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Sucesso e cultura do management no conjunto dos editoriais

3. LISTA DE GRÁFICOS

5.1 Os editoriais

5.1.5 Sucesso e cultura do management no conjunto dos editoriais

Levando em conta o conjunto dos editoriais que fazem parte do corpus examinado, cabe comentar ainda outros pontos que notamos, durante a análise, estar estreitamente relacionados à cultura do management e à questão do sucesso. Um deles é a visão que a revista traz sobre o futuro, o novo e a juventude, muitas vezes negando aquilo que passou e valorizando apenas o que está por vir. Como lembrou Gaulejac (2007), estamos num universo que estimula esquecermos o passado, desvalorizarmos o presente e exaltarmos o futuro. A expressão véspera de milênio (NOGUEIRA, 1998 e), usada com relativa frequência no lugar da expressão mais comum fim de milênio, é um indício disso. A figura do jovem é engrandecida e idades aparecem repetidamente nos editoriais, sobretudo nas edições mais recentes.

Adriano, aos 27 anos, como que representa o jovem brasileiro desta véspera de novo milênio. Sua cabeça não é povoada de fantasmas de uma época que, felizmente, morreu no Brasil. A época do Estado Paizão, das estatais onipresentes, dos subsídios aos amigos, do mercado protegido e isolado, da idéia do lucro como pecado. A repórter Laura Somoggi, de 24 anos, pertence também a essa geração desassombrada (NOGUEIRA, 1998 f, grifo nosso).

A barba branca, em Nelson Blecher, combina-se a pequenos olhos escuros dos quais irradia um entusiasmo de garoto recém-chegado a uma redação. A vibração de

novato – tão rara em quem não é – manifestou-se repetidamente em Nelson ao longo

do trabalho de traçar o perfil da TAM (NOGUEIRA, 1997 l, grifo nosso).

O editor David Cohen recentemente comemorou 28 anos. Não que ele tenha 28 anos. Tem 35. Mas decidiu comemorar apenas 28. Isto é David (NOGUEIRA, 1998g).

Esses trechos reforçam a questão apontada por Freitas (2000) sobre a juventude como valor, além da vontade generalizada de ser e parecer cada vez mais jovem. Assim, as pessoas acreditam se mostrar capazes de atender as demandas de um ambiente organizacional mutante, flexível e extremamente exigente. Como lembram Siqueira e Freitas (2006), parece que o sucesso bate à porta da juventude e os mais novos são vistos como tendo mais energia e disposição para participar dessa batalha, deixando-se de lado a capacidade dos mais maduros.

Outro ponto que fica claro é a visibilidade como valor.

Mário de Almeida, um dos melhores jornalistas de sua geração, estava fazia já alguns anos longe de uma redação quando o trouxemos para perto de nós, em 1994. Mário foi um jovem editor promissor da Veja nos anos 70 e, durante boa parte da década de 80, ocupou o invejado posto de correspondente da Gazeta Mercantil em Paris. Depois voltou ao Brasil para dirigir a redação de Isto é quando a Gazeta comprou a revista. Vendida outra vez a revista, Mário ficou um tempo na Gazeta e depois tentou a sorte em vários negócios. O mais saboroso deles foi uma fábrica de macarrão que deixou saudade em muita gente. Foi nesse período de retiro que Exame se aproximou de Mário. Ali estava alguém talentoso demais para ficar na sombra (NOGUEIRA, 1997 m).

Poderíamos, nesse caso, nos perguntar se realmente não ter colunas frequentes na mídia é estar na sombra e, mais que isso, qual seria o mal daquilo que a revista chamou de estar na sombra. Afinal, ela é posta como um lugar com conotação negativa, reservado aos desprovidos de talento. Contudo, essa questão se liga ao cenário que descrevemos antes: do universo em que cada um é uma empresa e precisa se vender. Para fazê-lo, deve necessariamente aparecer. Como apontaram Caldas e Tonelli (2000), na sociedade atual não importa se eu existo, mas se sou visto, se sou imagem. Para os autores, não é possível falar em interioridade, só há performance. Aqui, podemos notar trechos dos editoriais em que isso fica ainda mais claro e é defendido de maneira explícita.

Outra sentença combina perfeitamente com a reflexão de Pulitzer quando o assunto é o bom jornalismo. Ao jornalista, como aconteceu com a mulher de César, não basta ser honesto. Ele tem que parecer honesto. A frase de Pulitzer e a elevada expectativa em torno da mulher de César são valores arraigados no estilo Exame de fazer jornalismo (NOGUEIRA, 1998 h).

Outra razão de eu me sentir ainda mais feliz que o normal, como editor, é a entrevista que o subeditor David Coehn fez com uma professora de Harvard especializada na linguagem dos executivos. O modo como você fala, mostra ela, pode levantar ou afundar sua carreira (NOGUEIRA, 1998 i).

Nesse contexto, aspectos ligados à imagem pessoal ganham relevância. Diferentemente do que ocorria nos primeiros anos da revista, em que a preocupação com a aparência poderia soar mal,

[...] transformação mais lenta e menos surpreendente é a que está acontecendo com os executivos brasileiros, no plano pessoal. Abandonaram (finalmente) o terno cinza e o sapato marrom. Timidamente, no começo, até se enquadrarem em definitivo na moda masculina atual, colorida e ousada. Mas o assunto elegância ainda não é específico entre os executivos. Ninguém quer falar a respeito, com medo de parecer excessivamente preocupado com a aparência (O NÔVO..., 1971).

os cuidados com a apresentação, sobretudo nas últimas edições examinadas, são não só aconselháveis, mas tidos como obrigatórios. De acordo com Caldas e Tonelli (2000), pessoas e organizações são impelidas a buscar a aparência, não como fruto de um processo reflexivo e de necessidades verdadeiras, mas como reação a um universo hostil e beligerante. Em consonância com os autores, Ehrenberg (2010) afirma que a aparência do indivíduo se torna essencial para seu sucesso, aspecto que comentaremos de forma mais detalhada posteriormente.

Além disso, notamos uma incoerência: a revista se apresenta como instrumento para o homem que está por trás do executivo, cuidando também de sua vida particular e assumindo não ser apenas uma publicação de negócios.

Tudo para nos aproximar ainda mais de quem lê Exame e dela espera uma ferramenta útil para seu trabalho e desenvolvimento pessoal (KUPFER, 1987, grifo nosso).

A pergunta fundamental que sua carta levanta é a seguinte: quais são, afinal, os limites de uma revista de negócios? É uma questão complexa. Nosso universo, é claro, é o dos negócios. De uma maneira ou de outra, as empresas estão presentes da primeira à última página em cada uma das nossas edições. Este é o nosso mundo. Nossa missão prioritária é, naturalmente, cobrir o que se passa nas empresas e na economia. Mas e os nossos limites? Bem, creio que eles são, em última instância, o interesse dos nossos leitores. Estes procuram em nós informações que possam ajudá-

los em sua carreira ou em seu negócio – ou em sua vida. É aí, neste último ponto,

No entanto, se a missão – ainda que secundária – que Exame coloca para si inclui ser útil à vida do indivíduo como um todo, há que se perguntar por que aspectos ligados a outras dimensões que não o trabalho são tão negligenciados. Relacionado a isso, percebemos que não há espaço, entre os bem-sucedidos, para pessoas importantes, não só para o mundo dos negócios, mas para a sociedade como um todo, a menos que desempenhem funções ligadas à direção de organizações.

Mário Henrique Simonsen é o único integrante de nossa lista de Vencedores que não é um homem de negócios: nem empresário nem executivo. Ele é o olho que melhor enxerga a economia do país e a voz que melhor a explica. É o vitorioso entre todos os vitoriosos da lista que é nossa última capa de 1995 (NOGUEIRA, 1996 a).

A presença pífia de indivíduos que não estão relacionados diretamente a esse universo e a consagração das figuras que o ocupam reforçam o culto aos homens de negócio como modelo ideal de conduta, conforme discutido por Ehrenberg (2010) e descrito por Mazza e Alvarez (2000), quando comentaram o fato de a imprensa popular legitimar os membros da comunidade de administração como experts em problemas econômicos e também do dia a dia, influenciando, inclusive, o agir fora da empresa, ao estabelecer novas modas de vestir e novas formas de lazer, por exemplo.

Um último aspecto a ser destacado está presente em trechos como o seguinte.

É possível que não se misturem apenas duas nações na conformação do país. Há, ao que parece, também dois calendários, distantes um do outro alguns séculos. Um é o calendário de uma sociedade irrequieta e empreendedora, sempre disposta a arregaçar as mangas e trabalhar para colocar o Brasil em sintonia com o que se observa em centros como os Estados Unidos, Alemanha e Japão. O calendário dessa sociedade mostra que ela está pronta a ingressar no século XXI. O segundo calendário rege o Brasil oficial, às voltas com presidentes que viajam muito e governam pouco (O ARCAICO..., 1989).

Como pode ser visto, o Brasil oficial é apresentado como o país do atraso, aquele que ainda não está pronto para entrar no século XXI, ao passo que nações como os Estados Unidos são a autoridade exemplar da dianteira e do progresso, nelas se encontrando o que há de novo e de melhor. A própria publicação em estudo é um exemplo dessa visão que adota modelos estrangeiros como referência. Ela o faz em termos de forma e conteúdo, trazendo para as empresas locais novidades internacionais da gestão e apresentando-as da mesma maneira que revistas de Primeiro Mundo.

As ilustrações disso são variadas, nos textos. A edição de 18 de abril de 1996, por exemplo, inicia um período em que o veículo passou a trazer mensalmente artigos da “[...] respeitada Harvard Business Review” (AMORIM, 1976 b, p. 3). Na de 5 de março de 1986, Exame oferece como plus editorial a publicação de reportagens da Forbes americana, “[...] uma das mais conceituadas publicações especializadas em economia e negócios” (FALCÃO, 1986 b, p. 3). Nesse mesmo editorial, também fica visível que a expertise estrangeira é importada para as empresas brasileiras via treinamento: comenta-se que o diretor-executivo de arte da Time veio ao Brasil para treinar ilustradores da editora Abril. A edição de 14 de maio do mesmo ano faz questão de apresentar, como grande vantagem, a similaridade entre Forbes e Exame: “[...] seu crescente sucesso no competitivo mercado editorial norte-americano mostra o acerto de sua fórmula editorial, que em suas linhas gerais é também a de Exame” (VELLOSO, 1986b, p. 3). A parceria com essa publicação ganha espaço também em outros editoriais (FALCÃO, 1987), e seus princípios aparecem com frequência como fonte de inspiração da revista brasileira (NOGUEIRA, 1995 b). Mesmo quando Exame aborda alguma tendência e se vangloria por tê-lo feito antes de outros veículos, publicações estrangeiras se mantêm como referência de qualidade, modernidade e avanço.

Hoje, reengenharia é uma palavra que se discute em qualquer lugar do Brasil [...]. Quando, sobre esse assunto, havia pouco mais que um provocador livro de um acadêmico americano com nome de detetive de ficção (Mike Hammer), publicamos uma reportagem de capa em que expúnhamos a gênese e as premissas da reengenharia. A edição foi datada de 4 de agosto de 1993. A revista Fortune, que com as rivais Forbes e Business Week compõe a santíssima trindade das publicações de negócios americanas, fez também uma capa sobre o tema. Data: 23 de agosto de 1993. Demos antes (A GRANDE DIVISA..., 1994).

A adoção dessas revistas como modelo para a publicação nacional é explícita, e a realidade norte-americana povoa vários dos textos analisados.

Copiar o que é bom é uma grande virtude, e é sem nenhum constrangimento que anunciamos que nosso benchmarking, nessa área, é a revista Fortune. Ali são produzidos, em nossa avaliação, os melhores gráficos e tabelas do mundo. Bonitos, simples, fáceis de entender. São eles o metro pelo qual medimos nosso trabalho (NOSSOS ILUSTRADORES..., 1994).

A partir desta edição, você receberá quinzenalmente uma carta de Washington. Independente do conteúdo de cada carta, trata-se, desde já, de uma esplêndida notícia. É que quem as assinará é um dos mais reputados jornalistas americanos, Robert J. Samuelson. [...] Samuelson é articulista de importantes publicações americanas, como a revista Newsweek e os jornais The Washington Post, Los Angeles Times e Boston Globe. [...] Samuelson colocará você em contato com o que de mais decisivo se passa na economia americana. Antes, isso já era importante.

Agora, com a economia globalizada, passa a ser essencial. Um espirro americano resfria o mundo e o Brasil [...] (NOGUEIRA, 1995 g).

Essas constatações reforçam o processo de reprodução ideológica descrito por Caldas e Alcadipani (2006) em que importamos categorias, padrões e experiências, ao introduzir tecnologia administrativa no País. Nessa dinâmica, assumimos um modelo reproduzido numa rede complexa que inclui empresas, escolas, consultores e mídia de negócios, e que valoriza o que vem de fora como superior ao que produzimos localmente. Essa nossa postura de assimiladores de conceitos construídos fora do Brasil envolve as teorias que absorvemos, as práticas que procuramos imitar, os valores imbuídos em ambas e, como podemos ver, as figuras (pessoas, organizações ou países) eleitas para ocupar posições de destaque. Consumimos, repetimos e divulgamos uma (pseudo) vanguarda estrangeira (CALDAS e WOOD JR, 1999), sobretudo norte-americana.

Finalizando esse tópico, é importante estabelecer a cronologia dos resultados da análise, na tentativa de esclarecer, de acordo com as categorias determinadas para o exame dos editoriais, alguma lógica. Ao procurar fazê-lo, percebemos que às três primeiras delas (Promoção, Legitimação e Personalização) correspondem épocas mais ou menos distintas. Ainda que com fronteiras tênues, esses diferentes períodos podem dar indícios sobre a produção de sentidos da revista a respeito do sucesso.

À categoria Promoção, podemos associar predominantemente os primeiros anos da Exame, correspondendo à década de setenta ou, mais precisamente, aos anos de 1971 até 1982, quando a publicação tinha ainda um foco quase industrial. À categoria Legitimação, ligamos os anos de 1982 até 1993, em que trechos sobre características do veículo ou sua visão dos acontecimentos político-econômicos da época predominam. A partir de então, começam a aparecer, com mais frequência, os relatos típicos da categoria Personalização, sobre as pessoas que constroem a publicação. Os textos que trazem esse tipo de informação vão, em geral, de 1993 a 1998, último ano estudado. Aqueles ligados à categoria Referências ao sucesso, por sua vez, se distribuem por quase todo o intervalo de tempo pesquisado, concentrando-se, no entanto, na década de noventa, que reúne metade dos trechos selecionados. A figura 2 facilita a visualização dessas constatações.

Figura 2 – Distribuição das reportagens no tempo conforme as categorias de análise

Fonte – Elaborada pela autora da tese.

Por meio dela, é possível perceber que as fronteiras entre essas categorias são sutis, não existindo uma divisão rígida entre esses intervalos de tempo e as características dos editoriais que os compõem. Podemos, por exemplo, encontrar textos da categoria Legitimação, que sustentam a revista como ator a representar os interesses do setor produtivo, e que são típicos, sobretudo, dos anos de 1982 a 1993, também nos períodos anterior e posterior. No entanto, pelo preenchimento das figuras que correspondem à concentração dos textos em termos de número e quantidade, podemos ver que a presença mais ou menos intensa dos editoriais de cada categoria nesses distintos intervalos é um sinal a ser compreendido.

Procurando contextualizar esses achados, notamos que a primeira fase (1971-1982), que corresponde aos primórdios da revista, consiste no período que envolve dois acontecimentos importantes para o Brasil. O primeiro é o milagre econômico, nome que designa os anos de 1969 a 1973, quando o governo alcançava êxito na área econômica enquanto o País vivia um dos seus períodos políticos mais tenebrosos, em função do regime militar (FAUSTO, 2011, p.266). Nessa fase, como aponta o historiador Boris Fausto, a situação econômica internacional favorável, a ampla disponibilidade de recursos, o crescimento do investimento de capital estrangeiro e a grande expansão do comércio exterior favoreceram resultados como altas taxas de crescimento (incluindo variações de aproximadamente 10% do Produto Interno Bruto (PIB), ao ano) e baixos índices de inflação. O segundo fato a ser destacado é a crise do petróleo de 1973, que desestabilizou a economia mundial e atingiu em cheio o Brasil,

1971 1982 1993 1998 Categorias Promoção Legitimação Personalização Referências ao sucesso

importador de mais de 80% do que consumia. Efeito da Guerra do Yom Kippur, entre estados árabes e Israel, a crise encontrou um País vulnerável, em função de um milagre realizado às custas de excessiva dependência do sistema financeiro e comércio internacional, potencializando as repercussões sofridas pelo Brasil (FAUSTO, 2011).

Nessa época, os esforços da publicação pareciam se dirigir ao aproveitamento das oportunidades que a expansão econômica oferecia aos empreendimentos nacionais, como a exploração de novos mercados, seguida pelas formas de lidar com as adversidades vindas do problema energético, como demonstram, por exemplo, os seguintes trechos de editoriais.

No Nordeste, o que vende hoje é a qualidade, descobriu o redator Glauco de Carvalho, quando foi examinar a situação da indústria têxtil da região (página 62). “O tecido de baixa qualidade não tem vez no mercado” – escreveu de lá enquanto procurava uma explicação. A resposta foi encontrada em São Paulo pelo redator Arlindo Munglioli, analisando os resultados do censo de 1970. Conforme ele apurou, o poder de compra das classes com renda inferior a 200 cruzeiros mensais se manteve estável ou declinou na última década. Mas melhorou extraordinariamente o poder de consumo da classe média, que ganha agora mais de 1.000 cruzeiros por mês. Daí, a estagnação de indústrias tradicionais, que produzem artigos para consumo de massa, e a prosperidade de setores mais sofisticados, cujo mercado é a elite econômica do país (página 42) (A ESPERANÇA..., 1971).

Permito-me recomendar, também, a reportagem “O que as empresas estão fazendo

para economizar combustível?” Nela, com exemplos colhidos em todo o país, nos mais variados ramos industriais, a editora-assistente Regina Pimenta conta os esforços desenvolvidos pelas empresas para reduzir seus gastos com derivados de petróleo – seja pelo uso de fontes alternativas, seja racionalizando o consumo. Não falta, inclusive, um “guia prático para reduzir o consumo”, com sugestões elaboradas pelo Centro de Conservação de Energia do Instituto de Desenvolvimento Econômico e Gerencial (IDEG), do Rio, a partir de uma pesquisa com 127 empresas de sete setores industriais (VELLOSO, 1979 c).

Essa fase corresponde à categoria Promoção, e parece coerente pensar que o foco da revista, segundo mostraram os editoriais, estava em apresentar as reportagens que falavam do que as empresas – sobretudo as indústrias – estavam fazendo para tirar vantagem do aumento da capacidade produtiva e de consumo no País, além de mostrar também, posteriormente, como faziam para superar os complicadores à sua atuação, como aquele advindo da crise do petróleo. A impressão que fica é que, no início da revista, esta tentava se promover e se tornar conhecida, despertando o interesse do leitor ao ressaltar os assuntos que abordava, defendendo sua atratividade e utilidade para o público.

A segunda fase (1982-1993), correspondente à categoria Legitimação, inclui, no campo político, a consolidação do processo de liberalização do regime que, conforme definido por Ernesto Geisel (no poder de 1974 a 1979), seria “[...] lento, gradual e seguro”, mas na prática encheu-se de avanços e recuos (FAUSTO, 2011, p. 270). De qualquer forma, o presidente iniciou um processo de redemocratização, continuado pelo sucessor João Baptista Figueiredo (entre 1979 e 1985), que foi claramente apoiado pela Exame como condição para a economia de mercado acontecer de forma plena. Em alguns editoriais, por exemplo, a revista apresenta pesquisas feitas com o empresariado comprovando sua preferência pelas eleições diretas (NASSAR, 1984; FALCÃO, 1988). Ao mesmo tempo, a publicação cobra que a abertura política seja acompanhada pela econômica, sem a qual, de acordo com a revista, o desenvolvimento do País estaria comprometido.

Não é de hoje que Exame acredita nas virtudes do voto direto, aqui entendido como a livre manifestação da opinião da sociedade – ou de segmentos representativos dela – sobre questões que lhe afetam diretamente. Por isso, há praticamente dez anos Exame consulta periodicamente empresários e executivos de todo o país, seus leitores, sobre as mais variadas questões, como faz pela segunda vez com a sucessão presidencial (VELLOSO, 1984 b).

Ao substituir o natimorto decreto-lei 2045 por outro que consegue ser ainda pior – o

2064 – o governo deu mais uma demonstração de que o processo de abertura, levado

às últimas consequências no plano político, praticamente inexiste no campo econômico. No episódio ficou patente mais uma vez que o “cacife” dos políticos do PDS era bem menor do que o dos tecnocratas da área econômica. E o resultado não poderia ter sido pior. Um decreto-lei que a despeito de preservar as faixas até três salários mínimos atinge brutalmente a toda a classe média. E cuja consequência mais visível será um violento agravamento da recessão, que aumentará ainda mais o desemprego e a rotatividade, sobretudo na faixa teoricamente beneficiada (VELLOSO, 1983).

Essa fase engloba ainda a chamada década perdida (FISHLOW, 2011, p. 14), período marcado por desaquecimento e forte retração industrial no Brasil, num quadro que Fausto (2011, p. 279) descreveu como sendo de “[...] estagflação”, por combinar estagnação econômica e inflação. Diante de altas taxas de desemprego, de índices de inflação cujas expectativas atingiam 1.600% ao ano (OS CAMINHOS, 1988) e da perda do poder de compra