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A permanência dos estudantes na EJA sob as perspectivas das professoras

4.1. Sobre as professoras da EJA

4.1.3. A permanência dos estudantes na EJA sob as perspectivas das professoras

Neste tópico centramos nossas discussões sobre a temática Permanência na EJA. Buscamos captar, nas entrevistas com as professoras, que fatores elas consideram influenciar para os estudantes estarem na escola e que estratégias as mesmas utilizariam para contribuir com essa permanência.

Dessa maneira, uma primeira pergunta direcionada às professoras foi: Que motivos você considera que levariam os estudantes a permanecerem em seus estudos na EJA? A Professora A nos respondeu:

Acredito que a parte de valorizar esses alunos é uma coisa primordial para quem trabalha na EJA. A gente sabe que a EJA tem evasão, eles trabalham o dia inteiro. É chato até quando gente que vai à faculdade e a aula não é tão gratificante, imagina para quem trabalha o dia todinho no sol e chega à noite querendo aprender alguma coisa e a aula não tem motivação nenhuma. Ai foi pensado com os professores a questão de todo mês a gente celebrar os aniversariantes. Tudo era por conta dos professores. Teve um aluno meu que disse que nunca na vida ele tinha tido uma festa de aniversário, e a oportunidade que ele teve foi na escola. Quem faltava menos também a gente fazia o quadro de Aluno destaque. Era uma competição só. Tinha gente que não faltava por nada. Olhe, na enchente, não foi uma enchente, mas toda vez que chove a estrada fica coberta de água, faltaram quase todos os alunos, menos uma aluna que sempre estava lá. Só foi eu e essa aluna nesse dia.

A resposta acima explicita algumas estratégias utilizadas pela Professora A e que, segundo ela, “foi pensado com os professores”: comemorar os aniversariantes do mês e o Quadro Aluno destaque. Estas são tidas, pela referida professora, como ações de valorização dos estudantes, o que ela considera “primordial para quem trabalha na EJA”. A mesma segue explicando os resultados destas estratégias e, pela sua fala, percebemos que as mesmas tiveram êxito, como o Quadro Aluno destaque: “[...] toda vez que chove a estrada fica coberta de água, faltaram quase todos os alunos, menos uma aluna que sempre estava lá. Só foi eu e essa aluna”.

Entendemos que tais ações estão diretamente ligadas à prática pedagógica da Professora A, tendo em vista que elas contribuíram para que os estudantes continuassem frequentando a escola. Além disso, ao referir-se sobre o “valorizar esses alunos”, compreendemos a intencionalidade das ações direcionadas para um objetivo de acolhimento dos estudantes na escola. Percebemos que um sentimento de empatia, dado pela experiência da Professora A como estudante universitária, a fez refletir sobre sua prática com os jovens e adultos: “É chato até quando gente que vai à faculdade e a aula não é tão gratificante,

imagina para quem trabalha o dia todinho no sol e chega à noite querendo aprender alguma coisa e a aula não tem motivação nenhuma”.

Compreendemos que ao colocar-se no lugar de um estudante da EJA a Professora A reconstrói seu pensamento enquanto docente, passando a percebê-los “como novos personagens, com suas paixões, medos, esperanças e frustrações. Novas imagens, novos sujeitos que começam a falar, sem medo de falar de suas linguagens” (ARROYO, 2014, p. 50). É talvez por esse sentimento de empatia e de permitir o diálogo em sala, que o estudante vai sentir-se à vontade em relatar sua vida, o que a docente nos diz: “[...] que nunca na vida ele tinha tido uma festa de aniversário, e a oportunidade que ele teve foi na escola”.

A mesma pergunta foi realizada para a Professora B, que nos deu a seguinte resposta: Assim, o que eu vejo muito que causa evasão, alguns são pela droga que, infelizmente tem, e o cansaço do trabalho né. Muitos dizem que querem terminar aqui para fazer o ensino médio e conseguir uma profissão. A gente conversa muito, estimula eles para não desistirem, para terminarem e se qualificarem, fazer um curso. Acredito que nossas aulas sendo dinâmicas, usando estratégias diferentes, faça com que esses alunos fiquem estimulados.

A resposta da Professora B nos permite compreender que ela entende que os estudantes estão na escola em busca de concluir os estudos para, quem sabe, conseguirem um trabalho. Conhecendo o perfil da turma em que a Professora B leciona, entendemos ser possível que ao falar sobre o “conseguir uma profissão”, ela esteja referindo-se aos mais jovens que se encontram desempregados. Por outro lado, quando a mesma diz ser o “cansaço do trabalho” uma “causa da evasão”, ela refere-se aos estudantes mais adultos e idosos que já trabalham.

Esta relação feita pela Professora B entre os fatores “trabalho” e “evasão” dos estudantes da EJA, é uma percepção que corrobora com os estudos de Carmo (2010) quando este nos informa que o primeiro fator (trabalho) ainda é visto em pesquisas em educação apenas como influenciador do segundo (evasão). Além disso, sinaliza Carmo (2010) que algumas pesquisas pouco consideram que os estudantes estão na escola por que seus “trabalhos” lhes cobram certificação escolar ou por pretenderem futuramente trabalhar, como é o caso referido pela Professora B, ao nos dizer: “Muitos dizem que querem terminar aqui para fazer o ensino médio e conseguir uma profissão”. Entendemos que a referida professora reconhece que suas práticas podem influenciar sobre a permanência dos estudantes na escola, isto fica claro quando ela nos informa: “Acredito que nossas aulas sendo dinâmicas, usando estratégias diferentes, faça com que esses alunos fiquem estimulados”.

Aproveitando-nos de que as respostas das professoras direcionavam uma interpretação sobre suas práticas pedagógicas, na sequência da pergunta anterior fizemos outra, no intuito de captar uma relação com as aulas de Matemática: Como você considera que as aulas de matemática podem contribuir para a permanência dos estudantes na escola? A Professora A nos deu a seguinte resposta:

Sendo uma aula mais dinâmica eles com certeza permaneceriam. Quanto a isso, lá na Formação a gente aprendia músicas para poder lembrar as regras de matemática, sempre tinha algumas coisas assim, que a gente levava para a sala de aula e dava muito certo. Eles diziam que deixar o pessoal da EJA solto, em uma aula monótona, não dava certo. Tinha que motivar, tinha que estimular.

A referida professora é enfática ao nos informar que “com certeza” os estudantes permaneceriam na escola se as aulas de Matemática fossem “mais dinâmicas”. Em uma primeira leitura compreendemos que a Professora A entende suas aulas de Matemática como dinâmicas. No tocante à sua prática pedagógica matemática, ao informar que “aprendia músicas para poder lembrar as regras de matemática”, entendemos que ela se refere à dinâmica pelo viés da ludicidade, podendo trabalhar com musicalização em sala de aula, por exemplo.

Para a mesma pergunta, a Professora B nos respondeu a seguinte resposta:

Assim, a gente sabe que a EJA é uma modalidade diferente, é uma modalidade especial. A gente quer sim nosso aluno todo dia na sala de aula, mas eles têm filhos, família, trabalham durante o dia. A gente precisa ter essa flexibilidade sabe, de dizer assim, ta bom, falte, mas pelo menos me avise. Sobre a matemática, eu acho que as aulas mais dinâmicas fazem eles estar na escola, trabalhar da forma como eles aprendam, de acordo com a realidade deles. Ai sim, ajuda mais a conter a evasão.

A resposta da Professora B aproxima-se da Professora A, no sentido em que ambas falam de “aulas mais dinâmicas”. Contudo, ao analisar esta resposta da Professora B, entendemos estarem às aulas dinâmicas ligadas ao que ele entende como “atividades diferenciadas”. O fato de trabalhar com este tipo de atividades a leva entender estar construindo uma prática pedagógica dinâmica. Esta fala da professora reitera duas outras, anteriormente citadas por ela, nas quais a mesma afirma elaborar suas aulas de Matemática partindo da realidade dos estudantes, com o intuito de ser “mais prático”, e que da Formação, aproveita as dinâmicas, mas “com outro nível”, por considerá-las de nível alto à realidade de sua prática.

Em ambos os casos, as respostas das professoras convergem para um entendimento comum de que sendo as aulas de Matemática mais dinâmicas, os estudantes permaneceriam na escola. Além deste entendimento, cabe-nos destacar que as docentes relatam as aulas dinâmicas partindo de seus pontos de vistas. O que não necessariamente seriam os mesmos das estudantes.

Empenhados em melhor compreender as percepções das professoras, pedimos as mesmas para descreverem uma estratégia pedagógica, na qual elas entendessem contribuir para a permanência dos estudantes na escola. A questão proposta foi: Descreva uma estratégia que você acha que contribuiria para a permanência dos estudantes na EJA. A Professora A fez as seguintes sugestões:

Trabalhar em grupo. Esta foi uma das minhas metodologias e que eu faço até hoje.Eu já usei em outras salas de aula, quando nos estágios da faculdade, daí resolvi levar para a EJA. Como eu disse, os aniversariantes do mês, era uma estratégia de motivação. Projetos sobre a frequência, quem faltava menos a gente dava uma estrela: o aluno destaque era o que faltava menos, o nome dele ia lá para o cartaz dos estaques. E trabalhar com apresentação de cartazes: fizemos uma atividade, eles apresentavam para os outros, depois tudo era colocado na parte da EJA. Às vezes eu chegava na sala e eles estavam tão cansados que eu chegava falando: - Levanta o ânimo meu povo, vamos animar, vamos fazer atividades diferentes hoje. Ai fazia.

Partindo de sua experiência, a Professora A reafirma as ideias de trabalhar os aniversariantes dos meses e com projetos de estímulo à frequência escolar, como exemplos de estratégias para a permanência dos estudantes. Além destas, a referida professora traz o trabalho em grupo e com apresentações de cartazes como outras sugestões. Percebemos que a docente se preocupa com a estima dos estudantes, quando ela, retomando a “motivação” de sua fala anterior, nos diz que ao chegar na sala de aula e ver os estudantes falava:“ - Levanta o ânimo meu povo, vamos animar, vamos fazer atividades diferentes hoje. Ai fazia”.

A Professora B, ao responder sobre as estratégias diz:

A gente precisa dar voz esses alunos. Eles sabem muita coisa, por isso eu acho que sendo aulas dinâmicas e com diferentes tipos de atividades, eles passariam a gostar mais da escola. Uma estratégia seria partir do que eles entendem e sabem de matemática, por exemplo, para então começar os conteúdos. Trabalhar com jogos didáticos é uma boa saída. Mas, claro, tudo isso a gente precisa planejar e ver se realmente contribui para a aprendizagem deles.

Esta resposta da Professora B reafirma nossa compreensão de que as “aulas dinâmicas” por ela citadas referem-se às atividades que ela entende como “diferenciadas”. O

dinamismo que ela se refere a estas atividades teria como base o “ouvir” dos estudantes o que eles “entendem e sabem de matemática”.

Compreendemos a intenção da Professora B como positiva, no que diz respeito à escuta dos jovens e adultos, para então, pensar estratégias. Contudo, entendemos que apenas ouvi-los e saber o que eles sabem para, em seguida, “começar os conteúdos”, como a mesma sinaliza, seria reduzir os saberes das vivências dos estudantes a simples pontos de partidas para os conteúdos curriculares. De outra forma, entendemos que seria hierarquizar os conteúdos curriculares como superiores aos das vivências dos estudantes. A referida professora, ao sugerir o uso dos “jogos didáticos”, finaliza enfatizando que não apenas estes, mas também a ação de escuta dos saberes dos estudantes precisa estar planejada e dentro de um limite de contribuição para a “aprendizagem deles”. Isso nos permite compreender um sentido de prática com uma intencionalidade pedagógica.

Em uma análise geral, compreendemos que as professoras entendem suas práticas pedagógicas como um possível fator de influência para a permanência dos estudantes na EJA. Estas práticas, apresentadas em suas falas como “aulas”, segundo as docentes, teriam melhor contribuição para esta permanência se fossem elaboradas seguindo estratégias diversificadas, seja por meio do uso de atividades diferenciadas, jogos didáticos ou músicas, o que para as mesmas seriam “aulas dinâmicas”.