• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO I – FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

1.4 POLÍTICAS PÚBLICAS DO LIVRO DIDÁTICO NO BRASIL

De acordo com Laurence Hallewell (2005), os primeiros livros escolares brasileiros foram publicados pela Imprensa Régia em 1810, num esforço de suprir a lacuna deixada pelo corte no fornecimento dos livros vindos da Europa, em consequência das guerras napoleônicas. Mas, com o restabelecimento do comércio entre a Europa e o Brasil, a produção de livros escolares brasileiros não prosperou. Entre outros fatores que contribuíram para essa derrocada, destaca-se o tamanho do mercado que era muito pequeno, não despertando o interesse de nenhuma editora nacional e os métodos de ensino utilizados nas escolas da época, que dispensavam o uso de livros.

Durante muito tempo a produção de livros no Brasil ficou restrita à confecção de livros destinados ao ensino superior. A falta de livros escolares produzidos no Brasil e que atendessem às condições locais era visto como um fator impeditivo ao desenvolvimento da educação brasileira como mostra Hallewell (2005). Somente a partir de 1846, livros escolares começam a ser produzidos juntos com jornais numa escala mais comercial por tipografias locais.

No entanto, foi Baptiste Garnier, proprietário da Editora Garnier, o primeiro que se propôs a assumir os riscos do mercado e editar livros didáticos. Felisberto Rodrigues Pereira de Carvalho era o principal autor de livros didático da Garnier, responsável por diversos títulos, em sua maioria destinada à educação primária. Essa produção de iniciativa privada, não era respaldada pelos órgãos governamentais, os quais só instituíram programas de livros didáticos após 1930.

Os anos 1930 foram marcantes para a Educação Brasileira, com a realização da IV Conferência Nacional de Educação, em dezembro de 1931, que resultou, no ano seguinte, na publicação do mencionado Manifesto dos Pioneiros, documento dirigido ao povo e ao governo, propondo uma nova educação. O Manifesto teve uma grande repercussão com reflexo direto na Constituição de 19347, em que, no Cap. II art. 157, se refere ao livro didático, como material escolar, a ser distribuído gratuitamente, tornando-o parte de políticas mais amplas e contínuas.

7http://www.soleis.com.br/ebooks/Constituicoes1-17.htm

As sobras das dotações orçamentárias acrescidas das doações, percentagens sobre o produto de vendas de terras públicas, taxas especiais e outros recursos financeiros, constituirão, na União, nos Estados e nos Municípios, esses fundos especiais, que serão aplicados exclusivamente em obras educativas, determinadas em lei. (C. F. BRASIL, 1934).

O primeiro ato oficial sobre Políticas Públicas do Livro Didático data de 1937, com a implantação do Instituto Nacional do Livro – INL, pelo então Ministro da Educação Gustavo Capanema que em carta ao Presidente ressalta a importância do livro e a função do Estado em relação ao mesmo:

“O livro é, sem dúvida, a mais poderosa criação do engenho humano. A influência que ele exerce, sob todos os pontos de vista, não tem contraste.(...) É, portanto, dever do estado, proteger o livro (...) vigilando no sentido de que ele seja não o instrumento do mal, mas sempre o inspirador dos grandes sentimentos e das nobres causas humanas.” (GUSTAVO CAPANEMA).

O INL tinha, entre outras atribuições, a de editar obras literárias para a formação cultural da população, elaboração de uma enciclopédia e de um dicionário e a expansão do número de bibliotecas públicas por todo o território nacional.

Em 1938, foi instituído, pelo do Decreto-Lei no 1.006, a Comissão Nacional do Livro Didático, para produção, importação e utilização do livro didático no Brasil. Esse Decreto-Lei estabelece critérios para autorização de edição de livros didáticos e exigências quanto à correção de informação e linguagem. Em seu art. 2°, definiu, pela primeira vez, o livro didático:

“Compêndios são os livros que expõem total ou parcialmente a matéria das disciplinas constantes dos programas escolares (...) livros de leitura de classe são os livros usados para leitura dos alunos em aula; tais livros também são chamados de livro-texto, compêndio escolar, livro escolar, livro de classe, manual, livro didático.” (C. F. BRASIL, 1938)

As funções dessa Comissão foram redimensionadas pelo Decreto-Lei no 8.460, de 1945, centralizando, na esfera federal, o poder de legislar sobre o livro didático. Dessa forma, o Estado assumiu o controle sobre o processo de adoção de livros em todos os estabelecimentos de ensino no território nacional.

Criada, em 1952, pelo Diretor do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos – INEP, Anísio Teixeira, a Campanha do Livro Didático e Manuais de Ensino – CALDEME. Buscando amenizar as deficiências de qualificação dos docentes do ensino secundário, foi proposta por Anísio Teixeira a criação de duas campanhas: a

Campanha de Inquéritos e Levantamentos do Ensino Médio e Elementar – CILEME, que tinha como objetivo o levantamento das deficiências no processo de ensino, e a Campanha do Livro Didático e Manuais de Ensino – CALDEME, que tinha a incumbência de elaboração de livros didáticos, guias e manuais de ensino para docentes e diretores das escolas, a fim de suprir as deficiências identificadas pela CILEME.

A década de 1960 tem como pano de fundo a corrida espacial entre americanos e soviéticos, o que incita a busca de novos talentos pelo mundo afora e investimentos nas áreas tecnológicas, as quais, para se desenvolverem, necessitam de profissionais qualificados e com o domínio em áreas como Física e Química. Diante desse novo panorama, o presidente Castello Branco, em 1966, por meio do Decreto n° 59.355, de 4 de outubro, cria a Comissão do Livro Técnico e do Livro Didático – COLTED, para: incentivar, orientar, coordenar e executar as atividades do Ministério da Educação e Cultura relacionadas com a produção, a edição, o aprimoramento e a distribuição de livros técnicos e de livros didáticos.

Problemas internos na COLTED e a nova ordem interna levaram o Brasil a firmar um acordo com os Estados Unidos da América – EUA, acordo conhecido como MEC/USAID8, que tinha como objetivo aperfeiçoar o modelo educacional

brasileiro. Esse acordo permitiu a vinda de materiais didáticos denominados de projetos, exclusivos para as áreas de Ciências Naturais e Matemática visando ao desenvolvimento tecnológico. Foram eles: o PSSC (Physical Science Study Committee) de Física, CBA (Chemical Bond Approach) de Química, o BSCS (Biological Sciences Curriculum Study) de Biologia e o SMSG (Science Mathematics Study Group) de Matemática. Esses materiais foram desenvolvidos por professores do Massachusetts Institute of Technology– MIT, em 1956.

O Acordo MEC/USAID foi firmado em Janeiro de 1967 e segundo Freitag et al. (1989) tinha como meta disponibilizar gratuitamente cerca de 51 milhões de livros para estudantes brasileiros, no período de três anos, além de propor um programa de desenvolvimento que incluiria a instalação de bibliotecas e um curso de

treinamento de instrutores e professores em várias etapas sucessivas. Para a execução desse programa, a COLTED contava com um grande aporte financeiro.

Com a extinção da COLTED, em 1971, o Instituto Nacional do Livro assumiu as atribuições relacionadas ao livro didático, desenvolvendo o Programa do Livro Didático para o Ensino Fundamental – PLIDEF. Com o fim do acordo MEC/USAID, implantou-se a o sistema de contribuição financeira das unidades federadas para o Fundo do Livro Didático.

Em 1976, a Fundação Nacional do Material Escolar – FENAME, cujo estatuto foi aprovado pelo Decreto Nº 62.411, de 15 de Março de 1968, em substituição à Campanha Nacional de Material de Ensino – CNME, tornou-se responsável pela execução dos programas do livro didático. Os recursos eram provenientes do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE, da contribuição social do salário-educação e da contrapartida dos estados.

Logo no início dos anos de 1980, a FENAME foi extinta e três anos depois foi criada a Fundação de Assistência ao Estudante – FAE, que absorveu o PLIDEF. Em 1985, o Decreto 9.154, de 19 de agosto, regulamenta o Programa Nacional do Livro Didático em substituição ao Programa Nacional do Livro Didático para o Ensino Fundamental, o qual trouxe várias mudanças na execução da política do livro didático.

O Plano Decenal de Educação para Todos (1993),conjunto de diretrizes de política em processo contínuo de atualização e negociação, cujo horizonte deverá coincidir com a reconstrução do sistema nacional de educação básica, descreve o livro didático da seguinte forma:

O livro didático constitui um dos principais insumos da instituição escolar. Os aspectos referentes à sua política, economia, gerência e pedagogia são indissociáveis das demais características da questão educacional brasileira. (PLANO DECENAL DE EDUCAÇÃO 1993, p. 25).

Publicado em 1993, o Plano Decenal de Educação delega ao Ministério da Educação - MEC, a responsabilidade pelas metas relacionadas á qualidade do livro didático. Cabendo ao ministério zelar pela qualidade física e pedagógica do material didático, capacitar os professores para avaliar e escolher os títulos, ficando ainda a

cargo do MEC o planejamento de uma nova política pública para o livro didático. O Plano ressalta uma falta de política pública consistente que se preocupe com o aspecto qualitativo do livro didático.

A primeira providência tomada pelo MEC foi nomear uma comissão de especialistas dos vários componentes curriculares do ensino fundamental, que institui critérios para avaliação dos livros didáticos das quatro primeiras séries do ensino fundamental. Os critérios de avaliação e o resultado das avaliações realizadas por essa comissão dos compêndios mais utilizados pelos professores foram publicados no livro Definição de Critérios para Avaliação dos Livros Didáticos (1994).

A partir do ano de 1997, é extinta a FAE, e a execução do PNLD passa a ser responsabilidade do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE. Além do PNLD o FNDE abriga outros programas como Programa Nacional de Alimentação Escolar – PNAE, o Dinheiro Direto na Escola – PDDE, o Programa Nacional de Transporte Escolar – PNTE, o Programa Nacional Biblioteca da Escola – PNBE, o Fundescola, o Programa Nacional de Informática na Educação – Proinfo e o Programa de Alfabetização Solidária (FNDE, 2003).

A gestão do PNLD pelo FNDE possibilitou uma ampliação do programa, tornando-o mais abrangente, com distribuição de livros didáticos para todas as séries do ensino fundamental, inclusive a alfabetização. Ao longo dos anos o programa vem sendo implementado com a inserção de outros materiais como dicionários de língua portuguesa, livros em Braille e em outros suportes digitais. Segundo Serwy (2005) no período compreendido entre 1995 e 2005 o Governo Federal adquiriu por meio do PNLD cerca de 1 bilhão de livros didáticos, investindo R$ 3,8 bilhões.

Com a atenção do governo voltada para a educação básica e não somente para o ensino fundamental, o programa do livro didático é ampliado e passa a atender o ensino médio por meio do Programa Nacional do Livro Didático para o Ensino Médio (PNLD EM). Esse programa foi implantado em 2004, pela Resolução nº 38, de 15 de outubro de 2003, e pela Portaria 2.922, de 17 de outubro de 2003, que prevê uma universalização do livro didático do ensino médio aos educandos da

rede pública de ensino do país. O principal objetivo do PNLD EM é prover as escolas do ensino médio das redes públicas estaduais, municipais e do Distrito Federal de livros e outros materiais didáticos de qualidade, para uso dos alunos e professores, abrangendo os componentes curriculares para essa etapa da Educação Básica.

A execução desse Programa ficou a cargo do FNDE ao qual couberam as seguintes atribuições: inscrição e triagem dos livros, produção gráfica e distribuição do catálogo de orientação para a escolha dos livros e dos formulários de escolha, processamento dos dados contidos nos formulários; aquisição e distribuição dos livros, coordenação das atividades de distribuição e da Secretaria de Educação Básica – SEB/MEC que ficou responsável pela avaliação pedagógica dos livros; elaboração das resenhas dos livros e do catálogo de escolha dos livros aprovados na avaliação; elaboração do catálogo de orientação para a escolha dos livros; monitoramento do processo de escolha dos livros pelos professores; acompanhamento da distribuição dos livros; avaliação do uso do livro e do Programa Nacional do Livro Didático, conforme a Portaria que criou o Programa.

De acordo com a Secretaria de Educação Básica do MEC, a avaliação dos livros é feita por uma equipe de especialistas em educação básica (professores- doutores) de universidades federais, por um convênio entre o MEC e essas instituições. Os critérios básicos que norteiam essa avaliação pela equipe de especialistas são:

a) a falta de erros conceituais;

b) a coerência teórica-metodológica no conteúdo e nas atividades propostas; c) a contribuição para a cidadania, sem expressar preconceito, doutrinação ou

publicidade.

Existem ainda os critérios específicos de acordo com cada área específica. Esses critérios são instituídos pelo MEC que também coordena e elabora os editais.

Após a avaliação é elaborado um guia com os critérios de avaliação e a resenhados títulos recomendados. Esse guia é enviado para todas as escolas públicas do Brasil e a partir dele os professores têm autonomia para fazer a escolha do livro didático que utilizarão em sala de aula.

Os especialistas têm uma grande capacidade para avaliar os livros didáticos, sua atenção foca os aspectos mais técnicos tais como: a coerência entre a seleção dos conteúdos e a proposta curricular, ensino-aprendizagem e a relevância do conteúdo proposto nos textos. Além dos aspectos técnicos existem outros que são perceptíveis pelos professores, tendo em vista a sua experiência em sala de aula.

O edital do PNLD/2015 foi lançado pelo MEC cujo objetivo é a convocação de autores de obras didáticas, destinadas ao ensino médio. Esse edital comparado ao edital de 2012, também destinado ao ensino médio apresenta alguns avanços um deles diz respeito à composição das obras. De acordo com o edital de 2015 as obras são classificadas em: Tipo 1 – obra multimídia composta de livros digitais e livros impressos e Tipo 2 – obra impressa composta de livros impressos e PDF9. Além dessa categorização o edital traz todas as normas e procedimentos para submeter às obras a avaliação.

A implementação desse programa favoreceu a indústria gráfica e proporcionou a abertura do mercado para empresas estrangeiras. Livros didáticos brasileiros vêm sendo impressos na China, Índia, Coreia, Colômbia e Chile, as editoras argumentam que a indústria gráfica nacional não tem capacidade para atender a demanda no prazo estipulado. Na verdade os motivos são outros. Em alguns desses países, as relações trabalhistas ainda são extremamente complicadas, devido à exploração da mão de obra o que barateia o custo de produção. Segundo dados do MEC, para o ano de 2012 o Governo comprou 170 milhões de livros didáticos.

Brasil e Argentina são os países da América do Sul com o maior mercado editorial, seguidos de Colômbia, Chile e Venezuela como esclarece Cabanellas (2001). É um mercado em franco crescimento e que deve estar preparado para as mudanças que ocorrerão, com a adaptação do livro didático impresso para o livro didático em formato digital, previsto para as novas edições do Programa Nacional do Livro Didático.

9Formato de arquivo, desenvolvido pela Adobe Systems em 1993, para representar documentos de

maneira independente do aplicativo, do hardware e do sistema operacional usados para criá-los. Um arquivo PDF pode descrever documentos que contenham texto, gráficos e imagens num formato independente de dispositivo e resolução.

Documentos relacionados