• Nenhum resultado encontrado

Paul Rivet: Solidariedade e Humanismo a favor do Conhecimento Científico

1. O MUSÉE DE L’HOMME

1.3. Paul Rivet: Solidariedade e Humanismo a favor do Conhecimento Científico

Científico

Rivet nasceu em 1876 em Wasigny, na França, formando-se como médico pela Escola Militar de Medicina de Lyon em 1900. Seu primeiro trabalho para o exército francês consistiu no apoio médico à Segunda Missão Geodésica ao Equador36, levada a cabo de 1901 a 1905, ocasião em que também foi incumbido de registrar minuciosamente as características dos indígenas da região, assim como de sua flora e fauna.

Nos cinco anos em que permaneceu no Equador, Rivet atuou como médico não só do exército, mas de todas as comunidades percorridas durante a missão. Ao mesmo tempo, dedicou-se com afinco a inventariar as espécies vegetais e animais autóctones, trabalho que foi enviado ao Muséum National d’Histoire Naturelle e lhe proporcionou algumas homenagens, que consistiram em batizar certas espécies catalogadas por ele com seu nome, a exemplo do

Philydor Columbianus Riveti (pássaro) e do Hylodeo Riveti (anfíbio) (LAURIÈRE, 2008, p.

63). No entanto, a maior parte de seus esforços, e o trabalho que lhe rendeu o maior

35 Traduzido do original: [...] le musée finit par ressembler au cabinet de curiosités qu’il n’était pas.

36 As missões geodésicas francesas tinham o objetivo de confirmar a teoria newtoniana de que a Terra possuía a forma de uma elipse achatada nos polos. Para isso, percorreram o Equador medindo o arco do meridiano equatorial.

reconhecimento nesse museu, concentrou-se na descrição minuciosa dos indígenas da região, a qual englobava a cultura destes e, principalmente, suas características físicas.

Como abordado anteriormente, a Antropologia institucionalizou-se na França a partir de meados do século XIX. As especializações dessa disciplina que se concentravam na análise dos aspectos físicos do ser humano, como a craniometria, foram então consideradas mais importantes do que aquelas que se focavam nos aspectos culturais, visto que as metodologias científicas da época se baseavam no positivismo e na ideia de que medições, estatísticas e outros dados matemáticos, poderiam construir um conhecimento antropológico exato e imune a erros. Nesse contexto, a principal atribuição de Rivet como pesquisador era descrever detalhadamente os indígenas, registrando seus ângulos corporais, tomando a medida de suas cabeças e recolhendo, quando possível, ossadas e crânios que pudessem ser remetidos à França.

Durante os cinco anos passados no Equador o intelectual recolheu medidas corporais de aproximadamente trezentos índios, em sua maioria homens, focando seu trabalho no detalhamento dos crânios e suas dimensões. A atenção que era dada às medições das cabeças pode ser visualizada no artigo Les Indiens de Mallasquer (1904:150), onde Rivet apresenta os resultados relativos a vinte e dois tipos de medição craniais feitas aos índios Mallasquer, que habitavam então a região norte do Equador. Essas medições, no entanto, não eram sempre realizadas com o total consentimento dos grupos indígenas, sendo por vezes tomadas com o auxílio da polícia e até mesmo realizadas por meio da violação de túmulos, ocasiões em que houve a apropriação de ossadas, as quais foram enviadas à França (BACKX, 2013, p. 29). Essa ânsia por recolher informações sobre as características físicas dos indígenas e a desconsideração quanto à vontade destes de fornecerem-nas, demonstram que o dever científico e a importância dada à Antropologia por Rivet eram, nesse momento, mais relevantes para ele do que a vontade desses indígenas, suas crenças e culturas. A passagem retrata a importância que era dada à obtenção do conhecimento científico em fins do século XIX na França, demonstrando que não se aceitavam empecilhos, por parte dos povos estudados, para o desenvolvimento da ciência.

Durante sua estadia no Equador, Rivet passou a comunicar-se por meio de cartas com Ernest Hamy, que era então diretor do Musée d’Ethnographie du Trocadéro e titular da Cadeira de Antropologia do Muséum National d’Histoire Naturelle, instituição que receberia, posteriormente, todos os dados e objetos recolhidos durante a Missão Geodésica. É importante ressaltar que desde a inauguração do museu du Trocadéro foi instaurada uma tradição, segundo a qual a direção deste seria sempre assumida pelo titular da cadeira de Antropologia do MNHN. Essa conexão entre os cargos foi legalizada em 1928 por meio de um decreto, o qual procurava

ligar as duas instituições de modo a fornecer um maior apoio institucional ao museu de Etnografia (LAURIÈRE, 2012).

O contato com Hamy e com o médico Raoul Anthony, que ocupava na época o posto de assistente da Cadeira de Anatomia Comparada da mesma instituição, despertou em Rivet o interesse pelos estudos antropológicos, de modo que este começou a desenvolver análises ainda durante a Missão e a publicá-las em importantes revistas científicas francesas, como a Bulletins et Mémoires de la Société d’Anthropologie de Paris (Boletins e Memórias da Sociedade de Antropologia de Paris) (RIVET, 1904a, 1904b) e o Journal de la Société des

Américanistes (Jornal da Sociedade de Americanistas) (RIVET, 1903, 1905).

O apoio crescente por parte do Serviço Geográfico – responsável pela Missão Geodésica – e do museu de história natural, logrou com que Rivet volta-se à França, após o término da Missão em 1906, com as medidas antropológicas de aproximadamente trezentos índios, diversas ossadas e mais de mil e quinhentas peças arqueológicas, além de dados históricos, etnográficos e vocabulários indígenas (LAURIÈRE, 2008, p. 154). Com o reconhecimento da qualidade de seu trabalho no Equador e de suas análises antropológicas, ele foi destacado do exército e alocado como trabalhador livre do laboratório de Antropologia do

Muséum National d’Histoire Naturelle, onde começou a construir uma sólida carreira que o

conduziria à cadeira do laboratório.

Instigado por Hamy e por René Verneau, Paul Rivet concentrou seus trabalhos iniciais na análise das coleções osteológicas trazidas do Equador, temática que lhe era mais acessível devido à sua formação médica e o inseria num dos campos mais valorizados da Antropologia da época, a Antropometria, o que lhe abria a possibilidade de alcançar reconhecimento frente à comunidade científica de então. É nesse contexto que ele produz diversos artigos que versam, por exemplo, sobre análises da curvatura femoral (1907), anatomia óssea dos membros (1908a) e estudos craniométricos (1908b), onde já é possível enxergar que os interesses do autor não se limitavam a classificar as diferentes raças humanas com base em suas características físicas, mas compreender os processos de miscigenação entre elas (BACKX, 2013, p. 30).

Sua capacidade como pesquisador é de fato reconhecida em 1909, quando Verneau assume o cargo de Hamy – devido à morte deste no ano anterior – no MET e na direção da cadeira de Antropologia do MNHN, tendo Rivet sido nomeado assistente da cadeira. Uma análise de sua produção bibliográfica nessa época (décadas de 1910 e 1920) disponível em formato de lista na obra Paul Rivet – Octogenario Dicata (RIO, 1958), confirma que seus interesses iam muito além dos estudos antropométricos, concentrando-se também em análises

culturais, principalmente em estudos linguísticos. Com o tempo, a Antropologia tradicional, baseada sobretudo nas análises antropométricas, passou a ser considerada por Rivet insuficiente para desenvolver o conhecimento sobre o ser humano, pois este recusava o determinismo biológico, acreditando que a Antropometria traçava apenas diferenças mecânicas entre as diferentes raças. Por esse motivo passou a defender cada vez mais a importância de ciências como a Etnografia, a Paleontologia e principalmente a Linguística, e a interessar-se pelo cruzamento entre essas diferentes raças e seu deslocamento pelo globo terrestre.

Nesse repensar intelectual, Rivet aplicou suas novas ideias a seus antigos interesses americanistas e à enorme quantidade de fontes que havia levantado no Equador. Passou a concentrar seus estudos nos movimentos migratórios da América do Sul, com o objetivo de reconstituir a história da ocupação do continente e as origens de sua população, o que procurou fazer por meio do estudo de diversas línguas ameríndias. Ao desenvolver uma metodologia que se baseava no estudo da origem dessas línguas, sua comparação, os pontos de contato entre elas e também entre as sociedades que as utilizavam, aproximou-se do difusionismo, tornando-se um dos seus principais defensores na França (LAURIÈRE, 2008, p. 164).

O pensamento difusionista de Rivet foi bastante influenciado pelo geógrafo alemão Franz Boas (1858-1942), principal expoente da Antropologia sociocultural americana do início do século XX. Boas era representante da escola alemã difusionista, a qual se baseava na crença da existência de complexos culturais primários que fundamentariam grande parte das culturas modernas (BARNARD; SPENCER, 1996). Seu contato com Rivet – o qual ocorreu principalmente por meio de cartas trocadas por vinte e cinco anos antes que os dois se conhecessem pessoalmente – despertou neste último a compreensão da existência de uma solidariedade física, linguística, biológica e cultural entre os diferentes grupos humanos, ideia que Rivet aplicaria pelo resto de sua vida à sua obra intelectual e luta política. Até mesmo a proposta de criação de um Museu da Humanidade, onde os visitantes pudessem visualizar o conjunto das raças, civilizações e línguas do mundo, foi uma ideia despertada pela primeira vez em Rivet por Boas (RIVET, 1958), de modo que este se constituiu como uma importante influência no pensamento do francês e na elaboração de sua teoria acerca da igualdade dos seres humanos, derivada da noção da solidariedade intrínseca a eles.

Tal teoria fundamentava-se na ideia de que as descobertas de uma sociedade eram compartilhadas com todas as outras por meio das trocas culturais, de modo que todos os grupos humanos possuíam a mesma importância. Essas reflexões baseavam-se no conceito de cultura elaborado por Boas, segundo o qual a cultura era definida como a

[...] totalidade das reações e atividades mentais e físicas que caracterizam a conduta dos indivíduos componentes de um grupo social, coletiva e individualmente, em relação a seu ambiente natural, a outros grupos, a membros do mesmo grupo e de cada indivíduo consigo mesmo. Também inclui os produtos dessas atividades e sua função na vida dos grupos. No entanto, a mera enumeração destes vários aspectos da vida não constitui a cultura. Ela é mais do que tudo isso, pois seus elementos não são independentes, eles possuem uma estrutura (BOAS, 1938, p. 159)37.

O trecho em destaque nos permite perceber que a definição elaborada por Boas salientava a importância de que os produtos das atividades culturais e sua função na vida dos grupos humanos também fossem compreendidos como cultura. Posteriormente, essa noção foi basilar para a composição do projeto museológico do Musée de l’Homme, que se fundamentava na ideia do objeto etnográfico como “objeto testemunho”, ou seja, um indicador capaz de fornecer conjuntos de informações acerca de manifestações, técnicas e estruturas sociais.

As contribuições de Boas para a formação intelectual de Rivet e para o desenvolvimento da própria Antropologia foram importantíssimas. No início do século XX, o primeiro elaborou uma crítica sistemática às teorias evolucionistas que sustentavam a hierarquização das raças humanas, apoiando-se em análises históricas para explicar a grande diversidade cultural existente na humanidade e para afirmar a individualidade histórica de cada uma delas, de modo a sustentar que seu julgamento não poderia ser feito a partir da história de outras culturas (SILVA; SILVA, 2009, p. 85).

Boas criou uma obra intelectual inseparável de sua luta política e de suas crenças humanistas. Rivet nutria por ele uma grande admiração, a qual se devia em grande parte a seus estudos sobre a interdependência dos indivíduos e sua luta contra o Terceiro Reich (RIVET, 1958). Por meio do enfoque difusionista e de sua influência, Rivet foi capaz de associar o estudo do ser humano à sua cultura, e não unicamente à sua raça ou à natureza. Seus trabalhos de comparação linguística dinamizaram a disciplina, abrindo novas possibilidades de atuação para uma ciência cujo campo de atuação havia sido extremamente limitado no país.

Voltando seus estudos para a compreensão das origens da espécie humana na América, Rivet elaborou diversas análises comparativas entre as línguas, as técnicas, os costumes e a cultura material de diversas sociedades ameríndias, procurando encontrar os pontos de contato entre elas e traçar um esquema por meio do qual fosse possível visualizar as

37 Traduzido do original: [...] totality of the mental and physical reactions and activities that characterize the behavior of the individuals composing a social group collectively and individually in relation to their natural environment, to other groups, to members of the group itself and of each individual to himself. It also includes the products of these activities and their role in the life of the

groups. The mere enumeration of these various aspects of life, however, does not constitute culture. It is more, for its elements are not independent, they have a structure.

influências, as difusões e os povoamentos. Esse trabalho de análise e comparação cultural, principalmente quando foi aplicado aos estudos acerca dos desenvolvimentos agrícolas e metalúrgicos na América do Sul, o levou a concluir que todos os grupos humanos contribuiriam de alguma forma para o patrimônio comum da humanidade, de modo que eram todos igualmente importantes para o estudo e a compreensão do ser humano.

Os contextos históricos e políticos do início do século XX foram importantes catalisadores para essa reflexão de Rivet sobre a igualdade dos indivíduos. Sua participação na Primeira Guerra Mundial entre 1914 e 1918 – quando foi mobilizado major médico do exército francês – e o cenário científico-político da época, dominado pela crença da superioridade europeia frente a todas as outras sociedades e sua missão civilizatória, fizeram com que Rivet refletisse profundamente sobre as consequências das teorias hierarquizantes e os problemas relativos às minorias étnicas. Ao mesmo tempo, a adoção de políticas de Estado baseadas em teorias racistas, praticada por países europeus entre 1910 e 1920 (MAZOWER, 2001), demonstra que a sociedade europeia, como um todo, já se indagava sobre o lugar das raças consideradas inferiores – como os judeus e negros – na evolução da humanidade.

É nesse contexto que Rivet, procurando refletir sobre as problemáticas contemporâneas que envolviam as questões raciais, aprofunda seus estudos em pré-história e nas migrações, com o objetivo de compreender o surgimento do ser humano e de suas supostas raças (RIVET, 1924, 1926). Tais reflexões o levariam a defender que essas existiriam desde o surgimento da humanidade no planeta, de modo que elas se cruzariam desde tempos imemoriais. Nesse sentido, os três tipos de raças humanas – negra, branca e amarela – teriam se misturado há tempos e absorvido as características físicas e culturais das outras, tendo cada uma delas contribuído para os desenvolvimentos e as descobertas das demais (BACKX, 2013).

Os trabalhos desenvolvidos por Rivet com base nessas ideias auxiliaram o desenvolvimento da Etnologia como ciência independente e a sua institucionalização. Em 1925, o sociólogo Marcel Mauss (1872-1950) e o filósofo Lucien Lévy-Bruhl (1857-1939) criaram o

Institut d’Ethnologie de l’Université de Paris (Instituto de Etnologia da Universidade de Paris),

do qual Rivet tornou-se seu secretário geral. Fundada pelo Ministério das Colônias, a instituição marcou o reconhecimento acadêmico da Etnologia na França e possibilitou sua estruturação como disciplina, permitindo-lhe forjar seus princípios teóricos e metodológicos e formar os primeiros profissionais especializados.

O instituto funcionava basicamente por meio de subvenções provenientes dos governadores das colônias francesas, de modo que seus objetivos se concentravam principalmente em estudos etnológicos nessas e em fornecer informações a respeito de suas

sociedades aos futuros missionários e administradores franceses, de modo que pudessem compreender melhor a cultura dessas. Segundo Christine Laurière, a ciência desenvolvida nesse instituto propunha um novo humanismo, de cunho prático, no qual o estudo dessas culturas seria realizado por meio de métodos novos e aperfeiçoados. Nesse sentido, promovia-se uma espécie de “colonialismo de esquerda”, retomando a ideia da missão civilizatória, mas procurando superar os excessos da administração civil e militar (LAURIÈRE, 2008, p. 342).

Sendo assim, a Etnologia institucionalizou-se na França como uma ciência intrinsecamente ligada ao colonialismo, sendo até mesmo amparada economicamente por este. Os princípios científicos e os ideais por trás da criação do Institut d’Ethnologie de l’Université

de Paris demonstram a existência de um conjunto de intelectuais franceses que, no início do

século XX, começavam a repensar a importância da diversidade cultural e das alteridades para a humanidade, mas, ao mesmo tempo, compreendiam o colonialismo como um processo legítimo e favorável ao desenvolvimento das colônias e da ciência etnológica. Ao fazer parte ativa desse conjunto, Rivet forjava seu conceito de humanismo por meio de tais ideias, combinando sua teoria sobre a solidariedade entre os seres humanos com uma profunda crença de que a cultura europeia deveria conduzir o desenvolvimento das demais sociedades. Tais ideias seriam posteriormente aplicadas à direção do Musée de l’Homme e à organização das exposições permanentes deste.

Em 1928 a aposentadoria de René Verneau causou uma disputa acirrada entre Rivet e o antropólogo físico Henri Victor Vallois (1889 – 1981) pela cadeira de Antropologia do

Muséum National d’Histoire Naturelle, e, consequentemente, pela direção do Musée d’Ethnographie du Trocadéro, já que os cargos eram ligados. Rivet acabou eleito, assumindo

os cargos em 1929, mas o processo levou a uma ruptura, dentro da Universidade de Paris, entre a Antropologia Física e a Social, além da criação de uma forte inimizade entre o intelectual e Vallois, que viria a ser seu futuro substituto. Ao assumir, Rivet logo deu início ao projeto de renovação do MET, considerado por ele em estado deplorável. Para auxiliá-lo em tal projeto ele designou Georges Henri Rivière, um músico amador desconhecido até então no campo da Etnologia.

Rivière se consagrou como um dos grandes expoentes da museologia no século XX. Em 1915 graduou-se em filosofia e posteriormente estudou música na Escola do Louvre. Em meados da década de 1920 era conhecido como um boêmio e estava em constante contato com artistas da vanguarda, declarando-se a si mesmo como um modernista (DEBAENE, 2002). Contribuía ocasionalmente para a revista Cahiers d’Art (Cadernos de Arte), e a partir de 1926 ficou a cargo das coleções de arte do mecenas David Weill. Envolvido pela temática da arte

pré-colombiana, Rivière idealizou a exposição “Les Arts Anciens de l’Amérique” (As Artes Antigas da América), inaugurada em maio de 1928 e reconhecida pela sociedade parisiense de então como um grande êxito. Impressionado com os resultados dessa exposição, Rivet o convidou para assumir o cargo de subdiretor do MET e auxiliá-lo na renovação do museu, confiando-lhe a tarefa de tornar a nova exposição etnológica atrativa e acessível para a população em geral (LAURIÈRE, 2012).

Os primeiros trabalhos realizados no MET foram de caráter emergencial. Conforme denunciara o antigo diretor da instituição, René Verneau, o museu encontrava-se abandonado, sem recursos financeiros e até mesmo sem funcionários, pois a maior parte destes havia sido mobilizada para atuar na Primeira Guerra Mundial e, após o termino dessa, não havia sido readmitida. Desse modo, as primeiras tarefas levadas a cabo baixo a direção de Rivet foram a aquisição de novas vitrines, a catalogação de grande parte do acervo – que até então se encontrava abandonado – e a contratação de funcionários.

Grande parte dos recursos necessários às primeiras reformas vieram da Société des

amis du Musée d’Ethnographie du Trocadéro (Sociedade dos Amigos do Museu de Etnografia

do Trocadéro), criada por Rivière e à qual este próprio doou grandes somas de dinheiro. Aliados a essa instituição, os diversos convênios que este e Rivet conseguiriam firmar com empresas particulares fizeram com que o orçamento do museu saltasse em dois anos de 20.000 francos anuais (verba destinada pelo governo francês) para 320.000 (LAURIÈRE, 2008).

A partir de então, diversas reformas físicas e conceituais foram empreendidas ao MET, as quais estavam ligadas, no campo museológico, à grande importância educacional que os museus deveriam assumir perante a sociedade e, no campo etnológico, à noção da igualdade entre os seres humanos e à teoria da solidariedade entre eles, ideias fortemente defendidas por Rivet. Para alcançar o sucesso de tal empreitada, a reforma do edifício foi considerada por este e por Rivière fundamental, pois o Palais du Trocadéro foi considerado por eles um edifício inadequado para abrigar um museu, devido à grandeza de suas escadas, à amplitude e altura de suas salas e à falta de salas onde pudessem ser alocados os trabalhos técnicos e especializados, necessários ao funcionamento de uma instituição museal. Desse modo, Rivet propôs em 1928 a reforma do edifício para que neste pudessem ser reunidos as bibliotecas e as coleções etnológicas do Muséum National d’Histoire Naturelle, do Instituto de Etnologia de Paris e de