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3 MODELO ANALÍTICO: DESISÃO EM POLÍTICA EXTERNA, HEGEMONIA

3.1 Quadro Teórico e Metodologia

Nos fenômenos de poder, os dados não falam por si mesmos. As teorias de Ciência Politica são essencialmente instrumentos heurísticos que possibilitam aos pesquisadores interpretar dados. Essas ferramentas tornam possível a organização de conceitos abstratos que se interrelacionam na realidade empiricamente verificada, fazendo com que alguns dados sejam empregados para dar suporte à explicação construída. Os elementos investigados não incluem todos os dados possíveis, mas apenas uma parcela deles, cabendo aos analistas ordenar determinados fatores capazes de promover o entendimento adequado do objeto, uma vez que não é possível realizar uma análise capaz de coletar a totalidade das informações a respeito de qualquer fenômeno político. Sendo assim, todo o conhecimento em Ciência Política se estabelece com base em inferências (BURNHAM et al, 2004). O processo dedutivo ou indutivo depende, fundamentalmente, do contexto. Pode-se inferir uma conclusão a partir de múltiplas observações; esta é definida como correta ou incorreta, estabelecendo determinado grau de precisão ou situações. As conclusões inferidas podem, após esse processo, ser testadas por observações suplementares. Em todo caso, qualquer forma de observação científica pressupõe alguma modalidade de teorização pregressa que orienta o cientista, estabelecendo parâmetros dos aspectos de interesse a serem enfocados pela sua observação seletiva.

Proposições de observação são construídas na linguagem de alguma teoria e serão tão precisas quanto a estrutura teórica ou conceitual da qual se valem para construir enunciados explicativos sobre a realidade. As teorias precedem a observação na atividade científica. As observações e experimentos são artifícios realizados pelo investigador com o propósito de testar ou lançar luz sobre alguma teoria, fazendo com que somente aquelas observações consideradas relevantes devam ser registradas (CHALMERS, 1993, p. 5193). Nesse sentido, a observação e mensuração de aspectos de uma dada parcela da realidade necessita ser compreendida como um procedimento a serviço da investigação científica e não como a própria análise.

A maneira como as diferentes propostas metodológicas buscam confirmar ou refutar as hipóteses e enunciados formulados teoricamente, podem ser, grosso modo, divididas em métodos quantitativos e qualitativos. Essas técnicas diferem umas das outras por conta do escopo analítico e do nível de generalização empírica dos fenômenos observados. Nas ciências sociais, os acadêmicos quantitativistas preferem observar múltiplos casos, empregando, para tanto, algum mecanismo de análise estatística, para sumarizar as informações de seus bancos de dados. Por sua vez, os qualitativistas tendem a focar sua atenção em uma quantidade relativamente pequena de casos ou em um único caso particular observado em grande nível de detalhamento e profundidade.

Ao objetivar analisar as linhas diretivas da participação e do comprometimento do Brasil em questões relevantes para a cooperação regional, identificar-se-á a estratégia do país para o Mercosul em período contemporâneo delimitado. A posição do Brasil enquanto potência média regional e líder da integração regional sul-americana traz importantes implicações para o modelo de pesquisa a ser empregado. Assume-se, portanto, que os resultados políticos produzidos no intervalo temporal analisado (2000-2012) ocorreram dentro de circunstâncias particulares não generalizáveis para além desse caso. A construção contextual e factual, em que o Brasil adotou a política de hegemonia cooperativa, é fruto de um desenvolvimento histórico deveras específico, que permitiu ao país adotar um conjunto de medidas de política externa destinadas a promover seus interesses diante dos países da região. Eventos provenientes do plano internacional e a correlação das forças políticas domésticas produziram condições para a implementação dessa linha de política externa. Muito embora o modelo de construção da liderança regional brasileiro encontre algum paralelo com outros poderes emergentes (notadamente Índia e África do Sul), essa tese preconiza que o tipo de processo de integração regional no qual o país se engaja (união aduaneira parcial) e o perfil da sua atuação (hegemonia

cooperativa via investimentos infraestruturais) é um caso singular, demandando amiúde um estudo mais detalhado para a explicação da dinâmica adotada pela PEB. Tendo em vista a singularidade do fenômeno político analisado, a presente pesquisa emprega um modelo analítico qualitativista, uma vez que se acredita que essa perspectiva promove um entendimento mais apropriado de seu objeto de estudo. Segundo Rezende (2011)94, o modelo de pesquisa

qualitativa se adequa melhor ao entendimento de fenômenos políticos dotados de elevado grau de peculiaridade:

A diferença essencial considerada decisiva para demarcar os domínios entre os métodos quantitativos e qualitativos reside na questão crucial da singularidade na análise dos fenômenos políticos. O problema da singularidade está associado à importante noção de que, em um amplo espectro de condições, as leis e regularidades causais em ciência política são muito frequentemente consideradas irrelevantes ou triviais [...]. A pesquisa qualitativa comparada de casos partindo da pressuposição da variabilidade na conexão entre as causas e os efeitos estudados pelos modelos e teorias se mostra mais frutífero para a produção de inferências causais. Estudar causalmente tais fenômenos singulares exige que os cientistas políticos considerem métodos e desenhos de pesquisa que explorem a elevada variabilidade das causas, da articulação entre as causas, e, a existência de múltiplos caminhos entre as causas e os efeitos. (REZENDE, 2011, p. 223). Desse modo, considerando-se a singularidade do fenômeno político aqui analisado, adotou-se como referencial teórico-metodológico a abordagem de process-tracing no âmbito de um estudo de caso em profundidade, conforme discutido a seguir.