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2 O PLANEJAMENTO EDUCACIONAL: AS QUESTÕES DO FEDERALISMO E

2.3 PLANOS MUNICIPAIS DE EDUCAÇÃO E A ATENÇÃO AO ENSINO

É no interior do estado brasileiro federado que se insere nosso interesse de pesquisa. No entanto, nosso foco desloca-se para a questão do planejamento e do oferecimento do Ensino Fundamental. Nesse caso, tratar do tema a partir da necessidade de colaboração entre os entes federados é fundamental. É nesse contexto que discutiremos o planejamento da educação como elemento da política educacional, buscando entender como se desenvolve a questão do planejamento nacional e sua relação com o planejamento da educação municipal.

A política educacional é o conjunto de interações e ações pelas quais os poderes públicos respondem às necessidades de desenvolvimento cultural e escolarização da população. E, desde que a educação é uma política pública, existe a necessidade de se planejar e de se aconselhar (MONLEVADE, 2004). Planejar, no nosso complexo modelo federativo brasileiro, implica assumir compromissos com o esforço contínuo de eliminação das desigualdades que são históricas no Brasil. Isso é muito verdadeiro quando nos referimos ao âmbito das políticas de educação brasileira e a questão da qualidade da educação. Para isso, é preciso adotar uma nova atitude: construir formas orgânicas de colaboração entre os sistemas de ensino, mesmo sem que as normas para a cooperação federativa tenham sido ainda regulamentadas (BRASIL/MEC, 2014b)

Após Emenda Constitucional nº 59/2009 (EC nº 59/2009) essa necessidade de planejar, aparece na CF/88 através do art. 214 como necessidade de estabelecer o Plano Nacional de Educação, de duração decenal. Ou seja, compromisso por durante 10 anos, e essa periodicidade do PNE, que no texto anterior era plurianual, significa que planos plurianuais devem tomá-lo como referência (BRASIL/MEC, 2014b).

A Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014, foi sancionada, sem vetos e fez entrar em vigor o Plano Nacional de Educação (PNE) 2014-2024, o segundo PNE aprovado por lei após um longo processo de disputas e entraves. Foi um amplo e democrático processo de debate, que começou na Conferência Nacional de Educação (CONAE) 2010 e culminou com sua aprovação pelo Congresso Nacional, o que reforça o caráter especial desse PNE

(BRASIL/MEC, 2014b). Já que, como mencionado no início deste capítulo, os primeiros Planos eram elaborados pelo executivo e não contavam com a participação da comunidade em geral.

De fato, houve uma mobilização forte durante a tramitação do atual Plano Nacional na Câmara dos Deputados, que Azevedo (2014) diz ser um indicativo da atuação de forças da sociedade civil no processo de sua construção. Para ela, tal atuação resultou em modificações substantivas no projeto de lei do Poder Executivo, levando a que muitas das proposições registradas no documento final da Conae (2010) fossem incorporadas ao seu texto. Ao mesmo tempo em que temáticas propostas pelas conferências foram debatidas e incorporadas ao documento base, Oliveira (2014, p.448) ressalta que o Projeto Lei (PL) nº 8.035 apresentado ao Congresso Nacional em dezembro de 2010 era outro documento, de autoria do Poder Executivo, que deixava de fora importantes reivindicações da sociedade civil organizada expressas no documento final da Conae, sobretudo a perda de centralidade na constituição de um Sistema Nacional de Educação.

Então, seguindo a lógica do seu próprio processo de elaboração, o Plano Nacional de Educação (2014-2024) estabelece:

Art. 8º, § 2º - Os processos de elaboração e adequação dos planos de educação dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, de que trata o caput deste artigo, serão realizados com ampla participação de representantes da comunidade educacional e da sociedade civil. (BRASIL, 2014a).

O plano passou a ser considerado o articulador de um possível Sistema Nacional de Educação em regime de colaboração, com previsão do percentual do Produto Interno Bruto (PIB) para o seu financiamento. E, por essa razão, deve ser a base para a elaboração dos Planos Estaduais, Distrital e Municipais, que, ao serem aprovados em lei, devem prever recursos orçamentários para a sua execução (BRASIL/MEC, 2014d). Para Dourado (2014) a importância da nova proposta de financiamento para o PNE (2014-2014), parte da constatação da não efetivação do Plano anterior (2001) causada pelos vetos ao financiamento.

Dourado (2014, p.232) acredita que se o PNE for entendido como epicentro da política educacional, ele pode propiciar avanços importantes na educação, enfrentando questões centrais como:

o analfabetismo, a universalização do atendimento escolar, a superação das desigualdades educacionais, a melhoria da qualidade, uma formação mais ampla, humanística, científica, cultural e tecnológica, a valorização dos

profissionais, o respeito aos direitos humanos, à diversidade, sustentabilidade ambiental e ao princípio da gestão democrática.

No entanto, só o PNE não será suficiente para enfrentar essas questões, é necessário um Sistema Nacional de Educação que dê força a esse Plano. Sobre este termo, Libâneo (2007, p.240) lembra que foi na CF/88 que se alterou a noção de sistema e sua abrangência nas diferentes esferas administrativas. Assim como foi na LDB/96 que este mesmo termo foi substituído pela organização da educação nacional. O autor explica que:

A não-existência de um sistema nacional de educação foi resultado de um jogo político entre forças desiguais no Congresso Nacional. As dificuldades, após a promulgação da nova LDB, de organizar os diferentes sistemas, especialmente os municipais, devem-se também ao caráter impositivo de muitos sistemas estaduais sobre os municípios (LIBÂNEO, 2007, p.241).

Então, conforme o art. 211, § 1º da CF/88, reformado pela Emenda Constitucional 14 “a União organizará o sistema federal de ensino e o dos Territórios”. Nos parágrafos seguintes deste mesmo artigo, a Constituição estabelece que “os Municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil”, e “os Estados e o Distrito Federal atuarão prioritariamente no ensino fundamental e médio”. Logo, o Ensino Fundamental é de responsabilidade dos estados e municípios.

O sistema federal de ensino, segundo Libâneo (2007, p.242), refere-se às instituições, órgãos, às leis e às normas que, sob a responsabilidade da União, do governo federal, se concretizam nos estados e nos municípios. Dentro deste sistema, o Ministério da Educação (MEC) é o órgão líder e executor, colegiado pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) que normatiza o sistema e subsidia a elaboração e acompanha a execução do Plano Nacional de Educação.

Para Dourado (2014), o benefício da institucionalização do Sistema Nacional de Educação é o de contribuir para a organicidade das políticas educacionais. Desse modo, acredita que o atual Plano deu um grande passo ao propor um prazo de dois anos para instituição do Sistema Nacional de Educação. Mesmo entendendo que o SNE já esteja constituído, a partir da EC nº59, de 2009, na qual ele já aparece como a base para o PNE, é necessário institucionalizá-lo, pois faz parte da regulamentação e de sua construção na esteira

de relações cooperativas entre os entes federados, já que muitas vezes a relação é de dependência.

É na CF/88 que pela primeira vez o município é reconhecido como instância administrativa, “possibilitando-lhe, no campo da educação, a organização de seus sistemas de ensino em colaboração com a União e com os estados, porém sem competência para legislar sobre ele. As leis seguidas pelos municípios são estaduais e federais” (LIBÂNEO, 2007, p.248).

Segundo Viera (2011, p.128) os alicerces do poder local no campo educacional são fortalecidos com a Emenda Constitucional n. 14/96, a LDB/96 e a lei n. 9424/94que instituiu o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef).

De acordo com a LDB/96, “Os Estados incumbir-se-ão de assegurar o ensino fundamental e oferecer, com prioridade, o ensino médio a todos que o demandarem, respeitado o disposto no art. 385 desta Lei” (LDB, art.10, VI)6 e os Municípios:

Incumbir-se-ão de: V - oferecer a educação infantil em creches e pré-escolas, e, com prioridade, o ensino fundamental, permitida a atuação em outros níveis de ensino somente quando estiverem atendidas plenamente as necessidades de sua área de competência e com recursos acima dos percentuais mínimos vinculados pela Constituição Federal à manutenção e desenvolvimento do ensino (LDB, art. 11, V).

A diferença entre o papel de cada instância para Viera (2011, p.128) não é tão simples, pois segundo a autora uma coisa é “oferecer”, outra é “assegurar” e tais diferenças expressam algo da competição entre as esferas do poder público a quem cabe a responsabilidade pela educação básica – estados e municípios. Entra a questão dos recursos destinados a cada instância. Antes era o Fundef que assegurava recursos para o Ensino Fundamental, conforme o número de alunos matriculados por rede pública (estadual e municipal), depois foi substituído em 2007 pelo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) que assegurara recursos para toda a Educação Básica, com durabilidade prevista até 2020. No entanto, apesar dessa mudança representar um avanço, o Fundeb precisa ser aperfeiçoado, porque os coeficientes para

5Art. 38. Os sistemas de ensino manterão cursos e exames supletivos, que compreenderão a base nacional

comum do currículo, habilitando ao prosseguimento de estudos em caráter regular.

educação infantil e educação de jovens e adultos, por exemplo, estão aquém da real necessidade (DOURADO, 2014, p. 242).

Contudo, a estratégia 20.6, referente à meta de financiamento, é avaliada por Dourado (2014) como uma das grandes conquistas da sociedade civil. O autor explica que essa estratégia define:

não apenas a implantação do custo aluno qualidade inicial (CAQ) no prazo de dois anos, mas determina, ainda, que o CAQ deve atender a um conjunto mínimo de padrões, estabelecidos na legislação educacional, cujo financiamento será calculado com base nos insumos indispensáveis ao processo ensino-aprendizagem, além de prever que ele será progressivamente reajustado até a implementação plena (2014, p.242).

Retomando a questão da responsabilidade pela educação básica dos estados e municípios, Carvalho e Costa (2012, p.5) destacam que a municipalização do ensino não é obrigatória, mas a retenção dos recursos do FUNDEB que será destinado para quem for o responsável pelo Ensino Fundamental no Município, seja o próprio Município ou o Estado, é. Ou seja, o papel do poder local no que se refere à oferta de serviços é ampliado (VIEIRA, 2011 p.128).

Sobre essa discussão da ampliação e da autonomia dos municípios para administrar seus próprios recursos, Carvalho e Costa (2012, p.5) entendem:

a transferência de responsabilidade estabelecida na LDB/96 como desconcentração de tarefas, sem, no entanto, se efetivar a devida descentralização do poder decisório, no que tange à autonomia financeira, bem como para a normatização e planejamento de políticas públicas para a educação, pois, descentralizar é delegar poderes e desconcentrar é dividir tarefas.

Dentro desse contexto de municipalização e recursos do ensino, estão inseridos os Planos Municipais de Educação cujos insumos necessários para a sua execução terão de constar nos orçamentos da União e dos estados para que apoiem técnica e financeiramente os municípios ao longo da década (BRASIL/MEC, 2014b). Já na Prefeitura, instrumentos de planejamento terão de se vincular ao plano decenal de educação: Plano Plurianual (PPA), Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), Lei Orçamentária Anual (LOA), Plano de Ações Articuladas (PAR), entre outros (BRASIL/MEC, 2014b).

Sob a premissa de alinhamento ao Plano Nacional e ao Plano Estadual de Educação, a elaboração ou adequação dos PMEs está prevista no art. 8o do PNE (2014-2014):

Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverão elaborar seus correspondentes planos de educação, ou adequar os planos já aprovados em lei, em consonância com as diretrizes, metas e estratégias previstas neste PNE, no prazo de 1 (um) ano contado da publicação desta Lei. (BRASIL/MEC, 2014b).

Também é fundamental considerar que o PME deve ser do município, e não apenas da rede ou do sistema municipal. O Plano é de todos que moram no município; portanto, todas as necessidades educacionais do cidadão devem estar presentes nele (BRASIL/MEC, 2014b). Para isso, são distribuídas responsabilidades durante o processo de elaboração do PME. Assim, cabe à Comissão Coordenadora, Fórum ou o Conselho Municipal de Educação que assumem essa tarefa, ou caso não instituídos uma Comissão precisa ser nomeada, realizar um amplo e qualificado debate sobre a proposta do Plano. Cabe à Equipe Técnica (pessoas das equipes da Secretaria de Educação, Administração, Planejamento e Finanças do Município) fazer o levantamento dos dados educacionais e de elaborar uma proposta de Documento-Base a ser oferecido e validado pela Comissão Coordenadora antes da ampla divulgação e do debate público. O Documento-Base é a proposta preliminar do Plano Municipal de Educação e será o principal instrumento e referência para o debate público, onde a sociedade construirá os consensos e acordos necessários sobre os desafios educacionais prioritários e as formas de enfrentá-los ao longo da década de vigência do Plano. (BRASIL/MEC, 2014b).

Na construção de metas com corresponsabilidade entre os entes federados, existem algumas metas de responsabilidade direta do município, como a expansão da oferta da educação infantil. Mas, a responsabilidade não é só municipal; o Plano deve indicar que ações o município poderá desenvolver com apoio da União e do Estado para garantir o direito das crianças à creche e à pré-escola (BRASIL/MEC, 2014b).

No caso do Ensino Fundamental, o município e o estado têm responsabilidade direta na oferta. A Meta 2 do PNE (2014-2024) objetiva:

Universalizar o ensino fundamental de 9 (nove) anos para toda a população de 6 (seis) a 14 (quatorze) anos e garantir que pelo menos 95% (noventa e cinco por cento) dos alunos concluam essa etapa na idade recomendada, até o último ano de vigência deste PNE. (BRASIL, 2014a)

No entanto, temos como realidade o intenso processo de municipalização ocorrido nos últimos anos e que segundo Oliveira (2003), fez com que, desde 2000, a esfera municipal seja a maior responsável pela oferta do ensino fundamental e, a partir de 2002, responsabilize-se

por mais de 50% da matrícula total dessa etapa da educação básica, incluindo o setor privado. Logo, o cumprimento dessa meta também estará na responsabilidade direta do município.

Por fim, segundo o caderno de orientações (BRASIL/MEC, 2014b), o acompanhamento do processo de elaboração ou adequação do PME pelo Prefeito e a presença ativa dos secretários municipais são importantes para que o PME seja valorizado e definido com base na realidade do município, considerando suas fragilidades e potencialidades.

3 ESTUDOS E PESQUISAS SOBRE PLANO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO E SUA