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3. LISTA DE GRÁFICOS

5.2 As reportagens

5.2.6 Os resultados do sucesso

A quinta categoria de análise, chamada de Resultados do sucesso, buscou responder à seguinte questão: de acordo com Exame, quem tem sucesso tem o quê? Que repertórios aparecem diretamente ligados ao conceito nas reportagens? Para compreender melhor essa questão, procuramos por termos ou lugares-comuns que recorrentemente caracterizavam os resultados do sucesso. Eles foram encontrados em quarenta e oito, das cinquenta e oito reportagens analisadas, conforme mostramos no Apêndice O. Em seguida, contamos quantas vezes cada um apareceu, como está exibido no quadro 4.

Quadro 4 – Os resultados do sucesso conforme Exame

Os resultados do sucesso Número de citações

Ascensão profissional 28

Salário 22

* conforto material e dinheiro para consumir 2

* dinheiro para investir 1

* imóveis 4 * carros 2 * viagens 2 Empregabilidade 13 Problemas 9 Ascensão social 6 Sentidos alternativos 5

Prestígio e poder 4 cada, no total 8

Tornar-se dono do negócio 3

Mordomias e facilidades que dão status; novas responsabilidades; erguer um império; estabilidade; aprovação da organização; visibilidade e destaque; juventude 2 cada, no total 14 Outros 6 TOTAL 125

Fonte – Elaborado pela autora da tese.

Como podemos ver, a ascensão profissional se destaca como o resultado mais frequente que o bem-sucedido obtém, segundo a revista. Vinte e oito referências foram encontradas sobre isso, incluindo as seguintes expressões: atingir altos postos, subir degraus na escala organizacional (até o ápice da pirâmide, uma das reportagens salienta), progredir, progresso contínuo, promoções, cargos mais altos, bons cargos, carreira, alta posição ocupada, postos etc. (NO QUE DEU..., 1975; UM MAPA..., 1989; COMEÇAR.., 1989; ASSEF, 1994; SGANZERLA, 1996; MOLLER, 1996; GOMES, 1997; COEHN, 1998 a/b). Vemos aqui a forte presença da ligação entre a noção de progresso e a ideia de sucesso, que inclui não só o ter, mas também o conseguir, já apontada por autores como Pahl (1997) e Huber (1987). Nesse caso, falamos de pessoas alcançando cargos e funções de ponta, na hierarquia das organizações.

Santos veio de uma família de classe média com treze filhos. Seu pai era comerciante e sua mãe, professora primária. Ele entrou na Xerox em Brasília, em 1971, como leitor de máquinas, a pessoa que anota os números registrados nos medidores das máquinas. Na sua escalada profissional, desempenhou e ocupou várias funções e posições, percorrendo os Estados do Rio de Janeiro, São Paulo, Pernambuco e Bahia. Foi cobrador, vendedor de máquinas, supervisor de vendas, gerente de marketing da filial do Rio de Janeiro e gerente nacional de marketing. Finalmente chegou à gerência da filial de macrocontas em São Paulo, em 1995, um cargo de muita exposição na empresa (SGANZERLA, 1996, p. 94).

Durante mais de trinta anos, o engenheiro civil Alexandre Carvalho trabalhou no grupo Belgo-Mineira. Começou na usina da empresa, em 1963, chegando a chefe de produção. Transferido depois para a área comercial, abriu escritórios no Nordeste. Foi em seguida deslocado para a área de marketing e, mais tarde, passou para o departamento de comércio exterior. Seu último cargo: presidente da Bemex, a empresa do grupo que lida com exportações e importações (FONTOURA, 1996 a, p.70)

Em segundo lugar, em coerência com os achados anteriores, melhores ganhos financeiros acompanham a escalada de postos, nas empresas. Com vinte e duas referências encontradas temos, assim, os salários, envolvendo expressões como altos salários, salário, dinheiro, renda, remuneração e aumentos (NO QUE DEU..., 1975; POR QUE..., 1980; É DE PEQUENO..., 1990; O EXECUTIVO..., 1990; A TURMA..., 1992; CASTANHEIRA, 1996; STEINBERG, 1998; COEHN, 1998). Os resultados diretos desse ganho material aparecem ainda em duas citações sobre conforto material e dinheiro para consumir, uma referência a dinheiro para investir e outras quatro à posse de imóveis (apartamento caro, bom imóvel, casa própria, casa grande de campo), além de duas menções à propriedade de um automóvel e outras duas a viagens. Esse aspecto pecuniário se mostra, desse modo, como resultado claro de uma trajetória bem-sucedida e como um forte valor da revista.

Estou chegando ao fim de minha carreira e pretendo me aposentar nos próximos dias. Não posso me queixar do que conquistei. Afinal, sou vice-presidente de apoio logístico. O que isso quer dizer? Ninguém sabe. Mas, cá entre nós, quem se importa? No final, tenho o dinheiro de que preciso no bolso. E que agora vou levar o resto da vida para gastar (STEINBERG, 1998, p. 53).

Como disse Gaulejac (2007), o dinheiro adquire novo estatuto fora de limites: méritos e desempenhos são considerados essencialmente em termos financeiros, reconhecimento e existência sociais não têm outro valor além do monetário. O dinheiro abre todas as portas, elimina todos os obstáculos, permite a concretização de todos os sonhos. Com isso, torna-se o instrumento da realização de si mesmo. Como a perda de sentido produz um buraco infinito, este só pode ser preenchido por uma necessidade de dinheiro igualmente infinita, arrastando o mundo para uma corrida frenética, uma acumulação insaciável, uma perpétua fuga para frente.

A empregabilidade aparece como resultado que uma pessoa de sucesso tem por treze vezes, ainda que esse termo não seja explicitamente usado, como acontece numa matéria de 1988 que fala do perfil dos executivos chamados de “[...] agentes de mudanças”, profissionais especiais capazes de sacudir as companhias e implementar transformações duras, mas necessárias (UMA NOVA... 1988, p. 70). Pela reportagem, essas pessoas são caçadas e

disputadas pelas empresas a peso de ouro, outra forma de falar que esbanjam empregabilidade. Assim, aqui estavam incluídas diversas expressões, como: ser disputado pelas empresas, cortejado por grandes companhias, cobiçado por headhunters, evitar risco de desemprego, ter sempre algum trabalho e fonte de remuneração, ter empregabilidade, todas demonstrando que o bem sucedido é, necessariamente, portador de empregabilidade (É DE PEQUENO..., 1990; O EXECUTIVO..., 1990; A TURMA..., 1992; CASTANHEIRA, 1996; MOLLER, 1996). É uma pessoa em sintonia com o que a revista chama de novos tempos (CASTANHEIRA, 1996), e preparada para enfrentá-los.

Em nove matérias, os resultados do sucesso incluíram complicações de vários tipos. Dentre elas, stress, pressões, carga de responsabilidades, problemas de ordem pessoal, medo crescente em desajustados (BARTOLOMÉ e EVANS, 1980; COMEÇAR... 1989; QUEM ESTÁ... 1991). Um dos artigos, por exemplo, desconecta claramente o bem-sucedido da imagem de alguém feliz:

Percebo que a praga do marketing pessoal começa a fazer vítimas também entre crianças. Crianças que se tornam impessoais, descrentes de si mesmas e de qualquer ensinamento. Crianças que, influenciadas por adultos motivados apenas por interesses materiais e incapazes de fazê-las crescer espiritualmente, estão aprendendo a fazer o marketing antes de adquirirem noções de civilidade, ética e cidadania. Crianças que vão crescer pensando que mercado é vida, resultado é evolução e sucesso é felicidade (VIEIRA, 1996, p. 106).

Esse tom crítico, no entanto, não é o que prevalece, e a grande maioria das associações feitas sobre o assunto são positivas. A ascensão social, por exemplo, foi evocada cinco vezes, via termos como posição social, ascensão social, subir na vida, ascensão e alta posição (não no sentido organizacional, mas ligada ao sistema social) (COMO VIVE..., 1971; OS MERCADORES..., 1995; MARIACA, 1995). Prestígio, no sentido de respeito, influência e consideração (CALDEIRA, 1995; BERNARDI, 1997B), e poder, significando autoridade e ascendência pessoal (RESPONDA..., 1989; QUEM ESTÁ..., 1991; PETERS, 1997), apareceram como resultado do sucesso quatro vezes cada um.

Foram citados como frutos do sucesso, por três vezes, o fato de alguém se tornar dono de seu próprio negócio e, por duas, o de erguer um império, ambos relacionados à ideia do empreendedor, já discutida anteriormente (NO QUE DEU..., 1975; A TEORIA..., 1992). Numa das matérias, aparecem o sócio de um grupo italiano que detém a marca Vaporetto, o proprietário de catorze concessionárias de veículos, a dona de uma fábrica de perfumes que

faturou setecentos mil dólares em 1993 e a proprietária de um empreendimento de vendas de cartões de origami, que faturou oitenta mil dólares em um único mês (QUANDO O ACASO..., 1994). Em outra, Victor Civita é lembrado como aquele que construiu a maior empresa editorial e gráfica da América Latina, com mais de dez mil funcionários e faturamento de quatrocentos e cinquenta milhões de dólares em 1989 (SEU NOME... 1990).

Mordomias e outras facilidades, que conferem status ao bem-sucedido, receberam duas referências (COMEÇAR..., 1989). Dentre elas, as reportagens mencionam “[...] estadias em hotéis cinco estrelas, cartões de crédito e carro com motorista” (O QUE HÁ... 1986, p. 79).

Também são mencionados, duas vezes, resultados como estabilidade (em termos de segurança e tranquilidade na profissão, algo de grande valor num ambiente mutável e competitivo como o descrito pela publicação) (COMO VIVE..., 1971), aprovação na organização (como boa avaliação e reconhecimento) (BERNARDI, 1997 b), novas responsabilidades e o cuidar de bons projetos (incumbências inéditas e interessantes) (HÁ UM ABISMO..., 1993), visibilidade e destaque (no sentido de aparecer e brilhar, ao se alcançar o que se almeja) (BERNARDI, 1995), juventude (chance de atingir altos postos cedo e ter vigor para aproveitar tudo o que o dinheiro é capaz de proporcionar) (COMO VIVE.., 1971).

Por apenas uma vez, outros resultados do sucesso apareceram, todos eles, positivos. Um dizia respeito à glória, outro ao glamour, outro à experiência, outro a obter bons resultados em alguns setores, numa economia problemática, e um último se referia a ter uma esposa linda (TRABALHAR PARA..., 1971), mais um sinal de que a revista falava quase que exclusivamente para homens, pelo menos, em suas primeiras edições.

Em cinco trechos, percebemos uma abertura para sentidos alternativos do sucesso. Neles, os resultados do sucesso estavam ligados a aspectos como, por exemplo, um senso de realização: “[...] pela teoria da simplicidade, o sucesso profissional não é medido pelo número de coquetéis e jantares que você frequenta, mas pela intensidade e prazer com que desempenha suas funções” (GARCIA, 1998 a, p. 78). Contudo, mesmo nesse texto, percebemos que essa realização é obtida dentro da organização, confirmando a impressão de Du Gay (1991) sobre a invenção ideológica da empresa como local onde alguém se realiza pessoalmente. Em outro artigo, a jornalista afirma que se deve considerar a existência de indivíduos que, não por medo

ou algo parecido, simplesmente recusam o sucesso. “Nem todos querem ser um sucesso” (BERNARDI, 1996, p. 110). Aqui, no entanto, afirma-se que essa aspiração não é geral, mas não se cogita que o sucesso pode ter sentidos distintos para pessoas diferentes e, sim, que, como sinônimo de ascensão profissional, ele espanta quem não se dispõe a pagar seu preço.

Junto a isso, há uma passagem que lembra haver outros aspectos importantes, além do sucesso estritamente ligado a elementos materiais.

Coragem não é garantia de sucesso. Mesmo entre os que resolvem mudar, entre os que se dispõem a assumir riscos, o abismo está ali do lado. Mas isso, é claro, depende de como você encara o sucesso e o fracasso. “Se você pensar apenas em termos financeiros, é isso mesmo. Mas as pessoas que tomam posição e tentam coisas novas, mesmo se falharem, têm a vantagem de ter tentado. E pelo menos elas não vão para o túmulo com a música ainda dentro delas, elas não vão ter vivido apenas uma vida segura e bem-comportada. Há um senso de realização que vai além do sucesso financeiro (COEHN, 1998 a, p. 136).

Numa linha semelhante, no artigo de Bartolomé e Evans (1980), veiculado originalmente na Harvard Business Review e republicado por Exame, os autores criticam o fato de o sucesso ser equiparado à escala gerencial, dando a impressão de que essa noção é limitada e poderia incluir outros elementos. Os que são citados, pelos autores, são a especialização em áreas técnicas ou funcionais, o desejo de ser criativo, ter segurança e autonomia, por exemplo.

Isso vai ao encontro do que é afirmado na literatura anteriormente consultada, e consiste num possível espaço de abertura para novas definições, diante de tantas construções a reforçar o sentido do sucesso como algo universal e ligado a fatores extrínsecos. No entanto, acreditamos que esses ainda são estímulos muito tímidos para que efetivamente se configurem novos sentidos. A grande maioria das matérias analisadas, ainda que admita outras possibilidades, ainda insiste na definição de sucesso atrelada, sobretudo, à ascensão profissional e ao dinheiro, mesmo quando admite a possibilidade de existência de sentidos alternativos.

As pessoas estudam anos a fio, se preparam para entrar no mercado de trabalho, adquirem experiência e se tornam bons profissionais. Com que objetivo? Alcançar o sucesso. Salvo raras exceções, essa é a meta geral. Não vamos entrar na discussão filosófica sobre o que quer dizer sucesso, palavra com significados tão diferentes quanto o número de pessoas que se dedicam à sua busca. Mas para a grande maioria, sobretudo dos executivos, o sucesso, basicamente, se traduz em dinheiro, poder, posição, prestígio, reconhecimento e um sentido de realização profissional. É aquilo que se persegue desde o começo da carreira (BERNARDI, 1997 b, p. 92).

Em resumo, podemos dizer que a revista apresenta, como resultados do sucesso, a ascensão profissional, ligada à obtenção de cargos cada vez mais altos, acompanhada por salários e outros itens que remetem à questão pecuniária, como a posse de bens (carros, imóveis etc.). A empregabilidade aparece como outro resultado de pessoas bem-sucedidas, sem que se discuta se ela é causa ou efeito do sucesso. Além disso, complicadores como stress, pressão e carga de responsabilidades também são apontados, junto à ascensão social e a prestígio e poder. Consequências do sucesso desvinculadas de questões materiais ou externas como, por exemplo, um senso de realização são igualmente lembradas, porém com menos ênfase. Isso posto, podemos passar agora à última categoria de análise.