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Para onde foram os gritos? Desdobramentos dos grupos políticos de Junho

Depois do período de intensa efervescência política das Manifestações de Junho (MJ) e manifestações ocorrendo ainda em Julho171, surgiram alguns questionamentos sobre seus resultados. O que aconteceu com os grupos/movimentos que atuaram durante essas Manifestações?

Semelhante ao que ocorreu no Brasil, o Junho ludovicense não provocou a revolução. No entanto, ofereceu um “sopro de vida” ao processo das lutas sociais, rearticulando-as de modo conservador ou progressista, já que no modo de produção capitalista as classes dominantes e dominadas organizam-se em lutas que atravessam o Estado, e o resultado sempre dependerá da correlação de forças empreendida.

Devido à heterogeneidade de participantes, entidades, grupos, classes sociais, diversidade da pauta e disputas, as manifestações terminaram dispersas em São Luís, assim como em todo país. Com o intuito de entender esse processo político, na tentativa de manter “acessa a fagulha” dessa articulação política e direcioná-la mais progressivamente, alguns militantes organizaram momentos de reflexão e proposições, como o “#Vemprodebate – debate sobre as manifestações em Slz” e a “Assembleia Popular do Maranhão (APMA)” na Figura 16.

171 Apêndice B

174 Fonte: Páginas no Facebook dos respectivos eventos (2013)

O primeiro momento, realizado em 02 de julho (terça-feira) na UFMA, surgiu da necessidade “de se discutir as questões impostas pelos vários protestos que se espalharam pelo país” (Descrição do evento no Facebook). Participaram os professores universitários Flávio Reis (Ciências Sociais-UFMA), José Uchoa (Letras-UFMA) e Luiz Eduardo (História- UEMA); manifestantes do “Acorda Maranhão”, do “#VEMPRARUA! São Luís”, membros da gestão do DCE “Ninguém pode nos calar” e Hertz Dias do movimento Quilombo Urbano.

A APMA tinha como objetivo imprimir uma pauta e conteúdos populares e de esquerda aos protestos que estavam ocorrendo. Ficou claro que a dispersão das pautas diluía o conteúdo das reivindicações abrindo caminho para que a direita se apropriasse do movimento (Entrevistado B). A descrição na página no Facebook elenca a necessidade de aprofundamento e amadurecimento do processo iniciado em Junho:

Mas o processo democrático precisa ser aprofundado: a necessidade de união dos clamores da sociedade civil é emergencial. Só assim, fomentando o diálogo interno entre a população acerca dos problemas que a oprimem, será possível criar e manter um poder popular que possa efetivar suas demandas frente ao poder público. É com esse intuito que se convida os movimentos sociais, tanto os tradicionais, quanto os novos- advindos das redes sociais-, a sociedade civil organizada, e cidadãos em geral à uma ASSEMBLEIA POPULAR! (PÁGINA EVENTO NO FACEBOOK DA APMA172, 2013).

Essa ideia surge, então, da aproximação dos grupos e militantes que se encontraram nas Manifestações de Junho e que possuíam uma visão política à esquerda. Estiveram presentes nas assembleias juventude de partidos (PT, PSTU, PCdoB, PSOL), advogados populares, integrantes do Acorda Maranhão, anarquistas, e “independentes” que não se identificavam com nenhum dos demais coletivos presentes.

172 Disponível em: < https://www.facebook.com/events/468853759873492/>

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As assembleias eram convocadas173 semanalmente, para as tardes de sábado na escadaria da praça Nauro Machado no Centro Histórico de São Luís. Ocorreram APMAs também na Praça da Ressurreição no Anjo da Guarda, onde aconteceu formação política sobre regularização fundiária; e na Vila Eugênio no município metropolitano Paço do Lumiar, somando-se às várias famílias ameaçadas de despejo nessa localidade.

A dinâmica adotada iniciava com uma avaliação e debate sobre o contexto local e nacional para, em seguida, deliberar a atuação diante desses contextos. De acordo com participante da APMA entrevistado, as decisões eram balizadas por intenso debate e estimulavam o exercício da democracia direta, ou seja, as deliberações primavam pelo que se convencionou, a partir de junho, chamar de horizontalidade, no qual não se destacavam lideranças, mas todos tinham igual direito de fala e de apresentar proposições, que restavam aprovadas somente após serem crivadas pelo debate e submetidas ao voto. Esse era o método, que tomava bastante tempo, mas que assegurava a legitimidade das decisões. Enfim, um exercício de democracia direta (Entrevistado F).

Nessas reuniões, que mantiveram vivas as características das MJ no modo de organização e condução dos trabalhos, construíram e aprovaram coletivamente uma Carta de princípios da Assembleia Popular com 13 (treze) pontos: Apresentação; Organização; Democracia; Orçamento e Combate à corrupção; Reforma Urbana; Desmilitarização da Polícia, Segurança Pública e Descriminalização dos Movimentos Sociais; Mobilidade Urbana, Transporte e Tarifa Zero; Saúde e Saneamento Básico; Educação Pública; Cultura, Esporte e Lazer; Democratização dos Meios de Comunicação; Combate ao machismo, ao racismo, ao genocídio indígena, à xenofobia, à homofobia e a intolerância religiosa; Fora Sarney! Fora Oligarquia. Os pontos aprovados na Carta também estão imbuídos do espírito de junho, pois sintetizam objetivamente as reivindicações ressaltadas nas ruas durante os protestos.

Concretamente, além da elaboração da Carta de Princípios da APMA, os participantes dessas reuniões compuseram a Ocupação da Câmara contribuindo com uma pauta consistente que reivindicava, inclusive, transparência das contas públicas da Câmara Municipal. Ressalta-se que a reunião extraordinária da Assembleia Popular no dia 28 de agosto (quarta-feira) definiu um posicionamento de luta frente à Câmara dos Vereadores, na

173 A APMA se reuniu durante todos os sábados do mês de julho (dias 06, 13, 20, 27) e no primeiro sábado do

mês de agosto (dias 10,17 e 28). No site da Assembléia, aparecem convocatórias em 2014, dias 09 e 11 de janeiro. Ainda em janeiro no dia 22 aconteceu a aula pública intitulada “Oligarquia Sarney e Intervenção Federal”, ministrada pelo professor universitário da UFMA Wagner Cabral, organizada pela APMA e Movimento Sebo No Chão.

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Audiência Pública de Licitação do Transporte Público, para a Construção de um projeto popular de passe-livre e tarifa zero. Essas deliberações foram utilizadas na Audiência Pública como resultado da Ocupação na Câmara.

A referida ocupação é um capítulo à parte dos desdobramentos das manifestações de junho. A Ocupação foi marcada e divulgada em uma página evento no Facebook que, estrategicamente, convocava para a “1ª ocupação na porta da prefeitura de São Luís”. Desse modo, “as forças de segurança e repressão aguardavam então a manifestação para outro local, deixando o Parlamento Municipal “desguarnecido” (sem uma força ostensiva muito grande a impedir que se adentrasse em suas instalações)” (CASTRO; ROGENS, 2014, p.184). De acordo com os números divulgados pelos participantes, a Ocupação que durou uma semana (23 a 29 de julho) foi construída por aproximadamente cento e vinte ocupantes que representavam dezesseis comunidades e vinte e uma entidades e movimentos sociais organizados, como moradores da Vila da Associação de Produtores Agrícolas da Cidade Operária (APACO174) -que formavam o movimento “Salve Vila Apaco”, movimento “Quilombo Urbano”, pessoas que participaram do “Acorda Maranhão” e “#VEMPRARUA! São Luís”, integrantes do DCE-UFMA, do MPL e participantes da APMA.

Durante os sete dias de Ocupação, foram realizadas diversas atividades, como plenárias, oficinas de cartazes, sessões de cinema “cineocupação”, roda de diálogos, assembleias, grafitagem, aulas públicas (democratização das mídias, saúde pública, passe livre) e atividades culturais (apresentação de bandas, recital de poesias, apresentação de peças de teatro).

No dia 26 de julho (sexta-feira) o “coletivo de Ocupação à Câmara Municipal de São Luís” entregou aos vereadores uma pauta de reivindicação. O documento foi produzido pelos manifestantes em decisão unânime da plenária, realizada no dia anterior (25 de julho) à noite, e apresentava quatro encaminhamentos: 1) convocação de uma Sessão Extraordinária com os vereadores para o dia 29 de julho às 09 horas, para discutir a pauta de reivindicações; 2) que a pauta de reivindicação abordada na sessão extraordinária contemplasse três eixos: transporte e mobilidade urbana, regularização fundiária e transparência das contas públicas da Câmara

174A Vila Apaco localizada na Cidade Operária, foi prejudicada pelas fortes chuvas de 2013. Desse modo, 135

famílias formadas por 340 pessoas (sendo 140 crianças) perderam suas casas e passaram a morar em barracas organizadas pela Defesa Civil. Sem emprego, saneamento básico e água potável, as famílias ficaram vulneráveis a doenças, homicídios, etc. recebendo apenas ajuda de ações voluntárias que apenas suavizaram a situação. Nesse contexto é que os moradores da Vila Apaco participam ativamente da ocupação na Câmara, reivindicando ações para sua grave situação.

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Municipal; 3) que a sessão fosse organizada no formato de uma assembleia popular; 4) que fosse garantido que não haveria nenhuma forma de reintegração de posse judicial ou extrajudicialmente.

Nesse mesmo dia, a Procuradoria Geral da Câmara Municipal protocolou junto ao órgão competente um pedido de reintegração de posse. Esse pedido foi julgado pelo juiz Carlos Henrique Rodrigues Veloso da 2ª vara da Fazenda Pública, que emitiu sua decisão no dia 29 de julho (segunda-feira) - horas antes de a Câmara Municipal ser desocupada, após acordo entre manifestantes e vereadores. A decisão foi memorável, a favor dos manifestantes, pois não determinava a imediata reintegração do prédio com uso do aparato policial e reconhecia a legitimidade da ocupação. O juiz determinou ainda uma inspeção judicial nas dependências da Câmara e uma audiência de conciliação com representantes do legislativo municipal e dos movimentos sociais:

há que se fazer a distinção entre invasão, alegada pela autora, e as ocupações perpetradas pela população pelo país afora nos últimos dias, não só em virtude do animus de permanência e da situação de violência geralmente ocorrida no primeiro caso, como também, respeitante a intencionalidade, observando-se que estamos tratando de significados no campo social. Segundo relata a própria autora, as pessoas que se encontram no interior da Câmara Municipal estão reivindicando pretensos direitos que acreditam ser delas e da sociedade, o que se constitui um movimento de interface objetivando serem ouvidos e atendidos em direitos afetos à sociedade. E, salvo melhor juízo, procuraram o local e a instituição adequados para ouvir os reclamos dos munícipes, tendo em vista que os vereadores são os mais próximos e legítimos representantes dos cidadãos diante dos demais Poderes, e os legitimados e responsáveis pela edição de leis capazes de atender aos anseios sociais. A inicial não relata violências físicas ou ao patrimônio municipal, apenas manifestação pacífica e palavras de ordem como "dali não sairão até que sejam atendidas todas suas reivindicações". Diante desse quadro, parece-me que o caso é de ocupação. E o movimento é político, de pressão social do legítimo patrão dos políticos: a população e a sociedade, as quais, por força da Constituição Federal, têm legítimos direitos de manifestação e exigência de compromisso social, de ética, moralidade e probidade, de respeito e eficiência, de publicidade e prestação de contas, dentre outros, o que, infelizmente, a população não está conseguindo vislumbrar na classe política, isso tudo sem negar-lhe a importância para o estado democrático de direito. Neste caso, deve-se ter cuidado com a judicialização da política e com as consequências dos atos judiciais relativamente ao resultado dos anseios da sociedade, devendo-se escolher o caminho primoroso da negociação, do equilíbrio e do respeito mútuo entre os interesses dos mandantes, dos mandatários e da sociedade, sem esquecer que as instituições devem ser preservadas, visto serem donatárias da ordem social ... (MARANHÃO. 2ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA. AÇÃO ORDINÁRIA, 29 de julho de 2013)

Os manifestantes souberam dessa decisão judicial pelos advogados populares, quando realizavam um ato no Terminal da Integração para encerramento da ocupação. Pondera-se que, embora a decisão judicial tenha sido favorável aos manifestantes, não contraria a lógica do Estado burguês de Direito de organizar as classes dominantes pois, no

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exercício de sua relativa autonomia, pode conceder legitimidade a um ato político das classes populares - quando conveniente.

Um exemplo dessa conveniente estratégia de administração de conflitos foi dado pelo vereador Astro de Ogum175. No início das negociações, o vereador impôs-se autoritariamente, chegando a dizer a um militante “não fui eleito com seu voto”. Porém, no final da ocupação, já havia optado pela estratégia da “relativa concessão”, apresentada na seguinte nota:

Os entendimentos mantidos pela Mesa Diretora da Casa, na mesma data, aceleraram as providências adotadas pela Prefeitura de São Luís: a via principal de acesso à Vila Apaco está funcionando normalmente e o canal de drenagem em fase de construção, como medidas emergenciais, além de outras que se fazem necessárias. -A Mesa Diretora formaliza, neste ato, a realização de uma Sessão Especial, no dia 07 de agosto, às 10h, com uma Comissão Representativa dos ocupantes, no total de dez pessoas, para discutir a pauta de reivindicações, permitindo o acesso à Mesa Diretora, de três pessoas da comissão, mesmo número de vereadores na composição da Mesa. -A Mesa Diretora formalizará convite ao prefeito Edivaldo Holanda Junior e Secretários titulares da SEMOSP, SMTT e outros, caso haja necessidade. -A Mesa Diretora propõe que os ocupantes constituam uma Comissão de Acompanhamento das suas proposições junto à Câmara de São Luís e à Prefeitura de São Luís, ou quais outros órgãos públicos a quem os assuntos competirem [...] Até hoje, a ocupação foi pacífica e não se verificou nenhum dano às instalações da Casa e nenhum ato de violência contra os ocupantes foi praticado.

A audiência pública “Reivindicação de Movimentos Sociais organizados” resultante da Ocupação na Câmara ocorreu no dia 07 de agosto (quarta-feira). A sessão tinha como intenção discutir três temas: mobilidade urbana (transporte público), regularização fundiária e transparência nas contas públicas do legislativo municipal e dez participantes da Ocupação teriam direito a fala. Embora a proposta dos manifestantes fosse que a Assembleia se constituísse como uma Assembleia Popular, o que imperou foi a habitual formalidade e o aparente desconforto dos vereadores que se sentiram acuados pelos discursos dos manifestantes. A sessão foi encerrada antes do tempo, devido intenso tumulto entre manifestantes e vereadores, sem encaminhamentos da pauta. Abaixo, alguns trechos de falas176 de manifestantes durante a sessão:

175 Astro de Ogum, que neste período estava como presidente interino substituindo o presidente da Casa Isaías

Pereirinha afastado, conduziu as negociações com os manifestantes juntamente com os vereadores Fábio Câmara (PMDB), Ivaldo Rodrigues, (PDT), Ricardo Diniz (PHS), Professor Lisboa (PCdoB) e Marlon Garcia (PTdoB).

176 Trechos retirados das Notas Taquigráficas da Câmara Municipal de Vereadores referente à Audiência Pública

“Reivindicações de Movimentos Sociais Organizados”. As notas taquigráficas foram adquiridas através de solicitação à Câmara de Vereadores de São Luís por meio de dois ofícios protocolados, respectivamente, em 20 de maio de 2015 e em 24 de junho de 2015 - OF Nº 20/2015- PPGPP.

179 [...] nós do coletivo de Ocupação da Câmara, propomos que seja criada uma TV Câmara online que transmita em tempo real as sessões da Câmara, uma ouvidoria digital, a criação de comissões compostas por membros das Universidade Públicas, a Câmara e a Sociedade Civil organizada para discutir projetos sobre temas da cidade, sessões legislativas com participação popular para tratar especificamente cada uma das três pautas de hoje e que seja elaborado juntamente com a sociedade civil organizada um Projeto de Lei de tribuna popular já existente em muitos municípios brasileiros e de outros países (CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO LUÍS, 2013) [...] nós do DCE da UFMA e nós da ANEL também assim como muitos coletivos e muitos movimentos sociais construímos as grandes atividades que sacudiram São Luís como vocês já sabem, participamos ativamente e também além da abertura de planilhas das empresas de transportes públicos nós colocamos aqui para a Câmara a necessidade da criação de um projeto de passe livre [...] São Luís precisa começar a estudar possibilidades de implementar um projeto de passe livre, é preciso combater essa estrutura excludente, onde quem não tem R$2,10, não tem o direito de vim ao centro, não tem direito de ir à praia ...(CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO LUÍS,2013)

Algumas das reivindicações dos manifestantes de Junho e dos ocupantes da Câmara só foram atendidas no final de 2015 e início de 2016: a criação da Tribuna Popular; alteração do Regimento Interno da Câmara Municipal estabelecendo maior participação; a criação de um site institucional que solucionasse a falta de informação e transparência sobre as atividades do legislativo municipal aos cidadãos. Até o momento, as ações continuam estabelecidas apenas legalmente, mas não são postas em prática.

Os vereadores também foram peça chave no processo da licitação do sistema de transporte, que visava dar uma resposta sobre a caótica situação do transporte coletivo na cidade. A solicitação de mais transparência nas contas da Câmara ainda não foi atendida.

No Brasil e São Luís, o controverso resultado das MJ para as lutas populares evidencia a necessidade de (re)ocupar as ruas, retomar os trabalhos de base e as discussões nas igrejas, ruas e “redes”. Como diz Frei Betto (2015, s.n): “Não dá para ser de esquerda sem 'sujar' os sapatos lá onde o povo vive, luta, sofre, alegra-se e celebra suas crenças e vitórias. Teoria sem prática é o jogo da direita [...]. É mantendo o vínculo com movimentos sociais que encontramos o gás que nos alimenta nessa luta”.

180 CONSIDERAÇÕES FINAIS

As crises econômicas são inerentes ao sistema capitalista e, diante delas, as lutas sociais acirram-se, exigindo que a classe trabalhadora se organize em grupos ou movimentos sociais para realizar protestos de resistência a esse cenário adverso. A partir dessa premissa, no contexto da mais recente crise do Neoliberalismo (2008), foram analisadas as Manifestações de Junho de 2013 no Brasil e em São Luís, atentando para o dinamismo das lutas sociais (de classe) que atravessam o Estado e os aspectos ideológicos que as compõem.

Observou-se que, assim como aconteceu nos protestos globais (Primavera Árabe no Oriente Médio, o Occupy Wall Street nos Estados Unidos, os Indignados na Europa) anunciados como revolucionários no contexto da recente crise, em 2013 quando milhares ocuparam as ruas e praças de todo o Brasil, incluindo as ludovicenses, propagandeou-se que estava em curso um iminente processo de transformação consistente. A pauta inicialmente progressista denunciava a negação dos direitos básicos e necessários ao cotidiano – como o “de ir e vir” ameaçado nas grandes cidades pelo elevado valor de passagens do transporte público – e parecia indicar um processo de ascensão das lutas sociais progressistas, que não teria volta.

Paralelamente, a negação ao sistema representativo também desfilava nas ruas, desconhecendo partidos políticos, sindicatos e instituições representativas. Gradativamente, essas críticas voltaram-se apenas às organizações de esquerda e ao governo federal petista e, conforme as manifestações prosseguiram, as bandeiras anticorrupção e nacionalistas “ganharam corpo”. O fortalecimento dessas bandeiras e a adesão de várias classes sociais, com diferentes interesses, foram apagando o pensamento progressista em marcha, aplacando o caráter popular construído inicialmente pelo MPL, pelo MTST e pelo auxílio de alguns partidos de esquerda.

Diante desse panorama, constatou-se que os frutos das Manifestações de Junho em todo o Brasil caminharam para uma polarização ideológica. Ainda que emergissem coletivos de caráter progressista que promoveram debates temáticos, como a reforma política, ocupações de espaços públicos e outras atividades, a perspectiva conservadora da direita prevaleceu na correlação de forças. Assumiu o debate da reforma política com uma concepção pontual e normativa, empunhando a bandeira anticorrupção (questão transitável em todas as

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classes) e arregimentando uma multidão que não percebeu os reais interesses dessas manifestações: a defesa do status quo das classes dominantes.

Ressalta-se que a ascensão da direita no período posterior às manifestações foi possível devido ao contexto político vigente desde os anos 1990, com a implantação do neoliberalismo no Brasil. A consolidação das políticas neoliberais fragilizou a organização das classes populares, dificultando até mesmo a visualização de um projeto societal alternativo ao capitalismo. Por isso, durante o período das Manifestações de Junho de 2013, a consistência e a possibilidade de enfrentamento dos movimentos sociais e sindicatos encontravam-se enfraquecidas, a ponto de as classes populares perderem a capacidade de manter o direcionamento inicial das manifestações.

Em São Luís a conjuntura não era diferente: além das mobilizações de categorias de trabalhadores por melhores condições trabalhistas e coletivos que se erigiam em resistência a episódios pontuais, não existia uma clara articulação de movimentos sociais e sindicatos capaz de organizar a multidão às ruas ou expressar qualquer tendência revolucionária (anticapitalista/antineoliberal). Observa-se que essas manifestações permaneceram mais no âmbito do reformismo político/moral, com questionamento de algumas medidas neoliberais e figuras políticas.

A maioria dos protestos na capital maranhense (principalmente nas áreas centrais da cidade) foram iniciados pela classe média e inspirados no contexto da última fase das