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CAPÍTULO III: A(O)S ALUNA(O)S EM CONFLITOS

3.1. Os Critérios de Ingresso e Exames

Ao se cruzar o número de alunos com as exigências para a sua admissão, evidencia- se que a escola teve procura constante ao longo do período analisado. Embora, fosse de certa forma atingida pela débâcle das exportações da borracha, o que pode ser percebido pelo atraso dos salários de seus funcionários, mais e mais alunas procuravam adentrar esse estabelecimento de ensino. Do lado das autoridades, a resposta ao elevado número de ingressantes consistiu em estabelecer critérios cada vez rigorosos na admissão. Um dos motivos que explicam tão elevada procura poderia ser a exigência do diploma de normalista para o ingresso das professoras nas escolas públicas primárias1.

As exigências para a matrícula na EN inicialmente constituíam-se em: provar ter entre 16 e 21 anos para os rapazes e 15 a 21 para as moças; mostrar atestado de que teve varíola, ou foi vacinada(o); ausência de defeito físico que impedisse de exercer vantajosamente o magistério; certificado de exame do curso primario, ou caso não tivesse, apresentar aprovação num exame de admissão, cujos conteúdos seriam referentes ao conjunto de matérias daquele grau de ensino.

Novamente encontram-se presentes critérios de admissão, similares às exigências estabelecidas aos docentes, de higiene e competência, demonstrada em provas. Não se exigia atestado de conduta moral, talvez pela menoridade dos ingressantes. Caso a documentação estivesse falsificada, era prevista a penalidade de não mais poder ingressar na rede pública de ensino.

Em1891 acrescentava-se ainda em relação à saúde, que a(o) candidata(o) não deveria se achar acometida(o) de nenhuma moléstia crônica nem contagiosa ou ainda repugnante. Em 1893, alguns pedidos de ingresso indicariam ainda um exame de admissão. 2 Um década depois, apareceu a obrigatoriedade do pagamento de uma taxa no valor de 10$000 para o fundo escolar. Caso houvesse falsificação de documentos, a pena, além da criminal, era o impedimento de matrícula, em até dois anos nas escolas governamentais. Como a quantidade prevista de alunos a serem matriculados na 1ª série atingiria o teto máximo de 60 alunos eram escolhidos os detentores de melhores notas obtidas no ensino primário para compor a nova turma.

1 Decreto n.1191 de 19 de fevereiro de 1903.

Três anos depois, 15 anos passava a ser a idade mínima para a matrícula, independente do sexo e aumentava-se o número de vagas para 80. Caso houvesse excedentes, deveria ocorrer um exame de admissão que versaria sobre leitura, ditado, análise lexicológica e sintática, aritmética prática, contendo as quatro operações sobre números inteiros, frações ordinárias e decimais, noções de sistema métrico decimal. Os exames constariam de prova escrita de português. Fala-se em exames orais para outras disciplinas, embora só seja citado a matemática.

João Coelho em 31 de janeiro de 1911 resolveu suspender o exame de admissão. O critério estabelecido seria a classificação dos candidatos de acordo com o diploma de estudos primários até completar o número fixado. No caso de empate os alunos mais velhos teriam prioridade. A data mínima de ingresso na EN ficava sendo de 13 anos. 3 Essas mudanças indiciam uma escolarização mais precoce da população e consequentemente a finalização dos estudos primários com 12 anos, indicando a idade de 7 anos para o início da escolarização.

Aumentava-se para 100 o número de matrículas na 1ª série. No caso de excedentes, haveria exame de admissão. Em 1914, a idade de ingresso foi fixada em 14 anos, talvez pelo pouco rendimento ou baixa procura de candidatos com 13 anos. Além da idade mínima deveria ainda ter sido aprovado no agora obrigatório exame de admissão, independente do número de candidatos.

A matrícula na 1ª série era de até 60 alunas(o)s. Os candidatos aprovados no exame, mesmo que ultrapassando o número limite de vagas, teriam prioridade na matrícula do ano seguinte. Para dar continuidade aos dois anos finais, chamado de especial, era necessário outro exame denominado de madureza, de caráter oral, conforme critérios estabelecidos por uma comissão de quatro professores, na qual o diretor teria voto deliberativo.

Para os candidatos que não tivessem cursado a escola, era exigida uma idade mínima de 17 anos completos e o exame de madureza deveria ser aplicado por uma comissão composta pelo diretor que teria voto deliberativo e mais seis professores. O exame oral consistiria em ponto tirado à sorte pelo candidato, dentre todos os que fizessem parte dos programas de ensino das disciplinas do curso geral, salvo o de português, que constaria também em prova escrita. 4

Em 1918, aumentou-se a taxa de inscrição para 20$000 réis que ia para o fundo escolar. Acabava-se com o exame de madureza e a(o) aluna(o) que após terminar os três anos

3 Diário Oficial, 1º de fevereiro de 1911, p. 177.

iniciais, na escola, quisesse passar para o chamado curso especial de mais dois anos, precisaria ser aprovação no curso geral e pagar uma taxa do mesmo valor da anterior.

Em caso de empate de notas, haveria o critério de inscrição mais antiga, se fossem da mesma data, prevaleceria a ordem alfabética do prenome. Caso seguisse ainda empatado, venceria o candidato com maior idade. Esse indício aponta certo prestígio e maior procura pela instituição que desde o nascimento da república lutava por ser tornar uma escola de referência na formação de professores. Conforme a pesquisa vem demonstrando, o fazer-se da EN trilhou sinuosos processos políticos e sociais que a levaram para conflitos, contradições, superações e acomodações.

Em relação aos exames, pelo regulamento de 1890, os alunos da 1ª série seriam chamados pela ordem numérica de matrícula e das séries seguintes pela ordem da classificação por mérito. O que leva mais uma vez constatar que o aparelho escolar era um local de exame, classificação e disciplina. Os exames eram feitos por comissões compostas pelo professor da cadeira, como presidente e dois examinadores indicados pela congregação, aceitos pelo diretor geral de instrução pública e nomeados pelo governador.

Aqui embrincam-se duas questões. A primeira é referente à solenidade do ato de avaliar para garantir a excelência dos alunos e a segunda à publicidade através de anúncios das comissões nomeadas pelo governador do estado. Seguia uma longa tradição dos exames e concursos públicos da época imperial. 5

As provas seriam escritas e orais, com exceção daquelas disciplinas em que só caberiam exames práticos. As provas escritas teriam duração de duas horas, podendo ser prorrogadas. A prova oral duraria meia hora para cada examinda(o). Os graus de julgamento eram: distinção plenamente, simplesmente e reprovação. Considerava-se o português como disciplina fundamental, pois o candidato que fosse reprovado nesse exame estaria sumariamente desclassificado. 6

A(o) aluna(o) reprovada(o) apenas em duas matérias de ciências ou letras teria direito a se matricular no ano seguinte sob condição de primeiro refazer os exames do ano anterior antes de realizar os da série que estivesse cursando. Haveria um exame de segunda época em janeiro para os alunos que não tivessem sido avaliados anteriormente por motivos justificados. 7

5 Capítulo V. Portaria de 4 de fevereiro de 1890 do Regulamento da Escola Normal. PARÀ. Decretos do

Governo Provisório de 1890. Belém: Diário Oficial. 1893.

6 Idem.

Em 1891, o prazo para o exame oral, talvez em função do número de candidatos foi reduzido para 20 minutos e se a prova fosse prática, para 15. O presidente da mesa poderia agora interrogar o candidato por mais cinco minutos. A banca seria formada pelo presidente, professor da disciplina, dois professores do estabelecimento, nomeados pelo diretor ou da escolha da Congregação entre os professores e funcionários públicos nomeados pelo Diretor Geral.

Formar-se-ia uma mesa especial para as cadeiras de Desenho, Música e Caligrafia. O resultado final do exame do discente seria a média entre a do aproveitamento anual, da prova escrita, da prova oral e da prática, se houvesse. Os graus de julgamento agora eram mais detalhados e também quantificados, talvez por deixar margem a várias reclamações e descontentamentos: distinção 10; aprovado plenamente de (7 a 9); aprovado simplesmente de (4 a 6); reprovado de (0 a 3). 8

Em 25 de janeiro de 1900, o novo Regulamento estipulava que para ir aos exames finais o candidato deveria ter no mínimo nota 4. O curioso é que os candidatos que fossem fazer a prova escrita teriam à sua disposição pela banca examinadora livros de textos, tábuas e dicionários, o que significaria a facilitação na realização das provas ou uma avaliação preocupada com a criatividade e menos com a memorização de dados. Para os exames orais, era necessário ter obtida a nota mínima nos exames escritos ou nota de aproveitamento superior a 7. 9

A prova escrita era estendida para três horas. A comissão seria composta do professor da disciplina como presidente e de dois professores da própria escola. Previu-se a convocação de funcionários públicos, caso não houvesse professores suficientes da própria instituição. O funcionário escolhido era obrigado a comparecer sob pena de ter o seu dia de trabalho descontado. Aqui fica evidente a porosidade da instituição que podia ter como examinadores, pessoas que, embora também funcionários externos ao estabelecimento. 10

Modificavam-se também as notas e suas equivalências numéricas: (0) péssima; (1 a 3) má; (4 a 6) sofrível; (7 a 9) boa e (10) ótima. O grau de detalhamento também aumentava consideravelmente a necessidade de suprir as brechas dos regulamentos anteriores e dos conteúdos dos exames de português e francês. A(o) aluna(o) do 3º ano em diante não poderia cometer em qualquer prova escrita mais de quatro erros de português por página completa ou

8 Capítulo VI. Regulamento da EN de 24 de setembro de 1891. PARÁ. Decretos do Governo Republicano do

Estado do Pará. 1891. Belém: Diário Oficial. 1894.

9 Capítulo II. Regulamento para a Escola Normal de 25 de janeiro de 1900. PARÀ. Actos e Decisões de 1900.

Belém: Diario Oficial, 1902.

incompleta. Previam-se agora uma segunda época para os reprovados nos exames anteriores. Suspeita-se que com a procura maior de vagas para a escola, o governo, entre a contratação de novos professores e funcionários para expandir o ensino, optou por elitizá-lo. 11

A partir de 1900, as alterações até 1918 serão extremamente pontuais. Por exemplo, em 1912, só a(o)s aluna(o)s da 5ª série é que prestariam exames práticos em um dos grupos escolares que consistiria em uma pequena aula de até 20 minutos. Em 1914, a aula prática do 5º ano passava a ser dada na escola anexa à EN, perante a comissão examinadora cujo presidente seria o professor de pedagogia em até no máximo meia hora. No entanto, em 1918 o exame prático dessa série era suprimido. Na verdade, entre 1890 a 1900 foram fincados os pontos fundamentais em relação aos exames.

3.2. As Alunas Predominam

A EN republicana foi uma escola majoritariamente de mulheres, como pode ser observado na Tabela 05 de 1890 a 192012.

11 Capítulo II do Regulamento para a Escola Normal de 25 de janeiro de 1900. PARÀ. Actos e Decisões de

1900. Belém: Diario Oficial, 1902.

12 As lacunas aparecem em função de não se ter encontrado estatística. Optou-se pelos dados mais recentes do

governo Augusto Montenegro (1901-1909).

13 Relatório apresentado ao Governador do Estado pelo Director da Escola Normal, Paulino de Almeida Brito,

em cumprimento do art. 66.º, § 9.º do Regulamento expedido para execução do Decreto de 4 de Fevereiro de 1890 em anexo a: VERÍSSIMO, José. Op. Cit., p.185.

14 Relatório de 24 de junho de 1891 de Duarte Huet de Bacellar Pinto Guedes. A diferença entre a soma de

meninos e meninas e o total é em função de 17 ouvintes, p. 28.

15 Mensagem de Lauro Sodré de 7 de abril de 1894, p. 25.

16 Mensagem de 1º de Fevereiro de 1897 de Lauro Sodré. (anexo S1-24) 17 SOUZA, Altamir. Op. cit. p.35.

18 Idem.

ANO MENINAS MENINOS TOTAL

1890 11313 1891 107 (85 no 1º ano e 22 no 2º) 19 (15 no 1º e 4 no 2º) 14314 1893 16715 1897 12816 1898 16 186 20217 1899 16 188 20418

A conquista da mulher pela apropriação do saber letrado foi extremamente árdua no ocidente. O saber seria contrário à feminilidade. As religiões do livro (judaísmo, cristianismo e islamismo) confiam sua interpretação aos homens. Evidentemente houve exceções nas camadas mais privilegiadas da população. A Reforma protestante foi uma mudança significativa, pois obrigava à leitura da Bíblia a cada indivíduo. Para os filósofos do iluminismo caberiam às mulheres as luzes amortecidas. A educação feminina não seria necessariamente uma instrução. Se fosse instrução, seria apenas para torná-las agradáveis e úteis e formá-las para seus futuros papéis de dona-de-casa, esposa e mãe. 28

No Brasil não foi diferente a exclusão das mulheres à educação formal, herança da concepção lusitana de espaço público e educação escolar. Exceções foram as escolas particulares, as preceptoras, os conventos com uma educação voltada à preparação de uma

19 Os dados de 1900 até 1904 estão na Mensagem de Augusto Montenegro de 07 de setembro de 1904, p. 51. 20 Mensagem de Augusto Montenegro de 7 de setembro de 1905, p. 51. Segundo o regulamento, haveria exame

de admissão quando o número de alunos no 1º ano ultrapassasse 50. Nesse ano não entrou nenhum aluno homem.

21 Mensagem de Augusto Montenegro de 7 de setembro de 1906, p. 44. 22 Mensagem de Augusto Montenegro de 7 de setembro de 1907, p. 63. 23 Mensagem de Augusto Montenegro de 7 de setembro de 1908, p. 65. 24 Mensagem de João Luiz Coelho de 7 de setembro de 1912, p. 35.

25 Mensagem de Eneas Martins de 1º de agosto de 1916, p. 74. Não estão separados alunos das alunas. 26 Mensagem de Lauro Sodré em 7 de setembro de 1919, p. 118.

27 Mensagem de Lauro Sodré em 7 de setembro de 1920, p. 62. 28 PERROT, Michelle, 2008, Op. Cit., 91-94.

3º ano; 29, 4º ano) ano; 2, 4º ano)

1901 212(70, 1º ano; 58, 2º ano; 49, 3º ano, 35, 4º ano) 31(17,1ºano; 3, 2º ano, 4, 3º ano; 7, 4º ano) 243 1902 283 (122, 1º ano; 64, 2º ano; 57, 3º ano ; 40, 4º ano) 48 (27, 1º ano; 14, 2º ano; 4, 3º ano; 3,4º ano). 331 1903 340 (130, 1º ano; 112, 2º ano; 54, 3º ano; 44, 4º ano) 48 (18, 1º ano; 15, 2º ano; 12, 3º ano; 3 , 4º ano) 388 1904 344 (121, 1º ano, 84, 2º ano; 74, 3º ano; 65, 4º ano) 45 (6 no 1º ano; 16 no 2º ano; 12 no 3º, 11 no 4º). 38919 1905 277 (50 no 1º ano; 91 no 2º ano; 58 no 3º e 78 no 4º) 27 (0 no 1º; 11 no 2º; 9 no 3º e 7 no 4º) 30420 1906 211 (62 no 1º ano; 53 no 2º; 67 no 3º e 29 no 4º) 21 (4 no 1º ano; 3 no 2º; 6 no 3º e 8 no 4º) 23221 1907 153 (49 no 1º ano; 34 no 2º; 43 no 3º e 27 no 4º) 12 (4 no 1º; 0 no 2º, 4 no 3º e 4 no 4º) 16522 1908 151 (60 no 1º ano; 38 no 2º, 29 no 3ªº e 24 no 4º) 7 (3 no 1º ano; 3 no 2º, 0 no 3º e 1 no 4º) 15823 1911 23724 1916 218 (69 no 1º ano,53 no 2º, 40

no 3º, 55 no 4º,1 no 5º) 9 (1 no 1º ano, 1 no 2º ano, 3 no 3º ano, 4 no 4º ano) 227

25

1919 300 (1º ano 54, 63 no 2º, 71 no 3º, 64 no 4º e 48 no 5º)

4 (1 em cada ano a partir do 2º)

30426

boa mãe e esposa. As mulheres estiveram ausentes do ensino médio até o século XX. O magistério primário foi o espaço que elas pouco a pouco foram conquistando através do processo de feminização do magistério.

Esse processo explicaria, portanto a predominância de alunas afastando os homens que buscavam profissões mais bem remuneradas. O magistério primário estava se identificando cada vez mais com a maternidade e, portanto, feminilidade. Michelle Perrot explica que a obrigatoriedade da escola republicana francesa, no final dos séculos XIX, para os dois sexos, mas em escolas distintas, ampliou a necessidade de mulheres para ensinar as meninas. 29 No Brasil, como a escola primária era dividida entre escola para meninos e escola para meninas, também pode ter contribuído para se buscar, preferencialmente, professoras para as escolas femininas.

Lauro Sodré em 1896, expondo a realidade da temática no Pará, afirmou que: “Ainda continua muito reduzido o número de alunos do sexo masculino, que freqüentam a Escola Normal quando é tão grande o de alunas (...)”. Citando Garofalo, a respeito da Itália completou:

“que os raros moços que procuram as escolas normais, são os descontentes que não conseguem entregar-se às profissões liberais, e aceitam; por necessidade o emprego de mestre elementar, considerando-o como motivo humilde e inferior aos seus méritos”. 30

Essa afirmação não só parece corresponder às próprias concepções de Lauro Sodré e, possivelmente da sociedade desse período, como vem ao encontro da discussão acerca do processo de feminização abordado por Chamon, discutido no capítulo anterior. O governador então, acreditava que se deva oferecer vantagens “morais e materiais” aos professores que não tiverem: “natural inclinação para a profissão”. Os comentários ainda trazem implícito que o Governador aceitou também a naturalização provocada pelo processo de feminização do magistério primario, como profissão eminentemente feminina, cabendo dar incentivo aos homens para que superassem a falta da inclinação natural para a profissão.

Apesar de reconhecer que as mulheres naturalmente se inclinavam à carreira do magistério e ter afirmado a predominância das meninas na escola, usa a expressão professores. Estaria seguindo a norma culta da língua na qual o plural de sujeitos femininos e masculinos é sempre no plural ou revelaria um ideal de formação de professores?: Em 18977

29 PERROT, Michelle, 2008. op. cit. p.126.

lembrou que: “De nada valeriam os nossos esforços, todos em prol do levantamento do ensino primário, se uma Escola Normal destinada a formar bons professores não existisse”.31

Lauro Sodré parece insistir na ideia de reverter o processo de feminização, pois mais adiante lembra que:

“É um dever de todos nós fazer com que cada vez mais essa funcção tão digna de mestre escola, se torne uma carreira cheia de attração e seductora pelas vantagens não só materiais como morais, de sorte que venham a ella consagrar- se, como á mais nobre das profissões, os moços que elegem destino, consagrando-se ao serviço da Pátria e da Humanidade”.32

Um tema que começa a aparecer nas preocupações governamentais foi a dificuldade em fazer com que os concluintes da EN, em sua maioria professoras, fossem trabalhar no interior. Na opinião do governador Augusto Montenegro, os vencimentos pagos no interior não compensavam os quatro anos de estudos na EN. Lembra-se aqui que as escolas eram dividias em três entrâncias ou níveis, partindo das vilas até chegar às escolas da capital com vencimentos crescentes. A esse respeito teria dito:

“Parece-me que o ensino actualmente fornecido em nossa escola normal, quando bem aprehendido pelo alumno, tira-lhe o desejo de ir para o interior reger uma cadeira com poucos e minguados vencimentos. D’ahi esta natural aversão que tem todo recém-normalista de ir para o interior, insistindo com tenacidade em permanecer em um posto escolar na capital, mesmo com infracção dos regulamentos escolares e dos sagrados princípios de justiça, que determinam guardar-se esses logares para os que tenham prestado serviços no interior”. 33

Dois anos depois continuava a insistir no tema e na necessidade a necessidade de se estimular os professores normalistas a trabalhar no interior e de mais professores formados pela EN.34 O que acabaria mostrando-se uma contradição, não percebida pelo chefe do executivo, pois o exame de seleção foi responsável pela diminuição do número de matrículas. O governador compreendia que o exame de admissão evitaria que entrassem, na escola, postulantes despreparados e sem vocação. Dessa forma, atribuía aos alunos do primário a culpa pelo seu baixo desempenho, eximindo-se como governante de assumir parte da responsabilidade na qualidade do ensino público.

31 Mensagem de Lauro Sodré ao Congresso Estadual em fevereiro de 1897. 32 Idem.

33 Mensagem de Augusto Montenegro de 7 de setembro de 1902. 34 Mensagem de Augusto Montenegro de 7 de setembro de 1904.

Em 190735, voltou a falar na diminuição das matrículas na EN em função do exame de admissão e ainda da facilidade que seria o ensino ali ofertado “(...) pela exigência do exame de admissão e pela extirpação de certos abusos que offereciam grandes facilidades á obtenção do diploma de normalistas.” O tema da inexpressiva presença de professoras normalistas no interior é retomado:

“Em geral, as normalistas [utiliza o plural feminino, pelo elevado número de alunas ou simplesmente porque são as alunas mulheres as que se recusam a ir ao interior?] tudo fazem para ficar na Capital, de modo que, das senhoras que annualmente se diplomam, muito poucas são aproveitadas nos mesteres do professorado. Preferem o logar de adjuntas na capital, com minguados vencimentos, a irem para o interior com ordenado mais remunerador. A continuação deste estado de coisas só pode ser funesto ao ensino primário e vem contrariar os esforços do Governo, no sentido de dotar os grupos escolares de um pessoal apto a cumprir os árduos deveres do professorado”.36

Já o seu sucessor João Coêlho, em 1911 atribuía o desinteresse das normalistas pelas escolas do interior ao processo de concorrência estabelecido desde 1903, no governo anterior, pois esse último:

além de inexeqüível, (...) não assegurava de modo inilludivel o direito de acesso, que sempre me pareceu uma necessidade como estimulo aos que moirejam n’esse afanoso viver de mestre(...) A perspectiva em que vivia o professor primario investido de nomeação para o interior do Estado, − de que envelheceria sem esperança de melhorar de condição,− concorria poderosamente para que permanecessem abandonadas dos normalistas as