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As redes da festa de São João na Bahia CARLOTA GOTTSCHALL

POSITIVIDADES DA FESTA

Do ponto de vista das prefeituras municipais, as fontes de recursos advin- dos do São João 2013 foram diversificadas, tendo origem em patrocinado- res privados (Caixa Econômica Federal, Ambev, Sebrae, Bradesco, Trident, Schin, Cachaça 51, Petrobras que, através de edital, destinou R$ 8 milhões distribuídos entre 110 municípios e empresários locais); do Poder Público, R$ 3,86 milhões decorrentes de convênio celebrado entre Setur/Bahiatur- sa e os 77 municípios selecionados; da arrecadação do Imposto sobre Ser- viços de Qualquer Natureza (ISS) e da venda de espaço público para insta- lação de barracas, de pontos para ambulantes, quiosques e trailers, dentre outros. Para o governo estadual, a arrecadação de Imposto sobre a Circula- ção de Mercadorias (ICMS) é o principal destaque.

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As principais fontes de despesas municipais são: pagamento de músi- cos e infraestrutura de shows, decoração da cidade, segurança e limpeza pública. O pagamento dos músicos foi citado como o percentual mais ele- vado dos gastos, já que 70% das atrações são estaduais e nacionais e 30% são artistas locais ou regionais. É corrente entre os gestores públicos a im- portância financeira, de imagem e de retorno político que se sucede com a realização da festa.

De igual maneira, todos os entrevistados afiançaram os benefícios eco- nômicos, sociais e culturais da festa de São João em 2013. Para 92,4% dos empresários entrevistados, o festejo junino favorece o aumento do fatura- mento de suas empresas que, em geral, são empreendimentos de pequeno e médio porte (com faturamento médio mensal que varia entre até R$ 3 mil e superior a R$ 35 mil). A pesquisa evidenciou que quanto menor é a empresa, maior é o impacto positivo da festa. Identificou também que as empresas de menor porte são mais frequentes em Amargosa, Piritiba, Ca- choeira, Mucugê e Lençóis e as empresas com faturamento médio mensal são prevalecentes em: Jequié, Santo Antônio de Jesus, Cruz das Almas e Senhor do Bonfim.

Os setores de atividades mais representativos da amostra foram ali- mentação e bebidas, alojamento, comércio de vestuário e calçados. De ma- neira geral, os empreendimentos são beneficiados pela festa tanto pela de- manda externa – grupo de turistas hospedados em hotéis ou que alugam casas – quanto pela demanda dos moradores que recebem familiares e/ou amigos, principal meio de hospedagem identificado em pesquisa contrata- da pela SETUR.2

A importância econômica do São João justifica a contratação de traba- lhadores temporários, principalmente pelos empreendimentos que ope- ram com até três funcionários permanentes (67,6%). A totalidade dos em-

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presários dos segmentos de fabricação de artesanato, agências de viagem e operadoras de turismo, atividades artísticas e de espetáculo, demandou trabalhadores temporários. As novas vagas são ocupadas por moradores locais, dinamizando, assim, o mercado de trabalho das cidades que, em ge- ral, não oferecem oportunidades para os seus cidadãos.

Dentre os trabalhadores informais, observou-se que boa parte do traba- lho principal desenvolvido pelos entrevistados durante o ano, na maioria dos municípios, se relaciona à prestação de serviços de ambulantes de alimen- tação (60,9%) e de comércio ambulante que atua nas feiras livres (25,2%), havendo grande correlação entre estas atividades e as que oferecem nos dias de São João, quando predomina o comércio de produtos para alimentação.

Em geral, as funções desempenhadas pelos trabalhadores informais não demandam custo elevado e nem diferencial de competitividade, o que implica baixo retorno financeiro. Prova disto é que 46,4% dos responden- tes disseram ganhar até R$ 650,00 mensais em seu trabalho principal e apenas 10% obtiveram retorno financeiro superior a R$ 1.501,00. Durante a festa, parte dos entrevistados afirmou obter acréscimos em seu rendi- mento mensal, ainda que os locais nos quais acontecem as festas privadas que oferecem serviços all inclusive (Grupo 2) o retorno financeiro seja rela- tivamente menor do que nas outras localidades.

O impacto positivo do São João sobre as economias locais e regionais ad- vindo dos serviços comercializados pelos trabalhadores informais decorre do fato de que parte dos bens comercializados é proveniente da produção própria dos entrevistados (40%), que adquirem matérias-primas no comér- cio local, formal e informal, e/ou em outras praças (no Grupo 1, 48,6% dos entrevistados disseram elaborar o produto que comercializa); e da revenda de produtos de terceiros (acessórios, bijuterias, comestíveis, bebidas, arte- sanatos), adquiridos de empresas locais e de fora do município.

Em relação aos atores culturais, foram entrevistados, principalmente, músicos, grupos de forró e, em menor proporção, integrantes de quadri- lhas e produtores culturais. Neste conjunto, a pesquisa indicou que estes,

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em sua maioria, possuem rendimento superior (R$ 5 mil por mês) a média dos demais entrevistados, inclusive dos empresários, e que a festa de São João configura-se numa oportunidade para aumentarem o seu rendimen- to mensal. Outro aspecto interessante é o apreciável grau de investimento destes atores para participação no festejo, ao declararem aplicar recursos na reforma ou ampliação do negócio, ou ainda, na compra de matéria-pri- ma. Na maioria das vezes, este investimento promove efeitos multiplica- dores regionais, já que os produtos demandados não são encontrados nas cidades sedes da festa, em geral, os mercados de Feira de Santana e Salva- dor são os mais beneficiados.

Em todos os casos estudados, a pesquisa indicou que as positividades do São João e seus efeitos multiplicadores sobre a economia ultrapassam os limites territoriais dos municípios pesquisados, mas antes, provocam demandas regionais e interestaduais. Feira de Santana e São Paulo apa- receram como os principais fornecedores de produtos e matérias-primas citados pelos empresários em questão. Salvador responde pela emissão dos negócios artísticos e pela rede de produtoras culturais. (Ver Mapa 1, em anexo)

As entrevistas também permitiram a identificação da rede de fornece- dores e as conexões territoriais em cada um dos municípios pesquisados. Assim, pôde-se perceber que para Cachoeira, Alagoinhas é um polo impor- tante de fornecimento; para Lençóis, a principal indicação é Seabra; para Mucugê, Barra da Estiva, Vitória da Conquista e Jequié foram citados na mesma proporção. Cruz das Almas também demanda produtos de Alagoi- nhas, Santo Antônio de Jesus e Valença; Jequié, de Vitória da Conquista; Se- nhor do Bonfim demanda produtos de outros estados, com destaque para Petrolina/PE; Santo Antônio de Jesus se distingue por fornecer produtos para o abastecimento interno dos empresários e também por cumprir o pa- pel de distribuidor para os municípios vizinhos, a exemplo de Amargosa; e Piritiba procura fornecimento em Jacobina. (ver Mapas em anexo)

DIMENSÕE S CRIA TIV A S D A E C ONOMIA D A CUL TURA CONCLUSÃO

A pesquisa preliminar aplicada no São João 2013 em nove municípios tra- dicionais da festa apontou indicativos importantes que instigam a necessi- dade de se buscar metodologias e pesquisas primárias para aprofundar as informações que emergiram desta investigação. Um dos aspectos é a arti- culação em redes que se formam em função da festa: as redes de negócios dos artistas, dos produtores culturais, dos fornecedores de mercadorias e de serviços diversos. Estas redes demonstraram a centralidade regional de alguns municípios, que se destacam pela capacidade de produção e logís- tica de distribuição de bens e serviços. Outro indicativo é a diversificação dos serviços artísticos e do modelo de negócios do Carnaval que se desdo- bra de diversas maneiras dentre as inúmeras festas juninas.

Também chama atenção o retorno financeiro e os efeitos multiplica- dores da festa para a socioeconomia municipal, regional e estadual. Este impacto não foi mensurado a contento neste primeiro ensaio, devido às limitações metodológicas para geração de indicadores na área da cultura e, particularmente, das festas populares. Também, as limitações na coleta de dados institucionais e na metodologia do ensaio não permitiram avanços neste sentido.

O desafio para construção de indicadores na área da economia da cul- tura e, particularmente, da economia da festa, precisa ser enfrentado pelos estudiosos e pelo poder público, para avançar o processo de conhecimento e mensuração dos efeitos da economia da cultura para a geração de rique- zas no Brasil.

REFERÊNCIA

CAVALCANTE, B. C. Novos lugares da festa: tradições e mercados. Revista

Observatório Itaú Cultural, São Paulo, n. 14, p. 13. 2013.

GOVERNO DO ESTADO DA BAHIA. Carlota e outros. relatório: efeito da Festa de São João em Municípios Selecionados. Salvador: SEI, 2013. Disponível em: <http:// www.sei.ba.gov.br/images/publicacoes/download/relatorios/relatorio_sao_joao.pdf>. Acesso: 18 ago. 2015.

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GOVERNO DO ESTADO DA BAHIA. Pesquisa de Caracterização do Turismo Receptivo da Bahia. Salvador, Fundação Instituto de Pesquisa Econômica, 2011. Disponível em: <http://pt.slideshare.net/turismobahia/caracterizao-do-turismo- receptivo-2011>. Acesso em: 18 ago. 2015.

ITANI, A. Festas e calendários. São Paulo: Editora UNESP, 2003.

OLIVEIRA, G. C. F. de. Carnavalização do São João em Senhor do Bonfim – Bahia: tradição em movimento. In: ENCONTRO DE ESTUDOS MULTIDISCIPLINARES EM CULTURA, 6., 2010, Salvador. Anais... Salvador: Facom, UFBA, 2010.

REVISTA OBSERVATÓRIO ITAÚ CULTURAL. São Paulo: Itaú Cultural, ISSN 1981- 125X. Semestral.

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ANEXOS

Mapa 1 – Fluxo total dos fornecedores às empresas pesquisadas no São João 2013

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Mapa 2 – Fluxo de produtos por origem dos fornecedores que vendem aos empresários pesquisados no São João 2013 Grupo 1 de municípios

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Mapa 3 – Fluxo de produtos por origem dos fornecedores que vendem para os empresários pesquisados no São João 2013 – Grupo 2 de municípios

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Mapa 4 – Fluxo de produtos por origem dos fornecedores que vendem para os empresários pesquisados no São João – Grupo 3 de municípios

Políticas criativas para um