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O passo a passo da análise

No documento camilacarvalhogomesdasilva (páginas 91-95)

Capítulo 3 – De que identidade(s) estamos falando?

3.5 O passo a passo da análise

Para esclarecer melhor a metodologia adotada em nosso trabalho, evidenciaremos todo o processo de elaboração da análise realizada. Em outras palavras, mostraremos a lógica de funcionamento da análise, com o intuito de tornar a pesquisa mais inteligível.

O primeiro ponto a ser esclarecido diz respeito ao material examinado. Debruçaremo-nos sobre a amostra de 12 edições do Jornal Local, compreendendo o período de três meses ininterruptos do jornal – 18 de julho a 03 de outubro de 2013. Vale esclarecer que este período não foi escolhido aleatoriamente. Decidimos abarcar em nossa análise o período que cobrisse, além da Festa de Nossa Senhora da Glória, padroeira de Valença, ocorrida sempre na primeira quinzena de agosto, a data do aniversário da cidade, comemoração feita no dia 29 de setembro. Cabe alertar ainda para o fato de que, em função destas datas, este período escolhido é especialmente fértil para que se potencialize o discurso das efemérides valencianas. Por fim, ressaltamos que nosso corpus de pesquisa não ficará restrito a nenhuma editoria em especial, ou seja, analisaremos todos os textos, excetuando-se os publicitários.

Mais uma vez frisamos que o critério de categorização utilizado em nosso trabalho é semântico, visto que levantamos quatro temas, que chamamos de ideias-força, caracterizadores de uma certa identidade valenciana, identidade esta tida como a tradicional, na bibliografia cânone de Valença. A partir dessas quatro ideias-chave, chegamos a nossas categorias de pesquisa. De maneira sucinta, podemos dizer que as categorias elaboradas foram:

Tabela 1 – Categorias de análise

Categorias História da cidade Personalidades do município

Especificidades de Valença

Quanto à inferência, nossa hipótese é de que o Jornal Local segue os padrões já estabelecidos em relação à caracterização da identidade valenciana, ou seja, acreditamos que

o JL é um típico jornal conservador. Vale ressaltar que para justificar nossa hipótese inicial lembramos a opinião de Marcondes Filho (2002), ao enfatizar que jornalistas da imprensa empresarial, e a isto acrescentamos imprensa também conservadora e tradicional, vão em busca de confirmação para os modelos que já têm estabelecidos em suas mentes.

É importante esclarecer que faremos uma varredura completa dos textos jornalísticos do Jornal Local, ou seja, não nos voltaremos em específico para nenhuma editoria. Julgamos mais prudente proceder desta maneira para não chegarmos a uma conclusão equivocada em relação à nossa hipótese de pesquisa. Afinal, se escolhêssemos apenas uma editoria, poderíamos chegar a uma conclusão que fosse verdadeira para esta parte do periódico, mas que além de representar, quantitativamente, uma parte pequena do Jornal Local, não correspondesse ao discurso majoritário deste impresso sobre a identidade valenciana.

Relevante se faz também frisar que nosso trabalho se propõe a investigar não só qual o volume (quantidade) das ideias-chave, levantadas na bibliografia cânone sobre Valença e expostas no primeiro capítulo da pesquisa, mas principalmente a intensidade deste discurso no texto do Jornal Local.

Valendo-nos da referência já citada (livro “Identidade da imprensa brasileira no final do século – das estratégias comunicacionais aos enraizamentos e às ancoragens culturais”, organizado por Adolpho Queiroz e José Marques de Melo), o primeiro fator investigado foi a primeira página do jornal, visto que este é

o espaço mais importante do jornal, espécie de vitrine das informações que estão no bojo da edição; sua organização reflete a política editorial da empresa jornalística; corresponde também às estratégias mercadológicas destinadas a conquistar os leitores potenciais, induzindo-os à compra do exemplar, à leitura do material ali contido e à adesão aos pontos de vista difundidos (MELO; QUEIROZ, 1998, p.22). Tomando como pressuposto a citação de Melo e Queiroz (1998), o primeiro passo da nossa pesquisa foi analisar a capa. Caso o exemplar possuísse manchete relativa a alguma de nossas categorias na primeira página, depois de comentar tal manchete, passamos para o exame da notícia em questão. Procedemos assim até esgotar as notícias publicizadas na primeira página. Após este procedimento, analisávamos os textos seguindo a ordem estabelecida pelo impresso. Afinal, segundo nos informou Barros, editor do JL, as notícias mais importantes são publicadas na primeira parte do periódico.

É importante também clarear a conduta estabelecida para a crítica individual dos textos. Primeiro, foi realizada a leitura completa dos textos, quando marcávamos, ponto a ponto, as características deste quanto à nossa área de interesse. Cumpre lembrar que, todas as

unidades de registro (palavra, frase, parágrafo e texto inteiro) foram consideradas, de acordo com a relevância desta unidade para a interpretação do texto em análise. Depois, comentávamos as partes selecionadas, tomando o cuidado de não repetir exaustivamente trechos que apresentavam a mesma ideia. Vale lembrar que as fotos relativas aos textos analisados, assim como suas legendas, também foram averiguadas, sendo comentadas nas vezes quando julgamos relevante.

Outro ponto a ser assinalado é o fato de que alguns textos não foram explicitados no corpo de nossa argumentação, para não tornar a análise excessivamente extensa. Entretanto, eles foram considerados no resultado final do exame de cada edição, exposto em tabela no término dos comentários sobre cada exemplar. Quanto às tabelas, apenas vale dizer que, pelo fato de alguns textos terem sido colocados em mais de uma categoria, tivemos que indicar nas tabelas que estes eram os mesmos, e por isso usamos as cores. Em outras palavras, excetuando-se a cor preta, que indica a unidade de texto, cores iguais, na mesma tabela, correspondem ao mesmo texto.

Quanto a análise quantitativa da pesquisa, gostaríamos de ter utilizado os dados com maior precisão, usando, por exemplo, o método de centimetragem. Porém, pelas características próprias do JL, não foi possível utilizar este instrumento de mensuração. Afinal, os textos deste periódico não seguem a mesma estrutura de diagramação. Neste sentido, vale salientar que até no mesmo tipo de texto, como as notícias, há variações, como o corpo da letra usada. Coube a nós, então, encontrar uma maneira de medir, mesmo que de forma mais generalizada, qual o espaço dado ás categorias de nossa pesquisa, o que nos revelaria, no fim, qual a relevância dada pelo Jornal Local ao tema estudado por nós: a identidade valenciana. Com este intuito, fizemos uma comparação entre o número de páginas do impresso que traziam textos de nosso interesse, e o número total de páginas daquele exemplar do JL. Estes resultados quantitativos foram expostos após as tabelas, edição por edição.

Por fim, é crucial chamar a atenção para duas editorias: Lazer e Esporte. Após percebermos que estas partes do JL possuem uma estrutura padronizada, variando muito pouco de uma edição para outra, além do fato de sempre possuírem textos que se encaixam nas nossas três categorias de análise, optamos por não comentá-las a cada exemplar. Por tal motivo realizaremos um exame generalizado destas duas editorias.

As temáticas abordadas na seção Agenda, localizada na Editoria Lazer, traz rotineiramente informações sobre eventos que acontecerão em Valença e região – festas, bailes, saraus, entre outros – e, por isso, nos serviu de ferramenta para analisarmos as

categorias história da cidade e especificidades de Valença, pelo simples fato de que as festividades que ocorrem num local sempre nos dizem muito sobre sua história e sua cultura.

Na edição de 18 de julho de 2013 do JL, por exemplo, há a citação de cinco festas julinas que serão realizadas na região, além da menção ao sarau literário que ocorre toda terceira sexta-feira do mês, às 17h, na única livraria de Valença; além de uma quantidade considerável de eventos próprios do Festival do Vale do Café 201339, evento vinculado ao passado histórico de Valença, mais especificamente ao período evidenciado pelos tradicionalistas como o auge da cidade: a era do café, no século XIX.

Há ainda nesta seção a menção ao 6º Festival da Cultura Japonesa em Valença, que nos remete à categoria história da cidade, já que os japoneses fazem parte do grupo de estrangeiros que imigrou para Valença. Cabe aqui, fazermos um parêntese para comentar este festival. Primeiro, é público e notório, diante do que já expusemos em nossa pesquisa, que Valença possuiu um grande número de negros escravos nas fazendas de café. Só para se ter uma ideia, Leoni Iório (1953), citando a obra “História do café no Brasil”, de A. Taunay, nos mostra que Valença, nos idos de 1883, era o município cafeeiro da província do Rio de Janeiro com o maior número de escravos: 25. 344 escravos (IÓRIO, 1953, p.172). Enquanto que, em 1953, encontravam-se em Valença apenas cerca de oito famílias japonesas (IÓRIO, 1953, p.199). Não é de se estranhar que Valença já esteja há seis anos fazendo um festival de cultura japonesa e nunca tenha realizado, pelo menos com divulgação dos meios de comunicação, um festival de cultura negra? O que temos, neste sentido, é apenas a festa da comunidade quilombola de Valença, que ocorre num de seus distritos. Mas tal festividade ocorre em local distante, de difícil acesso para a maioria dos valencianos. Segundo, sabemos da existência de um Núcleo de Cultura Ítalo-Brasileira de Valença, que funciona inclusive em local cedido gentilmente pela Câmara Municipal de Valença. Todavia, se existe algo semelhante em relação à cultura negra em Valença, sua divulgação é muito “deficiente”, pois não se tem nenhuma notícia disto.

Voltando à Editoria Lazer, quanto à categoria especificidades de Valença, podemos comentar que através dos cursos divulgados nesta editoria, pudemos observar uma possível

39 No site do Festival, no link “Apresentação”, há o seguinte texto: “O Festival Vale do Café, é um projeto em caráter

permanente implementado desde 2003, que tem por objetivo criar um pólo turístico cultural e acelerar o desenvolvimento econômico do interior do estado do Rio de Janeiro. Através da preparação anual de uma grande celebração de música, história e natureza, aliada sempre ao respeito pelas raízes e pelo patrimônio histórico da região, o Festival Vale do Café chega a sua 11ª edição, entre os dias 16 e 28 de julho de 2013. Além de receber mais de 800 mil pessoas em suas 10 edições, que provoca o aquecimento econômico da região, o Festival Vale do Café resgata fortemente o patrimônio imaterial, estimulando o amor à natureza e divulga o patrimônio histórico e arquitetônico abrangendo os diversos municípios da região do Vale do Café, num dos mais lindos recantos do Estado do Rio de Janeiro, no Vale do Paraíba” (Informações adquiridas em:

tentativa de mostrar a diversidade cultural valenciana, já que há referência a cursos que abrangem desde oficinas mais populares, como a de Hip Hop no distrito de Santa Isabel, até cursos mais elitizados, como teatro e pintura em tela.

A Editoria de Lazer divulga inclusive, em toda edição do Jornal Local, informações do Parque Natural Municipal do Açude da Concórdia, um dos pontos turísticos de Valença: “O parque prima pela segurança e preservação ambiental sendo um lugar ideal para pesquisa e descanso” (JL, p.18). Através deste fragmento do texto é perceptível o intuito de por em relevo como uma das especificidades de Valença a presença de uma natureza privilegiada.

Por fim, esta Editoria ainda apresenta as “manifestações culturais” de Conservatória, um dos distritos de Valença, local conhecido por suas serestas, muito visitado por turistas. Julgamos que esta parte da Agenda pode ser perfeitamente encaixada na categoria história da

cidade, pois na narrativa podemos notar a tentativa de mostrar Valença, neste caso mais

especificamente Conservatória, como um lugar possuidor de um história “memorável”, ao considerar, por exemplo, o centro de Conservatória um “Centro Histórico”.

Em relação à categoria personalidades do município, cumpre apenas dizer que, ao divulgar as apresentações de músicos valencianos, além de outras apresentações de diversos artistas da cidade, esta editoria procura dar notoriedade e valorizar estas “figuras ilustres”, e, de certa formal, esta acaba por ser uma espécie de exaltação aos artistas de Valença.

No que tange a Editoria Esporte, a página destinada a ela sempre traz textos pertencentes às três das categorias de nossa pesquisa, pois ela segue frequentemente o mesmo padrão, ao trazer foto referente a times de futebol dos “velhos tempos”, quando publica, por exemplo, a antiga equipe de algum time de bairro valenciano (notinha classificada na categoria história da cidade), além de informações sobre “campeonatos” tipicamente valencianos, como o “campeonato de purrinha” (notinha classificada na categoria

especificidades de Valença), que ocorre todo sábado na tradicional Rua dos Mineiros, e de

fotos de valencianos vestidos com a camisa de seu time (notinha classificada na categoria

personalidades do município).

No documento camilacarvalhogomesdasilva (páginas 91-95)