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Pensando em ações efetivas de inclusão da diversidade sexual

Ao pensar na elaboração de ações que contribuam para garantir a efetiva inclusão da questão da diversidade sexual na pauta de estudos das escolas, e da inclusão e da permanência efetiva dos alunos e das alunas que manifestam orientação sexual diferente da heterossexual, penso que devemos dar atenção aos seguintes pontos:

a) O objetivo maior de todas as ações de inclusão é criar um ambiente de respeito e valorização da diferença, então, não se trata de abordar gueis, lésbicas e travestis como “coitadinhos” que necessitam apenas de proteção, mas como sujeitos que trazem uma discussão importante para todos, inclusive os heterossexuais, sobre o respeito à sexualidade e à diversidade sexual. Ou seja, as atividades educativas planejadas devem considerar que os rapazes heterossexuais têm muito a aprender sobre sua heterossexualidade no convívio e por meio da discussão com os ra-pazes homossexuais, e vice-versa.

b) A adequada discussão dessas questões deve ser feita sempre levando em conta que a escola é um espaço público, e necessariamente laico. Desta forma, aquilo que as religiões pensam e dizem acerca da sexualidade hu-mana não deve virar regra dentro da escola. As regras da escola são as regras do espaço público, regras democráticas de convívio, valorização e respeito da diferença. Escola não é igreja e professor não é sacerdote ou pastor. Quem quiser participar de um espaço onde homossexuais não en-trem pode criar o seu espaço para isto, mas a escola não é local onde isso possa ser feito; ela é um espaço público, como o são ruas, praças, hospi-tais públicos, postos de saúde, assembléias legislativas, apenas com regras diferentes de acesso e convivência, e propósitos e objetivos claramente diferentes de outros espaços públicos.

c) As questões que dizem respeito à inclusão da diversidade sexual, à valo-rização da diferença, à construção de um ambiente de respeito e acolhida para com as diferentes formas de viver a sexualidade devem constar cla-ramente nos documentos oficiais da escola, quais sejam, o Projeto Polí-tico Pedagógico (PPP), o Regimento Escolar, os Planos de Ensino e de Estudo etc. Esses temas devem ser discutidos com a comunidade escolar, e precisam ser traçadas diretrizes claras sobre o que se deseja com esta

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discussão. Nada deve ser feito “por baixo dos panos”, como se os assuntos que dizem respeito à vida sexual dos alunos fossem proibidos de ser dis-cutidos. Há uma farta legislação nos níveis federal e estadual, inclusive no âmbito dos municípios, apoiando as iniciativas que visem discutir te-mas de sexualidade nas escolas.

d) Dada a complexidade e o caráter polêmico das questões que envolvem a sexualidade, bem como a forte presença de movimentos sociais e a influência das igrejas neste assunto, recomenda-se que a escola busque parcerias para abordar estes temas. Estas parcerias podem ser feitas com ONGs, instituições de saúde, outras escolas, universidades, igrejas, movimentos sociais, empresas privadas etc. Mas a parceria não significa que a escola vai simplesmente abrir os portões para que outros venham abordar os temas. O trabalho em parceria pressupõe uma discussão e o estabelecimento de objetivos comuns, e a escola pode perfeitamente re-cusar certas propostas por razões pedagógicas, pois ela tem autonomia para isso. Não se trata de dizer “sim” a qualquer proposta de trabalho, mas de refletir como ela se integra nos objetivos da escola, verificando sua pertinência.

e) Conforme já foi discutido acima, nem tudo o que é importante para o movimento social é pertinente ao ensino escolar, que tem suas espe-cificidades, seus objetivos, suas limitações. O movimento social tam-bém precisa criar suas próprias instâncias de educação, e a escola pode ser parceira. Nem tudo precisa virar matéria escolar, matéria de aula, e acontecer na sala de aula. Podemos ter projetos em parceria por livre adesão dos alunos; podem ser atividades oferecidas no turno inverso ao das aulas, na forma de oficinas ou grupos de discussão. A escola apóia, designa um professor para acompanhar, mas não necessariamente as coisas precisam acontecer no horário escolar tradicional. E muito menos precisam ser obrigatórias para todos os alunos.

f) As questões que envolvem a diversidade sexual são complexas e exi-gem estudo por parte dos professores. Devemos lutar para ter acesso a materiais pedagógicos adequados, a cursos de formação, a participação em eventos que discutam os temas da sexualidade. Não devemos abordar nenhum tema de forma improvisada na escola. Escola é lugar de aprendi-zagens, e isto se faz de forma planejada.

g) O tema da diversidade sexual pode ser abordado no âmbito específico de algumas disciplinas, ou na forma de projetos que juntem diversas disciplinas; pode estar presente nos serviços da escola, como biblioteca, supervisão, orientação educacional ou acontecer paralelamente a ativi-dades do movimento social, como “Paradas do Orgulho Gay”. Enfim, temos que ter criatividade para fazer emergir o tema de muitas manei-ras e especialmente articulado com os interesses dos alunos e com as situações por eles vivenciadas.

h) Quais professores e professoras estão habilitados a trabalhar com os temas de diversidade sexual na escola? Penso que nenhum professor deva ser obrigado a abordá-los em sua sala de aula, se não se sentir confortável e esclarecido para fazer isso. Reconheço também que o per-tencimento religioso e/ou os valores morais de alguns professores não os habilitam a uma abordagem esclarecida e que permita a valorização da diferença. Estas questões são difíceis de serem discutidas pelo corpo de professores, mas precisam ser enfrentadas. A escola deve escolher pro-fessores e professoras que se sintam preparados e com vontade de deba-ter esses temas com os alunos. Os professores devem buscar formação e estudo, bem como coletar material específico para ficar arquivado na escola, subsidiando outros colegas que também queiram abordar estas questões em sua sala de aula.

Por fim, cabe salientar mais uma vez: não haverá educação de qualida-de na escola pública sem uma preocupação verdaqualida-deira com a inclusão escolar.

E não haverá inclusão escolar verdadeira sem uma preocupação genuína com a valorização da – e o respeito pela – diversidade sexual presente no mundo contemporâneo, e na escola, em particular. Sem isto não estaremos preparando adequadamente as crianças e os jovens para um outro mundo possível.

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