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Os padrões interacionais observados: a manutenção e o surgimento de

Capítulo 5 – Coleta tardia de dados (março/2006, etapa 2)

5.2 Profa Nelma – uma aula típica (15/03/06)

5.2.1 Os padrões interacionais observados: a manutenção e o surgimento de

Para comentar o Quadro 6, é importante trazer à tona a fala inicial da Professora Nelma em nossa entrevista após a aula de 15/03/06. Ao apontar para o gravador, Nelma declara: eu perdi o medo do listening. A declaração da professora é importante por sinalizar a existência de três aspectos que indicam o surgimento de algumas centralidades no cotidiano da sala de aula, observadas apenas na coleta tardia de dados, bem como a manutenção de outras, como introduzidas na etapa 1: (a) o uso da LI em situações reais de comunicação; (b) o desenvolvimento de atividades de compreensão oral (c) o uso da LI em situações de interação espontânea na sala de aula, por professora e alunos.

A observação sobre o desenvolvimento de atividades de produção oral revela, assim, a preocupação de Nelma, já apontada na fase 1 da pesquisa, em utilizar a realidade dos alunos como forma de motivá-los a aprender a LI: eu agora procuro trazer assuntos que eles gostem: músicas, videogames ,fliperama (SC de 15/10/04). Essa preocupação, em 2006, é concretizada em ação pedagógica, o que era tarefa difícil para Nelma anteriormente: eu ainda não sei como fazer isso (SC de 15/10/04)). Sobre isso, ela comenta: essa música (Lonely)), por exemplo, eu tirei da novela, eles ((alunos)) adoram. Ressalta-se que atividade foi, de fato, uma das mais motivadoras registradas, pois os alunos envolveram-se, cantaram a canção, além de atender às

solicitações da professora no exercício proposto. Ademais, ao contrário do que às vezes ocorria em outras atividades, não insistiam para que o trabalho fosse suspenso, ao invés disso, pediam: o professora, não pára não. Toca a música toda.

Outro aspecto significativo, apontado por Nelma na coleta tardia de dados, e também comprovado pela observação participante, diz respeito ao uso da LI, pelos alunos e por ela, no curso das interações sociais na sala de aula (c.f Quadro 5). É interessante notar que, no início da pesquisa, as aulas de Nelma eram quase que exclusivamente faladas na LM. Apesar de uma introdução progressiva da LI ano longo da pesquisa, principalmente pelo uso de chunks pelos alunos, é possível observar que, na coleta tardia de dados, o uso de inglês deixou de representar alvo da resistência dos alunos, para configurar-se em meio para algumas interações. Essa observação é importante, principalmente se considerarmos que os alunos da sexta-série, na E2, não tiveram, como se poderia supor, nenhum contato formal anterior com a LI, nem mesmo na quinta-série. Nelma parece compreender bem o significado da primeira aproximação dos alunos com a LI: eles nunca tinham visto inglês antes, aí eu tenho que planejar alguma coisa que eles gostem de fazer.

Quadro 6 - Dados comparativos das aulas de 2004 (agosto a novembro) e 2006 Professora Nelma

Padrões discursivos 200451 Exemplos 2006 Exemplos

Uso de LI pela professora

Instruções e advertências

Would you please, shut up?

Instruções, advertências, cumprimentos e

comentários

Ok, but not here, there. Very well

Uso de LI pelos alunos

Chunks It´s one for two Chunks, respostas à professora, cumprimentos e

comentários

Fine, and you? Yes, I like it.

Na fala de Nelma, há a presença de dois verbos principais: fazer e planejar. O primeiro, fazer, era bastante recorrente também em sua fala no princípio da pesquisa. Faz parte de seu perfil realizar, construir e implementar atividades dentro e fora da sala de aula. Ela promovia, no início da pesquisa, teatros com os alunos e agora ensaiava um coral a ser apresentado na festa de final de semestre. O repertório era majoritariamente em português, mas havia também uma canção em inglês. Seu trabalho, nessa atividade e em outras semelhantes, era voluntário e por ela mesma idealizado. O segundo verbo, presente em sua fala, planejar, aparece repetidamente na entrevista de 2006. Se por um lado representa uma alusão direta (e quem sabe até proposital) aos princípios preconizados pelo EDUCONLE, em cujos módulos de metodologia o planejamento é largamente enfatizado, por outro lado pode, de fato, representar uma mudança crítica,

51 Os exemplos de padrões lingüísticos das aulas típicas observadas no ano de 2004 da Professora Nelma

ou seja, uma modificação que incide sobre o micro-mundo da sala de aula e é capaz de atenuar os problemas do cotidiano.

É nesse sentido que Nelma, ao mostrar-me seu planejamento de curso, ressalta os objetivos propostos por sua disciplina, refletidos nas aulas observadas, principalmente no que tange à nova ênfase em habilidades orais e ao uso da LI em situações de comunicação (c.f Quadro 6). Essa nova abordagem, segundo ela, ajuda a resolver o problema da motivação e da disciplina, já que os alunos são muito barulhentos. O caráter crítico adicional da atividade de planejamento aparece quando Nelma relata a tentativa de trabalhar em rede, a despeito da resistência da maioria dos colegas, por meio de atividades conjuntas (caso do coral e do vocabulário sobre cores, que são também atividades realizadas pelas professoras de Artes e Língua Portuguesa, por exemplo). Desse modo, embora apenas alguns poucos colegas estejam dispostos a aderir, ela reconhece que houve mudanças na conduta deles, de quem, agora, aproxima- se.

Além disso, como Nelma agora planeja as aulas de modo mais informado, ela prevê onde pode/deve chegar com os alunos. Ela sente-se, pois, mais segura em avaliar os resultados obtidos e em alterar rotas: eu procuro modificar, se vejo que alguma coisa não está indo bem (entrevista, 15/03/06). Sobre o tema planejamento regular incide, ainda, outro aspecto, também observado na aula de 15/03/06: a revisão de conteúdos, essencial para a avaliação da aprendizagem. É isso que Nelma almejava na atividade em que os alunos foram solicitados a colorir o palhacinho só com as cores ensinadas, bem como na atividade de preenchimento de cheque, não concluída, e que visava à revisão dos números. Decorre disso que Nelma justifica a aparente fragmentação da aula típica,

em que variadas atividades, sem explícita ligação entre si, foram implementadas: eu queria rever o vocabulário e a pronúncia (entrevista, 15/03/06).

Com base nisso, verifica-se, na etapa 2 (c.f. Quadro 6), a manutenção do padrão de interação centrada na professora, mesmo que os alunos estejam dispostos em pequenos grupos. É ela quem inicia a atividade, a conduz e a encerra. Por outro lado, na observação tardia de dados, registram-se, pela primeira vez, episódios em que a professora estimula a participação mais ativa dos alunos, ainda que a interação estivesse centrada nela: o que vocês acham que é para fazer aqui? Ao fazer isso, ela compartilha com os alunos a condução da atividade, pois eles têm que refletir sobre as demandas do exercício, sem que Nelma, como quase sempre ocorria, tivesse que imputar para si toda a responsabilidade pelo desenvolvimento da aula.

No que concerne à administração específica da aula, Nelma usa mais o quadro agora, do que o fazia em 2004. Isso torna as correções e as explicações mais claras para os alunos, que parecem acompanhá-la melhor. Ela permanece misturando-se bastante entre eles para verificar seus cadernos e folhas de exercícios de perto, enquanto anda pela sala e dá instruções e esclarecimentos. Se, por um lado, o expediente produz certa desorganziação, dado o número de alunos em sala e certa dependência da professora, por outro lado, fortalece as relações afetivas entre eles e Nelma. Os alunos disputam, assim, por sua atenção, participam do jogo e esperam, entre chamados ora pacientes, ora ansiosos, que ela lhes aprecie a atividade, e/ou esclareça alguma dúvida.