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1 A DESVALORIZAÇÃO DAS HUMANIDADES NO ENSINO SUPERIOR:

1.2 A procura de formação superior em Humanidades

1.2.3 Os doutorados em Humanidades (ISCED 6)

Em 2012, 22604 alunos obtiveram o grau de doutor em disciplinas das Humanidades em 29 dos 30 países incluídos no grupo em análise (o Luxemburgo não foi incluído por falta de dados). Comparando com 2000, em 2012 doutoraram-se mais 5545 alunos nestas disciplinas (Figura 1-13). O grupo dos oito países onde se atribuem mais graus de doutor (ISCED 6) em

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Humanidades coincide com o grupo de países com mais graduados (ISCED 5A e 6) em Humanidades, observando-se diferenças no posicionamento destes países entre si.

Porém, esta tendência de crescimento não se verifica em todos os países. Indicamos os quatro países nos quais houve uma diminuição do número desses doutorados: Alemanha, Canadá, Austrália e Finlândia26. E, se analisarmos a evolução dos doutorados em termos relativos (enquanto percentagem de doutorados das Humanidades sobre o total de doutorados por país), só em dez dos países essa percentagem é maior em 2012 do que em 2000 (Figura 1-14) e, destes, só três também se encontram no grupo dos que cresceram percentualmente em termos de graduados: República Checa, República Eslovaca e Irlanda (comparar com Figura 1-7).

Figura 1-13 Evolução do número de doutorados (ISCED 6) em todas as áreas diplomados por ano, com destaque para os doutorados em Humanidades. Comparação entre os anos 2000 e 2012

Com os indicadores sobre doutorados, a singularidade da posição dos EUA sai reforçada: tal como acontece ao nível dos graduados, nos EUA formaram-se praticamente um terço de todos os doutorados em Humanidades: em 2000, 32% e em 2012, 29%. Esta evolução, contudo, denota um decréscimo da sua importância relativa no conjunto dos países analisados. Para além desta tendência, constatamos também que nos EUA os doutorados em Humanidades perderam peso relativamente a todos os doutorados desse país (conforme Figura 1-14). Ou seja, embora os EUA se mostrem cruciais em termos de formação em Humanidades, a dinâmica destas neste país denota uma tendência de desvalorização.

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Figura 1-14 Evolução da percentagem de doutorados em Humanidades sobre o total de doutorados de todas as áreas, diplomados por ano. Comparação entre os anos 2000 e 2012

Mesmo que tenha havido um crescimento dos doutorados em termos absolutos relativamente ao conjunto de países em análise, notamos novamente uma diminuição relativa do interesse (enquanto conjugação dos interesses das várias partes envolvidas no ensino superior) pelas Humanidades, quebra ainda mais pronunciada do que a constatada no universo dos graduados (ISCED 5A e 6). Se, em 2000, os doutorados em Humanidades representavam 12,3% dos doutorados em todas as áreas, esse valor passou para 10,2% em 2012 (nos graduados, esta alteração foi de 10% para 9%). Ou, enquanto o número de doutorados em Humanidades aumentou por um fator de 1,3 de 2000 para 2012, o número de doutorados em todas as áreas aumentou por um fator de 1,6 (nos graduados, estes valores foram respectivamente 1,4 e 1,6) (Figura 1-13).

A desvalorização das Humanidades acaba por se sentir mais no grupo daqueles que são considerados os mais qualificados para as enriquecer e as transmitir. Isto, se tivermos em conta o que se diz dos doutorados em geral:

Doctoral graduates have attained the highest education level and are key players in research and innovation. They have been specifically trained to conduct research and are considered the best qualified to create and diffuse knowledge (OECD, 2010: 48).

Resta saber como é que esta desvalorização das Humanidades em geral se repercute em cada uma das disciplinas das Humanidades: haverá uma única tendência ou coexistem várias, isto é, enquanto pode haver disciplinas a serem despromovidas nos curricula, não haverá outras em torno das quais cresce um consenso relativamente ao seu interesse? O

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próximo passo, porém, não será dado neste sentido, porque não se encontra disponível a informação necessária.

Com uma dificuldade similar se confrontaram os participantes no projeto POCARIM.

Mapping the Population, Careers, Mobilities and Impacts of Advanced Research Degree Garduates in the Social Sciences and Humanities (Canibano et al., 2013). Um dos seus

objetivos era o estudo das práticas e experiências dos doutorados em ciências sociais e Humanidades. O universo em observação, neste caso, correspondia aos doutorados que obtiveram o grau entre 2000 e 2012, num dos seguintes 13 países: Alemanha, Eslováquia, Espanha, França, Hungria, Itália, Letónia, Noruega, Polónia, Portugal, Reino Unido, Suíça e Turquia.

Numa das publicações elaboradas no contexto deste projeto, os dados relativos a doutorados em Ciências Sociais aparecem subdivididos em 4 disciplinas. No caso dos doutorados em Humanidades, estes não aparecem com nenhuma divisão disciplinar, sendo sinal da dificuldade em aceder a informação desagregada por disciplina das Humanidades, reconhecida nos seguintes termos:

[h]armonised data are not available that break down the disciplinary mix of Humanities PhDs awarded in POCARIM countries. A comparison of national data sets is required to gain insight into this question, with the attendant limitations of diverse national statistical categories. Greater disaggregation of harmonized data on Humanities PhDs by discipline would therefore be a desirable future outcome of methodological and standardization advances across EC statistical agencies, in collaboration with Eurostat. (Canibano et al., 2013: 9)

Um outro caso confirmativo da falta de informação necessária para se estudar o estado das Humanidades: a publicação Humanities World Report 2015 (Holm, Scott e Jarrick, 2015) autointitula-se como sendo a primeira tentativa para avaliar o estado das Humanidades a nível mundial, o que entendemos como uma confirmação da dificuldade de encontrar informação estatística disponível. No entanto, esse relatório consiste numa auscultação de opiniões de académicos das Humanidades e não o integrámos na nossa investigação por não termos considerado pertinentes as 13 questões do questionário que o suportam.

Uma estratégia alternativa poderia ser caracterizar a evolução das Humanidades por disciplina, país a país, reunindo informação de origem nacional, ainda que sem possibilidade de antevermos a completude do resultado final por país e globalmente, e sem sabermos qual o grau de comparabilidade entre países. A par, poder-se-iam juntar outros parâmetros de análise: alargar a janela temporal da análise, caracterizar as tendências de financiamento às

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Humanidades, e outros. O conhecimento adquirido até agora, quanto à dimensão relativa de cada país em termos de graduados nas Humanidades, mostra-se útil para apoiar uma abordagem assim definida, ao identificar a importância dos países, de alguns pelo menos, em termos de envolvimento na formação superior em Humanidades. Porém, esta estratégia não será adotada neste estudo dado que tal empreendimento esgotaria demasiado tempo, imprescindível para os outros temas, de acordo com a estrutura desta tese.

Assim, no contexto desta investigação, concretizamos esta possibilidade expressamente para o caso dos EUA, relativamente ao qual assumimos a relevância de o estudarmos, decisão fundamentada nalgumas razões que revemos e elencamos. Por um lado, devido ao seu contributo ímpar em termos de volume de formação superior nas Humanidades. Mas, por outro lado, pela desvalorização relativa das Humanidades que dele emerge, que poderá não se ter revelado maior devido ao crescente fluxo de estudantes internacionais que ocorreu entre 2000 e 2012 e que teve os EUA como principal destino27. E 12% dos estudantes internacionais que os EUA receberam em 2012 estudaram Humanidades. A par desta importância, a disponibilidade de informação, nomeadamente estatística, torna exequível esta pretensão. E, a rematar o conjunto das razões desta escolha, a influência que os EUA exerceram e exercem no desenvolvimento do ensino superior de outros países, facto já referido de passagem, ao qual regressaremos no capítulo 3.