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3 MODELO ANALÍTICO: DESISÃO EM POLÍTICA EXTERNA, HEGEMONIA

3.4 Pesquisa Qualitativa

O presente estudo lança mão de uma metodologia iminentemente qualitativa, a qual centra seus esforços no exame da formulação de política e na sua efetiva implementação para

ajudar a explicar, ex post facto, os resultados políticos em política externa de um caso específico. Destarte, o foco da investigação está na atuação do Ministério das Relações Exteriores e na Presidência da República, a qual se tornou mais ativa e diretamente envolvida em questões de política externa durante o período FHC-Lula. Diante do exposto, o presente trabalho visa a fornecer subsídios para a análise da atividade externa do governo brasileiro em período considerado vital para a definição da nova estratégia do Itamaraty para o Mercosul e para o regionalismo sul-americano. Como consequência, o trabalho emprega, na investigação do ator político estudado, uma combinação de teorias de análise de política externa (process-

tracing), hegemonia cooperativa e técnicas de análise de dados qualitativos, que almejam

fornecer uma explicação minimamente suficiente para o caso selecionado para a pesquisa. O tratamento teórico-metodológico acima descrito será aplicado às informações coletadas durante o presente estudo, as quais foram retiradas de publicações acadêmicas conceituadas100, que, dentro de sua abordagem mais ampla, tratavam do fenômeno analisado e seu modus operandi e de documentos oficiais produzidos pelas instituições responsáveis pela condução da política externa brasileira – o Ministério das Relações Exteriores (MRE) e a Presidência da República, além dos dados de comércio e investimento provenientes do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), Ministério do Planejamento Orçamento e Gestão (MPLO), da Divisão de Inteligência Comercial do Ministério das Relações Exteriores (MRE/DPR/DIC) e do Ministério do Desenvolvimento Indústria e Comércio (MDIC). Estas informações foram complementadas com dados econômicos oficiais, produzidos pela Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL) e pela Organização Mundial do Comércio (OMC).

Dessa maneira, a pesquisa qualitativa desenvolvida ao longo desta tese de doutoramento em Ciência Política baseia-se nos discursos, atas de reuniões, normativas, textos, documentos, declarações públicas de diplomatas e representantes governamentais, obtidas a partir do levantamento empírico de documentos relacionados à atuação da política externa brasileira para o Mercosul e para integração regional sul-americana.

100 Apesar de sua importância do ponto de vista do conhecimento cumulativo a respeito do objeto de estudo, as publicações acadêmicas, assim como outras fontes secundárias, possuem limitações que precisam ser compensadas através do aceso de informações provenientes de fontes primárias. O desenvolvimento das tecnologias digitais de acesso remoto, juntamente com maior tendência à promoção de medidas de transparência e prestação de contas dos órgãos públicos junto tem feito com que uma quantidade cada vez mais expressiva de informações seja acessada pelos analistas. Todavia, uma maior quantidade de dados disponíveis em fontes primárias não significa necessariamente melhor qualidade de informações. Muitas fontes de big data à disposição dos pesquisadores oferecem apenas relatórios com resultados sumarizados e não as bases de dados, fazendo com que o investigador precise montar seu próprio banco de dados e selecionar as informações mais importantes a partir da compilação de distintos relatórios.

Considerável parte da pesquisa histórica foi realizada através do exame dos acervos digitalizados de banco de normativas do Mercosul, trabalhos específicos sobre o assunto, dados disponíveis na internet, documentos e textos selecionados. Foram consultados discursos e seleção diária de notícias do Ministério de Relações Exteriores e do Senado Federal. disponíveis em seus sites na internet.

4 O MERCOSUL NA AGENDA DE PESQUISA CONTEMPORÂNEA

Este capítulo fornece um breve estado da arte do estudo da integração regional sul- americana na agenda de pesquisa contemporânea. Essa revisão bibliográfica se faz necessária pois apresenta um panorama geral dos estudos desenvolvidos a respeito desse domínio investigativo que se conecta com o tema investigado pela tese. A revisão trata, primordialmente, do estudo da integração pelo prisma da política externa. Algumas obras de interesse mais geral para o público acadêmico devotado a esse objeto de pesquisa são mencionadas pela sua relevância. Todavia, a retomada centra a sua ênfase nas contribuições fornecidas nos últimos anos pela literatura acadêmica especializada no estudo da política externa brasileira para a referida organização regional internacional, conectando-se com o objeto de estudo da tese.

Os trabalhos discutidos a seguir mostram a preocupação da comunidade acadêmica com a questão dos limites e possibilidades de complementação entre o Mercosul e outros processos de integração regional (ALCA, ALBA, UNASUL e CAN), apresentando os potenciais blocos complementares e rivais. Além disso, é possível notar o interesse crescente da literatura pela temática da integração infraestrutural no seio da Iniciativa para Infraestrutura Regional Sul- Americana (IIRSA); questão essa que se liga diretamente à problemática da liderança regional. Os dois pontos serão trabalhados por essa tese no cápitulo 4, em sua contribuição para o entendimento dos mecanismos da política externa de hegemonia cooperativa desenvolvida pelo Brasil para lidar com o Mercosul e o regionalismo sul-americano.

No sistema internacional contemporâneo, quase todos os membros da Organização Mundial de Comércio (OMC) participam de pelo menos um acordo de integração regional, formando, assim, blocos econômicos e outras modalidades de processos integracionistas. Os blocos regionais podem ser considerados um fenômeno político recente do ponto de vista histórico. Excetuando-se a União Europeia que tem sua gênese no imediato pós 2ª Guerra Mundial (período da primeira onda de regionalismo), a maioria dos processos de integração regional, hoje em curso, é fruto da chamada segunda onda de regionalismo, tendo se constituído ou se reformulado a partir do final da década de 1980. É precisamente nesta fase que se insere o Mercado Comum do Sul (Mercosul).

O desenvolvimento e a diversificação dos blocos regionais ocorrida a partir do último quarto do século XX foram responsáveis por estruturar um ambiente propício para politólogos e internacionalistas interessados em compreender a dinâmica do novo sistema político global. Uma significativa quantidade de trabalhos acadêmicos adere às chamadas matrizes econômica ou jurídica, caracterizando-se, principalmente, pelo emprego da metodologia comparativa e

tendo como maior referencial a UE. No que tange à produção acadêmica em Ciência Política e Relações Internacionais é possível identificar, de modo mais específico, na literatura a respeito do Mercosul, a presença de três campos fundamentais de pesquisa: integração regional comparada, economia política da integração e política externa brasileira para o processo de integração regional101. Estas três sub-áreas são examinadas a seguir.