• Nenhum resultado encontrado

IDEOLÓGICAS: CULTURAS E IDENTIDADE LOCAIS NAS POLÍTICAS LINGUÍSTICAS

3.3 POLÍTICAS LINGUÍSTICAS NO PERÍODO REPUBLICANO 99 : A BUSCA PELA CONSTITUIÇÃO DE “UMA NAÇÃO

3.3.4 Políticas de educação bilíngue e interculturalidade para todos na década de

Esta década foi marcada pelo conflito armado interno entre grupos de ultra esquerda e o Estado. Essa situação de violência e a elaboração de políticas destinadas à inserção do sistema capitalista no interior do país provocou a perda progressiva das terras e o enfraquecimento das organizações comunais (OLIART, 2003), provocando também deslocamentos para as principais zonas urbanas. As zonas urbanas foram hostis diante desses fenômenos migratórios, colocando em evidência a profunda desigualdade social entre o urbano e o rural, indígenas e não indígenas. A migração para as cidades foi “sinônimo de morte cultural, de assimilação e discriminação” (BELLO, RANGEL, 2000, p.19) e o ambiente das cidades foi adverso para a manutenção ou desenvolvimento de uma identidade indígena própria. As populações urbanas olhavam negativamente a heterogeneidade cultural ainda considerada como problema indígena.

Com Alberto Fujimori no governo, se emitiu a Política Nacional de Educación Intercultural y Educación Bilingue Intercultural para el Quinquenio 1991-1995 (PEBI, 1991). Segundo a nomeação desta política, se distinguem dois grupos alvos: hispanofalantes, aos quais estariam dirigidos a educação intercultural e os vernáculo-falantes, com a educação bilíngue intercultural. A seguir, trago uma citação da referida política,

A interculturalidade deverá constituir o princípio reitor de todo o sistema educativo nacional. Em tal sentido, a educação de todos os peruanos será intercultural.

A interculturalidade propiciará ao mesmo tempo o fortalecimento da própria identidade cultural, a autoestima, o respeito e a compreensão de culturas distintas.

A adoção da interculturalidade é essencial para o progresso social, econômico e cultural, tanto das comunidades e regiões como do país em sua totalidade.

Para as populações indígenas e camponesas cuja língua predominante seja vernácula a educação será bilíngue além de bicultural.

Para as populações hispanofalantes, o sistema educativo incluirá conteúdos referentes às culturas e línguas existentes no país e, quando for possível, o ensino de algumas línguas vernáculas. (MINEDU, 1991)124

A Politica Nacional de Educación Bilingue Intercultural de 1991 representou um avanço do conceito de interculturalidade, pois envolveu toda a população nacional em suas implicações positivas na constituição do sujeito-cidadão com valores para o convívio intercultural. Isto é, colocou o sujeito-cidadão em diálogo com o outro diferente em seus repertórios culturais, mas iguais enquanto ao reconhecimento de suas culturas. No entanto, permaneceu ainda uma concepção limitada do que especificamente se concebia como interculturalidade. Segundo o último paragrafo do texto supracitado, a interculturalidade para as populações não-indígenas aponta a inserção de informações sobre as culturas dos povos indígenas e, em algum caso hipotético, o ensino da língua vernácula.

Importa registrar aqui que a Constituición Política del Peru, oficializada em 1993, antecedeu em um ano a ratificação da Convenção n°169 que declarou o país como plurilíngue e multicultural a partir do direito individual, mas não reconhece a existência dos indígenas. Juridicamente, a representação dos povos está associada ao seu caráter agrícola e de proprietários de terras com algum reconhecimento de suas particularidades culturais (art. n°89). Ou seja, os povos indígenas são reconhecidos pelo seu caráter rural, razão pela qual as políticas de educação bilíngue intercultural passam a ser destinadas somente no setor

124 Tradução minha. No original: “La interculturalidad deberá constituir el principio rector de todo el sistema educativo nacional. En tal sentido, la educación de todos los peruanos será intercultural. La interculturalidad propiciará al mismo tiempo el fortalecimiento de la propia identidad cultural, la autoestima, el respeto y la comprensión de culturas distintas. La adopción de la interculturalidad es esencial para el progreso social, económico y cultural, tanto de las comunidades y regiones como del país en su totalidad. Para las poblaciones indígenas y campesinas cuya lengua predominante sea vernácula la educación será bilingüe además de intercultural” (MINISTERIO DE EDUCACIÓN, 1991)

rural e não nas zonas urbanas, ainda que a convenção 169 coloque o princípio de autoidentificacão anteriormente descrita (DEFENSORIA DEL PUEBLO, 2011).

Desde os tempos de colônia até a década de 1970, os povos originários foram silenciados e excluídos da historia nas projeções ocidentais de nação moderna. Nos anos 70 e 80, se emitiram políticas destinadas aos povos originários em termos de classe social campesina com certo reconhecimento cultural. Finalmente nos 90, com a subscrição à convenção 169 que resguarda os direitos dos povos indígenas e diversidade cultural, como mencionado anteriormente, houve uma orientação para uma cidadania intercultural, ainda que só no discurso oficial.

Na atual constitución política, as declarações dos direitos linguísticos no território peruano estão textualizadas em três artigos. O artigo n° 2 estabelece que “toda pessoa tem direito a sua identidade étnica e cultural. O estado reconhece e protege a pluralidade étnica e cultural da nação”. No artigo n° 15 se estabelece que os estudantes “tem direito a uma educação que respeite sua identidade”. No artigo n° 17, encontramos o compromisso estipulado de que o estado “[...] fomenta a educação bilíngue e intercultural, segundo as características de cada zona. Preserva as diversas manifestações culturais e linguísticas do país. Promove a integração nacional”. E, finalmente, no artigo n° 48, há a declaração de que “são idiomas oficiais o castelhano e em zonas onde predominem o quéchua, o aimará e as demais línguas aborígenes, segundo lei”.

A normatividade constitucional que sustenta a educação intercultural bilíngue se concentra no Título I da Constitución del Perú de 1993 referida aos direitos da pessoa e da sociedade. Portanto, pontuo aqui que a multiculturalidade e o plurilinguismo são reconhecidos a partir do direito individual e não como característica de povos segundo a Constitución Política del Perú. A seguir, no quadro n° 2 apresento os artigos relacionados às políticas linguísticas do país segundo à estruturação textual do documento Constitución Política del Perú de 1993. Trago aqui este documento, já que representa a viabilidade de toda política contemporânea de Estado.

Quadro 2 – Constitución Política del Perú de 1993 segundo artigos referidos às políticas línguísticas do país.

TÍTULO CAPÍTULO ARTIGO

Título I. Da pessoa e da sociedade. Capítulo I. Direitos ´Fundamentais da Pessoa.

Art. 2. Inc. 2 O Estado reconhece e protege a diversidade étnica e cultural da nação. Cada peruano tem o direito de usar sua própria língua perante qualquer autoridade através de um intérprete.125

Capítulo II. Dos direitos