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Os Programas de Competências Parentais e a prevenção dos maus-tratos

3. Programas de Competências Parentais

3.2 Os Programas de Competências Parentais e a prevenção dos maus-tratos

A prevenção dos maus-tratos na infância inclui um conjunto de actividades, estratégias ou programas para diminuir os factores de vulnerabilidade e aumentar os factores de protecção associados a esta problemática (Hughes et al., 2005). As autoras referem ainda que este conjunto de situações têm como objectivo, aumentar as capacidades dos pais, dos cuidadores e das comunidades, para protegerem, educarem e promoverem o desenvolvimento saudável da criança.

A prevenção dos maus-tratos é sempre preferível à tentativa de reabilitação das sequelas que estes deixam nas crianças (Lundahl, Nimer, & Parsons 2006; Whitaker, Lutzker, & Shelley 2005). Esta questão está também relacionada com o facto de os estudos demonstrarem que nem sempre os programas que visam o tratamento de pais, que exercem maus-tratos sobre as suas crianças, têm sucesso (Geerart et al., 2004). Por sua vez a taxa de sucesso nos programas de carácter preventivo é superior aos de tratamento (Peterson et al., 2003). Self-Brown & Whitaker (2008) referem que os dados permitem perceber que os Programas de Competências Parentais mostraram eficácia na redução da recorrência dos maus-tratos em famílias em que tal já tinha ocorrido, e que preveniam a sua ocorrência em famílias em que tal não se tinha ainda verificado.

A literatura disponível sobre prevenção deu ênfase à intervenção nas capacidades parentais (Sanders et al., 2004; Self-Brown & Whitaker, 2008). A pesquisa sugere que a prevenção e a intervenção precoce, sob a forma de programas de formação parental e serviços dirigidos às famílias, proporcionam oportunidades para o ensino aos pais de estratégias de gestão dos comportamentos das crianças. Desta forma melhoram a qualidade das interacções pais-criança, minimizando acções coercivas e negligentes (Stern et al., 2008). O treino de múltiplas capacidades parentais, promove a melhoria das interacções entre pais e filhos (Berard & Smith 2008).

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Existe também um grande consenso relativamente às razões etiológicas dos maus-tratos na criança, tendo por base a perspectiva ecológica em que se inserem as relações entre as características parentais e as influências familiares, comunitárias e culturais. Peterson et al., (2003) apontam a família como sendo a estrutura do sistema que exerce maior influência em termos de maus-tratos. Por esta razão, os pais maltratantes constituem a base de intervenção, quando nos referimos à prevenção.

As diligências, no âmbito da prevenção, apresentam uma grande variação em termos de objectivos, de população alvo e de actividades. Estas podem tomar a forma de iniciativas políticas, campanhas de esclarecimento público, programas de sinalização e avaliação de famílias e Programas de Competências Parentais, entre outros (Hughes et al., 2005).

A prevenção dos maus-tratos na infância pode ocorrer aos níveis, primário, secundário e terciário, ou mais recentemente, ao nível universal, selectivo ou indicativo (Geerart et al., 2004; Harder, 2005; Hughes et al., 2005; Self-Brown & Whitaker 2008). Assim, temos:

Prevenção Primária (Estratégia universal): aponta para a população em geral, sendo direccionada para as causas de sociedade que estão na base dos maus-tratos (ex. inclui campanhas de esclarecimento publico ou visitas domiciliárias para todos os recém- nascidos);

Prevenção Secundária (Estratégia selectiva): focaliza-se em grupos específicos identificados com o risco de exercerem maus-tratos sobre as crianças. Os programas podem ser disponibilizados para pais, famílias ou comunidades com base em factores de vulnerabilidade, tais como a idade dos pais, carências económicas, alcoolismo, violência doméstica, isolamento social ou depressão materna (ex. programa intensivo de visitas domiciliárias para mães primíparas com carências económicas, programas de formação para mães adolescentes, grupos de suporte para famílias monoparentais); Prevenção Terciária (Estratégia indicativa): inclui estratégias dirigidas para grupos (ex. famílias) em que as crianças já sofrem de maus-tratos, com o objectivo de prevenir a recorrência dos comportamentos nesse grupo (ex. formação parental para pais que são alegadamente maltratantes, indicados por um departamento dos serviços sociais, terapia

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de interacção pais-criança, para pais que exercem maus-tratos físicos).

A prevenção primária, por ser universal, reduz o estigma associado aos Programas de Competências Parentais, isto é, a mensagem é transmitida para todos os pais e não só para aqueles que exercem maus-tratos (Whitaker et al., 2005).

Peterson et al. (2003) apresentam um modelo de prevenção, baseado num modelo de sucesso parental, constituído por sete dimensões.

Figura 3 - Modelo de prevenção parental multidimensional

Fonte: Peterson et al. (2003)

Deste modelo resulta: (1) melhoria das capacidades parentais; (2) intervenções de gestão do comportamento, apropriadas em termos do desenvolvimento da criança; (3) conhecimento das crenças dos pais; (4) afectos positivos, os quais podem reduzir crenças erróneas sobre as capacidades das crianças e consequente resposta colérica em relação à criança.

Se um indivíduo não registou mudanças nestas quatro primeiras áreas, irá sentir dificuldade em aceitar a responsabilidade de: (5) ser o primeiro cuidador da criança; (6) ser um cuidador atento, pois perderá a motivação; (7) ter um sentimento de eficácia nas seis capacidades anteriores.

Os princípios da prevenção sugerem que os programas preventivos reduzem os factores de vulnerabilidade e promovem os factores de protecção (DePanfilis & Dubowitz, 2005), aspecto importante quando se define um Programa de Competências Parentais de caracter preventivo. Assim, DePanfilis & Dubowitz (2005) apresentam um conjunto de 7. Eficácia parental 5. Papel parental 6. Papel da mãe parental 3. Crenças 4. Afectos 2. Conhecimento do desenvolvimento 1.Comportamento de adaptação parental Sucesso parental sustentado

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passos definidos no âmbito da prevenção: (a) identificar o problema e considerar dados epidemiológicos relacionados com esse mesmo problema; (b) identificar os factores de vulnerabilidade e de protecção; (c) definir e conduzir estudos-piloto de eficácia e repetir os ensaios do programa de intervenção preventiva; (d) definir e conduzir ensaios clínicos aleatórios em larga escala; (e) facilitar a adopção, disseminação e avaliação contínua nos serviços da comunidade.

Os modelos ecológicos sugerem que um processo de prevenção eficaz requer uma abordagem multi-facetada. Essa abordagem envolve intervenção na comunidade (ex. reduz factores adversos, tais como a pobreza ou o alcoolismo), na família, a nível parental (ex. promove relações positivas pais-criança, aumenta a confiança e as competências parentais e modifica os padrões de comportamento que podem ser percursores dos maus-tratos) (Sanders et al., 2004)

Figura 4 - Modelo Ecológico de Factores de Risco e de Protecção dos Maus-Tratos

Fonte: Hughes et al. (2005)

Segundo Edwards & Lutzker (2008), a pesquisa realizada no âmbito dos factores que contribuem para os maus-tratos e para os efeitos negativos nas crianças, constituem o foco para os Programas de Competências Parentais, ao mesmo tempo que fornecem aos pais estratégias mais eficazes de intervirem com as crianças. Assim, estes programas permitem: a melhoria das interacções pais-criança, diminuir a recorrência dos maus- tratos, aumentar a estimulação da criança (Slack et al., 2004), melhorar as capacidades de educação da criança, utilizar menos estratégias coercivas e modificar atitudes ligadas a condutas severas (Lundahl et al., 2006), reduzir condutas que utilizem a disciplina

Cultural/ Social Factores de risco Normas sociais de violência Violência contra as crianças permitida Estatuto da criança secundário Factores protecção Desencorajamento da violência Apoio necessidades básicas das famílias

Comunitário Factores de risco Desemprego Pobreza Habitação Apoio às famílias Factores protecção Vizinhança estável e coesa Acesso a saúde adequada, educação de qualidade e serviços de emprego Família Factores de risco Interacção pais-criança Stress parental Discórdia parental Isolamento da família alargada Violência doméstica Factores protecção Capacidade de cuidar e rede suporte informal Modelos adequados Harmonia conjugal

Pais - Factores de risco Falta capacidades parentais Desconhecimento sobre desenvolvimento da criança História de maltrato

Alcoolismo/toxicodependência Doença mental

Criança com necessidades especiais

Factores Protecção Apoio informal de alguém Rede social informal Relações de satisfação emocional

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física, expandir a rede de apoio social maternal, criar expectativas mais adequadas ao nível de desenvolvimento da criança e melhorar as relações entre a mãe e a criança (Peterson et al., 1997). Edwards & Lutzker (2008) referem ainda que muitos dos programas de intervenção preventiva se focalizam em melhorar capacidades parentais, as quais se enquadram em factores que contribuem para a ocorrência dos maus-tratos na infância, tais como, falta de recursos, stress, discórdia conjugal, falta de apoio social, falta de capacidades de resolução de problemas e défices no conhecimento sobre estratégias parentais eficazes, nomeadamente na gestão do comportamento da criança. Os Programas de Competências Parentais devem dar apoio às famílias de múltiplas formas, incluindo o fornecimento de apoio jurídico e o empowerment3. No âmbito dos

programas deve-se trabalhar activamente para construir parcerias e colaborar com outros serviços da comunidade, para servirem mutuamente as famílias (Harder, 2005). Os estudos indicam ainda que as famílias que são alvo de um processo que implique a intervenção integrada de um conjunto de factores de vulnerabilidade para os maus- tratos, têm resultados superiores àquelas cuja intervenção versa apenas um destes factores (ex. gestão da cólera) (Sanders et al., 2004).