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viana (2000) e Portes (2000) descrevem uma ausência de projetos de escola- rização nas famílias de seus pesquisados. esse é o caso também dos entrevistados desta pesquisa. não há projetos previamente elaborados ou “intencionalidade” (viana, 2000), embora as mães tenham sempre procurado escolher as escolas de seus filhos pelo critério da proximidade com a residência e pela “qualidade” que acreditavam que o estabelecimento de ensino tinha. os projetos de escolarização seriam marcados pela “imprevisibilidade”, “aleatoriedade” e “vulnerabilidade”, em contraposição com comportamentos familiares de tipo “estratégico” caracte- rístico das camadas médias. Trajetórias, práticas e estratégias foram se configu- rando aos poucos, por vezes, de acordo com as possibilidades surgidas no próprio campo escolar.

Já Portes (2006), em seu estudo das trajetórias escolares de estudantes de famílias populares matriculados em cursos altamente seletivos da universidade federal de Minas gerais, aponta que se, por um lado, o “trabalho escolar”, isto é, ações empreendidas pela família no sentido de assegurar a entrada e perma- nência do filho no interior do sistema escolar, é ocasional ou precariamente organizado com relação ao dito estritamente escolar (em função dos poucos conhe cimentos escolares acumulados), por outro, um “conjunto de circuns- tâncias atuantes”, observadas nessas famílias, tenderiam a se relacionar com o sucesso escolar. essas circunstâncias, observa o autor, não seriam completa-

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mente autônomas, mas sustentar-se-iam de forma conjugada e complexa, não parecendo possuir efeito importante de forma isolada.

destacam-se, a nosso ver, nos artigos de Portes (2000, 2006), e também no registro das entrevistas realizadas, o valor e a importância atribuída à escola; acompanhamento e vigilância, principalmente às “companhias” dos filhos, a presença e a disponibilidade em escutar e dar atenção aos filhos; o ato de levar e buscar na escola; a permissão para que os filhos deem conta de suas tarefas esco lares sem precisar se ocupar de tarefas domésticas; o esforço empreendido para os filhos não se ocuparem de trabalho remunerado que contribua para o orça mento da família; a valorização e a aceitação da ajuda de outras pessoas que conheçam a estrutura e o funcionamento do sistema escolar, indicando, por vezes, caminhos alternativos importantes (geralmente, professores da educação básica); e a ajuda material de terceiros.

aqui poderíamos fazer referência a alguns trabalhos que levantam a questão da permanência. Posteriormente, em outro trabalho, avançaremos no levanta- mento bibliográfico da produção nacional e estrangeira. o trabalho de almeida (2007), “estudantes desprivilegiados e fruição da universidade: elementos para repensar a inclusão no ensino superior”, ao investigar as maiores dificuldades encontradas por um grupo de estudantes de origem popular matriculados na universidade de são Paulo, aponta, como barreiras a uma melhor “fruição” ou permanência nessa universidade, a falta de dinheiro para comprar e fotocopiar livros, ausência de computadores em casa e pouco domínio de línguas estran- geiras, além das dificuldades ao lidar com atividades como a apresentação de seminários e redação de relatórios e trabalhos.

entre os entrevistados desta pesquisa, as mesmas evidências são encon- tradas. entretanto, o “tempo”, ou a falta dele, foi a dificuldade mais enfatizada para se manter no curso. a maioria deles precisou/precisa organizar o tempo entre trabalho, estudos superiores, responsabilidades domésticas, marido/es- posa e filhos, além do tempo despendido no trânsito de um lugar para o outro. o Caso 5, por exemplo, relatou que precisou mudar de residência, passando a ha- bitar na casa de sua avó, no primeiro semestre do curso, uma vez que, desse modo, poderia ficar mais próximo da instituição de ensino, evitando perder muito tempo no trânsito. Posteriormente, mudou de campus, diminuindo o pro- blema da distância entre sua casa e a faculdade. Tal fato pode indicar que esco- lhas quanto à ies podem estar condicionadas por esse “problema”.

os demais informantes não precisaram se mudar, contudo, destacaram a questão da distância entre casa e/ou trabalho e ies. o Caso 2 declarou ter feito a escolha pela ies em função da proximidade de sua residência (tal como afir-

mado no parágrafo anterior) e também ter deixado o trabalho por causa da dis- tância: “ao optar pela instituição, fiz pela que ficaria mais próxima de minha residência, em detrimento da PuC […] a mais de 70 km da minha casa”. a questão da falta de tempo também se mostrou um problema para a realização de estágio curricular obrigatório, requisito para a conclusão do curso de graduação: “o grande problema é que para me manter na universidade não posso sair do trabalho, e com esse trabalho, não posso estagiar” (Caso 1). seguem outras falas registradas:

não precisei me mudar, porém demoro cerca de uma hora e meia para chegar na faculdade. Já pensei em me mudar para uma comunidade perto da faculdade, como muitos amigos meus fizeram, mas minha família não gostou muito e também sairia mais caro. (Caso 4.)

não precisei mudar, mas passei um perrengue por causa da distância: uma hora e 45 todo dia para ir e voltar, sem contar as vezes que dava mais, por causa da chuva, trânsito e engarrafamento. (Caso 12.)

Pego seis ônibus por dia: dois para ir para a universidade, três da universidade pro trabalho e um para casa. (Caso 1.)

acordar às 5h para chegar às 8h no trabalho, até às 17h, para chegar após às 18h30 na faculdade, que começa as aulas às 18h, saindo às 22h e chegando em casa às 23h30 para fazer os trabalhos da faculdade e outras atividades até poder dormir à 1h do dia seguinte. Por este motivo foi impossível seguir trabalhando por mais três anos e meio e hoje estou só estudando para conseguir conciliar com a universidade, e só a esposa é que trabalha para manter a casa e parentes ajudam nas despesas e imprevistos. (Caso 2.)

[…] tive que deixar o trabalho no centro do rio de Janeiro por incompatibi- lidade de horário. (Caso 2.)

[…] incompatibilidade de horários com atividades profissionais, mesmo tendo escolhido a instituição tenho que utilizar três ônibus para chegar à universidade da minha casa, e se trabalhando no centro do rio de Janeiro, único local que tem trabalho digno para quem mora na zona oeste, levamos mais de duas horas para chegar. Tive, portanto, de deixar de trabalhar para poder estudar, o que reduziu mais ainda a minha renda. falta apoio da própria sociedade que não compreende o esforço, se no trabalho, na família, e até na própria universidade que trata

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todos como se fossem apenas estudantes, desconsiderando aqueles que têm de trabalhar e estudar . (Caso 2.)

a questão do uso do tempo aparece também no trabalho de Zago (2006). a autora entrevistou 27 estudantes de camadas populares que ingressaram em dife rentes cursos de graduação da universidade federal de santa Catarina. o tempo investido no trabalho como uma exigência de sua própria sobrevivência material foi apontado como uma dificuldade à participação em encontros organi- zados no interior e fora da universidade, em trabalhos coletivos ou “em grupo”, demandados pelos professores, e até mesmo em festas organizadas pelas turmas. Tal fato provocaria um sentimento de estar à margem da comunidade acadêmica e/ou um sentimento de partilhar, no ensino superior, a experiência de estar vi- vendo em outro mundo. esse sentimento também é apontado por outros autores (ver, por exemplo, viana, 2000).

um trabalho mais recente (e de qualidade) é a dissertação de mestrado de ávila (2010), intitulada Trajetórias e estratégias escolares de mulheres de camadas

populares que vivenciam uma tríplice jornada diária: trabalho remunerado, tra-

balho doméstico e estudos. além de os sujeitos entrevistados terem origem nas camadas populares, a autora introduz a dimensão de gênero: todas as quinze informantes são mulheres, casadas e mães, além de estudantes da universidade federal de são João del rei e trabalhadoras remuneradas. esse trabalho também apresenta uma especificidade com relação aos outros da literatura sobre o tema: não enfatiza a rede familiar de origem das informantes (pai, mãe e irmãos); as configurações familiares partem do status da entrevistada em relação aos seus maridos e filhos.

ávila (2010) mostra, ao longo do texto, que o apoio do marido (e também dos filhos) é fundamental para que continuem estudando. entretanto, em muitos casos, os maridos manifestam-se contra o desejo delas de cursarem o nível supe- rior (por insegurança, ciúme, entre outras razões), o que provoca uma situação de “estresse emocional” intenso, que, segundo elas, é pior que o esgotamento físico provocado pelas tarefas que cumprem no trabalho, em casa e na univer- sidade. embora todas tenham trabalho remunerado, atuando, na maior parte do dia, fora de casa, elas ainda são responsáveis pelo trabalho doméstico, ou pela maior parte dele, além do cuidado com os filhos. interessante foi a constatação de que um bem durável se mostrou de grande importância na otimização que precisam fazer do tempo: a máquina de lavar roupa.

o espaço do trabalho é aquele em que elas conseguem se dedicar, exclusiva- mente, a apenas uma tarefa. Todos os outros espaços são marcados por uma mul- tiplicidade de tarefas que são realizadas ao mesmo tempo ou com constantes

interrupções (por exemplo, estudar e preparar comida ao mesmo tempo). na universidade, as estratégias de sobrevivência também são bastante interessantes. em primeiro lugar, procuram aproveitar ao máximo os momentos em que estão em sala de aula, pois sabem que em casa ou no trabalho não terão tempo para estudar. assim, “prestar atenção na aula”, além de “anotar tudo o que o pro- fessor fala” são as principais práticas apontadas em relação à conquista de boas notas. o mau desempenho é visto pelas entrevistadas como culpa do professor que não dá boas aulas e/ou não se interessa pelos alunos.

dessa maneira, a assiduidade às aulas é uma postura adotada por todas. as faltas são reservadas para casos de “extrema necessidade”, como a doença de algum filho, ou quando usam o tempo de uma disciplina para estudar para a ava- liação de outra. a questão da otimização do tempo também aparece no modo como se relacionam com os colegas. nos intervalos ou “tempos vagos” entre uma aula e outra, raramente conversam com outras pessoas ou se distraem com algum passatempo. ocupam todas as brechas de tempo com atividades esco- lares. além disso, estudam no ônibus, quando se deslocam de um local para outro ao longo do dia, no horário das refeições, de madrugada, quando a família vai dormir, ou mesmo antes de a família acordar. Muitas acordam antes do ama- nhecer com esse fim também pelo fato de estar mais silencioso em casa.

essa também é a realidade dos entrevistados desta pesquisa. o Caso 15 obser vou a mesma sensação dos informantes de Zago (2006): impossibilidade de viver, de fato, a condição de estudante universitário, por estar trabalhando. desse modo, não podia participar de eventos acadêmicos e nem mesmo de festas da turma. assim, parecia estar “à margem”, de estar vivendo num mundo que não era dele. Já o Caso 13 apontou o mesmo encontrado pelas entrevistas de ávila (2010): o apoio do marido nas atividades domésticas como fundamental para sua permanência na universidade. Tal fato, entretanto, não a livra do “es- tresse emocional” causado pelas reclamações dos filhos quanto à sua ausência em casa. a entrevistada relatou que um de seus filhos se sente “revoltado” porque tem uma “mãe diferente” (que estuda e não fica em casa).

os entrevistados também informaram que quase não se dedicam aos estudos fora do ambiente da ies. o Caso 3, por exemplo, observou que estuda nos fins de semana somente em épocas de provas. o Caso 6, por trabalhar de segunda a sábado, estuda “um pouco” apenas aos domingos. o Caso 12 relatou que não costuma estudar em casa, que “não gosta” e que só fazia isso “quando não tinha jeito, tipo fazer trabalho”. Portanto, “prestava muita atenção nas aulas e tentava estudar nos intervalos”. no caso de ser uma necessidade urgente, por exemplo, uma avaliação que teria que realizar em breve, “matava uma aula para estudar

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pra outra” ou tentava chegava mais cedo à faculdade para “recapitular” o con- teúdo. Ter que estudar fora do espaço da ies traria, para ela, “infelicidade”: “acho que a gente precisa de tempo para ser feliz” (Caso 12).

Portes (2000) observa uma estratégia importante, entre os estudantes de sua pesquisa, para uma melhor “socialização interna no mundo universitário”, e, assim, viabilizar sua permanência no ensino superior: a adoção de uma “postura autônoma” na qual o aluno, por si só, busca “se virar” para compensar as dificul- dades advindas, sobretudo, do conteúdo das disciplinas. entre os informantes desta pesquisa, essa dificuldade também foi evidenciada, mas com menor ênfase. uma das estratégias adotadas foi a iniciativa, dos próprios alunos, em organizar aulas de reforço – pagas – dirigidas por alunos já em conclusão de curso. e, sobre esse aspecto, teceram algumas críticas à atividade de “monitoria” das ies, que poderia ser mais bem aproveitada, funcionando como aulas de reforço/apoio gratuito, sob orientação dos próprios professores de suas disciplinas.

assim, até o momento, o que se pode concluir é que são limitadas as inicia- tivas institucionais que garantam a permanência desses estudantes nas ies, que têm que recorrer a família, parentes e amigos, numa tentativa de driblar suas difi culdades. além disso, foi comum a fala, muito próxima das dos achados de Portes (2000), de que é preciso “proatividade”, “luta”, “garra”, “determinação”, “independência”, “maturidade”, “esforço”, “atenção” e “senso de responsabili- dade” para, diante de circunstâncias tão adversas, gerir, ao mesmo tempo, várias lógicas de ação diferentes (família, trabalho etc.), incluindo o aprendizado do “ofício de estudante” (Coulon, 1998) ou da “entrada na vida universitária” – indo de uma posição de “estranhamento” desse novo mundo à completa “afi- liação” a ele (ou não, para aqueles que evadem).

enfim, esta foi apenas a “primeira rodada” de análise das informações levan- tadas nas entrevistas realizadas. em breve, espera-se o avanço no estudo de teo- rias e informações já produzidas no Brasil (e em outros países) sobre a perma- nência de estudantes de origem popular no ensino superior para uma melhor interpretação de evidências ainda por avaliar. espera-se, igualmente, o aprofun- damento de análises quanto às relações que os informantes estabelecem/conse- guiram estabelecer com o saber e com a instituição de ensino superior, com- preendendo as etapas apontadas por Coulon (1998), particularmente sobre como passaram a ser capazes de interpretar as regras explícitas ou não da ies e a do- minar as exigências intelectuais necessárias para realizar um verdadeiro “ofício de estudante”, mostrando fidelidade à cultura acadêmica.

Conclusão

neste trabalho se teve por objetivo apresentar os primeiros dados sistemati- zados de uma pesquisa empreendida sobre a permanência de estudantes benefi- ciários do Prouni no ensino superior. Como foi visto, a permanência, e, portanto, a não evasão ou desistência do curso de graduação, tem se constituído em um tema importante para a sociologia da educação, particularmente para o campo dos estudos em sociologia das desigualdades de oportunidades educacionais. desde os anos de 1950-1960 se tem observado que quanto maior o volume de recursos culturais, econômicos e sociais apresentados pela família de origem dos alunos, maior é a probabilidade de acessarem os níveis mais elevados do sistema de ensino e de nele permanecerem, chegando, com sucesso, ao diploma de ensino superior (e a posições no mercado de trabalho).

desse modo, como interpretar o sucesso escolar (e social) de indivíduos e grupos que, objetivamente, apresentam limitações desses recursos? essa é uma questão corrente. e, mesmo que uma política como o Prouni venha a minimizar o problema do acesso ao ensino superior, como garantir a permanência nele? a literatura sociológica tem mostrado que existem muito mais iniciativas indivi- duais e organizadas pelos próprios alunos, que tentam “se virar” para driblar suas dificuldades, que ações institucionais. estas deveriam levar em conta mais do que as limitações materiais, geralmente solucionadas com a oferta de auxílios sociais que custeiem os gastos com transporte, alimentação e compra de mate- rial. a questão da “falta de” ou da organização do tempo foi apontada como a maior dificuldade para além das questões financeiras.

ações institucionais poderiam e deveriam considerar um perfil de aluno muito marcado por ter que dividir o próprio tempo entre estudo, trabalho, fa- mília e tarefas domésticas. a distribuição de auxílio social é suficiente para lidar com esse fato? se não for, não seria preciso aprofundar questões acerca da peda- gogia universitária, estilos de aula e docência e até mesmo da formação de leitores (dauster et al., 2007) para garantir uma melhor conversão à cultura aca- dêmica? em seu livro A condição de estudante: a entrada na vida universitária, Coulon (1998) observa que a primeira tarefa a ser cumprida por quem ingressa na universidade é aprender o “ofício de estudante”, uma espécie de “afiliação” institucional e intelectual. a democratização do acesso, portanto, deveria ser acompanhada por uma democratização do acesso/afiliação ao saber.

Coulon (1998) mostra, a partir de um estudo de caso – a universidade de Paris 8 –, que o principal problema do “ser estudante” é o de manter-se por vá- rios anos na universidade, uma vez que o crescimento da demanda por formação

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superior e das possibilidades de acolhimento de mais estudantes não resultaram numa mudança sensível das taxas de abandono. sua hipótese é a de que os estu- dantes que não permaneceram não se “afiliaram”. essa afiliação se completaria por uma passagem em três tempos: o do “estranhamento”, o da “aprendizagem”, e o da “afiliação” propriamente. assim, num primeiro tempo, o estudante entraria num universo desconhecido; ele se adaptaria progressivamente e uma acomodação se produziria; e, por fim, o manejo relativo das regras e da cultura acadêmica permitiria a “afiliação”.

desse modo, o “sucesso acadêmico” dependeria, em grande parte, da capa- cidade de inserção ativa dos estudantes nesse novo ambiente, onde, em geral, a relação pedagógica com os professores é extremamente reduzida (diferentemente da educação básica). Com tanta autonomia na universidade para gerir a própria vida, Coulon (1998) argumenta que a entrada nela é acompanhada também por modificações que os estudantes devem fazer nas relações que mantêm com o tempo, de modo a aprender os inúmeros códigos da vida intelectual e proceder de maneira que os professores, que são também seus avaliadores, reconheçam que eles apresentam um domínio suficiente para exercê-los. a exibição da “com- petência” assumiria diversas formas: expressão oral e escrita, saber apresentar referências teóricas e bibliográficas etc.

Como, então, se adquiriria essa cultura? o que se observa – tanto no tra- balho de Coulon (1998) quanto em outros – é que quanto menos tempo se passa na universidade, mais isolado de múltiplas e minúsculas operações (burocráticas, sociais e culturais) importantes se toma parte, o que prejudicaria a “afiliação”, isto é, a obtenção dessa cultura acadêmica, fundamental para uma “permanência efetiva”. entre os que apresentam o desejo de abandonar o ensino superior há lamentações que indicam que não conseguiram se habituar ao mundo universi- tário ou que se sentiam cansados, abatidos ou que não “trabalharam o suficiente” (ibidem). o abandono pode ocorrer quando vínculos institucionais, sociais e cul- turais, ainda frágeis, são desfeitos. Para vínculos fortes seria necessário mais tempo de vivência no interior desse campo.

Muitos dos que pensam em abandonar não percebem, em instruções claras, que seus professores e a instituição em geral lhes demandam um trabalho cul- tural específico que eles próprios devem gerir. assim, uma das funções da orien- tação acadêmica deveria ser, precisamente, a de ajudar os estudantes a trabalhar academicamente. na pesquisa realizada, os entrevistados chegaram a reclamar da atividade de monitoria, pois ela nem sempre funciona, realmente, como orien- tação acadêmica ou reforço de conteúdo. eles nem chegam a citar qualquer tipo de ação de coordenações de orientação e acompanhamento acadêmico nas ies

onde estudam. seus informantes não são professores, mas os funcionários que trabalham nas secretarias, que, em geral, só acumulam um saber prático que faz deles experts institucionais de burocracias.

Coulon (1998) observa que muitos dos estudantes de sua pesquisa que ainda cursavam o primeiro ano e que afirmavam que não se sentiam bem na universi- dade eram aqueles que permaneciam nela apenas o tempo das aulas. e mais, quando não estavam presentes não pensavam nos estudos; só se davam conta que tinham “trabalho para fazer” no quadro instituído de um controle (uma prova, por exemplo). essa também é uma evidência encontrada na investigação condu- zida, uma vez que os entrevistados quase nunca estudavam fora da ies e das