Investigação Matemática

As aulas de matemática envolvendo HM podem ser desenvolvidas de diversas formas, conforme visto anteriormente. O foco desse projeto é utilizar a HM no sentido de evidenciar

as condições investigativas do processo construtivo da matemática que pode ser apoiado pelas

TDIC. De acordo com Mendes (2006), a investigação histórica:

pode contribuir para que o processo de cognição matemática, em sala de aula, se desenvolva de maneira significativa. Essa perspectiva investigatória, portanto, pode ser conduzida de forma orientada, constituindo-se como um agente de cognição matemática na sala de aula, fazendo com que os estudantes compreendam o processo de construção da matemática em cada contexto e momento histórico específicos. (MENDES, 2006, p. 91)

Nesse contexto, a Investigação Matemática será utilizada como caminho para o

trabalho com História da Matemática que possibilitará o entendimento, por parte dos

educandos, da álgebra geométrica desenvolvida na civilização islâmica medieval; isso contribuirá para que os estudantes consigam perceber essa mesma matemática como uma produção humana de grande importância para a sociedade. Assim, a IM favorece o uso da História da Matemática como um reorganizador cognitivo capaz de justificar as origens e os porquês matemáticos dos conteúdos ensinados na escola, sob um enfoque mais problematizador (MENDES, FOSSA E VALDÉS, 2006).

Uma visão mais ampla da matemática como ciência colaborará para um aprendizado significativo da disciplina, à medida que os alunos compreendam essa ciência como um instrumento de decodificação, interpretação e explicação de fenômenos do mundo real. Por este motivo, o produto aqui exposto traz investigação de problemas aplicados ao contexto da matemática islâmica medieval, assim como o contexto atual. Miguel e Miorim (2008, p. 129), nessa mesma linha de pensamento, enfatizam a HM como “campo de possibilidade de constituição das situações, contextos e circunstâncias culturais engendradoras do conhecimento matemático e de suas transformações, bem como, é claro, das significações semi-óticas intra e interculturais produzidas e negociadas nos processos de circulação, recepção e transformação desse conhecimento em diferentes contextos e épocas. ”

A investigação histórica, nessas condições, deve ser vista como uma proposta que

proporciona a problematização de situações ocorridas ao longo da HM. É importante

Em contextos de ensino e aprendizagem, investigar não significa necessariamente lidar com problemas muito sofisticados na fronteira do conhecimento. Significa, tão só, que formulamos questões que nos interessam, para as quais não temos resposta pronta, e procuramos essa resposta de modo tanto quanto possível fundamentado e rigoroso. Desse modo, investigar não representa obrigatoriamente trabalhar em problemas muito difíceis. Significa, pelo contrário, trabalhar com questões que nos interpelam e que se apresentam no início de modo confuso, mas que procuramos clarificar e estudar de modo organizado. (PONTE, BROCARDO; OLIVEIRA, 2009, p. 9).

A visão de Mendes (2006) acerca da IM utilizada em parceria com a HM reforça a ideia de um ensino-aprendizagem focado na compreensão e entendimento da matemática, pois:

[...] uma abordagem didática investigatória nas aulas de matemática, apoiada nas informações históricas, pode contribuir na concretização de um ensino e aprendizagem da matemática com significado, ao envolver situações históricas problematizadoras que conduzam os estudantes em busca de sua aprendizagem matemática. (MENDES, 2006, p. 67).

Nosso caderno de atividades, pensando nos pontos já destacados, objetiva fazer com que os estudantes vejam a matemática como resultado de processos históricos estabelecendo uma relação passado-presente, a partir da construção/desenvolvimento de conhecimentos matemáticos ligados às equações quadráticas. Mendes, Fossa e Valdés (2006) defendem que é preciso conceber atividades que conduzam o estudante a fazer descobrimentos pessoais, sendo que essas devem permitir explorar e examinar o mundo que lhes rodeia.

Nesse sentido, a busca pela resposta de algum problema por meio da Investigação Matemática exige a realização de uma série de etapas, que por sua vez podem ocorrer simultaneamente ou ainda ciclicamente. Essas etapas estarão presentes no caderno de atividades, assim como na aplicação desse no Ensino Superior (formação inicial do professor de matemática). Ponte, Brocardo e Oliveira (2009) chamam essas fases de momentos, resumindo-as no quadro a seguir:

Quadro 1 – Momentos na realização de uma investigação Exploração e formulação de questões  Reconhecer uma situação problemática

 Explorar a situação problemática  Formular questões

Conjecturas  Organizar dados

 Formular conjecturas (e fazer afirmações sobre uma conjectura)

Testes e reformulação  Realizar testes

 Refinar uma conjectura Justificação e Avaliação  Justificar uma Conjectura

 Avaliar o raciocínio ou resultado do raciocínio

Fonte: Ponte, Brocardo e Oliveira (2009, p. 21)

Observa-se que esses momentos estão estreitamente relacionados ao trabalho desenvolvido ao longo da HM (embora com diversos avanços, recuos e descontinuidades), para que a matemática estivesse no ponto em que está atualmente. É importante que os alunos conheçam esse processo, assim como se utilizem dele, tanto para que seja desconstruída a visão de matemática como ciência perfeita e pronta, como também para que eles sejam capazes de

produzir matemática5. Essa visão corresponde com a de Braumann (2002 apud Ponte,

Brocardo e Oliveira, 2009, p.19), que afirma:

aprender matemática não é simplesmente compreender a matemática já feita, mas ser capaz de fazer uma investigação de natureza matemática (ao nível adequado a cada grau de ensino). Só assim se pode verdadeiramente perceber o que é a matemática e a sua utilidade na compreensão do mundo e na intervenção sobre o mundo. (BRAUMANN, 2002 apud PONTE, BROCARDO; OLIVEIRA, 2009, p.19)

Corroborando com o que já foi exposto, D’Ambrosio (1996, p. 118) declara que “aprender é a capacidade de explicar, de apreender e compreender, de enfrentar, criticamente, situações novas. Aprender não é o mero domínio de técnicas, de habilidades, nem a memorização de algumas explicações e teorias. ”

É importante que seja destacada ainda que a investigação histórica utilizada em sala de aula como via para o trabalho com HM suscitará um trabalho que trará outros vários benefícios

para o estudante, tais como: o desenvolvimento da criatividade, da interatividade, do

raciocínio lógico, do pensamento crítico, da capacidade de interpretação, ação, comunicação e escrita, habilidades fundamentais na formação global do indivíduo e que também procuramos alcançar no produto, fruto desta dissertação. Essas habilidades são desenvolvidas ao longo das etapas do processo investigativo, desde a interpretação do problema, a realização de conjecturas e testes para validação dessas, até a formalização das ideias matemáticas construídas ao longo do percurso de aprendizagem. Para Lorenzato (2008, p. 72):

a experimentação é o melhor modo para se conseguir a aprendizagem com significado, uma vez que ela realça o ‘porquê’, a explicação e, assim, valoriza a compreensão. Além disso, ela possibilita: a integração de diferentes assuntos, a redescoberta, a memorização de resultados, a aprendizagem de diferentes estratégias de resolução de problemas, a verificação de conjecturas ou de resultados.

A possibilidade de discussão de ideias e socialização do que foi percebido durante a IM (momento de justificação e avaliação) é um ponto a ser salientado: o conhecimento se torna partilhado e pode gerar diversas reflexões sobre o saber matemático; a troca de informações favorece o pensamento ativo dos estudantes, e por consequência, a estruturação de ideias e interiorização dos conteúdos estudados. Isto posto, é importante ressaltar que para Ponte, Brocardo e Oliveira (2009), uma condição fundamental para a aprendizagem de qualquer disciplina é o envolvimento ativo por parte do aluno, já que esse aprende quando mobiliza seus próprios recursos cognitivos e afetivos com determinado intuito.

De fato, Mendes, Fossa e Valdés (2006) argumentam que um dos maiores obstáculos ao sucesso do ensino-aprendizagem da matemática diz respeito ao desinteresse dos estudantes com relação ao modo como a matemática é apresentada em sala de aula. Por esse motivo, os autores ponderam que uma das melhores maneiras de se aprender matemática atualmente é através de um ensino mais prático e dinâmico por parte do professor e dos estudantes, o que buscamos em nossa pesquisa por meio de uma abordagem histórica de álgebra geométrica sob uma perspectiva problematizadora e investigativa baseada no método de Ibn Turk e o contexto da matemática islâmica medieval.

É importante salientar ainda que a experimentação e análise das conjecturas (momento das conjecturas, testes e reformulação) podem levar os estudantes a conclusões inesperadas que tornam possível a aprendizagem de novos conceitos e ideias matemáticas, por vezes fora do

conteúdo curricular proposto para tal série, enriquecendo a bagagem intelectual dos

A realização e sucesso desse trabalho, cabe mencionar, dependem de vários fatores, especialmente no que se refere ao ambiente de aprendizagem criado na sala de aula. Para isso, é necessário que o professor assuma diferentes papeis durante a IM, com vistas a alcançar esse ambiente propício para o desenvolvimento de atividades com características até aqui descritas. D’Ambrosio (1996, p. 90, grifo nosso) afirma que “a função do professor é a de um associado aos alunos na consecução da tarefa, e consequentemente na busca de novos conhecimentos”.

O papel de associado, nesse sentido, compreende colaboração e participação no processo: especialmente nas aulas que envolvem IM, o professor deverá apropriar-se das seguintes funções, de acordo com Ponte, Brocardo e Oliveira (2009): desafiar os alunos, avaliar o progresso desses, apoiar o trabalho deles e raciocinar matematicamente. O objetivo dessas ações é ajudar os alunos a compreender e aprender a fazer investigações matemáticas. Os autores apontam ainda para o papel determinante que o docente terá nas aulas de IM, além dos obstáculos que o mesmo poderá enfrentar:

[...] a interação que ele [professor] tem de estabelecer com os alunos é bem diferente da que ocorre em outros tipos de aula, levando-o a confrontar-se com algumas dificuldades e dilemas. Tais aulas representam um desafio adicional à sua prática, mas, certamente, traduzem-se também em momentos de realização profissional. (PONTE, BROCARDO; OLIVEIRA, 2009, p. 47).

Em relação à essas dificuldades, pode-se afirmar que sua transformação em momentos de realização profissional dependerão, em grande parte, da postura assumida pelo professor: novas práticas podem ampliar as possibilidades de atuação do mesmo e tornar o ensino- aprendizagem melhor para o educando. Entretanto, para isso, são exigidas dos docentes diversas habilidades e competências envolvendo a pesquisa e o educar. No âmbito do produto aqui apresentado, destinamos uma seção de orientações ao professor que almejam reunir algumas destas informações de conduta.

Mendes (2006), com relação a esse tema destaca que:

as informações históricas podem ser usadas na geração da matemática escolar desde que o professor consiga inserir em suas aulas uma dinâmica experimental investigatória (a pesquisa como princípio científico e educativo) através do levantamento e da testagem de suas hipóteses acerca de alguns problemas históricos investigados e de atividades manipulativas extraídas da História da Matemática. Essa forma de agir em sala de aula contribui, sobretudo, para que os estudantes reflitam sobre a formalização das leis matemáticas a partir de certas propriedades e artifícios usados hoje e que foram construídos em períodos anteriores ao que vivemos. (MENDES, 2006, p. 91).

Assim sendo, a IM e a HM são tendências da educação matemática que podem auxiliar o docente em seu trabalho, à medida que proporcionam a construção/desenvolvimento do conhecimento, a comunicação com a turma e a participação dos alunos. Contudo, para atingir tais propósitos, é necessário que o professor envolva em sua prática diversos momentos de ação- reflexão-ação, renovando-se pessoal e profissionalmente. Propomos, pois, que uma maneira de otimizar este processo consiste em aliar HM, TDIC e IM investigando problemas históricos com apoio de tecnologia.

Apresentada a fundamentação teórica sobre a qual nos apoiamos para desenvolver esse trabalho, destaca-se que o caderno de atividades proposto se baseou na utilização da HM integradas com as TDIC via IM. Dessa forma, o capítulo que segue tratará dos elementos históricos abordados nessa pesquisa, que dizem respeito à civilização islâmica medieval e apresentação da biografia e produção matemática de Ibn Turk (século IX). Deste estudo histórico retiramos as situações a serem investigadas com apoio do Geogebra. No produto, tais informações estão condensadas em um tópico nomeado por Seção Texto e Contexto, como veremos posteriormente.

3 ‘ABD AL-HAMID IBN TURK (SÉCULO IX) E SUA SOLUÇÃO DE EQUAÇÕES QUADRÁTICAS NO CONTEXTO DA MATEMÁTICA ISLÂMICA MEDIEVAL

Nesse capítulo será feita uma contextualização histórica da civilização islâmica, evidenciando o cenário de seu surgimento, a sua expansão e os seus aspectos políticos e econômicos, contendo uma visão geral dessa sociedade. Depois, será abordada a ciência islâmica medieval, com destaque para a instituição Casa da Sabedoria assim como a matemática desenvolvida pelos estudiosos islâmicos, seguida da ênfase na apresentação de um de seus representantes, Ibn Turk (século IX), e sua produção matemática.