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A PERSPECTIVA ORIENTADA AO ATOR – A AGÊNCIA DOS ATORES E ARENAS NA EXECUÇÃO DO PROGRAMA FOMENTO COM COMUNIDADES

FAMÍLIAS PARTICIPANTES DO PROGRAMA FOMENTO

3 CONTRIBUIÇÕES PARA COMPREENSÃO DAS DINÂMICAS SOCIAIS DAS COMUNIDADES QUILOMBOLAS

3.4 A PERSPECTIVA ORIENTADA AO ATOR – A AGÊNCIA DOS ATORES E ARENAS NA EXECUÇÃO DO PROGRAMA FOMENTO COM COMUNIDADES

QUILOMBOLAS

A partir dos aportes teóricos da perspectiva orientada ao ator (POA) se analisa o espaço de implementação do Programa Fomento, a partir da centralidade na arena e seus atores. Conforme Bracagioli Neto (2014), essa abordagem teórica é utilizada na atualidade para trazer à tona a dimensão conflitiva e heterogênea de diversos espaços de participação democrática dos sujeitos (associações, conselhos, fóruns).

Para Deponti (2010), essa perspectiva considera a possibilidade dos atores influenciarem de maneira significativa os processos de mudança, não sendo meros objetos, passivos e alheios aos projetos e políticas de desenvolvimento.

Considerando o desenvolvimento como um processo para além da perspectiva econômica e com distintas interpretações, a partir da análise da dimensão que os indivíduos, atores envolvidos nos processos possuem, portanto como um processo de construção social heterogêneo e diverso, contempla os referenciais culturais das pessoas e a importância dos atores neste processo.

O enfoque ao ator busca examinar, a partir de uma análise histórica das pessoas envolvidas no processo e de como elas reagem a esses processos de desenvolvimento a partir das suas concepções. Procura valorizar novos diálogos, redes, produtos, instituições e capitais (ecológicos, sociais e culturais), a partir de diferentes visões, inclusive de conflito e oposição, entre os atores e os agentes de desenvolvimento (agentes externos) (DEPONTI; ALMEIDA, 2008; DEPONTI, 2010; GONZÁLEZ et al., 2015).

Deponti e Almeida (2008) ressaltam que a análise centrada nos atores não deseja excluir a ideia de estrutura34, mas considerar a construção das relações sociais específicas como tema central na análise, e como um novo modo de conceituar as complexidades e dinâmicas da vida social. Dessa forma, possibilita ver atrás dos mitos, dos modelos, das políticas de desenvolvimento e das instituições; permite explorar os valores locais e conhecimentos, descortinar os detalhes do “vivido nos mundos da gente”. Pois as “gentes” (indivíduos) são parte ativa dos processos de desenvolvimento e os fatores internos do mundo desses indivíduos agem sobre a intervenção realizada através de programas/políticas (fatores externos), transformando e mediando esses processos, estabelecendo uma inter- relação e a determinação mútua dos fatores e das relações externas e internas, importantes para a compreensão da mudança social (LONG, 2001 apud DEPONTI; ALMEIDA, 2008; DEPONTI, 2010).

Os aportes da POA contribuem para explicar respostas diferenciadas a circunstâncias estruturais similares, mesmo em condições aparentemente homogêneas, pois os padrões diferenciais que emergem são, em parte, criados pelos próprios atores.

Estes atores não são considerados como categorias sociais vazias (a partir da classe ou outra classificação) ou recipientes passivos de intervenção, mas, sim, como participantes ativos que processam informações e utilizam estratégias nas suas relações com vários atores locais, assim como com instituições e pessoas externas.

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Pois é uma das críticas a essa abordagem; por conta disso, Deponti (2010) menciona que Long e Ploeg (1994) não negam o significado das relações sociais de produção e nem dispensam o conceito de relação social de produção, mas apenas enfatizam que as relações sociais específicas são construídas, reproduzidas e transformadas. O ponto importante de referência é a elaboração, negociação e confrontação dos projetos dos atores. Servindo como um antídoto contra os excessos das explicações estruturalistas e culturalistas (DEPONTI; ALMEIDA, 2008).

Os diferentes padrões de organização social que emergem resultam das interações, negociações e lutas sociais que ocorrem entre os diversos tipos de atores, caracterizando a agência dos atores nos espaços de intervenção que são as arenas (LONG, 2007; SCHNEIDER; GAZOLLA, 2011; LONG; VAN DER PLOEG, 2011; LEITZKE; COTRIM, 2013).

Segundo Deponti (2010), a agência humana “é o coração que revitaliza o paradigma do ator social e forma um pivô que objetiva reconciliar as noções de estrutura e de ator”, atribuindo ao ator (individual ou grupo social) a capacidade de processar a experiência social (suas e dos outros), promover inter-relações entre elas e inventar caminhos para as situações problemáticas.

Giddens (1989) destaca que a agência não diz respeito às intenções que as pessoas têm para fazer determinadas coisas, “mas primeiramente à sua capacidade de fazer essas coisas [...]. A ação depende da capacidade do indivíduo de „causar uma mudança‟ em relação a um estado de coisas ou curso de eventos pré-existente” (p. 25-6). Isso implica que todos os atores (agentes) exercem um determinado tipo de poder. Para o autor, a agência requer capacidades de organização, a partir de uma rede de relações sociais, não sendo simplesmente o resultado de certas capacidades cognitivas e poderes persuasivos.

Portanto, a manifestação de um indivíduo que, enquanto ator, se expressa através da sua capacidade de agência, processando sua experiência social e delineando formas de enfrentar a vida, mesmo sob as mais extremas formas de coerção, com limites de informação, de incerteza e de outras restrições (físicas, normativas ou político-econômicas) existentes – são “detentores de conhecimento” e “capazes”. Procuram resolver problemas, aprender como intervir no fluxo de eventos sociais ao seu entorno e monitorar continuamente suas próprias ações, observando como os outros reagem ao seu comportamento e percebendo as várias circunstâncias inesperadas (GIDDENS, 1989).

Cotrim (2013) destaca a noção de projetos35 dos atores para melhor compreensão dos processos de desenvolvimento. Nessa noção, os atores, a partir das regras e costumes ligados à cultura do grupo social, constituem um espaço de

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O projeto social é o conjunto socialmente negociado das escolhas dos projetos individuais dos atores gerando naturalmente uma ampla diversidade dentro do grupo (LONG, 2001 apud COTRIM, 2013).

interface36 entre os atores, os seus projetos formados pelas articulações das práticas sociais, que são as arenas específicas.

Cada projeto individual é articulado com projetos, interesses e perspectivas de outros atores dentro de um complexo de arenas entrelaçadas. Os projetos dos atores entram em luta ou disputa, configurando a noção de articulação de projetos Nessa ação de interface entre os atores, utilizam-se de estratégias, de recursos, de um repertório de discursos e modos de argumentação, no sentido de busca de hegemonia (LONG, 2007).

As arenas se constituem, portanto, num espaço de confrontações concretas de agentes sociais em interação. Conforme Bracagioli Neto (2014 p. 33) “a concepção de arena pública busca estudar a ação coletiva através das relações de conflito e cooperação no contexto de uma lógica dramatúrgica onde os atores interatuam de forma dinâmica” abrindo espaço para a pluralidade que reside na multiplicidade de costumes, opiniões e modos de vida.

No caso da noção de arena para a análise de um projeto ou programa de desenvolvimento, como é o caso do presente estudo, é uma arena que não é neutra, porque apresenta conflitos entre os atores e agentes de desenvolvimento envolvidos, colocando em jogo duas acepções de poder; grupos estratégicos heterogêneos se afrontam movidos por interesses (materiais e simbólicos) mais ou menos compatíveis, dotados de poderes relacionais distribuídos de forma desigual (DEPONTI; ALMEIDA, 2008).

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Conforme (DEPONTI, 2010, p. 9) o conceito de interface social envolve como as diferenças de interesse social, interpretação cultural, conhecimento e poder são mediados e perpetuados ou transformados em pontos críticos de união e de conflito.

4 O CONTEXTO DA PESQUISA: O MUNICÍPIO DE SÃO LOURENÇO DO SUL E