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Planejamento e Gestão dos Recursos Hídricos

2.4 A Questão da Água

2.4.4 Planejamento e Gestão dos Recursos Hídricos

De acordo com Tundisi (2003), “o planejamento dos usos e do controle dos recursos hídricos desenvolve-se em dois níveis: o de implementação e viabilização de políticas públicas e o de interpretação”. No primeiro plano estão situados os objetivos, as opções e o zoneamento em larga escala das prioridades no uso integrado do solo, agricultura, pesca, da conservação, recreação e dos usos domésticos e industriais da água, em uma unidade que é a bacia hidrográfica. No segundo nível, deve destacar-se a capacidade de gerenciar conflitos resultantes dos usos múltiplos, bem como a interpretação de informações existentes, de forma a possibilitar a montagem de cenários de longo prazo, incorporando as perspectivas de desenvolvimento sustentável, os impactos dos usos e a escolha de alternativas adequadas, visando a conservação e recuperação dos recursos hídricos.

O papel dos pesquisadores e dos gerentes e administradores é fundamental e deve ser realizado em conjunto, com a finalidade de obter o máximo possível de benefícios dessa associação e dar condições para otimizar o sistema de gestão. Quanto ao planejamento e gerenciamento, é fundamental considerar a mudança de um sistema setorial, local e de resposta a crises, para um sistema integrado, preditivo, em nível de ecossistemas.

Segundo Leal (1998):

Os avanços no sistema de planejamento e gerenciamento das águas devem considerar os processos conceituais (a adoção da bacia hidrográfica como unidade de planejamento e gerenciamento e a integração econômica e social), processos tecnológicos (o uso adequado de tecnologias de proteção, conservação, recuperação e tratamento), bem como os processos institucionais (a integração institucional em uma unidade fisiográfica, a bacia hidrográfica, é fundamental).

Os indicadores das condições da bacia hidrográfica representam um importante passo na consolidação da descentralização e do gerenciamento. Eles vão desde a qualidade da água de rios e riachos, até taxas de preservação, contaminação, urbanização e a relação entre populações urbana e rural. Para gerenciar um sistema de recursos hídricos, deve-se atuar no sentido de assegurar uma distribuição temporal e espacial da água, que melhor se encaixe nos interesses da comunidade.

Tundisi (2003) conceitua o Gerenciamento de Recursos Hídricos como “um processo dinâmico, ambientalmente sustentável, que tem por objetivo uma operação harmoniosa e integrada das estruturas decorrentes, de forma a se obter o máximo de benefício das mesmas”, que, quando baseado numa adequada administração da oferta das águas, trata da organização e compatibilização dos diversos usos setoriais dos recursos hídricos.

2.4.4.1 Ordenamento Legal

A Constituição Federal (BRASIL, 1988) eleva os recursos hídricos a uma condição de especial cuidado, conforme se pode depreender no número de artigos que abordam o tema, dos quais, é interessante destacar:

Art. 22, IV: “compete privativamente à União legislar sobre: (...) IV águas, energia, informática, telecomunicações e radiodifusão”;

Art. 23, XI: “É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: (...) XI Registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões de direitos de pesquisa e exploração de recursos hídricos e minerais em seus territórios”;

Art. 26, I: “Incluem-se entre os bens dos Estados: I As águas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes, e em depósito, ressalvadas, nesse caso, na forma da Lei, as decorrentes de obras da União”.

A evolução da administração das águas públicas no Brasil pode resumidamente ser compreendida pela tabela 2-2.

Tabela 2-2 A evolução da administração das águas públicas no Brasil.

Data Acontecimento

1933 •Criação, no Ministério da Agricultura, da Diretoria de Águas, logo transformada em Serviço de Águas.

1934 •Decorrente da Reforma Juarez Távora, o Serviço de Águas foi inscrito na estrutura do Departamento Nacional da Produção Mineral – DNPM.

•Edição do Código de Águas e Código de Minas.

1940 •O Serviço de Águas tornou-se Divisão de Águas (Decreto 6.402/40). 1961 •Transferência do DNPM para o Ministério das Minas e Energia. 1965 •A Divisão de Águas foi transformada no DNAE (Lei 4.904/68).

1968 •Denominação alterada para Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica – DNAEE (Decreto 63.951/65).

1969 •Extinção do Conselho Nacional de Águas e Energia Elétrica – CNAEE, cujas atribuições passaram à competência do DNAEE (Decreto-Lei 689/69). 1973 •Criação da SEMA, no âmbito do Ministério do Interior.

1976 •Portaria GM-0013: estabelece a classificação das águas interiores.

1978 •Portaria Interministerial nº 90: cria o Comitê Espacial incumbido da classificação dos cursos d’água da União, bem como do estudo integrado e do acompanhamento da utilização racional dos recursos hídricos das bacias hidrográficas dos rios federais, no sentido de obter o aproveitamento múltiplo de cada uma, e minimizar as conseqüências nocivas à ecologia da região.

•Portaria nº 1.832: estabelece que somente serão apreciados pelo DNAEE os pedidos de concessão ou autorização para derivar águas públicas federais para aplicações da indústria e da higiene que, juntamente com os projetos das obras de derivações, apresentarem sistemas de tratamento dos efluentes aprovados pela SEMA, do Ministério Interior, ou por órgãos regionais devidamente credenciados pela mesma Secretaria.

1979 •Portaria Interministerial nº 003: aprova o Regimento Interno do Comitê Especial de Estudos Integrados de Bacias Hidrográficas – CEEIBH, criado pela Portaria Interministerial nº 90, de 29 de março de 1978.

1980-84 •Diagnóstico de Bacias Hidrográficas. O DNAEE desenvolve diagnósticos de 2.500.000 km2 de Bacias Hidrográficas, visando a classificação das águas e início de um processo de gerenciamento co-participativo.

1984 •CPI de Recursos Hídricos – Início das atividades do CONAMA e edição pela SEMA do Relatório da Qualidade do Meio Ambiente – RQMA.

1980-85 •Comitês de Bacia evoluem, como o Paranapanema, Paraíba do Sol e Doce. 1986 •Resolução CONAMA nº 20: estabelece a classificação das águas doces,

salobras e salinas em nove classes, segundo seus usos preponderantes. 1988 •Nova Constituição Brasileira.

1989 •Lei nº 7.990: institui, para os Estados, Distrito Federal e Municípios, compensação financeira pelo resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica, de recursos minerais em seus respectivos territórios, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva.

1990 •Lei nº 8.001: define os percentuais da distribuição da compensação financeira de que trata a Lei nº 7.990.

1991 •O poder executivo encaminha o Projeto de Lei nº 2.249-A, que dispõe sobre o Plano Nacional de Recursos Hídricos.

1993 •O relator do Projeto de Lei nº 2.449-A apresenta substitutivo preliminar e convoca audiência pública para análise do documento.

1997 •Lei nº 9.433: institui o Plano Nacional de Recursos Hídricos, cria o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos.

2000 •Lei nº 9.984: Dispõe sobre a criação da ANA.

2002 •Decreto CNRH, de 8 de julho: Cria o Grupo Executivo, para a integração entre a pesquisa e a lavra de águas minerais termais, gasosas, potáveis de mesa ou destinadas a fins balneários de gestão de recursos hídricos.

2004 •Lei nº 10.881: dispõe sobre os contratos de gestão entre a ANA e entidades delegatárias das funções de Agências de Águas relativas à gestão de recursos hídricos de domínio da União.

2005 •Decreto CNRH, de 22 de março: institui a Década Brasileira da Água, a ser iniciada em 22 de março de 2005.

•Decreto CNRH nº 5.440, de 4 de maio: estabelece definições e procedimentos sobre o controle de qualidade da água de sistemas de abastecimento e institui mecanismos e instrumentos para divulgação de informação ao consumidor sobre a qualidade da água para consumo humano. 2006 •Portaria CNRH nº 357, de 18 de novembro: institui, no âmbito do MMA,

Comissão Permanente, com a finalidade de sugerir procedimentos para articulação e integração das ações e temas conexos do CONAMA e CNRH.

•Decreto CNRH nº. 9, de 29 de novembro: institui o Comitê da Bacia Hidrográfica do rio Piranhas-Açu, com área de atuação no RN e PB.

O PNRH (IBAMA, 2006) – primeiro plano elaborado com enfoque direcionado à gestão integrada de recursos hídrico em um país da América Latina – avança no sentido de compreender as questões relacionadas à água e propor encaminhamentos, de forma a alcançar os seguintes objetivos estratégicos: (i) melhoria das disponibilidades hídricas, superficiais e subterrâneas, em quantidade e qualidade; (ii) redução dos conflitos reais e potenciais de uso da água, bem como dos eventos hidrológicos críticos; (iii) e percepção da conservação da água como valor socioambiental relevante.

Para isso, o primeiro dos quatro volumes do PNRH contempla um diagnóstico da situação atual dos recursos hídricos, de forma muito abrangente. Nele, são abordados os aspectos técnicos específicos da situação atual das águas no país, a inter-relação com a base jurídico/institucional, a macroeconomia nacional e internacional, a ecologia dos principais ecossistemas brasileiros e os aspectos socioculturais do uso da água. Uma abordagem de tal natureza representa avanço substancial com relação ao planejamento realizado de forma tradicional, em que unicamente os aspectos técnicos eram levados em consideração, com imposições que a sociedade deveria aceitar. Essa falta de participação da sociedade pode ter sido, no passado, responsável pelo fracasso de muitos projetos.

No segundo volume, são construídos cenários para o ano 2020, em que foram destacados os principais usos da água, que deverão afetar os recursos hídricos do país: água na irrigação; a geração de energia; os requerimentos para a navegação; e as necessidades para a diluição dos esgotos domésticos e industriais. O consumo de água para abastecimento domiciliar está condicionado apenas pelo crescimento populacional e a expectativa de crescimento da população atendida. O crescimento da demanda industrial está vinculado de forma mais estreita com os cenários futuros, mas sua participação atual, igual que para o abastecimento urbano, é relativamente reduzida.

O terceiro volume contempla as diretrizes do PNRH, que orientaram a definição dos programas que permitirão que os objetivos estratégicos sejam alcançados. Tais diretrizes são vinculadas a subprogramas incluídos dentre os 13 programas em que o PNRH foi estruturado, descritos no volume de número quatro. No que diz respeito ao monitoramento e à avaliação da política, está prevista a constituição de uma base geral de informações, compatível com o sistema nacional de informações em recursos hídricos, no qual suas alterações / atualizações, bem como os indicadores de monitoramento, serão armazenados. Dessa forma poderá se avaliar se os objetivos estratégicos estão sendo

alcançados, ao mesmo tempo em que se mantém a integridade e consistência metodológica, cartográfica e estatística da política.