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Trato aqui, para finalizar, de duas tópicas: criação de (novas) infraestrutu- ras agregadoras da comunicação e da investigação educacional; construção de novos e mais favoráveis modos de relação com o ambiente externo da investi- gação em educação.

No primeiro aspeto, penso na necessidade de outro modo de compatibiliza- ção entre as dinâmicas de insularidade – a imprescindível insularidade da criação individual, a estrutural insularidade das organizações académicas – e as não me- nos importantes dinâmicas de continentalidade, necessárias ao reforço de uma área de estudos. Tal mudança, que exige também alterações na nossa escala de trabalho e no modo como pensamos a escala do nosso labor investigativo, pode concretizar-se em projetos de investigação de envergadura e em programas dou- torais conjuntos, sobretudo nestes, pois imagino-os, efetivamente, como espaços potencialmente agregadores, como lugares de concretização de algo que muito falta em CE: a produção discutida e a discussão produtiva.

A este propósito, convém voltar ao que já foi observado e escrito – e este re- gresso não é, em si mesmo, sinal que se possa festejar: temos ainda muito, mas muito para melhorar, na nossa capacidade para o diálogo e a polémica académica, no rigor das nossas teorizações e dos nossos métodos, e na nossa erudição (Lima, 2010). E esta continua a ser uma condição básica e maior para levar o que escre- vemos para outros lugares.

Passo, deste modo, para a questão da intervenção crítica sobre as políticas educativas e na ação pública. Neste segundo aspeto, penso na construção de no- vos e mais favoráveis modos de relação com o ambiente externo da investigação em educação; o que me conduz à possibilidade de se inventar uma mais feliz com- binação entre a capacidade de fazer releituras das políticas e a capacidade para informar a ação pública.

A capacidade para reler (as políticas) impõe uma investigação que tenha como ponto de partida desafios atuais, mas que procure desfamiliarizar os modos como, na atualidade, as políticas colocam problemas, oferecem e implementam soluções e justificam agendas. Em poucas palavras, uma investigação que se contente con- sigo mesma se – e apenas se – dá a perceber ao mundo social ‘coisas diferentes’

daquelas que os atores já conhecem ou tomam como um adquirido; e que, como escreveu Carol Weiss (1990), professora emérita de educação em Harvard, tenha presente apenas poder ambicionar uma influência indireta e desapressada sobre as políticas públicas; não mais.

Todavia, para existir fora da academia e em contextos que clamam, mais e mais, pelo what works, o conhecimento com vocação analítica precisa de encon- trar um extra de eficácia na sua relação com a ação pública. Esse extra poderá vir da renovação nas formas de relação com a ação pública ou, talvez seja mais certo dizê-lo de outro modo, poderá depender da criação de novos objetos em função dos quais essa relação se concretize: fóruns híbridos; organização de aqui- vos e acesso a informação relevante; bases de dados; conjuntos de argumentos inteligíveis que expliquem publicamente os fenómenos educativos. Dito de outro modo, instrumentos que, a partir do conhecimento investigativo, possam ser ge- nerativos da construção de conhecimento pelos outros. Esta é uma área na qual vamos mesmo precisar de trabalhar muito a nossa imaginação. Sobretudo, se não quisermos ficar prisioneiros de velhos acordos tácitos (como os que sobrevivem entre a Administração da Ciência e as CE), nem de novos acordos tácitos, como os que se pode começar a entrever em projetos que reúnem filantropia, academia e elites recorrentemente presentes nas políticas públicas (Viseu & Carvalho, 2018), onde a adoção de uma vocação instrumental para a investigação nos torna mais iguais a outros universos de conhecimento com os quais dificilmente podemos medir ou ser medidos.

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As Ciências da Educação