• Nenhum resultado encontrado

3. Programas de Competências Parentais

3.4 Estratégias na definição dos Programas de Competências Parentais

3.4.1 Utilização de novas tecnologias

Nos últimos anos tem-se verificado um interesse crescente pela utilização das novas tecnologias na área da prevenção (ex. telemóveis, internet, vídeo conferência, televisão e rádio). As novas tecnologias podem ser usadas na identificação, prevenção e intervenção com crianças que sofrem de maus-tratos (Self-Brown & Whitaker, 2008). Self-Brown & Whitaker (2008) referem que as tecnologias informáticas podem ser úteis no despiste e identificação de pais que beneficiaram de serviços no âmbito dos Programas de Competências Parentais, nomeadamente através do uso do computador e da internet. Desta forma, o uso de instrumentos padronizados, administrados por computador, facilita o processo, atendendo a que toma significativamente menos tempo do que as versões administradas por um técnico, pois elimina problemas associados à influência do técnico, gera instantaneamente os resultados e pode ser preenchido em vários lugares.

97

Também a nível da prevenção, a internet tem disponíveis numerosos sítios com informação sobre desenvolvimento da criança e parentalidade. Para além desta informação passiva, a internet permite ainda colocar os técnicos ou pais em contacto com outras pessoas, através de grupos de discussão, grupos de apoio online, e-mail, etc. O telefone ou telemóvel pode também ser usado para avaliações e para o processo de intervenção (Self-Brown & Whitaker, 2008). A nova abordagem para aumentar a inscrição e a retenção de pais nos programas de formação parental, com base em visitas domiciliárias, requer o uso de telemóveis (Bigelow, Carta, & Lefevre, 2008). As autoras afirmam que, para programas preventivos dos maus-tratos, o telemóvel permite a manutenção da comunicação com os pais, difíceis de encontrar, devido à sua grande mobilidade ou aos horários incompatíveis.

O vídeo permite uma utilização regular com o objectivo de realizar avaliações das interacções pais-criança. Os autores afirmam também que o vídeo foi utilizado na prevenção de maus-tratos (lesões craneo-encefálicas e síndroma do bebé abanado) e ainda a nível das competências parentais, através de um programa baseado na teoria da aprendizagem social (Self-Brown & Whitaker, 2008).

Relativamente à televisão e ao rádio, Calam et al., (2008); Self-Brown & Whitaker (2008) atestam a existência de programas de entretenimento, educativos, com grande potencial e veículos de sucesso da promoção de atitudes parentais eficazes. Estas séries, que decorrem nos Estados Unidos da América e no Reino Unido, transmitem informação prática e aconselham os pais sobre problemas e comportamentos comuns do desenvolvimento da criança, bem como outras questões relacionadas com a parentalidade.

Uma metodologia indicada para alterar crenças é o emprego de técnicas no âmbito da psicologia social, tais como o uso de publicidade televisiva (Peterson et al., 2003). No que diz respeito à disseminação e implementação de Programas de Intervenção Precoce, Self-Brown & Whitaker (2008) apontam o uso de internet e do computador no sentido de tornar possível a divulgação dos programas, dos materiais e de permitir o treino de técnicos; a câmara de vídeo permite a medição da fidelidade das intervenções, enquanto os vídeos gravadores, DVD ou CD-ROM permitem entre outras coisas, o treino de profissionais para trabalharem nestes programas.

2ª Parte

1. Objectivo do Estudo

Até há bem pouco tempo, a questão dos maus-tratos ficou camuflada no espaço do privado e do íntimo, o que era um obstáculo ao conhecimento público desta problemática, e consequente estudo (Martins, 2001). No entanto, a crescente consciencialização da importância da infância enquanto período de desenvolvimento, com especificidades, necessidades e problemas próprios e o aumento dos padrões culturais associados à saúde e bem-estar, conduziu a um maior enfoque na problemática dos maus-tratos a crianças (Araújo & Formosinho, 2004). A importância desta questão na sociedade actual, resulta tanto da visibilidade que lhe é conferida pela comunicação social (Araújo & Formosinho, 2004; Martins, 2001), como pelo novo estatuto da criança na sociedade e na família.

A pesquisa sobre as diferentes configurações de intervenção, no âmbito das estratégias preventivas – universal, específica e indicativa – dos maus-tratos, conduziu aos programas de formação parental (Programas de Competências Parentais), que promovem uma parentalidade eficaz. Segundo Rodrigo et al., (cf. 2006, p. 58), uma parentalidade eficaz implica: a) auto-eficácia (os pais acreditam na sua capacidade para resolver os problemas da família); b) locus de controlo interno (os pais têm a sensação de que têm controlo sobre a sua vida); c) concordância conjugal (o casal é consensual quanto à educação da criança); e d) dificuldade do papel (os pais têm noção de que a sua tarefa é difícil).

Foi da confluência destas questões que surgiu a objecto de estudo deste trabalho, que implica dar resposta à seguinte pergunta:

Quais são as percepções sobre os maus-tratos e sobre os Programas de Competências Parentais, das famílias com filhos entre os 0 e os 5 anos, e dos técnicos que trabalham com famílias de risco, na Região Autónoma da Madeira?

A referência ao contexto espacial onde se aplicou o estudo deve-se ao facto de só terem participado pessoas desta região portuguesa, seleccionada por razões de conveniência, dado ser o local onde a autora reside. A relevância da temática já foi suficientemente demonstrada na primeira parte do nosso trabalho, dada a importância para a sociedade

99

das problemáticas “do desrespeito à criança, da violação dos direitos de crescer com amor, diálogo, paciência e de se desenvolver na sua plenitude” (cf. Weber et al., 2002, p. 171). Pelo facto de terem surgido, entretanto, metodologias de intervenção e prevenção (Programas de Competências Parentais), com o objectivo de prevenir ou evitar a recorrência destes comportamentos, melhorar a qualidade das intervenções parentais e facilitar o desenvolvimento da criança, os estudiosos são convidados a avaliar a eficácia institucional e prática desta metodologia.

Assim, depois de definido o objectivo geral deste estudo, salientamos, agora, os objectivos específicos, para a amostra seleccionada, que são os seguintes:

A amostra tem uma clara percepção do significado e âmbito dos maus-tratos infantis? Entende a amostra as competências e os papéis na relação pais-filhos?

Tem a amostra conhecimento dos Programas de Competências Parentais? Qual a importância destes Programas para a amostra?

Quivy & Campenhoudt (1998) referem que a organização de um trabalho de investigação tem como referência as hipóteses de estudo, que possibilitarão a sua condução com ordem e rigor, visto que estas transmitem à investigação um fio condutor e eficaz.

Acautelando o ponto anterior e atendendo de novo à amostra seleccionada, definiram-se as hipóteses que vão conduzir este estudo. São elas as seguintes:

# Os inquiridos têm uma percepção, dentro dos padrões desejados, sobre o que são os maus-tratos e a negligência na infância.

# Os inquiridos têm uma percepção, dentro dos padrões desejados, sobre as consequências dos maus-tratos nas crianças.

# Os inquiridos têm uma percepção, dentro dos padrões desejados, sobre as causas dos maus-tratos nas crianças.

# Os inquiridos têm uma percepção, dentro dos padrões desejados, sobre as competências parentais.

100

# Os inquiridos têm uma percepção, dentro dos padrões desejados, sobre o papel dos Programas de Competências Parentais na protecção da criança.

# Os inquiridos têm uma percepção, dentro dos padrões desejados, sobre a estrutura e adequação das visitas domiciliárias nos Programas de Competências Parentais

# Os inquiridos têm uma percepção, dentro dos padrões desejados, sobre as competências a desenvolver nos cuidadores no âmbito dos Programas de Competências Parentais.

# Os inquiridos têm uma percepção, dentro dos padrões desejados, sobre a influência dos Programas de Competências Parentais no desenvolvimento da criança.

De referir que na definição das hipóteses anterior, o termo “dentro dos padrões desejados” se refere à análise da literatura feita na primeira parte do trabalho e que dota esta temática dos padrões que seriam aceitáveis em termos de referências dos elementos da amostra.

2. Procedimentos metodológicos

O termo método refere-se a procedimentos ou técnicas específicas para recolha e análise de dados (cf. Pinto, 1990, p. 35).

A pesquisa efectuada neste trabalho implicou a utilização de métodos qualitativos e métodos quantitativos, que serão seguidamente especificados.

2.1 Métodos Qualitativos

Em relação aos métodos qualitativos, foram usadas duas técnicas de recolha de dados: a entrevista e a história de vida.

A entrevista constitui uma conversa entre duas pessoas com o objectivo de recolher informações, sendo um importante instrumento de trabalho nas ciências sociais (Marconi & Lakatos, 2003). De referir que as entrevistas realizadas procuraram respeitar o princípio da diversidade o qual, segundo Guerra (2006), implica que se entrevistem sujeitos cujas opiniões sejam heterogéneas, para assim reunir um leque variado de situações.

As entrevistas foram do tipo semi-directivas, realizadas segundo um guião de entrevista (vid. Anexo 1) previamente elaborado e decorreram num ambiente calmo e propício à recolha de informação. Como ferramenta de registo recorreu-se à gravação das entrevistas em áudio, após autorização dos entrevistados, anteriormente informados de todos os procedimentos, com garantia de anonimato. Estas foram posteriormente transcritas (vid. Anexo 2). A duração das entrevistas oscilou entre os 30 e os 50 minutos.

Na história de vida pediu-se a um sujeito que descrevesse a sua história pessoal, utilizando a técnica de entrevista semi-directiva como base de recolha das informações (Poirier, Clapier-Valladon, & Raybaut, 1999). Foram realizadas cinco entrevistas, em momentos e situações diferentes, cuja duração oscilou entre 25 e 50 minutos, tendo decorrido em ambiente calmo e propício à recolha de informação. As entrevistas foram gravadas em áudio após autorização da entrevistada, tendo posteriormente sido transcritas (vid. Anexo 3).

102

Os dados foram analisados segundo o método de análise de conteúdo (vid. Anexo 4), uma técnica que permite “a descrição objectiva, sistemática e quantitativa do conteúdo manifesto da comunicação” (cf. Vala, 1986, p.103).

2.2 Métodos Quantitativos

Relativamente ao uso dos métodos quantitativos, elaborou-se o Questionário sobre os maus-tratos/negligência a crianças e os Programas de Competências Parentais (vid. Anexo 5), com base em Hill & Hill (2005), no seu livro “Investigação por Questionário”.

Um questionário é um instrumento de observação e medida, que acarreta a medição das propriedades ou características de um objecto, em que a definição das características a observar implica o domínio da teoria, e a definição da medida é sujeita a um processo de codificação (Moreira, 2004). Embora a codificação permita a reprodução da informação original, parte dessa informação é sempre perdida no processo e por isso irrecuperável (cf. Moreira, 2004, p. 21).

O Questionário sobre os maus-tratos/negligência a crianças e os Programas de Competências Parentais foi construído em três partes: a primeira com os dados sócio- demográficos, a negligência e os maus-tratos (com 12 questões), e os Programas de Competências Parentais (com 17 questões). A segunda e terceira parte são constituídas por duas “variáveis latentes” (maus-tratos e Programas de Competências Parentais), que constituem variáveis que são definidas por um conjunto de itens, as “variáveis componentes”, medidas a partir das perguntas do questionário (Hill & Hill, 2005). Após a selecção dos itens para definir a variável latente, procedeu-se à determinação da adequacidade do questionário para medir a variável latente, a fiabilidade (consistência da variável) e a validade (se mede o que se pretende), para a qual foi realizado um pré- teste (Hill & Hill, 2005).

Utilizou-se um questionário sob a forma de escala de Likert, em que são dadas cinco alternativas de resposta, e que constitui a forma mais adequada de medir uma atitude (Hill & Hill, 2005; Moreira, 2004), neste caso, face aos maus-tratos e aos Programas de Competências Parentais. As respostas foram quantificadas, tendo em consideração que o valor mais elevado será na direcção da concordância com a afirmação.

103

Para a realização deste trabalho, foram definidas variáveis. A variável constitui um conceito operacional a que foram atribuídos valores (Marconi & Lakatos, 2003). Assim, foram determinadas como variáveis independentes (aquelas que influenciam ou afectam outra variável), as que correspondem aos dados sócio-demográficos: concelho de residência, idade, sexo, habilitações literárias, profissão4 e rendimento mensal do agregado familiar.

Relativamente às variáveis dependentes, que constituem, segundo Marconi & Lakatos (2003), os valores que são influenciados pelas variáveis independentes, foram definidas as seguintes:

Percepção parental de maus-tratos na infância, através de cinco dimensões, que incluem: maus-tratos físicos; maus-tratos psicológicos; negligência; causas de maus-tratos; e consequências de maus-tratos.

Percepção parental dos Programas de Competências Parentais, segundo cinco dimensões: compreensão parental quanto ao desenvolvimento da criança; aumento de redes sociais; adequação das visitas domiciliárias; gestão do comportamento da criança; e influência directa no desenvolvimento da criança. Cada uma das cinco dimensões das duas variáveis dependentes, foi delimitada pelo cálculo das médias entre os itens do inquérito referentes a determinada temática. Desta forma, as dimensões da variável “percepção parental sobre maus-tratos na infância” implicaram o agrupamento dos seguintes itens referentes à segunda parte do inquérito: maus tratos físicos – item 8; maus-tratos psicológicos – itens 2,6 e 9; negligência – itens 7, 10 e 12; causas dos maus-tratos – itens 1, 3 e 5; consequências – itens 4 e 11. Por sua vez, para as dimensões da variável “percepção parental sobre os Programas de Competências Parentais”, foram agrupados os itens da terceira parte do inquérito da seguinte forma: compreensão parental sobre o desenvolvimento da criança – itens 3,6,9 e 10; aumento das redes sociais – itens 4,8 e 14; adequação das visitas domiciliárias – itens 2, 7, 13 e 15; gestão dos comportamentos da criança – itens 1, 5, 11, 12 e 16; influência no desenvolvimento da criança – item 17.

Para o tratamento dos dados recorreu-se ao programa estatístico SPSS, Statistical Package for the Social Sciences (versão 10).

4

104

2.3 Amostras

A amostra que foi alvo do estudo qualitativo, divide-se em dois tipos de amostragem que se caracterizam: como amostragem por caso único e amostragem por casos múltiplos (Guerra, 2006). A amostragem por caso único consiste na escolha de uma pessoa ou situação para fazer um estudo intensivo do tipo «estudo de caso» ou «história de vida»; a amostragem por casos múltiplos, é do tipo de amostra por homogeneização, em que se pretende estudar um grupo homogéneo, aplicando-se o princípio da diversidade interna, isto é, através da procura de variáveis que façam diferenciar a posição do actor face ao objecto (cf. Guerra, 2006, p. 46).

A amostra utilizada no estudo quantitativo enquadra-se no âmbito de uma amostra não probabilística, segundo o método de amostragem por conveniência, num total de 250 indivíduos: pais de crianças entre os zero e os cinco anos, residentes na RAM. Este tipo de amostragem embora tenha como vantagem o facto de ser fácil, barata e rápida de aplicar, os resultados e as conclusões só podem ser aplicados à amostra, não podendo ser extrapolados com confiança para o Universo, pois não há garantia de que seja razoavelmente representativa da população (Hill & Hill, 2005).