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Redemocratização e mudanças políticas: rupturas do poder no Ceará.

CAPÍTULO III – GESTÃO DE ANTÕNIO MARDÔNIO DIÓGENES 59 (1983-

CORONELISTA EM PEREIRO

3.4. Redemocratização e mudanças políticas: rupturas do poder no Ceará.

O processo do movimento pela redemocratização política no Brasil aos poucos abalou as bases de sustentação do regime militar, que de forma lenta e gradual cedeu às reivindicações e pressões políticas e sociais. A partir de 1984, o Presidente João Figueiredo inicia o processo de abertura política, ao mesmo tempo cresce o movimento pelo fim da ditadura militar. A partir de 1985, o movimento se fortalece, passando a exigir eleições diretas para a escolha dos seus governantes. O movimento pelas “Diretas Já”, encabeçado pelo PMDB, consegue adesão dos movimentos sociais, forçando o Presidente João Figueiredo à instituir a eleição indireta para Presidente do Brasil. Essa foi a estratégia do regime militar na tentativa de continuar no poder.

Em 1985, Tancredo Neves é eleito indiretamente Presidente da República pelo Congresso Nacional. A partir de então, o movimento do PMDB por eleições diretas resultaria na instituição das eleições diretas para escolha dos governos estaduais e municipais que ocorreriam em 1986.

A redemocratização política abalou o sistema coronelista ainda sobrevivente nos estados e municípios, principalmente aqueles da região Nordeste. Nesse contexto, o estado do Ceará, no governo de Gonzaga Mota (1983-1986), permanece atrelado ao domínio do regime militar, quiçá, sob a forte influência e domínio dos coronéis Virgílio Távora, César Cals e Adauto Bezerra, os quais comandavam o estado por cerca de quatro décadas. No entanto, o Ceará ainda é um dos estados mais pobres do país. Sua estagnação econômica, o controle do poder, os desmandos políticos e a pobreza se repetiam nos municípios do interior, os quais eram dirigidos por seus correligionários.

Nesse contexto, o município de Pereiro encontra-se em situação de estagnação econômica, pobreza, carente em serviços públicos e sob o domínio político coronelista

que faz uso da intimidação e da violência para controlar a vida local e se sustentar no poder. Na percepção de um entrevistado, “Pereiro era parado, empereirado, Pereiro era estagnado”. (Entrevista nº 01, 2011, p. 04).

O processo de redemocratização, a eleição de Tancredo Neves e a aproximação das eleições estaduais de 1986 fortalecem o movimento da sociedade por mudanças no sistema político, criando espaços para que novos personagens entrassem em cena no âmbito estadual e municipal. No estado do Ceará, o movimento por mudanças antes iniciado pelo PDMB alcança êxito e adesão da elite empresarial do estado. A partir de então, as reivindicações por mudanças estruturais, políticas e econômicas envolvem um grupo de empresários com ideologia modernista, os quais agregados no Centro Industrial do Ceará (CIC) passaram a contestar o governo dos coronéis, exigindo uma nova política que contemplasse as reivindicações dos empresários modernos e movimentos sociais organizados da sociedade civil.

A extensão dos movimentos, sentimentos e desejos de mudança se expandem às regiões metropolitanas do estado e municípios do interior, alcançando o município de Pereiro. Esse contexto possibilitou a formação de novas lideranças (estudantis, comunitárias, esportivas) políticas no município que, observando as mudanças propiciadas pela redemocratização, aos poucos se organizam no sentido de buscar soluções para os problemas do seu município. Essas lideranças se organizam no que denominam de Movimento Pró-Mudanças63, do qual sairiam os futuros governantes do município. Em seguida, com a aproximação das eleições estaduais, o movimento se fortalece com a adesão de representantes de instituições sociais e de pereirenses residentes fora do município.

Lançada a candidatura de Tasso Jereissati ao governo do estado em 1986, o Núcleo do PMDB64 de Pereiro faz sua convenção e regulariza o partido no município com objetivos de apoiar a campanha eleitoral de Tasso, do PMDB, contra Adauto

63Foi fundado em Pereiro, em 1985, com apoio à eleição do Presidente (Tancredo Neves - PMDB), cujos

componentes inconformados com a administração centralizadora e ditatorial do prefeito Mardônio Diógenes (PFL), uniram-se na luta pela liberdade política do seu povo. O contexto é de violência, falta de liberdade de expressão, pistolagem, medo e insegurança desencadeados pela dominação tradicional há décadas prevalecente na região. O movimento foi encabeçado por Antônio Bezerra Falcão, Raimundo Pessoa, José Irineu de Carvalho, o vereador Leônidas Morais, vereador José Francisco dos Santos Sobrinho, Moacir José Estevam e outros integrantes do Núcleo do PMDB no município, culminando no que Antônio Bezerra Falcão, Presidente do PMDB municipal, na época denominou de Nova Oposição.

64 A organização do partido centrou-se em dois objetivos: a) apoiar Tancredo Neves à Presidente da

República e Tasso Jereissati ao governo do estado do Ceará; b) organizar um grupo político no município que pudesse agregar setores da sociedade que discordavam do sistema político que governava o Ceará e Pereiro na época.

Bezerra (PFL), candidato do prefeito Mardônio Diógenes, também defensor do sistema político dos coronéis. Nesse período, conforme entrevistados, apenas as lideranças destemidas apoiaram a campanha do Tasso. Vejamos o que disse um dos dirigentes do PMDB na época.

Então começaram esse movimento de mudança que foi com a fundação do partido do PMDB, foi quando o Tasso Jereissati se elegeu governador do estado pelo PMDB, daí foi quando se conseguiu fazer o partido em Pereiro; de fazer a convenção, mesmo todo mundo amedrontado, nesse momento, pouca gente participando, só os mais destemidos mesmo são os que participaram. Então se conseguiu realizar esse movimento (Entrevista nº 10, 2012, p. 03).

Havia, na realidade, por parte da sociedade local e apoiadores de campanha de Tasso Jereissati, apreensão, medo e insegurança. A figura, a força e a cultura do coronelismo ainda era muito presente no sertão cearense. Conforme análise de Saraiva (2011), o regime militar no Ceará criou a sensação de temor aos coronéis. Para Saraiva, aos poucos o povo foi perdendo o medo, foi “espantando o medo”.

Na verdade, era isso mesmo: havia um temor de que, se libertando dos chefetes que representavam os coronéis, estes pudessem tomar represálias. A alma penada dos velhos senhores do sertão parecia assombrar as pessoas. Creio que, para os menos informados, os ingênuos e desavisados, esse temor era remanescente do sistema militar vigente até bem pouco tempo. Em outras palavras: se era “coronel”, podia mandar prender, arrebentar. (SARAIVA, 2011, p. 163).

No âmbito da política estadual, alguns desdobramentos políticos desagregação no interior da elite dirigente, assim resultando na ruptura do poder. Gonzaga Mota rompera primeiro com Virgílio Távora, em seguida, no último ano de seu mandato, em 1986, rompe com Adauto Bezerra. No mesmo ano, Gonzaga Mota lança Tasso Jereissati como candidato a governador pelo PMDB. Candidatura inspirada, segundo Saraiva (2011), nos ideais da Renovação, quando os publicitários ainda não tinham cunhado a palavra adequada, “Mudança”. Nesse sentido, deflagrado o processo eleitoral, Tasso derrota Adauto Bezerra, do PFL, desbancando do poder o grupo dos coronéis, resultado do projeto politicamente viabilizado por Gonzaga Mota e sustentado por um movimento de massa para derrubar o regime militar, o coronelismo e “acabar com o clientelismo”. Dessa forma, põe fim à hegemonia política dos governos militares no Ceará.

Essa ruptura no poder só foi possível devido ao processo de reorganização e exercício do poder político no Ceará, ocasionada com a mudança do domínio político dos coronéis para o empresários modernos, quando Tasso Jeriessati foi eleito governador do Ceará em 1986. O contexto histórico e econômico também contribuíram para a ruptura do sistema coronelista para um sistema político moderno. Nesse sentido, segundo Carvalho,

Com a desestruturação das velhas formas de economia e de política, duas alternativas básicas de reorganização e exercício do poder se anunciam. A primeira, materializada na presença dos movimentos de trabalhadores rurais no cenário político partidário, o que certamente tem implicações no desenho do poder local. A segunda, representada pela participação na disputa de postos políticos por grupos empresariais importantes, que se apresentam como críticos do coronelismo e portadores de uma mensagem de mudança política. (2009, p.12).

Nesse momento, a situação do município de Pereiro é idêntica a de muitos outros da sua região. Conforme estudos de Rodrigues, Menezes, Moura (2010, p. 21),

A região do Vale do Jaguaribe controlava esse poder oligárquico marcado pelo apadrinhamento, favores clientelistas e nepotismos exagerado. O que se fez em comum no município de Pereiro, município brasileiro do estado do Ceará que perpassou esse período coronelista.

A história real do município ultrapassa as fronteiras literárias de seus poetas, poetisas e cantadores, ou melhor, insere-se em uma sociedade dividida pelas classes sociais, portanto, ainda marcada pelo exercício do coronelismo, na qual “A estagnação econômica e social se arrastava por longos anos, chegando a despertar um sentimento de utopia na sociedade. O município de Pereiro ansiava por uma abertura política”. (RODRIGUES, MENEZES, MOURA, 2010, p. 21-22).

3.5. Governo Jereissati, movimento e oposição ao coronelismo municipal versus

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