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Capítulo IV – Trabalho Pedagógico na práxis: movimentos de transformação?

4.2 Participação da classe trabalhadora no Trabalho Pedagógico

A participação da classe trabalhadora no TP é central para o desenvolvimento do TP crítico, uma vez que leva em consideração os saberes e as percepções dos trabalhadores- estudantes da EJA EPT na concretude e na consolidação da política (MARASCHIN, 2019). A partir desse pressuposto, foi investigado, no grupo focal com os professores, como estes observam a participação da classe trabalhadora nas decisões da EJA EPT. As respostas foram:

Part. 1: Na organização a gente não teve esses momentos de discussão. Pelo menos desde que eu participo, desse trabalhador participar da construção do curso. Part. 2: Não há participação! Part. 3: Não, não há participação! Part. 4: Não há participação estava pensando, mas, não tem, não há. Part. 5: Na verdade é ao contrário a gente pensa no que os trabalhadores precisam né? Part. 6: No que a gente acha que eles precisam né? Part. 7: No que o comércio, no que a comunidade precisa, que tipo de profissional e, aí, forma-se esse tipo (GFP, 12/12/2018, grifos nosso).

Destaca-se nos discursos dos professores o reconhecimento unânime de que a classe trabalhadora não participa das decisões da EJA EPT, evidenciando, inclusive, de que são eles (os professores) que tomam as decisões em nome dessa classe. Ora, se a classe trabalhadora não tem espaço nas agendas institucional, curricular e estrutural do curso, como será possível aproximar-se de suas realidades? Restará a ela somente o lugar de “apreendente” no processo de produção do conhecimento? Nesse sentido, o professor Miguel Arroyo (2017, p. 133-134) aponta as implicações de se reconhecer a participação da classe trabalhadora nesse processo e assinala:

Dar centralidade às formas de produção do conhecimento e à diversidade de produtores obriga a desmascarar as certezas, os absolutismos que ainda imperam sobre os conhecimentos dos currículos de cada disciplina, e também a desmascarar os sujeitos de sua produção e seleção. Sobretudo, desmascarar as certezas da objetividade, do realismo, da centralidade e do cientificismo como os quais estão impregnados os conhecimentos e que são passados como dogmas aos docentes e aos educandos. O caráter impositivo dos currículos e da docência está nessas certezas, e não tanto na relação pessoal com os alunos. Se há autoritarismo na docência, ele vem da própria visão que se apoderou dos conhecimentos curriculares que tem de transmitir, como a síntese de todo o conhecimento socialmente produzido.

Entretanto, a superação desses paradigmas enraizados nos currículos da Educação Básica em geral e, em específico da EJA EPT, ainda não foi alcançada, mesmo considerando os esforços na implementação do currículo integrado, como a proposta nos documentos norteadores, a exemplo do PPC (2014, p. 15-16, grifos nosso):

A Política de Assistência Estudantil abrange todas as unidades do IF Farroupilha e tem entre os seus objetivos: promover o acesso e permanência na perspectiva da inclusão social e da democratização do ensino; assegurar aos estudantes igualdade de oportunidades no exercício de suas atividades curriculares; promover e ampliar a formação integral dos estudantes, estimulando a criatividade, a reflexão crítica, as atividades e os intercâmbios de caráter cultural, artístico, científico e tecnológico; bem como estimular a participação dos educandos, por meio de suas representações, no processo de gestão democrática. [...] Para o desenvolvimento dessas ações, cada Câmpus do Instituto Federal Farroupilha possui em sua estrutura organizacional uma Coordenação de Assistência Estudantil (CAE), que, juntamente com uma equipe especializada de profissionais e de forma articulada com os demais setores da Instituição, trata dos assuntos relacionados ao acesso, permanência, sucesso e participação dos alunos no espaço escolar.

Segundo relatado pelos professores, o único espaço que admite, efetivamente, a participação da classe trabalhadora nas decisões da EJA EPT, seria durante a construção do PDI, que acontece de quatro em quatro anos. Essa constatação revela novo descompasso entre a participação dos estudantes na “gestão democrática”, prevista nos documentos oficiais e a realidade encontrada. Estarão certos os conceitos de gestão democrática desenvolvidos? O trabalho da equipe da CAE não fica fragilizado ou comprometido sem a efetiva participação dos estudantes? Como pensar políticas para os estudantes ou trabalhadores-estudantes sem a sua efetiva participação?

Na busca pelas respostas a esses questionamentos, buscou-se investigar, junto aos estudantes, a percepção de participação da classe trabalhadora nas decisões da EJA EPT. No grupo focal com os do primeiro ano, foi possível obter somente uma contribuição, no seguinte sentido: “Nós percebemos, a gente já fez bastante enquete aqui. Já fomos perguntados sobre

o curso então, basicamente sim, a gente já participou ativamente, já foram feitas bastantes pesquisas nesse ano” (GFE – 1, 29/11/2018). Pela percepção do pesquisador, não havia

clareza quanto ao conceito de classe trabalhadora e nem mesmo sentimento de pertença, como se observa no registro: “depois de realizado o questionamento os estudantes permaneceram

em silêncio por um longo período e solicitaram que fosse refeita a pergunta. Mesmo refazendo-a ficou visível o estranhamento dos estudantes e o não reconhecimento como pertencente a esta classe” (Diário de Campo, 29/11/2018).

Diante da única manifestação dos estudantes do primeiro ano e das incertezas entre os demais, registradas no Diário de Campo, arrisca-se dizer que. além de não ter claro o significado de classe trabalhadora, também, ou talvez, por consequência disso, não se reconhecem como tal, muito embora a grande maioria sejam trabalhadores-estudantes. A esse respeito, perguntamo-nos: Será que o currículo integrado realmente se efetiva? E o TP dos professores está sendo práxico? A busca por respostas a estes e outros questionamentos

acompanharam a pesquisa e a realização do próximo grupo focal com os estudantes do terceiro ano, apesentados a seguir.

Part. 1: Olha, eu não percebo nenhuma participação! Part. 2: Eu também não! Part. 3: Nenhuma participação! Part. 4: Nós sempre estamos em conversa, dialogando e dando nossas opiniões sobre o curso; Part. 5: Sim, até teve aquela vez ali que a professora veio aqui e relatou tudo que era o PROEJA e falou que se a gente tinha alguma colocação para dizer e falar para eles conversar e decidir o que era melhor; Part. 6: Eu percebo que é um curso bem transparente e que sempre está pensando em algo para fazer para nossa região (GFE – 3, 29/11/2018, grifos nosso).

Neste grupo com o terceiro ano as opiniões estavam divididas, mesmo assim, identifica-se, pela percepção dos estudantes, que quando acontecem às participações da classe trabalhadora nas decisões da EJA EPT são incipientes e superficiais. Quando assinalada a participação da classe trabalhadora, o entendimento é vago e não representa realmente o que se pretendeu investigar. No entanto, este grupo que estava prestes a se formar, ou seja, no final de sua trajetória formativa, demonstrou conhecer o significado de classe trabalhadora e ter claro o sentimento de pertença. Indicações de que aconteceu a práxis no trabalho pedagógico, assim como, certa integralidade do currículo.