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2 PERCURSO TEÓRICO E METODOLÓGICO

2.3 Metodologia Qualitativa Dialética

2.3.1. Pesquisa exploratória

Na fase exploratória da pesquisa procurou-se delimitar o problema, os objetivos, objeto e referencial teórico, já expostos na introdução e nos item 2.1 e 2.2 e os instrumentos de coleta de dados que serão descritos juntamente com a descrição da pesquisa de campo.

A primeira tarefa que se propôs a fim de delimitar o objeto e de compreender as normas antecedentes, foi a realização de uma pesquisa exploratória que se iniciou a partir da revisão de literatura e análise de documentos. Essa pesquisa procurou incluir diferentes pontos de vista e ângulos do problema. Tais informações foram organizadas em dois grandes subgrupos:

A. Evolução normativa: análise dos documentos (leis, portarias, políticas públicas e sites oficiais do Ministério da Saúde e Ministério da Justiça) e produções científicas (livros e artigos científicos, dissertações e teses) que abordam o tema reforma psiquiátrica, saúde mental, rede de atenção psicossocial/CAPS ad, álcool e drogas/ tratamento, redução de danos, trabalho em saúde. Priorizaram-se documentos e estudos dos últimos 30 anos. Foram incluídos estudos que descreviam os aspectos históricos do tratamento de usuários de álcool e drogas; discursos e práticas de tratamento reconhecidos social e cientificamente, os quais encerram saberes e valores que perpassam a atividade das equipes; a descrição do projeto político; os avanços e

desafios na construção de uma rede de atenção psicossocial e os conceitos de clínica ampliada e interdisciplinaridade que compõem as normas antecedentes do trabalho em saúde mental.

B. Demandas do ponto de vista do trabalho: foi realizado um levantamento de publicações de artigos, dissertações e teses, no período de 2005 a 2011, a partir dos descritores: Trabalho, Centro de Atenção Psicossocial, Álcool e drogas. Foram consultadas as bases de dados Scielo, Bireme, BVS, EBSCO e os portais CAPES, USP, UFMG, UFBA e UFPR. Foram encontrados poucos estudos que tratassem diretamente do trabalho das equipes multiprofissionais no CAPS ad. Optou-se por incluir os que abordassem o trabalho das equipes multiprofissionais nos CAPS uma vez que, em muitas localidades onde o CAPS ad ainda não foi implementado, o CAPS responsabiliza-se não só pela atenção às pessoas com transtornos mentais como também por aquelas com necessidades decorrentes do uso de álcool e drogas. Verificou-se que alguns dos estudos recortaram como objeto a delimitação do “papel” de determinadas categorias profissionais no CAPS, especialmente de psiquiatras, psicólogos e enfermeiros, enquanto que outros estudos discutiam o trabalho de forma coletiva. Priorizou-se publicações que apresentavam resultados de estudos empíricos acerca do trabalho coletivo nos CAPS e CAPS ad, tais como, a avaliação do funcionamento e efetividade dos serviços, os desafios enfrentados pelos profissionais frente as novas diretrizes políticas, as representações e sentidos do trabalho para os profissionais. Foram excluídas as publicações de revisão de literatura, as que tratavam exclusivamente das políticas públicas ou da atenção em outros serviços de saúde mental e as que abordassem o trabalho de apenas uma categoria profissional ou de usuários. Alguns desses estudos incluíam os CAPS ad de maneira indiferenciada, enquanto que outros se referiam somente aos CAPS II e III. De qualquer forma, embora estudos específicos sobre o trabalho nos CAPS ad ainda sejam poucos e insipientes, a importância em se investigar o que essas pesquisas têm apontado consiste no fato de que o modelo de atenção psicossocial e o processo de trabalho implementados nos CAPS, em tese, não difere muito daquele proposto para o CAPS ad, embora a população alvo tenha características muito particulares e, por vezes, demandas diferenciadas que exigem outras competências por parte da equipe que não foram consideradas como foco de análise em tais estudos.

Delimitou-se como local da pesquisa um CAPS ad da região metropolitana de Belo Horizonte. A escolha justifica-se devido ao CAPS ad constituir-se em um serviço assistencial público central, inovador e que exerce papel central na Rede de Atenção Psicossocial. Além disso, destaca-se o fato de ter como diretriz prestar assistência médica e atenção psicossocial a pessoas com necessidades decorrentes do uso de álcool e outras drogas, em consonância com as políticas do Sistema Único de Saúde - SUS. As características institucionais, bem como a população trabalhadora, usuária e as tarefas serão descritas com maiores detalhes no Capítulo 4.

O “esquema geral de abordagem” de Análise Ergonômica do Trabalho proposto por Guérin et al (2001) foi eleito no projeto inicial como um dos eixos orientadores para o levantamento e análise dos dados deste estudo, entretanto, o resultado do encontro entre pesquisador e sujeitos da pesquisa e as características do campo, especialmente no que concerne à possibilidade de acesso, fizeram com que as entrevistas e observações participantes (MINAYO, 2004, 1992) se mostrassem instrumentos mais viáveis para responder aos objetivos do estudo. Contudo, procurou-se não abandonar o ponto de vista do trabalho e da atividade propostos pelos referenciais teóricos da Ergonomia da Atividade e da Ergologia ao longo da pesquisa.

Ainda na fase exploratória da pesquisa, o projeto foi apresentado para os gestores, solicitando o consentimento para realizar a pesquisa. Foi realizada uma reunião com a Coordenação de Saúde Mental e, em seguida, uma visita ao campo e apresentação do projeto para a gerente do serviço. Foi possível perceber sua surpresa ao se informar que a pesquisa seria realizada no âmbito da Engenharia de Produção. Já nesses primeiros contatos com os gestores foi possível destacar algumas verbalizações indicando que a construção de uma rede para usuários álcool e drogas era insipiente, mas que estavam sendo dispendidos esforços para o aperfeiçoamento tanto dessa rede quanto dos processos de trabalho. Não houve direcionamento de nenhuma demanda específica ao pesquisador neste primeiro momento, mas foi acatada sua demanda em contribuir com sua pesquisa para a consolidação desse processo.

Em seguida, submeteu-se o projeto aos Comitês de Ética e Pesquisa da UFMG e da Prefeitura da cidade e, uma vez aprovado, foi apresentado para os trabalhadores em uma reunião de equipe onde todos os presentes foram convidados a contribuir espontaneamente com a pesquisa. Já na primeira reunião, foi possível mapear alguns problemas que posteriormente foram aprofundadas a partir de entrevistas semi-estruturadas com

trabalhadores, gerente e usuários e de observações participantes no cotidiano de trabalho na fase de pesquisa de campo.

Uma das questões identificadas na primeira reunião com os trabalhadores referia-se a revisão do projeto terapêutico institucional, uma vez que, o aumento da procura pelo serviço e as condições reais de trabalho impunham frequentemente, formas de trabalhar diferentes daquelas que estavam instituídas, especialmente para os profissionais de nível superior.