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PERIGOS E CUIDADOS NO ENFRENTAMENTO DO PROBLEMA Iniciamos este artigo delimitando um problema: aquele que se circunscre-

Anotações sobre criatividade, inovação, cultura e desenvolvimento

PERIGOS E CUIDADOS NO ENFRENTAMENTO DO PROBLEMA Iniciamos este artigo delimitando um problema: aquele que se circunscre-

C OLE Ç Ã O DO OBSER V A TÓRIO D A E C ONOMIA CRIA TIV A

ra e desenvolvimento. Afirmamos que, em contexto tão paradoxal, nosso objetivo era somente contribuir para fazer avançar a discussão da equação do desenvolvimento e de suas variáveis – criatividade, inovação e cultura.

É evidente que a rapidez com que tentamos delimitar conceitual- mente os “novos” termos (cultura, inovação, criatividade) que têm vindo a frequentar a “equação” do desenvolvimento nem de longe dá conta da complexidade que encerram. É esta, com certeza, uma tarefa que exige um esforço de investigação multidisciplinar que precisa ser devidamen- te aprofundado.

Analisamos a relação entre desenvolvimento, inovação e criativida- de, de uma perspectiva schumpetriana, definindo desenvolvimento como o processo de destruição criadora, engendrado pela geração e difusão de inovações. Assinalamos ainda que, da perspectiva da literatura sobre de- senvolvimento e inovação revisada, não podemos incorrer no risco de desconhecermos a importância e as contingências das instituições e do ambiente institucional (da cultura) para a criatividade, inovação e desen- volvimento, tendo em vista que todo desenvolvimento é dependente de caminho (path dependence).

Tentamos também evitar a “naturalização” do resultado virtuoso da re- lação entre cultura e desenvolvimento e o risco de negligenciar especifici- dades do “onde e quando” se dá a trama sociocultural, isto é, as especifici- dades simbólico-culturais dos lugares e territórios e sua apropriação por atores diferenciados, pois transformações nos usos e práticas podem vir acompanhadas de exclusões tanto de culturas como de seus agentes pro- dutores primários. Também não podem ser negligenciadas variáveis fun- damentais e que se inscrevem no terreno da história, da política e da eco- nomia. Lembremos que a ênfase excessiva na criatividade de indivíduos e grupos na conformação de padrões de produção e de acumulação amplia riscos de recaídas deterministas de que “progresso” e “desenvolvimento” são apanágios apenas de determinados povos enquanto que outros estão fadados à pobreza e ao atraso eternos.

DIMENSÕE S CRIA TIV A S D A E C ONOMIA D A CUL TURA

Outro cuidado de grande importância diz respeito ao fato de que não se pode sobrevalorizar os aspectos alegóricos dos bens culturais em detri- mento de seus aspectos simbólicos para atribuir-lhes valor de mercado, isto é, valor de troca, o que significaria reservarmos à cultura um papel de simples e mero “recurso” na composição da “equação” do desenvolvimen- to. Cuidados também devem ser adotados no que concerne às formas de organização da produção e do trabalho no mercado da cultura e seus reba- timentos sobre a geração de valor, a natureza dos bens e serviços simbóli- co-culturais e as formas de apropriação da riqueza gerada.

Por fim, e numa perspectiva mais geral, é preciso estarmos atentos e aler- tas para que o potencial de geração de riquezas e de empregos representado pelo mercado da cultura não seja apartado da compreensão da cultura como geradora de riquezas simbólicas. Ou seja, não se trata apenas de perseguir o crescimento econômico por meio do estímulo às atividades ligadas à cultura, mas também, e principalmente, de criar condições propícias ao aumento da diversidade das manifestações culturais, promovendo a inclusão, simultane- amente cultural, social e econômica, de novos e múltiplos agentes criadores. Adotar uma visão instrumental, e não substantiva, da relação entre cultura, inovação, criatividade e desenvolvimento, significará, sem mais, reforçar e proteger os interesses dos agentes e repertórios culturais e de inovação já estabelecidos. Significará, enfim, desconsiderar-se que a cultu- ra, dimensão fundamental do desenvolvimento das sociedades, dos grupos sociais e dos indivíduos, representa, em especial, corpo de valores que ali- menta o enriquecimento do patrimônio comum da humanidade, na medi- da em que as tradições e experimentações (criativas e inovadoras) de uma sociedade ou de um grupo social e suas formas de expressão são seus meios de afirmar sua presença no mundo. A ausência dessa visão substantiva de cultura impacta negativamente sobre os outros termos da equação do de- senvolvimento: criatividade e inovação.

Assim, o que se espera da relação entre cultura e desenvolvimento é, além da criação de um clima cultural propício à criatividade e à inova-

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ção, certamente, a perspectiva do acionamento das oportunidades que se abrem quanto à expansão do espaço de criação e de circulação de mani- festações culturais, com evidentes ganhos econômicos, mas também, com ganhos propriamente culturais, com a produção e a circulação ampliadas de repertórios simbólicos capazes de oferecer alternativas às produções simbólicas dominantes, incluindo-se aí diferentes concepções e modelos de desenvolvimento.

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