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CAPÍTULO 2 QUADRO METODOLÓGICO

2.1 Modelos e justificativas

2.1.1 Pesquisa-ação

A Pesquisa-ação, de acordo com Thiollent (2011, p. 8), “pode ser concebida como mé-

todo, isto quer dizer, um caminho ou um conjunto de procedimentos para interligar conheci-

mento e ação, ou extrair da ação novos conhecimentos”. Para nós, ela foi concebida como opor- tunidade de gerar dados para perceber a motivação dinâmica e complexa no aconselhamento linguageiro e para responder a questões sobre o uso de estratégias motivacionais e seus efeitos ao longo das trajetórias de aconselhamento que acompanhamos. Com essas intenções, cabe na

46 “[...] a pragmatic solution to the demands of a theoretical perspective that seeks to understand the dynamics of change in complex system”.

definição acima, mudar o múltiplo “ou”, por “e”, quanto aos benefícios que pretendemos al- cançar com essa estratégia de investigação.

São princípios da Pesquisa-ação “desenvolver o conhecimento e a compreensão como parte da prática” (ENGEL, 2000, p.182) e realizar “intervenção em pequena escala no mundo real e um exame muito de perto dos efeitos dessa intervenção” (MOREIRA; CALEFFE 2008, p.89), agregando “vários métodos ou técnicas de pesquisa social, com os quais se estabelece uma estrutura coletiva, participativa e ativa em nível da captação de informação” (THIOL- LENT, 2011, p. 32). O mesmo autor caracteriza essa modalidade de pesquisa como um diálogo e não um monólogo, como meio de identificação e resolução de problemas coletivos, com trans- formações advindas do aumento do conhecimento e da tomada de consciência no plano do agir, sendo que seus conceitos e resultados são construções complexas, “relacionadas com as visões dos atores47, o todo mutável no decorrer da ação” (THIOLLENT, 2011, p.10).

Esta perspectiva está presente em um argumento de Larsen-Freeman e Cameron (2008) que também nos levou à Pesquisa-ação. Conforme as autoras, ela propicia a geração de conhe- cimento científico advindo de situações em seus contextos, nos quais os fenômenos são obser- vados e interpretados considerando-se o dinamismo de sistemas. Além disso, ao ocorrer no ambiente de sistemas e ao investigar sua resposta a uma perturbação, esse tipo de pesquisa contribui para aprofundar a compreensão da dinâmica desse sistema, revelando, principalmente, as possibilidades de comportamento, no lugar da previsibilidade.

Quanto ao repertório de procedimentos cabíveis em um estudo orientado de acordo com os princípios da Pesquisa-ação, em geral, há o desenvolvimento de ciclos de pesquisas com momentos de ações diagnósticas e de ações terapêuticas que se complementam (MOREIRA; CALEFFE, 2008). De acordo com Tripp (2005), cada ciclo da Pesquisa-ação é fomentado pela colaboração dos participantes e envolve o diagnóstico de situações-problema, a pesquisa para encontrar os meios para elucidá-las, o desenvolvimento de um plano de ação para solucioná-las atuando sobre elas, a implementação desse plano, o monitoramento dos efeitos das intervenções e a avaliação de sua eficácia para verificar a necessidade, ou não, de novas intervenções. Per- ruzo (2003) ressalta que, a cada ciclo de pesquisa, é esperada a devolução dos resultados aos participantes envolvidos. Segundo a autora, isso representa uma forma das pessoas envolvidas perceberem que esses achados estarão ao seu dispor e poderão subsidiar o autoconhecimento do grupo. Além disso, é desejada a divulgação externa dos resultados para ampliar a circulação

47 Ao longo do nosso trabalho, os atores mencionados por Thiollent (2011), serão mencionados como agentes, termo adotado pela abordagem da complexidade (LARSEN-FREEMAN; CAMERON, 2008).

de ideias e o avanço do debate acerca das questões abordadas, fomentando a aprendizagem do saber fazer e a aquisição de novas habilidades.

Essas orientações contribuíram para o planejamento da nossa pesquisa, no sentido de nos levar a refletir sobre como implementá-la em consonância com as características de siste- mas complexos. Por exemplo, como delinear ciclos de estudo diante do dinamismo e não line- aridade dos fenômenos que investigamos? Para tanto, encontramos apoio em Thiollent (2011, p.23) ao defender que “a configuração da Pesquisa-ação depende dos seus objetivos e do con- texto no qual é aplicada” e que seu planejamento é flexível, sem fases rigidamente ordenadas.

Para o autor, na Pesquisa-ação, pode-se pensar em um ponto de partida e em um ponto de chegada. Entre eles há um “vaivém de preocupações a serem adaptadas em função das cir- cunstâncias e da dinâmica interna do grupo de pesquisadores no seu relacionamento com a situação investigada” (THIOLLENT, 2011, p.55). Isto se coaduna com a pesquisa em comple- xidade. Enquanto sabemos que o sistema continua se movendo e mudando no decorrer da pes- quisa, o ponto de partida é representado pelo momento em que começamos a estudá-lo e um dos possíveis pontos de chegada é quando paramos de fazê-lo, embora o sistema não se esgote aí.

Ainda sobre pontos de partida e de chegada, outro posicionamento que consideramos foi que um possível ponto inicial seja a fase exploratória, caracterizada por uma rotina que se assemelha àquela sugerida pelos autores Moreira, Caleffe (2008), Tripp (2005) e Perruzo (2003) quando descrevem ciclos da Pesquisa-ação. Porém, para Thiollent (2011), este momento repre- senta apenas o início do processo de diagnóstico e do enquadramento da situação problema em um marco teórico para nortear estratégias de ação. Quando se parte para a ação, essa rotina é entremeada pela reflexão constante acerca das transformações no sistema, sendo que “o estudo se desenrola paralelamente ao acompanhamento da ação e dela depende a manutenção do inte- resse dos participantes” (THIOLLENT, 2011, p.61). Para este autor, outro possível ponto de chegada, é a possibilidade de divulgação externa, consensual entre os autores consultados, e que Thiollent (2011, p.81) valoriza pela “ ‘visão de conjunto’[...] um efeito de síntese de todas as informações parciais coletadas e um efeito de convicção entre os participantes”. Segundo ele, o conhecimento dos resultados da pesquisa, “poderá gerar reações e contribuir para a dinâ- mica da tomada de consciência e, eventualmente, sugerir o início de mais um ciclo de ação e de investigação”.

Para nossa pesquisa, foi primordial contar com a adaptabilidade ao contexto conferida à Pesquisa-ação por Thiollent (2011). Com isso, vimos meios de desenvolver diagnóstico, in- tervenção e retorno, sem engessá-los em etapas ou ciclos distintos e sem impedi-los de se

sobreporem parcialmente, quando foi o caso. Vimos também possibilidades de assumir um de- senho para a trajetória da nossa pesquisa, sem recorrer aos círculos e espirais, sugeridos para quem faz estudo desta natureza. Da mesma forma que nos interessou a flexibilidade sugerida pelo autor, foi importante conhecer seu pensamento acerca do que vem a ser imprescindível à Pesquisa-ação: o perfil dos participantes da investigação.

Em relação a essa questão, Thiollent (2011, p. 22) sugere que, para favorecer a Pesquisa- ação, é esperado que pesquisador e pessoas participantes sejam atores desempenhando “um papel ativo na própria realidade dos fatos observados”, tendo ampla e explícita interação na situação investigada, com voz e vez, sabendo o que dizer, o que perguntar e o que fazer. Isso implica em disponibilidade para negociação, para interferir no que está sendo observado, mudar alguns aspectos da situação pelas ações que decidem empreender, avaliar essas ações e verificar os obstáculos encontrados no caminho, enriquecendo a informação com essa captação e resti- tuindo-a como parte do conhecimento. Desta interação, resulta “a ordem de prioridades dos problemas a serem pesquisados e das soluções a serem encaminhadas sob forma de ação con- creta” (THIOLLENT, 2011, p. 22). Mesmo colocando os participantes em iguais condições de ação, o autor defende que o papel do pesquisador “é modesto: apenas acompanhar, estimular, catalisar certos aspectos da mudança decidida pelos grupos interessados” e que também, sob este prisma, “deve-se abandonar a ideia de mudar os comportamentos dos outros. São os pró- prios atores que podem decidir se querem ou não mudar” (THIOLLENT, 2011, p. 126).

Essas ponderações acerca da qualidade da participação mereceram atenção, porque ao final do Método 1, sob os princípios da Pesquisa-ação, embora, na fase inicial, aconselhamos três estudantes, apenas uma delas apresentou perfil de participação que se coaduna com o pen- samento de Thiollent (2011). Isso se evidenciou no seu comprometimento em manter diálogo conosco, investindo no trabalho de parceria para a aprendizagem de LAd e contribuindo para responder aos questionamentos do nosso estudo. Isso, por sua vez, ampliou nossas oportunida- des para atuar no seu processo motivacional em desenvolvimento no aconselhamento lingua- geiro, alvo deste estudo.

Ressaltamos que esse conjunto de observações que colocamos foram determinantes para delinear os próximos passos da investigação, uma vez que, a partir delas, tomamos a decisão de focar nos dados gerados pela participação desta aconselhada e, quando fosse o caso, mencionar possíveis influências advindas da sua relação com agentes que eventualmente participaram do grupo. Com isso, continuamos nosso estudo por meio da adoção do Método 2, sob princípios do Estudo de Caso, explorando um caso único. A próxima subseção enfoca este método de pesquisa. Antes disso, trazemos um último ponto sobre a escolha da Pesquisa-ação, o qual ficou

claro para nós após melhor conhecer suas características. Tal ponto diz respeito aos vínculos que conseguimos estabelecer entre este método de pesquisa e o que já mencionamos acerca do aconselhamento linguageiro, bem como das pesquisas coordenadas pela Professora Doutora Walkyria Magno e Silva que abrangem esta atividade.

O primeiro vínculo advém da percepção de que independentemente de ser um dos re- cursos que usamos para conduzir nossa investigação, vimos que a própria atividade de aconse- lhamento é realizada como uma Pesquisa-ação na qual participam o conselheiro e seus aconse- lhados que diagnosticam problemas relacionados à aprendizagem de uma LAd, depois explo- ram como lidar com eles conciliando estudo, reflexão e ação constantes. Já o segundo, advém do ato de compartilhar o que acontece no aconselhamento como parte de uma Pesquisa-ação mais ampla na qual conselheiros linguageiros tomam conhecimento das atividades uns dos ou- tros e estudam juntos como melhorar sua prática, conforme se tem feito nos encontros dos gru- pos de pesquisa que mencionamos anteriormente. Assim, concluímos esta subseção afirmando que não só escolhemos a Pesquisa-ação, como ela também já ‘se fez escolhida’ estando atrelada ao aconselhamento que praticamos.