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Papéis e relações entre tecnologias, crianças e educadores

CAPÍTULO II – ENQUADRAMENTO TEÓRICO

2. Tecnologias informáticas na Educação Pré-Escolar

2.2. Papéis e relações entre tecnologias, crianças e educadores

Para que as tecnologias informáticas tragam as mais valias desejadas ao processo educativo devem ser encaradas não como instrumentos que as crianças utilizam como fim em si mesmas, mas como meios culturais que utilizam com o objectivo de realizar actividades que assumem significado real e que se inserem num contexto integrado e social de aprendizagem, do qual o computador também faz parte (Amante, 2003).

Esta ideia já tinha sido explicitada anteriormente por Cornell (2001) que salientou que o uso das tecnologias informáticas é um meio para atingir um fim, não um fim em si mesmo, fazendo alusão a uma sábia questão que Donald Ely sempre (se) colocou e que transformou em título de um dos seus artigos: A tecnologia é a resposta, mas qual é a pergunta? (Ely, 1997: 102, citado por Cornell, 2001).

Por outras palavras, para que o uso das tecnologias informáticas no Jardim-de-Infância possa constituir um contributo válido para uma prática de qualidade, deve ser entendido não como um mero recurso didáctico, mas como um instrumento cultural que, no dia-a-dia, ganha contornos significativos. É importante abrir horizontes, encarando as tecnologias informáticas como um pedaço de cartão, uma caneta, uma garrafa de plástico, estas são material e ferramenta, não um caminho já preparado e traçado.

Tal utilização educativa das tecnologias informáticas, num contexto ambiental em que o professor, o aluno e as tecnologias coabitam equilibradamente, modificará substancialmente a maneira de aprender e de ensinar e instigará à adopção de inovadores métodos de trabalho e de novas funções e papéis para crianças e educadores – “mudanças que incluem alterações nas relações humanas, mais fortemente ligadas à aprendizagem, (…), relações entre pares com interesses comuns” (Papert, 1997: 42).

Ao utilizar as tecnologias informáticas, o educador deve estar consciente do seu papel e estar preparado para escolher quais os programas adequados, qual a melhor altura para introduzir propostas utilizando o computador, como organizar o espaço e o tempo em redor do computador. Deve-se manter um utilizador informado, crítico e com maior exigência de qualidade em relação aos produtos existentes no mercado. Segundo Ponte (2002), o educador tem de ser um explorador capaz de perceber o que lhe pode interessar, e de aprender, por si só ou em conjunto com os colegas mais próximos, a tirar partido das respectivas potencialidades.

Anteriormente, o educador/professor era o único “transmissor” de conhecimento, devendo passar, agora, a ser o mediador de inúmeras acções nas suas diversas vertentes.

Oliveira (2004: 42) diz que o educador que assume o papel de facilitador “ajuda a criar laços num grupo, contribui para a automotivação de cada estudante, organiza e faculta recursos para a aprendizagem, considera-se a ele próprio também um recurso (perito ou conselheiro) e participa, portanto, no processo colectivo de aprendizagem”.

O aluno também deverá passar de mero receptor a ter uma participação mais activa em todo o processo de aprendizagem. A atitude dos alunos deve ser, como afirma Moderno (1996b: 25) citando Teodoro (1992: 20), “uma atitude permanente de actor, de construtor, de explorador, num perspectiva em que o mais importante é o que o aluno faz com o computador e não o que o computador faz com o aluno”.

Ramos (2005) diz que o aluno tem de ser o princípio e o fim de tudo e o professor não pode ignorar isso. Vecchi & Carmona-Magnaldi (1996) também mencionados por Ramos afirmam que o professor tem que deixar de ser o actor principal da aprendizagem, com o intuito de ajudar a construir um saber, tarefa que se apresenta difícil, na medida em que exige um esquecimento de si próprio, e que tome a posição, não à frente do alunos, não atrás deles, mas com eles, desempenhando o papel de “chefe da orquestra” (236) – “O professor não é o factor principal no processo de aprendizagem, é simples auxiliar, no sentido de que o seu papel consiste em criar uma situação que permita a actividade do aluno” (Moderno, 1992: 167).

Já em 1994, Davis sugeria que os educadores que pretendessem implementar as tecnologias informáticas no contexto educativo deviam guiar a criança através do software,

encorajando a exploração do mesmo. Dizia, ainda, que o papel do educador passa por assegurar que a criança realize as tarefas o mais autonomamente possível e apresentar-se como modelo, utilizando e integrando visivelmente as tecnologias na vivência da sala, sendo crítico na selecção do software apropriado.

O educador deve, assim, assumir um novo estatuto, onde será sempre mais importante a capacidade do aluno pensar e expressar claramente as suas ideias, solucionar problemas e tomar decisões em vez da memorização de factos ou da repetição de respostas certas tão característico do modelo de escola tradicional em que fomos educados (Santos, 2001). Já em 1992, Ponte afirmava que, substituindo o saber enciclopédico do aluno, surgia um novo saber que englobava a capacidade de procurar e seleccionar informação, explorar hipóteses, simular situações e investigá-las, inovando e produzindo coisas novas. A mesma ideia é veiculada por Moderno (1996b: 16) que afirma que “o conhecimento em si mesmo, disponível nos bancos de dados e bibliotecas, será menos importante do que a capacidade de gerir redes de comunicação e encontrar, rapidamente, a informação”.

Posteriormente, Oliveira (2004: 52) reforça que, além da sociedade, também os conhecimentos disponíveis estão em mutação, por isso, o “mundo do trabalho exige profissionais flexíveis com elevadas competências de auto-aprendizagem, capacidade de adaptação e espírito empreendedor colaborativo”.

Também Paraskeva defende que “a grande preocupação não está no conhecimento que se difunde [existe actualmente tanta informação no globo que é impossível a criança aprender tudo] mas sim em criar condições à criança, através da aprendizagem de determinadas destrezas para que esta possa construir os seus próprios utensílios para a apreensão do conhecimento necessário” (Paraskeva in Paraskeva & Oliveira (coord), 2006: 80).

Na mesma linha vai Pereira (2007: 172) ao dizer que “é fundamental adquirir a aptidão de encontrar o conhecimento essencial e as competências básicas para um mundo constantemente em mudança” e posteriormente que “a rápida taxa de crescimento e desactualização do conhecimento faz com que seja impossível aos indivíduos adquirirem, numa fase inicial da sua vida, conhecimentos que lhes permitam ser eficientes durante as suas vidas activas, tornando-se clara a necessidade de, por um lado, se insistir não tanto na aquisição de conhecimentos, mas na dotação de capacidades para os vir a construir (aprender a aprender) e, por outro, na educação contínua, ao longo da vida, como tão importante como a educação inicial, que prepara para a vida activa” (id: 491).

Também é importante referir que nunca se podem perder de vista os objectivos da Educação Pré-Escolar que, globalmente, apontam para a promoção de formas de aprendizagem que estimulem na criança a capacidade de pesquisa, o desenvolvimento do seu espírito crítico,

que lhe permite resolver pequenos problemas. Assim, o papel do educador é facultar às crianças um melhor acesso a experiências e vivências, e à criação de espaços próprios que facultem o contacto com o computador e outros recursos e a exploração dos mesmos, para possibilitar também o desenvolvimento de capacidades informáticas.

O educador deve contribuir para a aquisição da capacidade de criar e pensar, por parte das crianças, tendo em conta que o desenvolvimento de tais habilidades é um processo longo que se deve iniciar desde os primeiros anos de vida. Segundo Ponte (1990) citado em Ramos (2005) “o computador é, essencialmente, um instrumento que cria novas possibilidades de trabalho e novas responsabilidades ao professor… a necessidade de actualização e formação permanente do professor… que passa a ter de assumir um processo de aprendizagem contínua. Tal como os alunos, tem de estar sempre a aprender” (106-107). O professor é, assim, visto como um profissional do ensino – no que diz respeito à sua actividade com os alunos – e como um profissional da aprendizagem – no que se refere à sua própria educação (Teodoro, 1991).

Nas actividades educacionalmente mais promissoras é toda a relação professor/aluno que é afectada pela presença do computador… o professor passa a ter de fazer não só um esforço permanente de aprendizagem, mas de aprendizagem com o aluno. Professor e aluno passam a ser companheiros, ainda que com funções e bases de experiência diferentes (Ramos 2005).

Na sua comunicação acerca do computador no ensino e aprendizagem da língua, Barros (1993) diz que ao introduzir a informática na Educação Pré-Escolar, o educador deverá saber escolher programas que realizem o que uma criança quer e é capaz de aprender, condição essencial para a entrada do computador no seu mundo.

A troca de informação entre as crianças é fundamental, uma vez que traz benefícios para a aprendizagem. O educador/professor deixa de ser o detentor de todo o saber, e passa a ser o educador-educando, expressão utilizada por Paulo Freire.

O educador tem um papel de guia, de conselheiro, de parceiro na procura de informação e da verdade, contribuindo para o aumento da participação cada vez mais activa da criança.

No caso concreto de crianças de 3 e 4 anos, Haugland (2000) refere que já se encontram preparadas para utilizar os computadores e, cada vez mais cedo, os educadores de infância vêem os computadores como uma actividade válida para este nível de ensino. Fazendo alusão ao grupo etário 3/4 anos, refere que o papel do educador deve ser o de observador atento enquanto a criança trabalha no computador. Por vezes um pequeno incentivo, uma indicação mínima permitem à criança avançar com sucesso na realização da tarefa.

Segundo a autora supra citada (id) a forma de introduzir e utilizar as tecnologias, nomeadamente o computador, com crianças de 3/4 anos deve ser diferente do que sucede com crianças no final do Pré-Escolar ou início do 1º ciclo. As crianças de 3/4 anos necessitam de mais tempo em relação às mais velhas, para experimentar e explorar a tecnologia. Esta autora propõe que o trabalho no computador seja realizado em grupo, permitindo à criança a aquisição de competências como a responsabilidade, capacidade de resolução de problemas e cooperação.

Também o educador pode beneficiar com a utilização das tecnologias informáticas em variadas situações quer relacionadas com a resolução de problemas burocráticos e gestão dos centros educativos quer relacionadas com a prática docente (planificação de actividades, concepção de fichas, etc.).