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A política administrativa do João Terceiro: suas fontes de poder e construção da infraestrutura municipal.

CAPÍTULO II CONTINUIDADE E TRADIÇÃO: ASCENSÃO POLÍTICA DE JOÃO TERCEIRO E A HEGEMONIA POLÍTICA DE CHICO NOGUEIRA

2.3. A política administrativa do João Terceiro: suas fontes de poder e construção da infraestrutura municipal.

No período de 1947 até o final da década 1970, as prefeituras municipais e seus prefeitos dependiam demasiadamente dos arranjos políticos no âmbito estadual e federal, haja vista que os recursos públicos obrigatórios de repasse pelo Estado e União aos municípios são ínfimos. Além disso, a renda de um Município de pequeno porte no

interior nordestino era insignificante, resultando na falta de autonomia econômica e, respectivamente, dependência política do governo municipal com o governo estadual e federal. Diante da escassez de recursos públicos, portanto, o prefeito municipal ficava na dependência do governo do estado e dos deputados estaduais e federais influentes para poder realizar as demandas básicas do seu município.

Conforme Leal (1993, p. 165) “É evidente que a anemia financeira das municipalidades aumenta a sua dependência em relação aos governos estaduais e, consequentemente, favorece a submissão política dos chefes locais”. O mesmo diz que buscar uma explicação puramente política para o fato seria atribuir ausência total de espírito público aos nossos homens de partido. Seu argumento é que

em nossos dias, outros fatores, que não os políticos, terão contribuído para criar essa consciência difusa, mas atuante, de que era necessário aumentar a receita dos municípios, como instrumento de elevação do nível de vida das populações do interior (IDEM).

Com base nas entrevistas realizadas nesta pesquisa e consulta ao Arquivo Histórico do Município de Pereiro, fruto de anos de pesquisa do Historiador do Município, Adauto Odilon da Silva, constatamos que os prefeitos que governaram até meados da década de 1970 pouco conseguiram realizar obras estruturais no município. Haja vista que os recursos públicos e rendas do município eram insuficientes, ou seja, havia a anemia financeira do município. As demandas eram na maioria dos casos individuais, e no caso de demandas coletivas, quando efetivadas, eram reconhecidas como favor pela população, o poder público argumenta que são obrigações do gestor. Nesse caso, maioria de sertanejos e pereirenses percebem a realização de serviços, demandas, a atendimentos pessoais, à saúde e educação como favor prestação de favor, ao contrário da tese de Domingos Neto (1999, p. 63), que defende que “O que é normalmente apontado como prestação de favor, é encarado, por sertanejos dominantes e dominados, como cumprimento de obrigações.”.

As demandas e o trabalho político do vereador na época, segundo ex-vereador que exerceu mandatos no período a pouco citado, eram realizados da seguinte forma:

Naquele tempo os prefeitos quase não ajudavam a ninguém. A gente tinha muita vontade, tinha muita amizade. Nessa época a gente andava a cavalo, subindo e descendo essas grotas. Quando tinha uma pessoa doente levava pro Hospital, pegar um documento tinha que ir pegar onde estivesse a cavalo. Depois chegou o tempo de aposentar, essa Serra todinha eu aposentei esse pessoal mais velho tudinho. Fui buscar documento e em qualquer canto deste Ceará eu andei. (Entrevista nº 05, 2011, p. 01-02).

Essa prática de aposentar trabalhadores rurais na década de 1980, em alguns casos, indevidamente, implicou em crimes impetrados pela Justiça Federal a vereadores do Ceará, tornando-os inelegíveis.

O prefeito conseguia serviços de estrada, ajudava a aposentar pessoas idosas, trazer escolas e outros pequenos serviços para o município, ou seja, fazia o trabalho de mão dupla com o vereador da sua confiança. O vereador e o prefeito, para realizarem suas demandas, buscavam a mediação de deputados correligionários ou recorriam diretamente ao governador do estado; às vezes, o vereador procurava, individualmente, a ajuda dos políticos ou de instituições competentes. Muitas das demandas ou serviços municipais continuaram sendo realizados por intermédio de deputados e senadores com base eleitoral no município, os quais se empenham em aprovar projetos ou enviar recursos aos municípios, prática essa que perpassa os anos 1970. No século XXI, as prefeituras, embora tendo maior autonomia econômica e política, ainda dependem do intermédio de políticos externos para realizarem determinadas demandas.

Conforme os dados analisados e avaliação de vários munícipes entrevistados, alguns que presenciaram gestões das décadas de 1950 ao final dos anos 1980, outros que foram vereadores ou realizaram atividades políticas no município de Pereiro, segundo seus relatos, o que havia era a política do favor, da amizade, dependência pessoal e da parentela. Além da falta de recursos, é necessário relativizar a análise sobre cada gestor de acordo com as condições políticas de sua época. O relato de ex-prefeito eleito em 1988 é significativo para explicar essa questão.

Vejamos que [...] cada momento é um momento diferente e eu acho que é importante a gente fazer justiça, porque muita gente vai fazer análise e aí analisa o tempo do seu Chico Nogueira [prefeito Chico Nogueira] que foi muitos anos prefeito de Pereiro, João Terceiro, seu Benício Diógens Diógenes, José Lira e diz: ah, mas não fazia nada! Também

assim o seu Humberto [Nogueira de Queiroz], o município não tinha receita naquela época, ou quando passou a ter era insignificante, às vezes você recebia um mês, outros meses não tinha dinheiro, ora o prefeito recebia com um semestre depois, então os prefeitos que foram anos anteriores a Constituição de 1988, ou anterior aos anos 80, vamos supor, eles realmente não tinham condições de fazerem muita coisa, eles até podiam fazer alguma coisa, mas nada que fosse significativo. (Entrevista nº 18, 2012, p. 12-13).

É na segunda gestão do João Terceiro (1977-1982) que as obras estruturais do município de maior impacto às necessidades da população são realizadas. No seu governo, a Educação foi priorizada com a construção de pequenas unidades escolares, equipamento para funcionamento das mesmas, transporte para o setor, fundação de biblioteca, dentre outros serviços, haja vista que a atuação na Educação foi inicialmente o trampolim para o ingresso do João Terceiro na política. Além do setor da educação, a infraestrutura do município foi sendo criada, pois era praticamente inexiste na época.

Quando analisamos a lista de serviços realizados por João Terceiro na gestão 1977 a 1982, observamos que demandas e serviços em diversificadas áreas foram efetivados, demarcando avanços significativos em comparação às gestões anteriores, impactando, assim, a qualidade de vida em Pereiro. Os relatos seguintes comprovam, destacam e sintetizam os impactos da última gestão do João Terceiro no município.

A infraestrutura inicial aqui de Pereiro partiu dele, talvez 70% da cidade. O Hotel Municipal foi ele que construiu, foi ele que trouxe para Pereiro, ele trouxe com muito esforço a energia elétrica, o serviço de telefonia foi ele que trouxe e também o abastecimento d’água, quer dizer, a infraestrutura da cidade nós devemos a João Terceiro. (Entrevista nº 14A, 2013, p. 01).

[...] O melhor prefeito de Pereiro foi o João Terceiro e os benefícios melhores que houve foi na gestão do João Terceiro. Olhe, eu ainda continuo falando que o João Terceiro foi o melhor prefeito de Pereiro e não foi porque ele me deu nada não, é porque quando ele pegou Pereiro não tinha verba, não tinha verba, aí João Terceiro pegou Pereiro e fez 12 grupos escolares, fez o Colégio de Segundo Grau, fez Hospital Maternidade, Cibrazen, Teleceará, calçamento, Hotel Municipal, botou energia elétrica, botou posto médico, então foi o prefeito melhor que houve porque não tinha verba. Cadeia pública, [...] energia na sede e na zona rural, água encanada que ainda não tinha aqui em 78 e energia nos distritos e na sede. Ele empregou na

faixa de quatrocentos e setenta pessoas no município. Fez campos de futebol. (Entrevista nº 14C, 2013, p. 10).

A partir desses dados, compreendemos que, apesar dos recursos orçamentários do município ser de baixo valor, há outras formas de conseguir recursos externos por intermédio de deputados, senador e governador com base política no município. Sem o empenho desses mediadores, seria impossível que o prefeito João Terceiro realizasse os serviços que efetivou no município, fruto do seu capital político e prestígio social perante o regime militar e governo dos coronéis Adauto Bezerra e Virgílio Távora.

2.4. As fontes de poder do João Terceiro: a ligação da política municipal com o

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