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1 EM BUSCA DE DETERMINAÇÕES GERAIS PARA PENSAR O

1.1 Os circuitos do sistema do capital na contemporaneidade

No fim da década de 60 e início da década de 70, o capitalismo entra em uma

crise que põe fim aos seus “30 anos gloriosos”18. O aumento do valor da matéria-prima, os

altos índices de inflação, uma série de falências, as crises bancárias, a crise do petróleo 1973/7419, a queda na taxa de lucro foram sinais importantes de que o sonho havia terminado. Nesse ínterim, o capitalismo inicia um processo de transição que o faz ganhar novas configurações e contornos. De fato, nas últimas três décadas do século XX e limiar do século XXI, o sistema do capital vem assumindo uma versão tardia, financeira, mundializada, complexa, em que a crise é uma constante.

De acordo com MANDEL (1985), a partir da década de 70, tem-se início a uma nova fase do capitalismo a que denomina de capitalismo tardio, caracterizada pelos processos de globalização dos mercados e do trabalho, pela intensificação dos fluxos internacionais do capital, pelos processos de financeirização da economia.

18Os “trinta anos gloriosos”, também conhecido como ‘Anos Dourados”, foi o termo utilizado para designar o período em que o capitalismo vigorou (40-70), pautado numa estabilidade econômica, no controle das relações salariais, no pleno emprego, na melhoria das condições de vida devido às medidas adotadas pelo Estado de Bem-Estar Social. O capitalismo desse período funcionava a partir do fordismo-keynesianismo que adotava “um conjunto de práticas de controle do trabalho, tecnologias, hábitos de consumo e configurações de poder político-econômico”. (HARVEY, 2010, p.119).

19A crise do petróleo foi alavancada pela decisão da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) de aumentar os preços do petróleo, assim como, pelo embargo do petróleo aos países ocidentais por parte dos países árabes, durante a guerra de 1973 entre árabes e israelenses. Tais decisões acarretaram um forte aumento dos insumos de energia e, ainda, uma instabilidade financeira por conta dos petrodólares excedentes. (HARVEY, 2010).

A rigor, em tempos de capitalismo contemporâneo, Chesnais (1996) identifica o fenômeno da mundialização do capital numa fase de dominância financeira. De fato, o capital produtivo, comercial e financeiro vem superando as barreiras nacionais - o que exige um

contexto necessariamente desregulamentado – em busca de sua acumulação ininterrupta em

escala mundial. Cabe destacar que, nesse contexto, a esfera financeira passa a ser campo privilegiado na obtenção de lucros,através da forma dinheiro gerando mais dinheiro (D – D’), ou seja, por meio de um valor que valoriza a si mesmo, sem passar pela mediação da produção e da comercialização de mercadorias. Ressalte-se que essa autonomia da esfera financeira é relativa, uma vez que os capitais, que se valorizam nesta esfera, advêm dos setores produtivos com a produção de mais-valia. Em verdade, a riqueza produzida na esfera produtiva não é nela reinvestida, mas, antes, expropriada pelos setores financeiros, onde o capital se valoriza. Nesse ínterim, o capital financeiro-especulativo20 domina o capital produtivo, processo a que Chesnais (idem) dá o nome de financeirização da economia.

Nessa mesma direção, Teixeira (1999, p. 11) afirma que, hoje, “o capital cria uma comunidade global de mercadorias.” Em verdade, a forma de produção de mercadorias, na contemporaneidade, é radicalmente diferente da que vigorou durante a grande indústria, período em que “o capital-dinheiro era um negócio particular dos bancos; o capital produtivo, dos industriais; e o capital-mercadoria, dos comerciantes.” (ibidem, p.109). De fato, segundo este autor, o capitalismo contemporâneo rompe com essas particularizações e passa a funcionar a partir de uma cooperação complexa entre capital-dinheiro, capital-produtivo e capital-mercadoria. Esta cooperação complexa acontece, por exemplo, quando um grande industrial, além de realizar investimentos em sua indústria (capital-produtivo), começa a investir no comércio (capital-mercadoria) e, ainda, passa a contar com sua própria companhia de financiamento (capital-dinheiro), fazendo de seu negócio a encarnação de todas as formas de existência do capital.

Cabe ressaltar que essa nova configuração que o capitalismo assume hodiernamente tem por base uma crise constante. De fato, para os referidos autores, o processo de financeirização, mundialização e complexificação do sistema do capital é uma tentativa deste contornar sua crise e evitar o colapso.

Mészáros(2010), em suas análises sobre a crise do capitalismo hodierno, afirma que esta se difere, fundamentalmente, das crises cíclicas anteriores, pelo seu caráter

20 A especulação pode ser definida como uma operação que não tem nenhuma finalidade além do lucro que pode

estrutural.Analisando-a para além de sua superfície conjuntural, o referido autor atenta para o fato de que esta crise vem atingindo as dimensões fundamentais do sistema do capital21, tais como a produção, o consumo, e a circulação/distribuição/realização. De fato, essa crise estrutural, de natureza ininterrupta, revela-se através da superprodução de supérfluos, da subsunção crescente de todas as necessidades humanas ao valor de troca e da destruição da força de trabalho, acentuando, assim, as contradições do capital em tempos contemporâneos, expressas no desemprego crônico, na destruição do meio ambiente, na contradição entre o desenvolvimento econômico transnacional e os Estados Nacionais.

Assim, percebe-se que as dimensões adquiridas pelo capitalismo – últimas décadas do século XX e início do século XXI - não solucionou sua crise e não minimizou seus efeitos devastadores. Em verdade, essa nova configuração do sistema do capital aprofundou os elementos destrutivos que presidem a sua lógica.

Mészáros (idem) destaca a destruição da força de trabalho como conseqüência primordial da referida crise. De fato, o trabalho humano vem sendo substituído, paulatinamente, pelo trabalho das máquinas. Em verdade, segundo o citado autor, o trabalho, um dos pilares do capitalismo, vem tornando-se cada vez mais supérfluo22.

De acordo com Antunes (1997, 2005, 2007), cerca de um terço da força mundial que trabalha vem sendo lançada para o desemprego e para os mais diversos tipos de trabalho precário.

A rigor, os efeitos do capital em crise são devastadores para o trabalhador: destrói-se força humana que trabalha; destituem-se direitos sociais; brutalizam-se uma grande massa de trabalhadores, tornam-se descartáveis tanto coisas como pessoas, lançando para fora dos circuitos do capital tudo que não lhe serve. (ANTUNES, 1997).

No âmbito desta crise estrutural, o capitalismo encarna configurações peculiares em diferentes conjunturas. Em verdade, essas tendências globais impactam, de forma ainda

21 De acordo com Mészaros (2010), o capital existiu antes do capitalismo através da produção de mercadorias e, ainda, nas sociedades pós-capitalistas de tipo soviético, muito embora, tenha sido no capitalismo que o capital se desenvolveu mais plenamente através da mercadorização da força de trabalho. Para o referido autor, o capital é um sistema sociometabólico que tem seu núcleo central formado pelo tripé capital, trabalho assalariado e Estado, sendo essas dimensões fundamentais e inter-relacionadas, fazendo com que o sistema só possa ser superado com a eliminação dos três elementos. A rigor, Mészáros (idem), ao fazer esta distinção entre capital e capitalismo circunscreve uma fecunda via analítica.

22 De acordo com Mészaros (2010), a crise do trabalho diz respeito à crise do trabalho abstrato e não do valor trabalho, uma vez que, para ele, o valor trabalho é categoria ontológica ineliminável do ser social.

mais devastadora, os países periféricos, em particular nos países do continente latino- americano, onde o Brasil está inserido.

Este país, a partir da década de 1990, nos governos Collor e Fernando Henrique Cardoso (FHC); e nos anos 2000, no governo Lula, resguardando as devidas diferenças para este governante23, passou a inserir-se na dinâmica financeira e mundializada do capital. Essa inserção deu-se de forma subalterna, através desregulamentações econômicas, fim de uma série de restrições ao capital internacional, abertura comercial e financeira, privatizações, configurando um capitalismo liberal periférico. (FILGUEIRAS; GONÇALVES, 2007).

No Ceará, a consonância com as novas tendências do capitalismo mundial veio com o governo de Tasso, gestão que incorporou o espírito modernizador dos jovens empresários do Ceará.(TEIXEIRA, 1999).

A rigor, essa nova forma do Brasil inserir-se na dinâmica internacional do capital aprofunda uma série de problemas históricos, como é o caso das desigualdades sociais. Com isso, tem-se um desenvolvimento truncado da sociedade brasileira, que Francisco de Oliveira denominou de um ornitorrinco.

Para os trabalhadores brasileiros, os impactos da crise do capital são, de fato, mais gritantes.

É sobre as conseqüências que o capitalismo traz para o mundo do trabalho, no contexto mundial e brasileiro, que abordaremos no tópico seguinte.

1.2 O mundo do trabalho na contemporaneidade: reconfigurações em meio à