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teoria, decisões e corpus

1.2 o estabelecimento do córpus

1.2.1 percurso de definição

No início desta pesquisa, dois objetos de estudo haviam sido selecionados:

• o conjunto de livros didáticos da coleção Brasil Intercultural: língua e cultura

brasileira para estrangeiros (daqui em diante coleção BI), o mais recente dentre

os materiais indicados em lista elaborada pela Sociedade Internacional de Português Língua Estrangeira (SIPLE),16 produzido em Buenos Aires pela Casa do Brasil sob a autoria de Aline Moreira, Cibele Nascente Barbosa, Giselle Nunes de Castro, Isaüre Schrägle e Paula Monteiro Mendes, com coordenação de Edleise Mendes, e cuja primeira edição havia sido publicada em 2011;

• as unidades didáticas de Português Brasileiro disponibilizadas pelo Brasil (152 no momento da coleta) no Portal de Ensino do Professor de Português Língua Estrangeira (PPPLE), lançado em 29 de outubro de 2013 na II Conferência

sobre o Futuro da Língua Portuguesa no Sistema Mundial, em Lisboa.17

Postos em relação, estes materiais poderiam se revelar interessantes, uma vez que constituídos por modos distintos de textualização – aspecto relacionado às condições de produção pouco estudado nos materiais didáticos de Português Língua Estrangeira (daqui em diante PLE), que enfatiza a alteridade constitutiva da “passagem do discurso ao texto” (SALGADO, 2016b, p. 147) e que

[...] procura abarcar a condição dinâmica dos textos, na qual um conjunto de práticas alimenta o sistema em que elas se instituem – algo diferente da noção de texto mais corrente nas teorias textuais, em que o termo texto delimita o objeto fundamental (SALGADO, 2016b, p. 196).

Nos interessava observar as implicações de produção e de recepção de um livro impresso, catalogado e distribuído para venda em vários países, muito diferentes daquelas que decorrem de unidades didáticas produzidas em formato PDF (Portable Document Format

16 A lista podia ser conferida na aba “Séries didáticas” do Portal da SIPLE disponibilizada no site da Sociedade

pelo menos até maio de 2019, quando a coleção BI continuava sendo a mais recente das indicações. A página não está mais disponível, mas um print screen da tela está registrado na figura 32 (cf. item 2.2 do CAPÍTULO 2).

17 Com informações da notícia publicada no Blogue do IILP – Instituto Internacional de Língua Portuguesa em

30 de outubro de 2013. Disponível em: http://iilp.wordpress.com/2013/10/30/ppple-esta-no-ar/. Último acesso em: 06 maio 2019.

[Formato Portátil de Documento]) e liberadas para reelaboração e uso não comercial sob a licença Creative Commons,18 facilmente baixáveis mediante um registro simples de usuário.19 Importava pensar esses materiais, portanto, na relação estabelecida entre o material linguístico e seus modos de inscrição, ligados a práticas discursivas que influenciam diretamente seus fluxos de circulação e leituras decorrentes.

Ao longo da pesquisa, notamos uma baixa interatividade dos usuários e a impossibilidade do mapeamento da circulação das unidades do PPPLE, como mencionamos anteriormente. Decidimos, em certo momento, excluir as unidades didáticas do córpus; no entanto, posteriormente, levando em consideração a importância outorgada ao PPPLE para a construção da lusofonia pelas instituições que abrigam esse projeto político – como o Instituto Internacional de Língua Portuguesa (IILP) e, portanto, a própria Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) – e o fato de termos encontrado suas unidades disponibilizadas como “Materiais Didáticos” no site da Rede Brasil Cultural – Divisão de Promoção da Língua Portuguesa (DPLP),20 mantido pelo Ministério das Relações Exteriores (Itamaraty), o Portal foi mantido como parte integrante do córpus.

Como um segundo aspecto constitutivo das condições de produção desses mídiuns dizia respeito à conjuntura glotopolítica internacional em que esses materiais foram concebidos, para observar o modo como ideologias linguísticas postas no debate público entram em conflito nesses materiais, bem como as suas implicações para o ensino e para a circulação de imaginários de língua e de cultura relacionados ao Brasil, fizemos um estágio de onze meses em Buenos Aires entre março de 2017 e fevereiro de 2018 sob supervisão da pesquisadora Elvira Arnoux21.

Esse estágio nos permitiu conhecer uma parte importante da produção e a circulação de

18 De modo resumido, a licença Creative Commons se diferencia de outros tipos de registro pela possibilidade de

o autor especificar os parâmetros de compartilhamento e adaptação do material, mantido o direito de atribuição. Seu funcionamento pode ser encontrado em: http://creativecommons.org/. Último acesso em: 21 nov. 2016.

19 “Todos os materiais disponibilizados no PPPLE estarão ao abrigo de uma licença Creative Commons (by-nc-

sa). Esta licença permite que outros remixem, adaptem e criem obras derivadas sobre a obra original, desde que com fins não comerciais, e obriga que atribuam crédito ao Portal e licenciem as novas criações sob os mesmos parâmetros. Toda nova obra feita a partir desta deverá utilizar a mesma categoria de licenciamento, de modo que qualquer obra derivada, por natureza, não poderá ser usada para fins comerciais” (IILP, 2017b).

20 Note-se que, ao menos até a data de 3 de fevereiro de 2018, o “Portal do Professor” do hiperlink da página não

correspondia ao Portal do Professor de Língua Estrangeira (PPPLE) – tratava-se, seguramente, de um equívoco entre duas plataformas de nomes semelhantes, mas com finalidades e públicos distintos. Em nova consulta no mês de setembro de 2018, verificamos que o erro foi corrigido. Atualmente, as Unidades passaram a ser disponibilizadas na própria página do Itamaraty e organizadas por módulos, diferentemente de sua disposição no Portal, que não tem sequência definida além dos níveis pré-estabelecidos (1, 2 e 3). Disponível em: http://redebrasilcultural.itamaraty.gov.br/material-didatico. Último acesso em: 05 set. 2018.

21 O estágio foi financiado pela modalidade de Bolsa de Pesquisa de Estágio no Exterior (BEPE/FAPESP).

materiais didáticos de português brasileiro em Buenos Aires, cidade onde foi lançada a coleção BI, que já compunha o córpus inicialmente definido.

O leque de materiais didáticos foi então ampliado para abranger essas produções bastante recentes de ensino do português brasileiro em circulação no ano de 2017, portanto em relação interdiscursiva com a coleção produzida pela Casa do Brasil. Assim, estabelecemos como recorte o ano de 2017 e os materiais produzidos por quatro instituições de ensino de português tradicionais da cidade (no sentido de que, à exceção do Centro Cultural Brasil- Argentina (CCBA), todas atuam há mais de 20 anos na área de ensino de português).22

A coleta dos materiais impressos e digitais se deu entre abril de 2017 e janeiro de 2018. A seguir, descrevemos brevemente os materiais coletados e as instituições visitadas. Os dados referentes a publicações e a números de inscritos em cursos foram fornecidos por coordenadores e diretores de cada instituição entre os meses de junho e julho de 2017, por e-mail, após as entrevistas, e indicam o número de matriculados, sem necessariamente refletir a quantidade de alunos que finalizaram os cursos.23