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PARTE I REVISÃO DA LITERATURA

CAPÍTULO 1. O SETOR DA FARMÁCIA

1.2. POLÍTICA DO MEDICAMENTO

Encarando-se as alterações ocorridas ao nível dos medicamentos como determinantes para a situação económico-financeira das farmácias, aborda-se, de seguida, sucintamente e apenas nos aspetos mais relevantes, esta problemática.

Conforme Barros e Nunes (2011), a despesa com medicamentos em Portugal, na década de 2000 a 2009, teve um crescimento considerável, independentemente do nível de avaliação (valor absoluto, per capita, em proporção da despesa total em saúde ou em proporção do PIB). Concretamente, os autores apontam níveis de crescimento na ordem de 1.4% (Barros e Nunes, 2011), como se pode verificar no gráfico infra.

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2007 2008 2009 2010 2011P 2012Pe

Valor (106 €) 15 838,6 16 602,8 17 256,2 17 552,7 16 536,8 15 628,10 Taxa de variação nominal (%) 4,8 4,8 3,9 1,7 -5,8 -5,5 % do PIB (%) 9,4 9,7 10,2 10,2 9,7 9,5 Per capita (€) 1.493,03 1.562,99 1.622,97 1.650,10 1.552,64 1.474,03

Valor (106 €) 169 319,2 171 938,1 168 529,2 172 859,5 171 053,1 165 246,8 Taxa de variação nominal (%) 5,3 1,6 -2 2,6 -1 -3,4 Despesa corrente em saúde

Produto Interno Bruto (PIB)

Figura 2 - Despesa total em medicamentos Fonte: Barros e Nunes (2011)

No entanto, o Memorando de Entendimento da Troika exigiu ao Estado Português a aplicação de um conjunto de medidas, de modo a reduzir a despesa pública com os medicamentos, o que se veio a verificar nos anos de 2011 e 2012, como se descreve na figura seguinte.

Fonte: INE

P – Provisório Pe - Preliminar

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Através do Quadro 1 constatamos uma inversão da tendência de crescimento da despesa corrente em saúde, assistindo-se a uma acentuada diminuição nos anos de 2011 e 2012 sendo -5,8% em 2011 comparativamente com o ano anterior, e de -5,5% em 2012, o que corresponde a 9,70% e 9,5%, respetivamente, do Produto Interno Bruto (PIB).

A realidade não foi muito diferente de outros países europeus de referência. O gráfico seguinte apresenta o peso do custo dos medicamentos nas despesas de saúde em Portugal e nos três países de referência utilizados no sistema de fixação de preços por referência internacional (Barbosa, 2012).

Figura 3 - Custo com medicamentos em percentagem dos custos em saúde 2002-2009 Fonte: Barbosa (2012)

Nos últimos anos a situação evidenciava gastos com a saúde muito superiores à variação ocorrida no produto interno bruto (PIB)1,o que motivou a adoção de medidas de contenção da despesa com medicamentos. Segundo Barbosa (2012), de 2002 a 2009, Portugal foi quem apresentou uma redução mais significativa, 5,4 p.p.. Assim sendo, qualquer avaliação da política do medicamento tem de ser contextualizada no quadro da evolução da despesa com medicamentos, simultaneamente, causa e resultado de medidas legislativas.

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Portugal adotou, neste âmbito e nestes últimos 10 anos, medidas similares à de outros países da Europa Ocidental, designadamente a promoção do uso de medicamentos genéricos. Para o Estado, a vantagem da utilização deste tipo de medicamentos insere-se nos objetivos de redução da despesa pública a este nível, porquanto o seu preço é inferior ao dos medicamentos de referência.

Para os utentes, significa poderem usufruir de medicamentos de qualidade comprovada a um preço mais baixo (Barros e Nunes, 2011). A evolução em Portugal do consumo desse tipo de produto vem traduzida na figura seguinte em termos de valor e de volume de transações.

Figura 4 - Evolução da quota de mercado dos medicamentos genéricos em valor e volume Fonte: Barbosa (2012)

Barbosa (2012) refere que, até meados de 2001, quase não havia mercado de genéricos em Portugal, começando a desenvolver-se a partir dessa data, inicialmente a um ritmo lento e, mais acelerado, em meados da década.

A figura seguinte apresenta a evolução das quotas dos genéricos no mercado nacional. A APIFARMA (2013) demonstra-nos que o número de consumo de embalagens subiu desde 2003 em 300%, verificando-se uma diminuição a nível dos valores.

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Figura 5 - Evolução das quotas de Genéricos no mercado Total – Em valor e em volume Fonte: APIFARMA (2013)

A problemática dos medicamentos genéricos mantém-se em discussão até à data, continuando a ser objeto de medidas legislativas. O governo pretende atingir 60% do mercado até final em 2014, pelo que irá conceder 50 cêntimos por cada medicamento vendido às farmácias que vendam mais de 45% dos seus produtos em genéricos (Garcia, 2013).

Independentemente das variáveis de análise, que suportam as conclusões dos estudos efetuados, e das discussões que a temática suscita, o incremento da venda dos medicamentos genéricos é um fator muito importante na Política do Medicamento, a qual engloba também a liberalização da venda de MNSRM, que se traduz não só em preços mais baixos praticados pelas parafarmácias (cerca de 6% em média), como também em preços mais baixos nas farmácias limítrofes cerca de 1,4%(Barros e Nunes, 2011).

A Política do Medicamento, segundo o INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, IP (2013), visa: (i) assegurar o acesso aos medicamentos, bem como a sua eficácia, segurança e qualidade; (ii) garantir a sustentabilidade do sistema, através de uma maior racionalidade e eficiência na gestão

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do medicamento em meio ambulatório e hospitalar; (iii) melhorar a prescrição e despensa; (iv) promover o desenvolvimento do setor farmacêutico.

Refletindo sobre os objetivos enunciados e relativamente à década em análise, Barros e Nunes (2011) concluíram em relação, especificamente, ao acesso aos medicamentos, que as medidas referentes aos MNSRM levaram ao aumento da acessibilidade geográfica, pela abertura de pontos para a respetiva venda e a uma maior acessibilidade via preço, uma vez que o preço nestes postos de venda aumentou, em média, menos do que a inflação.

No que respeita à sustentabilidade do sistema, a despesa global com medicamentos foi independente das medidas adotadas, uma vez que as reduções administrativas de preços diminuem a despesa por efeito mecânico, mas não alteram a tendência de crescimento. Verificou-se um aumento da quota do mercado e de consumo de genérico, embora independente, em grande escala, da promoção usada. Houve uma redução, principalmente dos preços de medicamentos de marca e menos nos genéricos, em grande medida pela antecipação da entrada em vigor dos preços de referência, Barros e Nunes (2011).

No que se refere à melhoria da prescrição, não houve resultados significativos, embora tenha havido uma redução do consumo não racional em algumas áreas, mas, não se podendo considerar como efeito de medidas da Política do Medicamento. Também não se verificaram medidas sistemáticas que fomentem o desenvolvimento do setor farmacêutico nem uma preocupação específica de proteção da indústria farmacêutica nacional, nem de explicitação de como fazê-lo através desta Política, refere (Barros e Nunes, 2011)

No entanto, relativamente a 2012, o relatório “Análise do Mercado de Medicamentos em Ambulatório– (AMMA) dezembro 2012” evidencia ser o ano em que o acesso a medicamentos aumentou em Portugal, ao mesmo tempo que os utentes do SNS suportaram encargos mínimos históricos dos últimos 5 anos (Portal da Saúde, 2013).

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O relatório "AMMA – dezembro 2012" mostra que os portugueses, em relação a 2011, consumiram mais 5,8 milhões de embalagens de medicamentos (+ 2,5%) e reduziram as despesas com a farmácia em 343 milhões de euros (-11,7%). Considerando o segmento dos medicamentos comparticipados, os utentes pouparam 110 milhões de euros, gastando menos 15%, extrapolando os 107 milhões de euros poupados até novembro de 2012, e o SNS poupou 151 milhões de euros (INFARMED, 2012, citado no Portal da Saúde, 2013). Assim, considerando os dados disponíveis para os 5 últimos anos, segundo o Portal da Saúde, 2013), nunca o Estado e os utentes tiveram encargos tão baixos com os medicamentos, o que se deve à implementação e consolidação das medidas a seguir enunciadas:

 Revisão internacional do preço de medicamentos, efetuada comparando e alinhando os preços em Portugal com preços mais baixos de outros países europeus;

 Incentivo ao mercado de genéricos e competição pelo preço, desbloqueando judicialmente as questões relacionadas com patentes e aumento de substâncias ativas com medicamento genérico comercializadas;

 Implementação da prescrição e dispensa por denominação comum internacional (DCI), determinando a dispensa dos medicamentos mais baratos que cumpram a prescrição médica, exceto se for outra a opção do próprio utente;

 Aumento da quota de medicamentos genéricos, tendo os mesmos atingidos ¼ de todas as embalagens do mercado e 35% dos medicamentos comparticipados pelo SNS.

Todas estas medidas e outras que visem o controlo de custos, incluindo as diretamente direcionadas para as farmácias e grossistas, como seja a alteração da margem de lucro, por escalão de preços e de forma regressiva, estabelecida no decreto-lei nº 112/2011, de 29 de novembro, exigem do setor farmacêutico a adoção de estratégias de readaptação, designadamente a nível de marketing, para controlo dos seus próprios custos, porquanto, como refere Marques (2011), Portugal ainda não refletiu sobre um plano nacional para uma política da farmácia e do medicamento.

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Mais concretamente, e no que diz respeito à política de controlo das margens de lucro dos medicamentos, estas variam consoante os escalões dos medicamentos, salientando- se o valor fixo da margem de lucro, a partir de 50,01 €, o que implica um esforço acrescido para as farmácias.

Quadro 2 - Margens de lucro definidas por Dec. Lei nº 112/91

PVA Min PVA Max PIC Min PIC Max Margem % Valor Fixo Fee 0,00 € 5,00 € 0,00 € 7,40 € 27,90 0,00 € 0,00 € 5,01 € 7,00 € 7,41 € 10,29 € 25,70 0,00 € 0,11 € 7,01 € 10,00 € 10,30 € 14,58 € 24,40 0,00 € 0,20 € 10,01 € 20,00 € 14,59 € 28,56 € 21,90 0,00 € 0,45 € 20,01 € 50,00 € 28,57 € 69,12 € 18,40 0,00 € 1,15 € 50,01 € 999.999,99 € 69,13 € 999.999,99 € 0,00 10,35 € 0,00 €

Fonte: ANF - Sifarma 2000 Versão2.8.10

Em que:

PVA Min – Preço mínimo de venda ao armazenista PVA Max – Preço máximo de venda ao armazenista PIC Min – Preçomínimo inscrito no caixa

PIC Max – Preço máximo inscrito no caixa Fee –Taxa de compensação fixa

Na perspectiva dos empresários da farmácia, esta legislação é limitadora na medida em que uma descida acentuada do preço dos medicamentos restringe a capacidade de obtenção do lucro do setor.

O compromisso assumido no Memorando de Entendimento da Troika (2011) pretendia reduzir os custos públicos com medicamentos para 1,25% do PIB até final de 2012 e para cerca de 1% do PIB em 2013. Porém o presidente da APIFARMA revelou que a despesa publica em medicamentos seria superior à meta da Troika, devendo atingir 1.13% em 2013.

É, contudo, evidente que o facto de Portugal ter estado sob um Programa de Assistência obrigou à adoção de medidas urgentes que visavam garantir a sustentabilidade do SNS,

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que passavam pela redução do preço dos medicamentos. O esforço nesse sentido está patente na diminuição nominal conseguida na despesa corrente da saúde, em 2011 (5,8%) e em 2012, (-5,5%) (INE, 2012).

Como se pode verificar na figura seguinte, em 2011 e 2012, a despesa corrente em saúde diminuiu a um ritmo muito superior ao do PIB, que registou reduções nominais de -1,0% em 2011 e -3,4%, em 2012.

Os gráficos infra mostram uma diminuição das despesas do SNS com os prestadores. No que se refere às farmácias, as medidas da política do medicamento implementadas, que se traduziram no decréscimo dos preços dos medicamentos, na diminuição das comparticipações pelo SNS e no incremento dos medicamentos genéricos, propiciaram também uma redução significativa da despesa do SNS (INE, 2012).

Figura 6 - Despesa corrente em Saúde e PIB (2007-2012Pe) - (variação nominal 2007=100) Fonte: INE: Conta Satélite da Saúde, junho 2012

Nota: P - Provisório; Pe - Preliminar

Figura 7 - Despesa corrente do SNS por principais prestadores (2007-2011P) Fonte: INE

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Figura 8 - Despesa corrente do SNS, por prestador (2007-2011P) Fonte: INE: Conta Satélite da Saúde, junho 2012

Em suma, podemos afirmar que as diversas alterações legislativas foram o lastro das dinâmicas de mudança num setor, que, dada a radicalidade das mesmas, só abraçando novos desafios com dinamismo crescente e adotando estratégias que tenham em linha de conta o contexto circundante, valorizando a qualidade do serviço prestado, sem descurar a gestão racional dos recursos, poderá transformar as ameaças em oportunidades e afirmar-se, nesta nova realidade, como um dos principais agentes de prestação de saúde em Portugal.