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3 MODELO ANALÍTICO: DESISÃO EM POLÍTICA EXTERNA, HEGEMONIA

5.5 Projetos Paralelos: Contradições e Complementariedades

5.5.5 UNASUL e IIRSA

Um dos elementos mais importantes da estratégia brasileira para a América do Sul – especialmente no que diz respeito à desmobilização dos aspectos negativos da ALBA e do engajamento da Venezuela – corresponde, necessariamente, à criação da União de Nações Sul- Americanas (UNASUL). Segundo os termos expressos em seu documento constitutivo152, a UNASUL é uma iniciativa de integração regional que associa os países sul-americanos a partir do fortalecimento da soberania e da autonomia nacional dos países-membros. Dentre os objetivos, está o fortalecimento de mecanismos de cooperação regional, que busca articular um espaço econômico e político sul-americano, preservando, porém, os espaços nacionais de formulação de política. A constituição e a posterior institucionalização da UNASUL levaram à seguinte indagação: em que medida a instituição poderia representar uma nova dimensão da integração, sem, contudo, deixar de lado a política brasileira em relação à América do Sul?

Portanto, é preciso compreender se essa lógica consegue compatibilizar o conceito de autonomia, objetivando a cooperação e aspectos setoriais de integração. Participam da UNASUL doze países sul-americanos: Argentina, Brasil, Uruguai, Paraguai, Bolívia, Colômbia, Equador, Peru, Chile, Guiana, Suriname e Venezuela. A formação da UNASUL se deve, principalmente, à influência direta do Brasil que, desde o início, buscou a expansão geográfica da integração. Ainda durante o governo de Itamar Franco, na VII Cúpula do Grupo do Rio, em 1993, se abriu caminho para a criação de uma Associação Sul-Americana (ALCSA). Anos depois, a discussão foi retomada no segundo governo de FHC, através da realização de cúpulas presidenciais sul-americanas em Brasília (2000) e em Guayaquil (2002). Durante a Terceira Reunião de Presidentes da América do Sul, ocorrida em dezembro de 2004, foi instituída a Declaração de Cuzco153, que criou a base para o surgimento da UNASUL. Houve também a criação de um projeto intitulado Comunidade Sul-Americana de Nações (CASA) e, em 2007, na Venezuela, durante a I Reunião Energética da América do Sul, o nome foi substituído por UNASUL. Em maio de 2008, em Brasília, representantes dos doze países sul- americanos assinaram outro tratado que objetivava a criação da UNASUL e esta passou a ser formalmente um organismo internacional.

O estabelecimento da União das Nações Sul-Americanas (UNASUL), enquanto instância de coordenação política regional, operou como mais um instrumento de

152 O Tratado Constitutivo da União de Nações Sul-Americanas, também chamado Tratado Constitutivo da Unasul, ou ainda Tratado da Unasul, foi assinado em Brasília no dia 23 de maio de 2008, durante a III Cúpula de Chefes de Estado e de Governo.

153 A declaração foi redigida depois da III Reunião de Presidentes da América do, Sul realizada na cidade peruana de Cuzco, em 8 dezembro de 2004. No documento os chefes de Estado se propõem a estabelecer critérios igualitários entre os países da América do Sul a fim de promover a cooperação temática nas áreas política e social, infraestrutural, econômica e ambiental.

compartilhamento de poder na estratégia de hegemonia cooperativa da PEB para a América do Sul. A referida ORI funciona como um fórum político destinado a majorar a projeção externa dos países da região, promovendo a cooperação temática funcional. O politólogo neorrealista Joseph Grieco (apud PEDERSEN, 2002, p. 684) assevera que uma das maneiras de compartilhar poder consiste, essencialmente, em conferir “oportunidades de voz” a outros parceiros menores. Nesse sentido, a UNASUL surge como um espaço para a amplificação dos posicionamentos dos Estados sul-americanos em relação aos temas regionais e globais. As reuniões de cúpula de chefes de Estado da região dentro do quadro institucional da UNASUL expressaram a diversidade política dos Estado membros.

A UNASUL foi criada com o objetivo de estabelecer uma instituição regional para regular e resolver problemas regionais sem a interferência de qualquer grande potência, como os Estados Unidos. Esse processo seria feito através de um mecanismo multilateral de caráter concensualista, centrado nos executivos nacionais. A União de Nações Sul-Americanas não prevê nenhum projeto de integração econômica comercial mais complexo como uma união aduaneira ou mercado comum. Nesse sentido, não representa um obstáculo ou um concorrente para o Mercosul. Essa organização política adota um desenho institucional intergovernamental, em que o processo decisório se estabelece em reuniões de cúpula dos chefes de Estado dos países-membros. Ao contrário do Mercosul, a União de Nações Sul-Americanas corresponde a uma forma bastante ampla de cooperação regional, sendo, majoritariamente, voltada à promoção da coordenação política e não à integração comercial. Todavia, a dimensão da cooperação em infraestrutura revela as assimetrias desse processo e a existência de um ator hegemônico que arca com a maior parte dos custos do processo de integração.

Um dos principais elementos de compatibilidade da UNASUL com o Mercosul corresponde à Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana (IIRSA). O projeto, iniciado no ano 2000 por ocasião da primeira Cúpula Sul-Americana, corresponde a um plano de desenvolvimento que objetiva ligar as economias dos países sul-americanos, através de investimentos contínuos em energia, transporte e projetos de telecomunicações. Os objetivos da IIRSA, propostos anteriormente pela iniciativa venezuelana da ALBA, foram enquadrados na hegemonia da cooperativa brasileira a partir das políticas de exportação de capital realizadas sob a forma de investimento em infraestrutura. A partir de então, para que houvesse uma conexão entre as demandas econômicas, sociais e culturais dos países, buscou- se, essencialmente, ressaltar o sentido estratégico da integração física, visando projetar seu poder e influência, arcando com considerável parcela do financiamento dos projetos da IIRSA.

A partir da criação desses instrumentos, foi possível ao Brasil estabelecer sua nova estratégia de projeção de capacidades através do investimento em infraestrutura. Essa relação, estabelecida depois da I Cúpula Sul-Americana, ganha sentido e propriedade por volta de 2003 e é discutida em seguida.

5.6 A Primeira Cúpula Sul-Americana e a IIRSA na Estratégia de Hegemonia