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GEOLÓGICO REGIONAL

5.2. PRINCIPAIS FORMAÇÕES QUATERNÁRIAS DA REGIÃO E SEU ENQUADRAMENTO ESTRATIGRÁFICO

5.2.1.5. Outras formações fluviais

A par das quatro formações fluviais anteriormente caracterizadas, cuja existência e desen- volvimento escalonado foi exclusivamente estabelecido ao longo da margem direita do rio Lis, na zona do seu vale que se estende entre o diapiro de Leiria e o diapiro de Monte Real, existem também depósitos similares a montante, embora se trate quase sempre de testemunhos menos expressivos e difíceis de correlacionar com os seus homólogos. Em todo o caso esta situação contrasta de forma flagrante com a circunstância de a jusante do diapiro de Monte Real se registar a total ausência deste tipo de depósitos.

Este último facto, de acordo com os dados que se puderam coligir, sugere que toda esta região próxima do litoral terá conhecido uma evolução morfológica recente (TEXIER e CUNHA-RIBEIRO, 1991-1992), o que é aparentemente confirmado pela presença de uma sedimentação característica de estuário nas sondagens realizadas nas aluviões actuais (F4), junto de Monte Real.

Quanto aos pequenos retalhos de formações fluviais identificados a montante de Leiria, al- guns deles, como é o caso dos situados nas imediações da povoação de Cortes, encontram-se mesmo assinalados na folha referente à região da Carta Geológica de Portugal na escala de 1/50000 (TEIXEIRA e ZBYSZEWSKI, 1968) (vd. folha do Anexo Cartográfico). De acordo com a interpretação que aí é aduzida, tratar-se-iam de “terraços tirrenianos” correlacionáveis com os depósitos que a jusante de Leiria correspondem à formação fluvial F2. O seu estudo pormenorizado, decorrente da importância arqueológica do depósito situado no lugar de Pousias, permitiu contudo sugerir uma interpretação diferente.

Desde logo a altimetria da base do depósito aponta para a sua correlação com o conjunto inferior da unidade sedimentar F1b identificada a jusante de Leiria (EST.1.A e EST.3). É

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A generalidade das tentativas de reconstituição da evolução recente do litoral português assenta quase exclusivamente em dados oriundos da documentação histórica conhecida, nunca se tendo procurado em geral realizar uma investigação directa e concreta dos respectivos testemunhos geomorfológicos e sedi- mentares, por forma a cruzar entre si estes dois tipos de informação. Relativamente à zona costeira adjacente à bacia hidrográfica do rio Lis, tais estudos são aliás omissos, o que poderá justificar-se pela mobilidade da larga cobertura dunar que aí se desenvolve (MARTINS, 1946; CASTELO-BRANCO, 1957). Apenas dispomos de indicações que apontam para a já referida existência de uma zona de características alagadiças e pantanosas no vale do rio Lis, a jusante de Leiria (BARBOSA, 1992), bem como a pontual referência que sugere ter sido o rio Lis eventualmente navegável ao longo de parte significativa do seu curso (CASTELO-BRANCO, 1958; RIBEIRO, 1977).

contudo tendo em conta a estrutura sedimentar cascalhenta do depósito de terraço aí preser- vado, bem como a pedogénese que o afecta (vd. EST.20), que é possível aceitar esta proposta interpretativa (CUNHA-RIBEIRO, 1990-1991).

Situação algo similar ocorreu com um outro depósito de terraço identificado próximo da povoação de Jardoeira, no vale do rio Lena, imediatamente a jusante da Vila da Batalha (EST.1.A). Os trabalhos aí realizados não só conduziram também à recolha de materiais líticos talhados integrados na cascalheira do depósito, como foi igualmente considerada sugestiva a sua conexão com a unidade sedimentar F1b, essencialmente a partir da sua estrutura sedimentar grosseira e da incidência da pedogénese que aí se observa (CUNHA-RIBEIRO e MONTEIRO- RODRIGUES, 1990-1991), apontando aliás no mesmo sentido a posição altimétrica do depósito em relação ao actual leito adjacente do rio Lena (EST.3).

Em ambos os casos procurou-se assinalar o posicionamento dos dois pequenos depósitos na cartografia da região, tendo em conta a sua importância arqueológica, apesar de tal procedimen- to não ter sido alargado a outros testemunhos, raros, de formações quaternárias congéneres existentes na área da bacia hidrográfica do Lis e Lena (vd. folha B do Anexo Carto- gráfico).

Finalmente, refira-se a inexistência de quaisquer vestígios de formações fluviais anteriores a F1, a qual, pela sua posição altimétrica no escalonamento evidenciado pelas diferentes for- mações fluviais reconhecidas a norte de Leiria, é sem dúvida a mais antiga. Na verdade, apesar de os autores da folha referente à área de Leiria da Carta Geológica de Portugal na escala de 1/50000 sugerirem a hipótese contrária, afirmando que “as cascalheiras dos terraços superiores (Siciliano I) confundem-se com as cascalheiras dos planaltos pliocénicos, das quais não foram separadas” (TEIXEIRA e ZBYSZEWSKI, 1968, p. 13), nenhum indício de tal presença foi assinalado nos trabalhos de levantamento que aí se efectuaram a partir dos anos oitenta.

5.2.2. As coluviões

O desenvolvimento de formações coluvionares quaternárias na área da bacia hidrográfica do rio Lis foi particularmente favorecido pela composição detrítica de muitos dos depósitos geológicos mais antigos aí existentes. Daí que a sua presença tenha sido mesmo assinalada na Carta Geológica de Portugal na escala 1/50000 na rubrica do Quaternário indiferenciado, onde a par de depósitos de terraços se integram “areias superficiais, provenientes da lavagem das vertentes, e algumas areias eólicas que as acompanham, de idade quaternária indeterminada” (TEIXEIRA e ZBYSZEWSKI, 1968, p. 13). De acordo com referida carta estas formações surgem preferencialmente nas vertentes do vale do Lis, bem como nalguns dos seus principais afluentes, com natural destaque para o vale do rio Lena.

Os trabalhos realizados em toda esta área permitiram porém registar a sua presença de uma forma algo mais ampla em associação com depósitos detríticos do Cretácico, do Miocénico

continental, do Pliocénico marinho e das várias formações fluviais quaternárias (TEXIER e CUNHA-RIBEIRO, 1991-1992).

A espessura destas formações varia essencialmente em função da posição ocupada pelos de- pósitos na topografia da região, raramente ultrapassando no entanto mais de 1,5 m. Saliente-se que a densa cobertura vegetal que ocupa frequentemente as vertentes dos principais vales, bem como as áreas planálticas dos respectivos interflúvios, onde as coluviões se encontram melhor desenvolvidas, dificultam amiúde a sua identificação e posterior caracterização, pelo que se optou por não assinalar a presença de tais depósitos na cartografia que realizámos da região, dada a impossibilidade de o fazer de uma forma sistemática.

No que se refere à sua organização estratigráfica, ela revela por norma uma única camada constituída por materiais de textura diversa, dispersos, integrando nalguns casos pequenos seixos que quase sempre evidenciam traços de eolização. Apenas num ou noutro caso se identi- ficou a presença de mais do que uma geração de coluviões. Foi o que sucedeu, por exemplo, em Casal de Santa Maria e no topo da unidade superior da formação fluvial F1 observada no Areeiro da J.A.E., onde a geração mais nova é por vezes mesmo recente.

Do ponto de vista pedológico, só excepcionalmente foi possível vislumbrar nestes depósitos coluvionares uma fácies de rubefacção. Regra geral eles encontram-se associados a um solo podzólico ou, mais raramente, a um solo ocre. Nos cortes mais significativos identificaram-se mesmo seis horizontes diferentes (EST. 5).

Em primeiro lugar surge um horizonte IA1 com uma espessura de 8 a 10 cm, constituído por areias orgânicas que apresentam uma estrutura grúmulosa fina e uma coloração cinzenta escura. A separação do horizonte subjacente, um horizonte IA2, aparece bem marcada, embora sinuosa. Este novo horizonte, com uma espessura que oscila entre 10 e 30 cm, é constituído por areias de cor cinzenta clara, revelando uma base nítida mas ondulada. Nalguns cortes estes dois primeiros horizontes apresentam-se fortemente perturbados por fenómenos antrópicos, sendo em tais circunstâncias substituídos por um horizonte Ap heterogéneo.

Sucede-lhes um horizonte I Bh-Bs, desenvolvido numa banda de 30 a 40 cm, onde predomi- nam areias pouco argilosas com uma estrutura flóculosa e uma coloração que varia entre o cas- tanho vivo e o castanho amarelado. Pontualmente observa-se a presença de concreções humo- ferruginosas de cor castanho avermelhada, enquanto a transição para o horizonte subjacente se efectua de forma progressiva. É então que surge um horizonte IC com 20 cm a 30 cm de espes- sura constituído por areias de cor cinzenta clara e castanho clara, igualmente delimitado do horizonte inferior de forma gradual e por vezes mesmo até difícil de identificar. Segue-se, desta forma, um horizonte IIA2g com uma espessura de 15 a 20 cm, que corresponde ao topo das formações detríticas antigas. Embora evidencie características idênticas às do horizonte ante- rior, este horizonte apresenta todavia manchas de sedimentos mais argilosos, amarelados ou de cor cinzenta clara, os quais se tornam mais frequentes na sua base, onde aliás ocorre de novo uma passagem progressiva para o horizonte seguinte. Este corresponde a um horizonte II Btg,

no qual se integram areias argilosas de coloração avermelhada, matizada por manchas cinzentas-claras.

5.2.3. Interpretação da dinâmica das formações quaternárias e