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5.2 O que estamos compreendendo por sistema?

5.2.2 Poder causal da consciência fenomênica e psicológica e da criatividade

temporal, physical, social, and cultural context in which the agent was embedded and in which the action occurred.”

174 Não nos deteremos, aqui, em explicitar as diferenças da concepção que estamos defendendo com a proposta

de Juarrero (1999), isso ficará para outra pesquisa. A título de hipótese, podemos sugerir que pode ser a compreensão que, inclusive, nos níveis mais simples de organização que constitui o ser humano, o aspecto mental e material já existem entrelaçados e interagem na informação ativa, como causa formal e final. Esse seria um modo diferente de não cair no epifenomenismo, o qual Juarrero (1999) também procura evitar.

175 Autocatálise está relacionada à função não-linear do feedback positivo (JUARRERO, 1999, p. 125).

176 Podemos pensar que, em decorrência disso, o sistema nervoso central como um todo “dirige ou controla”

os processos que geram comportamentos e modificações orgânicas, mas isso não significa que ele “armazena” todas as informações que caracterizam nossas crenças, desejos, habilidades etc. E, neste sentido, a hipótese da Memória Sistêmica apresentada na introdução desta tese pode fazer sentido.

Para Bohm, quanto maior for a consciência dos padrões rígidos de pensamento implícitos na nossa ação, mais provável é o ser humano libertar-se da carga emocional ligada a eles. Quanto maior a consciência, maior o grau de liberdade; o que também está relacionado à capacidade criativa. A criatividade expande-se na medida em que a percepção total aumenta.177 Mas ela só flui na medida em que os padrões rígidos de pensamento são criticados (ou seja, flexibilizados). Qualquer movimento livre pode dissolver as informações erradas relacionadas a padrões rígidos e destrutivos que bloqueiam a criatividade. À medida que aquelas informações erradas são eliminadas, a ‘carga emocional’ ligada a elas também é limpa e um estado de vibração surge e intensifica o estado excitado de criação que pode permear outras áreas da vida também. O ato criativo é um estado de alta energia que torna possível novas percepções (BOHM; PEAT, 2011, p. 270).

Tais percepções incluem aquelas que consideramos relacionadas à consciência fenomênica, que se dão por familiaridade e não necessariamente por meio da aplicação de categorias linguísticas. Neste sentido, a percepção total que trata Bohm distingue-se do pensamento analítico, ela refere-se, antes, a um tipo de apreensão da realidade que não está atrelada a conceitos. Por isso, parece estar relacionada a apreensão de conteúdos sentidos (BOHM, 1980, p. 253), que estamos considerando como um conteúdo fenomênico. Assim posto, consideramos que a consciência fenomênica pode auxiliar a compreender a realidade também, além de poder modificar um comportamento e produzir alterações orgânicas.

Além disso, à medida que a consciência fenomênica surge, é possível modificar ou reforçar um atrator,178 pois ele serve como algo que direciona a atuação do sistema em seu meio. Se tomamos consciência do quanto uma situação incomoda-nos, por exemplo, deixando-nos extremamente raivosos, podemos buscar evitar tais situações. Ou, se tomamos consciência do quanto uma situação alegra-nos, podemos buscar com mais frequência situações semelhantes.

Assim, a consciência fenomênica pode auxiliar no estabelecimento de atratores para a nossa ação. Ela pode ser valiosa, ademais, se estivermos atentos as nossas sensações físicas

177 Bohm desenvolve essas ideias em uma fase considerada, por muitos de seus leitores, como mística, na qual

ele tem interlocuções com Jiddu Krishnamurti. Para uma compreensão maior sobre a percepção em Bohm, ver Bohm e Hiley (1993), Bohm e Peat (2011) e Krishnamurti e Bohm (1999). Para uma rápida compreensão, ver Oliveira (2013).

178 Segundo Debrun (1996b, p. 36-38), atrator refere-se a uma “exigência” criada pelo processo que faz surgir

um sistema a partir de um amontoado de elementos distintos. Tal atrator pode ser indefinido ou aberto, fraco ou forte. Antes de formar-se um sistema, os elementos distintos têm uma igualdade de força, não há vencedor do embate, se houver um vencedor, pode-se considerar que a organização foi imposta externamente. Na medida em que o sistema forma-se, o atrator refere-se à organização autoimposta criativamente, a partir da qual o sistema relaciona-se com as coisas ao seu redor. Ele constitui-se como uma memória “efetiva” que serve de orientação para o futuro, o que está relacionado à cristalização do sistema.

e emocionais. Pesquisas em neuropsicologia têm sugerido uma relação entre a rigidez de pensamento e a rigidez muscular, na medida em que a estimulação mental e os exercícios físicos ajudam a prevenir a doença de Alzheimer, cujos sintomas são perda de memória, confusão mental, perda de flexibilidade etc. (DOHERTY, 2011, p. 129). Se houver uma atenção apropriada para os indícios dos sintomas do Alzheimer, como a consciência da falta de flexibilidade, por exemplo, o sujeito pode buscar mudar alguns hábitos e, quem sabe, retardar um possível surgimento daquela doença.

As pesquisas da neuropsicologia em relação ao Alzheimer também podem constituir uma evidência para a participação mente-corpo na direção em que estamos defendendo. Além disso, tais pesquisas corroboram o que afirma a Medicina Tradicional Chinesa, para a qual os meridianos do fígado e da vesícula biliar, que são acoplados, estão relacionados à emoção da raiva, supondo que quando a energia nesses meridianos e essa emoção estão equilibradas, ocorre a expressão máxima da criatividade (para resolver problemas etc.). A função desses meridianos de energia é, no aspecto físico: contração e relaxamento, além de assegurar o movimento das articulações; no aspecto psicológico: produzir criatividade. Quando a energia desses meridianos está desequilibrada, alguns sintomas são: rigidez muscular, câimbras musculares, obstinação, inflexibilidade mental, teimosia, irritabilidade etc. A partir dessa perspectiva, o indivíduo está saudável se a sua energia está equilibrada e, consequentemente, se há criatividade e flexibilidade física e mental; porém, quando a sua energia está desequilibrada nesses meridianos, há rigidez mental e física.

Assim, se essas perspectivas estão corretas mesmo e se o sujeito estiver atento as suas emoções e sensações, ele pode evitar a doença e buscar a saúde de forma intencional. Nem sempre o processo de dissolução de padrões rígidos é feito de forma consciente e intencional. Mas quando ele é feito dessa forma, como diriam Juarrero (1999) e Debrun (1996b), há um atrator constrangendo o comportamento humano, o que reduz a aleatoriedade e, então, o sucesso em alcançar um grau maior de liberdade, criatividade e bem-estar pode ser maior. Esse atrator, por exemplo, um desejo por estar perto de pessoas queridas que fazem nos sentirmos bem, surgiria em níveis superiores na hierarquia neurológica, diante da consciência fenomênica da sensação prazerosa.

Mas o fato de a consciência fenomênica, assim como a psicológica, surgirem em níveis superiores da hierarquia neurológica não significa que os processos que ocorrem nos órgãos mais distantes do cérebro não sejam importantes e não contribuam para a auto- organização complexa e sutil que permite a emergência de novas intenções, de crenças,

enfim, de novos atratores. Por outro lado, o ambiente natural e cultural também contribui para a formação de crenças e sensações no ser humano.

...

Até o momento, vimos que a conexão entre os aspectos mental e material do ser humano caracteriza-se por ser um tipo de participação compreendida como uma interação entre as causas formal, final, eficiente e material que atuam através da informação ativa de modo a modificar-se a si mesma entendida como outra. Vimos ainda que a conexão entre os níveis superiores e inferiores de organização no sistema humano pode ser caracterizada como um tipo de participação compreendida como uma causação circular e que o ser humano só auto-organiza-se como sistema nesses diversos níveis de complexidade mediante as suas relações com o ambiente natural e cultural em que está inserido. Mas como podemos entender a participação/envolvimento entre ser humano e mundo (este incluindo muitos outros sistemas - dentre eles, outros seres humanos - e elementos distintos)?

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