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EXPERIÊNCIAS E LUTAS PELA GESTÃO DEMOCRÁTICA DA EDUCAÇÃO NAS ESCOLAS E SISTEMAS DE ENSINO PÚBLICOS

2.2 Eixos de lutas em torno da gestão democrática da educação pública

2.2.3 Participação nos conselhos escolares

Em relação aos embates e divergências em torno da participação, foram identificadas algumas particularidades e optou-se por analisar duas dimensões. a) participação da comunidade na gestão; e b) participação versus legitimação.

Os Conselhos de Escola foram apreendidos no estudo de Oliveira (2005) como um organismo de gestão da unidade, composto por representantes da direção, dos professores, dos funcionários, dos alunos, dos pais e das organizações do bairro. Desse modo, base de democratização da gestão da unidade como sujeito do processo educacional, e o centro permanente de debates e articulação de todas as questões que perpassam a escola.

O Conselho de Escola se propõe a propiciar a mais ampla participação da comunidade, reconhecendo o seu direito e seu dever, garantindo a democracia plena da gestão financeira da unidade, naquilo em que ela tem autonomia em relação à receita e despesa. Deveria contribuir para a qualidade do ensino ministrado na unidade; integrar todos os segmentos da unidade na discussão pedagógica e metodológica; integrar a escola no contexto social, econômico, cultural em sua área de abrangência; levar a unidade a interagir em todos os acontecimentos da relevância que ocorreram ou que venham a ocorrer em sua área de abrangência; e ser uma das instâncias da construção da cidadania e gestão democrática da escola. [...] O Conselho de Escola, ainda, elaboraria, conjuntamente com a equipe de educadores, o calendário escolar e projeto pedagógico da unidade, observadas as normas oficiais; aprecia os relatórios anuais da Unidade; e acompanha o desenvolvimento do projeto pedagógico. (OLIVEIRA, 2005, p. 215).

A autora aponta a afirmação dos conselhos escolares como proposição da gestão do Projeto Escola Viva. Contudo, a pesquisa empírica demonstra outra dimensão.

Destaca-se que em quase todas as falas coletadas [...] o papel do Conselho de Escola enquanto conselho gestor é minimizado, anulado e desqualificado

como instância manipulável pelas direções, bem como as reuniões de TDC ou de Avaliação do Projeto Pedagógico (AVP) são, em geral, referenciadas como reuniões conduzidas pela equipe gestora da Unidade Educacional, sem a participação dos professores.

Por outro lado, como veremos, os diretores reclamam de sua interferência nas decisões, sendo poucas as referências as quais reconhecem o Conselho de Escola como um componente participativo e complementar das atividades da gestão escolar, ou mesmo um caminho para torná-la coletiva. (OLIVEIRA, 2005, p. 364)

Na experiência de Campinas, o Conselho das Escolas Municipais, formado por representantes dos conselhos de cada unidade escolar, eleito por seus pares, atua no planejamento dos trabalhos de cada ano letivo, reunindo-se a cada dois meses para debater questões como a elaboração do orçamento da Educação, discussão da política educacional, garantia e permanência com qualidade do aluno na rede, incluindo a alfabetização do adulto.

Entretanto, na experiência de Aracaju, encontrou-se referência à exclusão da participação da comunidade na gestão da escola.

Num dos eventos que participou foi responsável por uma perda fundamental: quando os participantes do Seminário sobre gestão democrática decidiram favoravelmente sobre a inclusão de pais e lideranças comunitárias nos Conselhos Escolares, seu presidente influenciou no sentido contrário e conseguiu reverter aquela posição, gerando inclusive um mal-estar com os representantes da sociedade civil organizada. (BEZERRA, 2007, p. 177).

Na experiência estudada por Souza (2006), observaram-se os processos de implementação do princípio da autonomia sob uma matriz de orientação neoliberal na rede pública de Recife. O autor defende que, em escolas localizadas em comunidades que historicamente são reconhecidas por sua capacidade de organização, mobilização e participação popular ocorrem um movimento de autonomia que escapa do modelo outorgado pelos órgãos superiores de gerenciamento da rede escolar em virtude de os atores sociais de estas escolas possuírem anseios e concepções de autonomia da escola que resultem de processos participativos. O autor descreve o histórico de lutas da comunidade do bairro recifense Brasília Teimosa e o relaciona ao envolvimento da comunidade na gestão da escola e à qualidade do ensino desenvolvido.

Por outro lado, o estudo de Santos (2004) também demonstrou o envolvimento do coletivo de professores na organização e implementação de uma gestão colegiada no Colégio Universitário de São Luiz (MA). A gestão colegiada foi construída mediante a elaboração de seu projeto político-pedagógico, por meio de planejamento participativo e de processos

coletivos de tomada decisão. Entre os resultados desse processo de gestão democrática, Santos (2004, p.151) aponta ainda “a participação de vários segmentos da coletividade escolar, aproximação dos pais da escola, processo eleitoral, criação e funcionamento de conselhos de escola, autonomia dos membros do conselho.”

Contudo, a autora aponta também debilidades a serem superadas, tais como as posturas corporativas e a predominância do segmento docente no conselho escolar. Desse modo, a autora propõe o estabelecimento do princípio da paridade entre os segmentos para composição do conselho.

Além da análise referente à participação da comunidade escolar na gestão da escola, embates se desenvolveram na questão participação versus legitimação e estão presentes nas teses de Cabral Neto e Bezerra, pois participar do processo significa legitimá-lo. Essas lutas, confrontos e dissensos foram levados a cabo pelo sindicato dos professores, em um dos depoimentos apresentados pela autora,

Lamentavelmente o Sindicato dos Profissionais de Ensino do Município de Aracaju (Sindipema), apesar de muito atuante nas reinvidicações salariais, na defesa dos direitos docentes, de melhores condições de trabalho e nas greves, manteve-se praticamente à margem do processo de construção da Proposta Curricular propriamente dita; pareceu não perceber sua importância e também não querer contribuir, com receio de fortalecer uma administração municipal cuja política salarial repudiava com tanta veemência. Sua participação limitou-se à abertura de alguns eventos, através de representação. (BEZERRA, 2007, p. 177).

A tese de Cabral Neto também aponta para embates relacionados à inclusão da participação na agenda do governo na experiência do Projeto Nordeste, decorrente de uma estratégia política de legitimação para a execução do projeto. Nesse processo de concessão de participação nas políticas públicas versus busca de legitimação das ações governamentais, a sociedade civil brasileira, mais organizada, passou a requerer mais participação nas decisões e ações governamentais.

É fundamental acentuar que o planejamento participativo não pode esconder sua tessitura típica de proposta de intervenção na realidade. Todo planejamento significa intervenção, pois parte da convicção de que é possível direcionar o curso da história, pelo menos em parte. O que diferencia o planejamento participativo de outros não é uma pretensa supressão da intervenção, trata de reduzi-la, compondo uma cena de atores produtivos na qual a discriminação entre sujeitos e objetos diminua ao mínimo possível. Planejamento participativo, em termos realistas e dialéticos, é aquele que democratiza a intervenção. (CABRAL NETO, 1997, p. 80).

Para o autor, o Estado adiantou-se e concedeu a participação para não perder o controle da situação, neste sentido, para o autor, participar pode significar legitimar.

Assim, o estudo da participação realizado por Lima (2001) demonstra o amplo espectro sob o qual as estratégias de participação podem ser compreendidas. O autor apresenta uma tipologia da participação e da não-participação na escola43. Preliminarmente, distingue o autor a participação do tipo consagrada e a do tipo decretada da participação praticada que, no caso em tela, permite compreender a situação descrita no Projeto Nordeste apresentada por Cabral Neto em que ocorre uma concessão de participação nas políticas públicas.

As experiências analisadas reforçam um movimento dos sujeitos sociais em termos de práticas, de convicções e propostas que acreditam, demonstrando assim, uma disposição em defender seus valores, conquistas e utopias.

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